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CONTRIBUIÇÕES DO PIBID PARA A FORMAÇÃO DOCENTE
Contribuições do PIBID para a formação docente
Samantha Pereira Muniz De Almeida Silva72 Maria Riziane Costa Prates73 Tatiana dos Reis de Abreu Grampinha74 Ana Paula Patrocínio Holzmeister75
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Resumo: Este texto apresenta experiências vividas no Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à docência- PIBID, em uma Unidade Municipal de Educação Infantil de Vila Velha-ES. O PIBID tem como objetivo principal a elevação da qualidade da formação inicial de professores nos cursos de licenciatura, promovendo a integração entre ensino superior e educação básica. Com Larrosa, Alves, Ferraço, dentre outros, faz uso metodológico da pesquisa nos/dos/com os cotidianos das escolas como experiência que possibilita a ampliação da produção de docências outras. Conclui apontando a necessidade de investimento em programas que contribuam para uma formação docente mais atrelada à realidade social, visando transformá -la.
Palavras-Chave: PIBID. Experiências. Docência .
PIBID e indagações...
72 Graduada em pedagogia pela Universidade Vila Velha. E-mail: samanthapereiramuniz@gmail.com 73 Doutora em educação, Mestrado, Especialização e Graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Professora da Universidade Vila Velha na graduação em pedagogia, Professora do Mestrado em Segurança Pública (UVV). É professora da Educação Infantil no município da Serra, atuando no assessoramento da equipe da Gerência de Educação Infantil (GEI-SEDU-Serra). E-mail: rizianeprates1@gmail.com 74 Graduada em pedagogia pela Universidade Vila Velha. E-mail: tati.grampinha@gmail.com 75 Doutora em educação. Professora da Universidade Vila Velha e coordenadora do curso de graduação em pedagogia (UVV). É professora da Educação Infantil no município de Vitória. E-mail: ana.holzmeister@uvv.br
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Este texto apresenta narrativas de dois trabalhos de conclusão de curso - TCC na graduação em pedagogia da Universidade Vila Velha, tecidos no ano de 2021, a partir das experimentações no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à docência - PIBID 20182020, em uma Unidade Municipal de Educação Infantil de Vila Velha – ES, com intervenções aprendentes de múltiplas linguagens com as crianças e professoras, nas composições com estudantes das graduações em pedagogia, artes cênicas e educação física da Universidade Vila Velha.
O PIBID é um Programa Federal que tem como objetivo, a integração da formação inicial dos cursos de licenciatura no ensino superior, com a educação básica, nas redes públicas de ensino, pela valorização docente e ampliação das práticas e enfrentamentos dos desafios que propõem o âmbito escolar. Os futuros professores são inseridos em escolas públicas como estagiários pesquisadores bolsistas, para conhecerem as situações inerentes ao cotidiano educacional, no sentido de propor ações de intervenção pedagógica interdisciplinar.
O programa oferece bolsas de iniciação à docência aos alunos de cursos presenciais que se dediquem ao estágio nas escolas públicas e que, quando graduados, se comprometam com o exercício do magistério na rede pública. O objetivo é antecipar o vínculo entre os futuros mestres e as salas de aula da rede pública. Com essa iniciativa, o Pibid faz uma articulação entre a educação superior (por meio das licenciaturas), a escola e os sistemas estaduais e municipais (BRASIL, 2018, p.1).
Ao entrarmos no Programa, algumas questões nos instigaram: Essa iniciativa tem a funcionalidade de melhoria na educação e incentivo à carreira do pesquisador? O projeto fará diferença em nossa formação docente? Como as práticas são tecidas na escola com as crianças enquanto movimento de experiência que pode provocar rupturas em nosso modo de pensar e fazer educação? O que tem feito a gente entrar em relação com a educação de uma maneira diferente?
Para responder a tais questões, o presente texto narra experiências vividas em um Centro de Educação Infantil da rede pública municipal de Vila Velha – ES, mostrando a importância da pesquisa na formação docente, e os desafios experimentados entre crianças, pesquisadores e professores, com a aposta no trabalho com as múltiplas linguagens como potência na educação infantil.
