Revista Aime 11

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Nesse mar de informações truncadas, ainda podemos encontrar participantes que tentam desconstruir ou criar o efeito de que estão desconstruindo os estereótipos do gay:

Me entristece muito ver alguns perfis que taxam, que exigem perfeição de seres que nasceram apenas para almejar e não para obter a mesma. Ao meu ver esse tipo de perfil mostra abertamente que seu mentor é um pobre leigo que se afoga em seus preconceitos baratos. Todos aqui são bem-vindos. Pode ser para uma simples conversa, um encontro que talvez não dê em nada, uma amizade inesperada e por fim, se rolar uma química bacana: ‘por que não levar em frente’?

Quando esse participante demonstra sua indignação com os perfis que taxam e exigem perfeição dos outros, e depois critica seus donos atribuindo-lhes a característica de “pobres leigos que se afogam em seus preconceitos baratos”, ele, na verdade, está construindo uma imagem de si, quer se desvencilhar da imagem do gay preconceituoso e exigente de perfeição, pois afirma que “todos aqui são bem-vindos”. Ao analisar a forma como os homossexuais masculinos constroem uma imagem de si ao se descreverem e descreverem o outro em um site de relacionamento, percebemos que grande parte baseia-se em diversos estereótipos sobre o grupo dos gays, como o do gay afeminado e também do gay promíscuo, mantendo, dessa forma, uma homogeneidade. Independentemente de se o estereótipo serve para excluir o outro de forma preconceituosa ou para fazer um discurso de inclusão “politicamente correto”, fato é que grande parte dos textos presentes nos perfis toca nas características mais estigmatizadas dos homossexuais. Isso parece contribuir para a ideia de que os homossexuais mantêm, entre si, o preconceito existente na cultura tradicionalmente heterossexual. Como afirmou um participante de um site, trata-se de um “precon-

ceito requentado” que, embora indesejável por todos os componentes do grupo, se direcionado para si, é usado como critério para a escolha do outro ou para a criação de uma autoimagem positiva. Embora muitos possam pensar que a repulsa e a crítica estejam baseadas no gosto pessoal de cada participante, questionamos se esse gosto é realmente pessoal ou um reflexo do que se considera positivo na sociedade em geral. Evitaremos adentrar, no entanto, nesse âmbito, pois gosto não se discute. Ou se discute? *Daniel Mazzaro elaborou o artigo acima para a AIMÉ com base na pesquisa “Gosto se discute? – Análise de perfis de um site de relacionamento gay”, realizada para conclusão do curso de graduação da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais. AIMÉ

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