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Valdir Oliveira: um cearense com disposição para retribuir tudo que recebeu de Brasília

Atual superintendente do Sebrae-DF, Valdir Oliveira se prepara para deixar o cargo no fim de dezembro, mas ainda como muita disposição para retribuir tudo que recebeu e conquistou na capital federal. Ele chegou a Brasília em julho de 1982, no auge da sua adolescência, o que lhe proporcionou acompanhar o boom do rock na cidade. Iniciou sua jornada em defesa das micro e pequenas empresas no antigo CEAG, que antecedeu o Sebrae, e sempre acreditou no grande potencial empreendedor da cidade.
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Conte-nos, quem é o Valdir Oliveira? Fale um pouco sobre sua experiência como superintendente do Sebrae.
Sou cearense, torcedor do Fortaleza Esporte Clube, time que aprendi a gostar desde criança. Cheguei em Brasília às 10:30 da manhã do dia 27 de julho de 1982. Com 15 anos, vivi minha adolescência na Brasília dos anos 80, onde o rock e a liberdade eram as pautas da cidade. Como baterista e filho de um democrata assumido, apaixonei-me por Brasília no primeiro instante, quando vivi a derrocada da ditadura e as baladas que encantaram a minha geração, com inspiração da mais bela arte que já vi na vida: o nosso céu, o céu de Brasília.
Sou formado em Administração de Empresas e fiz duas pós-graduações em Economia na Fundação Getúlio Vargas. Iniciei minha jornada em defesa das micro e pequenas empresas quando ainda estava na universidade, momento em que fui selecionado para um estágio no antigo CEAG, que antecedeu o Sebrae, em 1986, quando o Plano Cruzado fracassou, deixando as pequenas empresas endividadas e (quando) precisávamos encontrar soluções fora do crédito para as micro e pequenas empresas de Brasília. Em março de 2011, 25 anos depois da minha experiência no CEAG, assumi a Superintendência do Sebrae no DF, de onde saí para assumir a Secretaria de Desenvolvimento Econômico em 2017, voltando ao comando do Sebrae no DF em 2019.
Em dezembro, encerrarei meu ciclo no Sebrae no DF. Com o sentimento de missão cumprida, como diz a poesia de Fernando Brant “Encontros e Despedidas”, eternizada na voz de Milton Nascimento: “o trem que chega é o mesmo trem da partida”. Paro na estação final do Sebrae no DF e sigo para a próxima estação, com a certeza de que fiz o melhor. Tive muitas conquistas pessoais e profissionais e agora vou seguir para a próxima jornada.

Brasília sempre foi uma cidade de servidores públicos, comércio fraco e sem indústrias. Como é esse cenário hoje?
Brasília tem comércio forte e boas indústrias. Nosso maior problema é o desconhecimento dos próprios brasilienses sobre a verdadeira Brasília, a que abre e fecha seus negócios todos os dias em nossas Regiões Administrativas, que segura o sustento de muitas famílias e que, muitas vezes, tem o sacrifício do empreendedor na manutenção de quem produz e abastece o Distrito Federal - mesmo não sendo a principal pauta dessa cidade, muito menos sendo reconhecido pelos brasilienses como protagonistas da construção da nossa cidade.
Brasília foi construída para ser a capital do país e, como tal, tem no serviço público o seu principal empregador e consumidor. As compras governamentais movimentam bilhões de reais e os salários dos servidores públicos garantem a maior renda per capita do Brasil, garantindo-nos o consumo privilegiado, que deixa nosso comércio e serviço muito fortes, tornando-os grandes indutores da nossa economia.
Brasília terá sempre o serviço público como protagonista importante de nossa economia, mas isso nunca deixará nos-


so setor privado fraco. Ao contrário, esse é o nosso diferencial para impulsionar a nossa economia e nos fazer grande com potencial para que muitos realizem o sonho de ter seu próprio negócio.