Dos planos de aula à experiência de docências...
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O movimento formativo vivido no PIBID, teve muitos desafios experimentados no cotidiano escolar, envolvendo a elaboração de planos de aula, a relação entre professores e crianças, o conhecimento do espaço da escola, pelas vivências diferentes a cada dia. A escola em que foi desenvolvida esse projeto, fica no município de Vila-Velha. No início houve um estranhamento da escola, pois eles ainda não entendiam o papel do PIBID e qual era a nossa função na escola, mas com o tempo as relações foram sendo produzidas e as pesquisas tecidas como experiência, compreendendo com Larrosa (2002), que a experiência é aquilo que nos passa, que nos acontece, que nos toca.
Estávamos organizados em grupos, os cursos que estavam selecionados eram a pedagogia, a educação física e as artes cênicas. Os grupos foram organizados tentando misturar e contemplar os três cursos, para um trabalho coletivo. A partir dessas experiências pudemos observar como a escola funciona, como os professores ministram as aulas, como nossa orientadora abordava as crianças e como ela se preocupava para que todos participassem das aulas. Observávamos atentos ao modo como a professora fazia seus planos de aula, o que foi, para nós, um grande desafio.
Imagem 1: professora da UMEI estabelecendo combinados com as crianças
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Os primeiros movimentos foram de observação das aulas de educação física. Em uma aula de luta, a professora delimitou um espaço, um campo de disputa, colocou uma bola entre duas crianças e elas, sem levantar a bola do chão, tiveram que empurrar a bola até o limite oposto para ganhar a disputa, e cada um teria que defender seu campo com força e outras variações do jogo e lutas baseadas no filme Kung fu Panda que ela tinha exibido para as crianças antes de começar essas aulas. A professora sempre levava algo para conceituar o porquê de estarem fazendo aquilo naquela aula, de modo que fizesse sentido para as crianças e através disso ela trabalhava também conceitos de ética, respeito ao próximo, amizade, sempre no final das lutas, os participantes se cumprimentavam em um aperto de mão, sinalizando com a cabeça o respeito ao seu oponente, ensinando assim, que apesar de ter perdido a disputa continuariam amigos. Algumas crianças não sabiam lidar muito bem com o sentimento de perda, algumas choravam, outras não queriam brincar mais, mas a professora contornava a situação e fazia de alguma forma com que todos fossem vencedores, ao menos uma vez.
Deleuze comenta: ‘Nada aprendemos com aquele que nos diz: faça como eu. Nossos únicos mestres são aqueles que nos dizem: ‘faça comigo’ e que, em vez de nos propor gestos a serem reproduzidos, sabem emitir signos a serem desenvolvidos no heterogêneo’. A relação ensino-aprendizagem depende de um mestre que não se furte de sua condição de aprendiz (KASTRUP, 2001, p.24).
Assim, fomos encaminhados às tessituras das práticas na escola que nos levaram a encantamentos e também questionamentos quanto ao seu funcionamento, indagando como podemos desengessar modos de fazer educação, modos de dar aula e habitar os corredores da escola de forma que não sejam só corredores, explorar todos os espaços, até os mais improváveis. A entrada na escola, como estudantes pesquisadoras, sob a orientação das nossas professoras coordenadoras da Universidade, foi tecida, como experiência singular em nossa formação acadêmica. Inicialmente, o estranhamento, os medos...depois...o envolvimento no processo e as alegrias das tessituras com o cotidiano escolar.
Trabalhar com o cotidiano e se preocupar como aí se tecem em redes os conhecimentos, significa, ao contrário, escolher entre as várias teorias à disposição e muitas vezes usar várias, bem como entendê-las não como apoio e verdade, mas como limites, pois permitem
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ir só até um ponto, que não foi atingido, até aqui pelo menos, afirmando a criatividade no cotidiano (ALVES,2001, p.5).
