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Pau para toda obra

Acoluna deste mês é sobre um personagem que a cada dia ganha mais destaque no governo: o Secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Cappelli. Trata-se de uma espécie de curinga ou pau-pra-toda-obra que o governo vem utilizando para resolver situações tensas que exigem ao mesmo tempo firmeza e temperança, além de uma imensa capacidade de tomar e comunicar decisões.

Foi acionado logo nos primeiros dias do governo para assumir a função de interventor federal à frente da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, depois da catastrófica aventura anti-democrática do 08 de janeiro, em Brasília. Pouco mais de dois meses depois – uma breve pausa para comemorar os 51 anos de idade -, foi novamente convocado para apagar um incêndio de grandes proporções. Frente à polêmica envolvendo o Gabinete de Segurança Institucional, foi escalado para assumir interinamente o órgão, até que o presidente Lula encontrasse um novo titular. Os riscos em ambas as operações eram enormes - para o governo e para ele mesmo. Em ambos os casos, saiu maior do que entrou, deixando a cozinha arrumada.

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ficou em terceiro lugar, não muito longe da votação de José Serra (23% contra 18%). Cappelli assistia do chão de fábrica à confusão no andar de cima.

“Lula e Geraldo Alckmin. O PSDB, cujo presidente estadual no Rio Grande do Sul participara das “Conversas de Frente”, resolveu apostar na terceira via, que minguava ao longo dos meses que antecediam as eleições. O PMDB, que nem havia participado da minha série de entrevistas, entraria de cabeça na campanha no segundo turno, contra a reeleição de Bolsonaro.”

Entre 1997 e 1999, foi presidente da UNE, como muitas das lideranças de seu então partido, tendo sucedido Orlando Silva, que depois viria se tornar Ministro do Esporte, substituindo seu chefe, Agnelo Queiroz, eleito Senador pelo DF. Está com Lula desde o primeiro governo, quando assumiu a Diretoria de Esporte Universitário, naquele ministério. Era o órgão cativo do partido na esfera federal sob a a gestão do PT - com breve soluço de comando do PRB com Dilma (vale lembrar que no nível dos estados é o setor predileto da representação política da Igreja Universal). Nesse órgão foi subordinado exatamente de Orlando Silva, que atuava como Secretário-executivo. Daí, foi trabalhar com outro ex-presidente da UNELindbergh Farias, então Prefeito de Nova Iguaçu, como Secretário de Desenvolvimento. A UNE, o PcdoB e a intrincada política do Rio de Janeiro fazem parte de sua história e de seu aprendizado. E ele ainda estava no PCdoB quando o conheci. Sua saída, juntamente com Flávio Dino, para o PSB ocorreu depois de nossa aproximação.

Mas se engana quem acha que o curinga do Palácio da Justiça é novo na arena. Tem uma longa trajetória política, tendo passado anos no PCdoB. Integrou o Governo do Estado do Rio de Janeiro, num momento de muita confusão sobre o destino da centro-esquerda naquele estado - Garotinho fora eleito governador pelo PDT em 1998, mas deixou o partido por desavença com Brizola. Migrou para o PSB e desincompatibilizou-se para disputar em 2002 a Presidência pelo PSB - sua vice, a petista Benedita da Silva, o substituiu e se elegeu governadora nas eleições daquele ano. Garotinho

Foi na condição de representante do PCdoB que o convidei para uma conversa. Em razão das eleições municipais de 2020, organizei, entre os dias 17 de julho e 04 de agosto daquele ano, uma série de entrevistas – muito mais conversas abertas – com lideranças partidárias espalhadas pelo Brasil de nove diferentes partidos – PDT, Cidadania, PCdoB, PV, PSDB, PT, Rede, PSB e Psol. A série se chamava “Conversas de Frente” e o tema era o papel das eleições municipais na formatação de uma frente ampla nas eleições que ocorreriam dois anos depois, para Presidente.

Além da diversidade de filiação partidária, havia uma grande diversidade geográfica – desde o Rio Grande do Sul até o Maranhão, passando por São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Paraná, Ceará e o Distrito Federal. Dentre os entrevistados, desde candidatos locais e vereadores, até secretários de estado e presidentes estaduais e nacional de alguns dos partidos. Cappelli foi a voz do PCdoB, na função de Secretário de Representação do Maranhão em Brasília – logo em seguida assumiria a Secretaria de Comunicação. Já demonstrava muito pragmatismo, com uma posição claramente favorável à formação de uma frente mais ampla do que alguns dos outros representantes dos partidos mais à esquerda. Menos de dois anos depois, Cappelli participava ativamente de uma costura complexa para fazer caber, numa mesma chapa, Lula e Geraldo Alckmin. O PSDB, cujo presidente estadual no Rio Grande do Sul participara das “Conversas de Frente”, resolveu apostar na terceira via, que minguava ao longo dos meses que antecediam as eleições. O PMDB, que nem havia participado da minha série de entrevistas, entraria de cabeça na campanha no segundo turno, contra a reeleição de Bolsonaro.

Hoje está no PSB, de Alckmin, França e de seu parceiro e mentor Flávio Dino. A aproximação com este se concretizaria apenas em 2015, por meio das estruturas de seu antigo partido - Dino precisa de gente qualificada para montar seu governo - mas a parceria é, hoje, das mais sólidas do governo e, certamente, Cappelli é o mais importante membro do segundo escalão. Não apenas porque seu chefe é uma das estrelas da nova gestão Lula, como porque ele mesmo está trilhando um caminho de êxitos, liberado do peso de seu antigo partido – o centralismo democrático do PCdoB não é para os fracos. A disciplina e fidelidade que trouxe da sua experiência comunista lhe é muito útil, mas no novo e maleável partido, pra onde migrou por uma costura eleitoral, Cappelli pode exercer com muito mais desenvoltura suas habilidades de comunicador e administrador. Na altura onde está atuando, a flexibilidade e a capacidade de diálogo são mais do que habilidades desejáveis, são a única forma de continuar voando. Flexibilidade e estômago.

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