Com aumento significativo da população, criação de novas cidades, ampliação do Entorno (Região Metropolitana do DF), a cidade de servidores públicos - e apenas poucos serviços - deixou de existir? O que houve?
O crescimento de Brasília tem se pautado na ampliação do setor privado, porque o setor público tem diminuído a sua capacidade de ser o provedor de empregos no Distrito Federal, como foi a realidade no início da nossa capital. A dinâmica do cotidiano de Brasília gera oportunidades diárias que são aproveitadas e tornam-se realidade em negócios espalhados pelas Regiões Administrativas do DF, ampliando as soluções privadas, como alternativa das próximas gerações. Nossos jovens precisam compreender que o setor privado é uma alternativa viável e uma oportunidade real para quem quer construir sua vida e buscar o sustento de sua família. Há mercado empreendedor no DF hoje? Quais?
Sim. O segmento dos serviços é o de maior potencial no nosso mercado. A nossa renda per capita privilegiada garante um consumo que, em muitos lugares, é supérfluo, mas que, aqui, se torna uma grande opção, garantindo faturamento para nossos empreendedores.
Nosso mercado tem grande potencial no comércio e serviço, mas a realidade econômica do Distrito Federal facilita iniciativas no campo da indústria e do agronegócio que aqui se desenvolvem, porque nossa distribuição geográfica facilita a aproximação entre consumidor e produtor de Brasília.
Hoje, um dos maiores problemas do Brasil - e não diferente no DF - é a falta de emprego, seja por falta de oportunidades e/ou qualificação. O Sebrae no DF tem projeto para isso?
A essência do trabalho do Sebrae é a geração de emprego. O fomento ao empreendedorismo, aos pequenos negócios, é o estímulo à geração de emprego e distribuição de renda. Os pequenos negócios foram responsáveis pela geração de 70% dos empregos no último ano e representam aproxima-


damente 30% do PIB. Não há o que se falar em desenvolvimento com geração de emprego e distribuição de renda, sem a pauta principal ser o fomento aos pequenos negócios.
Qual o maior desafio, hoje, do Sebrae no DF?
Ampliar a sua base de atendimento através dos canais/ soluções digitais. Fazer a atuação do meio digital alcançar os pequenos negócios nas regiões administrativas.
Hoje, o estilo de consumo é diferente de 20 ou 30 anos atrás. Os empreendedores têm acompanhado essa mudança?
A decisão de consumo hoje é influenciada pela comodidade e agilidade. Quem não incorporar isso em seus modelos de negócios estará perdendo mercado. Nossos negócios têm evoluído nisso, mas ainda há muito a ser construído.
O Estado tem acompanhado essas mudanças e qualificado os empreendedores, de modo que eles possam atender esse novo estilo?
A grande máquina de qualificação de empreendedores no Brasil é o Sistema Sebrae. O papel do Estado é sinérgico ao Sistema Sebrae, complementando com a desburocratização do ambiente empreendedor e a oportunidade do crédito de fomento.
O que sugere aos jovens que estão à procura de oportunidades de trabalho e/ou de algo para empreender hoje?
Nossos jovens precisam se qualificar para realizar o seu sonho. Se o empreendedorismo é o sonho, que busquem as oportunidades de capacitação e se preparem de forma adequada para enfrentar o mercado. Mas o principal é acreditar nos próprios sonhos. Quem acredita, realiza e tem uma vida muito mais feliz.
Na sua visão, qual a maior dificuldade do Governo Bolsonaro em relação à geração de novos empregos no Brasil? (O governo) Não soube enfrentar as crises que cruzaram o caminho da sua gestão. Mais importante que o conhecimento intelectual é a capacidade de lidar com as adversidades. O governo Bolsonaro fracassou no enfrentamento dessas crises porque não teve a inteligência emocional para vencer obstáculos. O segredo de uma boa gestão pública é a empatia. Sentir a dor do outro. Quem sente a dor, resolve os problemas de quem precisa de atendimento. Governo que não atende as pessoas não serve para ser governo. Faltou empatia aos mais pobres no governo Bolsonaro. O preço foi a derrota nas eleições. Nenhuma solução econômica ou política pode ser tomada sem que os mais pobres sejam atendidos. O liberalismo não combina com o militarismo. O militar é nacionalista por formação, não vai permitir que o mercado seja o condutor das soluções. O casamento entre os militares e o liberalismo criou um país em que tivemos a desconstrução do modelo vigente, mas não foi colocado nada no lugar. Criamos no Brasil um liberalismo de bravata, em que desconstruímos o Estado, desqualificamos o Estado, mas não construímos nada para substituir o que foi desmontado. Nossos liberais mostraram uma característica autofágica. Querem acabar com o Estado, mas não sobrevivem sem ele, porque querem um Estado Provedor. O maior erro do Governo Bolsonaro foi a formação do próprio Governo e o despreparo para atender os que mais precisam dele.
Qual o Plano B do Valdir?
Quem não vive para servir, não serve para viver. Está na hora de retribuir para Brasília um pouco do que essa cidade me deu. Fechamos um ciclo, vamos iniciar outro. O trem vai continuar para a próxima estação e eu estarei pronto para seguir a minha viagem.