O PIBID oportunizou um mergulho no cotidiano escolar, como aponta Alves (2001), enquanto tentativa de decifrar os pergaminhos e caminhos formativos, em que não é possível ficar no raso da imensidão do mundo escolar, mas lançar-se à imensidão profunda do oceanoescola76 , com sua diversidade, suas relações, pleiteando possíveis transformações pela busca de aprendizagem.
Ora, agenciar transformações, resistir perpassam pela experimentação de outras maneiras de fazer, pela invenção de novos modos de aprender. Experimentar a escola inventivamente se torna, assim, possibilidade de aprender com alegria pela potência da busca, pela sensibilidade dos encontros e pela diferença da composição com os espaços, tempos e coletivos nas vivências experimentadas (PRATES, 2020, p.134).
Para transformar, aprender, compreender é preciso mergulhar nos cotidianos. Não há possibilidades de ficar indiferente ao que acontece nos espaçostempos da escola, é preciso sentir, correr o risco de ser afetado positiva ou negativamente, lançar-se para além do planejado, ser surpreendido pelo inesperado. O cotidiano nos reserva novidades, e “ uma coisa é certa, o que existe é uma incessante experimentação” (PRATES, 2020, p.135). Através do que se percebe nos cotidianos, é importante tentar compreender esses acontecimentos, sem categorizar e classificar com regras rígidas e limitadas, pois o que buscamos é superar as barreiras das limitações. Quando tudo acontece fora do que foi planejado, não significa que tenha dado tudo errado, mas que aconteceu algo novo, que não estava planejado ou pré-determinado. A nossa busca era, assim, por experimentações na escola enquanto possibilidades que vão além do esperado, das ideias e planejamentos fixos ou teorias como verdades absolutas, pois o que buscávamos eram práticas e metodologias de aprendizagem que alargassem os nossos caminhos, para além do já posto, já sabido, para aprender a aprender e a aprender a ensinar.
76 Com Alves (2002), juntamos as palavras, como maneira de superar as dicotomias e atribuir novos sentidos e forças ao termo produzido.
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As aulas planejadas pelas professoras na escola, continham momentos de brincadeiras regionais, e momentos com atividades em sala de aula, sempre uma encaixando na outra, um dia era desenho, histórias sobre a região, outro dia era atividade mais prática, com experimentação da brincadeira proposta e a representação dos instrumentos musicais a partir de desenhos. A cada aula, fazíamos um plano de aula, ele era uma previsão do que iríamos fazer com alguns objetivos e sequências. Esse plano era composto pelo tema da aula, os objetivos de aprendizagem e as alternativas para desenvolvimento das atividades com as crianças. As professoras sempre solicitavam que organizássemos uma atividade prática e uma atividade teórica. Importante salientar que compreendemos com Corazza (2012, p.236) que:
Uma aula é, desde sempre, feita de clichês-dados. Se o professor quiser que a sua aula seja instigante, interessante e, mesmo, sua – em outras palavras, se desejar realizar uma aula singular –, não vai planejar, preparar e desenvolver a aula, como se ela estivesse vazia; tampouco vai se restringir à tarefa de, tãosomente, prever objetivos, conteúdos, atividades, recursos, avaliação.
Nesse movimento, por entre as vivências das aulas na escola e os estudos na Universidade, para além dos planos em si, desejávamos uma atuação na docência como convocação da experiência que, segundo Larrosa (2002, p.26) “É aquilo que ‘nos passa’, ou que nos toca, ou que nos acontece, e ao nos passar nos forma e nos transforma. Somente o sujeito da experiência está, portanto, aberto à sua própria transformação”.
Em segundo lugar, a experiência é cada vez mais rara por excesso de opinião. O sujeito moderno é um sujeito informado que, além disso, opina. É alguém que tem uma opinião supostamente pessoal e supostamente própria e, às vezes, supostamente crítica sobre tudo o que se passa, sobre tudo aquilo de que tem informação. Para nós, a opinião, como a informação, converteu-se em um imperativo (LARROSA,2002. p.22).
Movidos pelas experiências nesse fazer pesquisa, pela “tentativa de fazer proliferar vozes, produzir habitação [...] inventar novos modos de composição com as crianças e com os professores” (PRATES, 2020, p.132), traçamos saídas como experimentações de aulas diferentes, oportunizando “modos outros de experimentar a escola, tentativa de reexistência e resistência de um coletivo” (PRATES, 2020, p.133).
A potência das múltiplas linguagens e a Formação docente...
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O nosso desafio foi criar, junto às professoras da escola, aulas desafiadoras, em que as crianças pudessem experimentar metodologias e aprendizagens inusitadas. Como tínhamos no grupo, estudantes de pedagogia, educação física e artes cênicas, montávamos aulas com atividades corporais, artísticas e pedagógicas. As múltiplas linguagens permitem explorar o currículo de forma que os elementos colocados em estudo se comunicam. O foco deixa de ser somente a leitura e a escrita e passa a ser a exploração sem limites de todas as potencialidades de aprendizagem. Compreendemos que as crianças, enquanto sujeitos históricos e produtores de cultura, se constituem nas brincadeiras e no contexto social em que estão inseridas, experimentando sensações, cheiros, cores, sons, texturas, formas, bem como traçando linhas de vida ao subir, descer, cantar, dançar, ouvir, sentir, etc.
Um modo de estar no mundo é constituído por relações e práticas diárias vivenciadas, e é através dessas práticas, nas brincadeiras, no lúdico, nas invencionices, nas relações com o outro que a criança se constitui, se expressa e conhece o mundo.
Crianças brincam individual e coletivamente, e neste ato experimentam e descobrem a vida que pulsa em diferentes ritmos a partir das linguagens com as quais aprendem a relacionar-se com os outros. [...] Como contrapor-se aos espaços cerceadores das capacidades criativas das crianças? Como incentivá-las a explorar os ambientes e expressarem-se com palavras, gestos, danças, desenhos, teatro, música sem recriminar o choro e o aparente excesso de movimentos (GOBBI, 2010, p.1).
E assim, junto às professoras, algumas atividades foram tecidas em nosso movimento de sujeitos aprendizes, pesquisadores. Nosso primeiro planejamento foi sistematizado pelo projeto baseado na história do Magico de Oz, tema indicado pela professora da escola, nos primeiros seis meses do PIBID, de agosto a dezembro de 2018. Colocar as ideias no papel foi o primeiro passo, depois para colocá-las em pratica é que foi o desafio.
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Imagem 2: Teatro “O mágico de Oz” produzido pelos estagiários do PIBID/ Imagem 3: Registro de uma criança a partir do teatro
A proposição de atividades a partir de múltiplas linguagens, oportunizou experimentações não somente das crianças, mas das professoras aprendizes, enquanto aulas que obrigaram a sair de um modo estático de docência, enraizado por décadas na educação, como aponta Silva (2001); um tipo de educação que tem base na Teoria Tradicional, sem a preocupação com reflexões mais radicais sobre os arranjos educacionais vigentes e as formas de produção do conhecimento. Nossas aulas eram sempre em algum espaço amplo da escola, proporcionando um processo de experimentação de diferentes possibilidades de aprendizagem. Nas experiências tecidas junto às crianças, narrar os cotidianos, pela conversa, trocas de informações, ensinamentos, histórias e vivências corporais, compunham as nossas aulas. A cada resposta de uma criança, uma dúvida, um questionamento para uma nova leitura da brincadeira. Em outro momento, junto às professoras, contribuímos nas atividades do projeto “O menino Maluquinho” , a partir do livro de Ziraldo. Fizemos a leitura da história com as crianças sobre o menino maluquinho e a professora maluquinha. Nosso grupo de estudantes pesquisadores, resolveu produzir um teatro para apresentação na escola, a partir da história. Selecionamos os pontos que chamaram a atenção das crianças na contação da história e acrescentamos outros. A colega das artes cênicas colaborou com a escrita da peça de teatral, e a pedagogia e educação física trouxeram elementos pedagógicos e corporais para o enredo.
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Imagem 4: Encenação do teatro o Menino Maluquinho vai ao Egito
O teatro, como linguagem artística, funcionou como força para abertura afetiva para o lúdico, a fantasia, um convite para explorar a imaginação e a coletividade de ideias e fluxos de vida.
O teatro é um acontecimento de cultura, envolve ricos processos de criação de todos os envolvidos, diria ainda mais, daqueles que participam não somente da encenação, mas dos que assistem as peças, sejam quais forem e como acontecerem, independentemente de sua faixa etária. (GOBBI, 2010, p. 15)
A exploração das múltiplas linguagens na educação infantil, pode contribuir para uma maior expressão das crianças. Em uma das intervenções foram utilizados dois contos, em que as crianças puderam recontar encenando, e isso foi marcante, pois as crianças puderam vivenciar a história sendo os personagens, expressando seus modos de se colocar no mundo, pela fala, pelo canto, pela dança, pela pintura, pela interação com a literatura, a poesia, a música e a invenção.


Imagem 5: Pintura coletiva Menino Maluquinho / Imagem 6: Pintura em Xilogravura a partir do projeto Literatura de Cordel
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Imagem 7: Contação de histórias O Rei Cacto e a Princesa Suculenta com encenação feita pelas crianças / Imagem 8: Intervenção feita com as crianças após a contação onde foi-lhes apresentado várias mudas de cactos e suculentas e depois feito o plantio.
As professoras nos orientavam a explorar cada vez mais o corpo, o movimento e possibilidades das crianças, apontando a necessidade de oportunizarmos espaços, tempos e brincadeiras que possam dar abertura para diferentes expressões e aprendizagens. Assim, a partir da história do menino maluquinho, junto com as professoras de educação física da escola, elaboramos um exercício de crossfit com escalada numa rede de cordas, experimentações com slackline, etc.

Imagem 9: Slackline – Circuito na UMEI – 2019
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Tínhamos o desafio de pesquisar o novo, para produzir conhecimento com as crianças, através da brincadeira. Uma brincadeira tomada como linguagem desafiadora apontada pelas crianças nos cotidianos da escola. Compreendemos com Ferraço (2007, p.78)
que:
qualquer tentativa de análise, discussão, pesquisa ou estudo com o cotidiano só se legitima, só se sustenta como possibilidade de algo pertinente, algo que tem sentido para a vida cotidiana, se acontecer com as pessoas que praticam esse cotidiano e, sobretudo, a partir de questões e/ou temas que se colocam como pertinentes às redes cotidianas.
Assim, em meio às redes tecidas no cotidiano escolar, as atividades foram sendo produzidas com as crianças, enquanto desafios apontados por estudantes de pedagogia, educação física e artes cênicas em formação expansiva.


Imagem 10 e 11: Crianças no circuito na UMEI-2019
Descobrimos em nossas docências e intervenções, com as crianças e as demais professoras da escola, potenciais que ultrapassam o já posto. A cada projeto, um novo desafio e experimentações de aulas diferentes e dinâmicas, envolvendo músicas, brincadeiras, contação de história, teatro, múltiplas linguagens. Um trabalho de indagação dos modos de fazer educação, modos de dar aula e habitar os corredores da escola de forma que não sejam só corredores, mas espaços e tempos de ampliação das aprendizagens, pela exploração de todos os espaços, até os mais improváveis. As múltiplas linguagens oportunizam às crianças modos de expressão pelas brincadeiras, música, dança, criação de histórias, teatro, possibilitando uma prática
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pedagógica mais coletiva e inventiva. Toda essa experimentação constitui-se como elemento que ajuda os estudantes e futuros professores, a problematizarem suas docências a todo tempo, no encontro desafiador com a possibilidade de fazer o novo, de ser outros, com movimentos que podem contribuir para uma educação mais sensível, inventiva e transformadora.
Como pausas no deserto ou encontros ilógicos; devires imperceptíveis, experimentações, energias ou silêncios de transformação se propagam nas relações entre professores e crianças, (de) formando seus modos de docência, infância, aprendizagem, inventando nos espaços e tempos da escola, a partir dos encontros como acontecimento; outros mundos, formas diferenciais de experimentar a grupalidade e os movimentos curriculares como atividade micropolítica que conjuga uma vida e os traçados afetivos de suas imanências (PRATES, 2018, p. 82).
A invenção de outros mundos, apontados por parte, remete a pensar a força dos encontros entre professores, crianças, futuros professores e as políticas públicas de formação docente, que se efetivam em Programas como o PIBID, em que oportunidades são arremessadas e transformadas em novas possibilidades de produção e transformação de si.
Os ziguezagues da docência...
O encontro com as crianças e professoras na educação infantil, oportunizou-nos movimentos de produção docente em que no espaço da escola, tínhamos a professora orientadora e junto a ela, observávamos aulas e traçávamos planejamentos para intervenção com as crianças. Concomitante a essa metodologia na escola, tínhamos na Universidade, encontros para planejamento das ações na escola e tentativas de estudo e escrita mais acadêmica.
Com o tempo, a partir das vivências tecidas no estudo, pesquisa e experimentação na escola, começamos a produzir os nossos projetos de intervenção com as crianças, atuando inteiramente como docentes, pela primeira vez. Criamos um projeto interdisciplinar nas composições entre trios e duplas, entre os estudantes de pedagogia, educação física e artes cênicas, que foi trabalhado durante o ano de 2019 na UMEI com as crianças. A orientadora, pediu que ficássemos em turmas diferentes para que conhecêssemos as crianças e a turma como um todo, para uma intervenção a partir do que as crianças demandassem. Adentramos a turma do 5F. O primeiro contato foi desafiador, era a nossa primeira aula como professoras, pesquisadoras.
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Nosso projeto era sobre sons e brincadeiras regionais do Brasil, nós levávamos muitas brincadeiras e sons que as crianças não conheciam. A partir do momento que você traz outras culturas, tudo vira novidade, e o nosso objetivo era que as crianças pudessem brincar e apreciar cada som, aprender coisas novas, e sons diferentes. A cada aula era passada uma brincadeira ou atividade pedagógica.

Imagem 12: Crianças brincando no pátio da UMEI - 2019
A cada aula, novas abordagens, novas questões. Tínhamos medo de errar, mas, ao mesmo tempo, esse medo ajudou-nos a ir, aos poucos, entrando em relação com as crianças, seus desejos, seus medos também. Antes de começar as aulas, criávamos sempre um plano de aula, mostrávamos a nossa orientadora para que ela contribuísse, a partir desse movimento. Pegávamos os materiais e nos preparávamos para começar a nossa aula. Como aponta Corazza (2012, p.237), “O professor necessita fazer um trabalho de maior relevância, que pertence à aula,mas precede o ato de dar a aula: trabalho preparatório, ‘invisível e silencioso, e, entretanto, muito intenso’ , pelo qual o ato da aula é um a posteriori em relação a esse mesmo trabalho” . As nossas intervenções eram realizadas no PIBID, durante as aulas de uma professora de Educação Física, daí o nosso investimento em atividades mais brincantes e corporais, pela exploração de múltiplas linguagens.
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Imagem 13: Crianças brincando no refeitório da UMEI- 2019
As aulas aconteciam no refeitório. Na escola não tínhamos quadra de esportes, aproveitávamos todos os espaços da escola, o que, de certo modo era potente, pois todos os espaços constituíam-se como espaços de aprendizagem e espaços de aulas. A turma era diversa, com crianças autistas, crianças com síndrome de down. Todas as crianças participavam da aula e das atividades propostas. A partir dos nossos projetos de intervenção, junto com as crianças, íamos redesenhando os planos de aula, objetivando ampliar a oportunidade de aprendizagem. Assim, no desejo de conhecer o instrumento musical casaca, oriundo das terras capixabas, iniciamos
nossas conversas.
A casaca e a produção de uma aula... O primeiro movimento foi de desenho, cada um desenhou a casaca do seu jeito, usando sua imaginação e criatividade. Depois o manuseio, a experimentação, o toque, o som, a melodia e seus desdobramentos.
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Imagem 14: Instrumento Casaca/ Imagem 15: Crianças tocando casaca na UMEI- 2019
A corrida, os circuitos e banhos de mangueira, a criação de brinquedos...
Em uma outra aula, no refeitório, planejamos junto às crianças, uma atividade de corrida, compreendendo com Kastrup (2001, p.19) que “[...] a ação motora, por si só, não substitui o privilégio da sensibilidade como origem da aprendizagem, esta será antes de tudo uma aprendizagem da sensibilidade”. Uma das crianças autistas tinha medo de correr, a outra não gostava de fazer as atividades pedagógicas em sala de aula. Nessa aula, a menina que tinha medo de correr, participou da aula, correndo junto com as outras crianças. Seguramos na sua mão. A criança que não gostava de fazer atividade em sala, participou ativamente. Com o tempo a criança autista foi participando das aulas.

Imagem 16: Crianças brincando no refeitório da UMEI-2019
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Assim, o projeto oportunizou diferentes traçados, ziguezagues das docências, como movimento que obriga a (de) formar o tempo, a visão de aula, escola, planejamento, para compor em encontros como experiência.
Em terceiro lugar, a experiência é cada vez mais rara, por falta de tempo. Tudo o que passa demasiadamente depressa, cada vez mais depressa. E com isso se reduz o estímulo fugaz e instantâneo, imediatamente substituído por outro estímulo ou por outra excitação igualmente fugaz e efêmera (LARROSA, 2002, p.23).
Foram ziguezagues delineados pela aposta em encontros brincantes que, a partir da experimentação de múltiplas linguagens, oportuniza aprendizagens. “A criança não nasce sabendo brincar, é nessa relação com os outros que ela vai constituindo esse entendimento, e assim começa a compreender o brincar como forma de linguagem” (LOMENSO; VINCI DE MORAES, 2012, p.5). Assim, a aposta em circuitos, brincadeiras e produção de brinquedos.

Imagens 17 e 18: Circuito no gramado / Imagem 19: Banho de mangueira na Umei-2019
Nesse movimento de intervenções, produzimos aulas em que, experimentávamos circuitos junto às professoras de educação física, propúnhamos uma brincadeira regional, contribuindo com o projeto da escola, em uma tentativa de invenção com as crianças de novas tessituras do cotidiano escolar. Produzimos petecas com areia, sacola, tnt, e pedras bem pequenas; sendo que, em outros momentos, brincávamos no pátio com essas petecas produzidas. Nessa tessitura produzimos juntos, dois bois feitos de caixa de papelão, representando a cultura de uma das regiões do Brasil. Todos os brinquedos confeccionados pelas crianças, do jeito delas.
Outro aspecto a ser destacado tem por objetivo descaracterizar a ideia de redes de fazeressaberes como algo que acontece no cotidiano, como uma dada característica ou propriedade do cotidiano. Consideramos cotidiano o próprio movimento de 147
tessitura e partilha dessas redes. As redes não estão no cotidiano. Elas são o cotidiano! (FERRAÇO, 2007, p. 78).

Imagem 20: Crianças brincando com o boi no pátio da UMEI-2019
Experimentar esse movimento da escola, fazendo com as crianças, inventando, constitui-se como aprendizagem potente na produção de uma docência que quer estar junto, aprender sempre. Todos os espaços da escola, até os desabitados e estreitos, foram descobertos e alargados, como novas possibilidades de compor uma aula, para além do já posto, como liberdade e aprendizagem que “[...] avança com a tomada em consideração de um número crescente de elementos do ambiente, que passam a compor o contexto onde a ação se dá’’ (KASTRUP, 2001, p.22).
Linhas de escrita e vida...
O PIBID chegou ao fim em dezembro de 2019 e foi preciso escrever um artigo sobre o trabalho desenvolvido. A escrita não é um exercício tranquilo, pois o vivido sempre transborda em relação à escrita sobre ele. Lançamo-nos à essa empreitada que nessas linhas conclusivas, desejam prosseguir. Afirmamos, nessa tessitura, a importância desse programa e dos estágios na formação inicial. Interessante seria se todos os estudantes das licenciaturas que irão se formar
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professores um dia, pudessem vivenciar os campos de pesquisa, e principalmente com bolsas de estudo, pois essa contribuição, por vezes, é a única alternativa para algumas pessoas que não tem condição financeira de fazer um bom estágio, por trabalhar o dia inteiro e não ter tempo para o investimento mais qualificado nessa atividade. Ao iniciarmos essa escrita, tínhamos algumas indagações. E para concluir essa escrita, desejamos afirmar que acreditamos na funcionalidade desse projeto como melhoria na educação e incentivo à carreira do pesquisador, pois essa experiência fez diferença em nossa formação docente, pelas experimentações com as práticas tecidas na escola com as crianças e professoras, enquanto movimento que provocou rupturas em nosso modo de pensar e fazer educação, pelo exercício docente que obrigou a entrar em relação com a educação de uma maneira diferente.
Aprendemos que a docência é tessitura de vida, linhas de errâncias. Assim a necessidade do investimento em políticas públicas que potencializem diferentes modos de estágio docente, pela conexão entre educação básica e ensino superior, em linhas que tecem escritas e vida.
Referências
ALVES, Nilda. Decifrando o pergaminho – o cotidiano das escolas nas lógicas das redes cotidianas. In OLIVEIRA, Inês Barbosa de e ALVES, Nilda. Pesquisa no/do cotidiano das escolas – sobre redes de saberes. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. p.13-38 ALVES, Nilda et al. (Org.). Criar currículo no cotidiano. São Paulo: Cortez, 2002.BRASIL. Ministério da Educação 2018. Disponível em:< http://portal.mec.gov.br/pibid> Acesso em 18 de Nov de 2020. CORAZZA, Sandra Mara. Didaticário de criação: aula cheia, antes da aula. XVI ENDIPE, UNICAMP, Campinhas, 2021.
FERRAÇO, Carlos Eduardo. Pesquisa com o cotidiano. Revista Educação e Sociedade. Campinas, v.28.n.98, p73-95. Jan/abril de 2007. GOBBI, Márcia; Múltiplas linguagens de meninos e meninas no cotidiano da educação infantil. Textos do currículo em movimento, Brasília, SEB/CNE, 2010. KASTRUP; Virgínia. Aprendizagem, Arte e Invenção. Revista Psicologia em estudo. Maringá, v.6, n.1, p.17-27. Jan\jun. de 2001. LARROSA, Jorge. Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Tradução de João Wanderley Geraldi. Revista Brasileira de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Departamento de linguística, Campinas, 2002.
LOMENSO, T.; VINCI DE MORAES, L. A importância do brincar na educação infantil. Instituto superior de vera cruz, 2012. Disponível em:< http://site.veracruz.edu.br/doc/ise_tcc_thaisy_lomenso.pdf> . Acesso em 01/06/2021.
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PRATES, Maria Riziane Costa. Subjetividades Nômadeafetivas: currículos em espaçostempos de uma grupalidade. Revista Currículo sem fronteiras, 2018.
PRATES, Maria Riziane Costa Prates. Políticas de amizade e alegria nos currículos e formação de professores da educação infantil. Appris, Curitiba, 2020.
SILVA, Tomaz T. da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Autêntica, Belo Horizonte, 2001.
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