35 Anos do SNS... ideias para o futuro do SNS: o contributo dos enfermeiros

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‌ideias para o futuro do SNS o contributo dos enfermeiros


Coordenação: Raul Alberto Cordeiro Professor Adjunto – Escola Superior de Saúde de Portalegre Colaboração *: Cláudia Alexandra Martins Diogo Maria Manuela de Sena Carita Gomes Macedo Helena Maria Almeida da Silva Ferreira Telma Sofia Chinarro Dias Cláudia Sofia Baptista Carrapiço Bruna Carina Ferreira Galveias Rute Isabel Gonçalves Formiga das Neves Maria José Martins Catalão Maria João Maximino Marques Falé Jacinta Rosa Morais Luís Miguel do Espírito Santo Rosa * Estudantes de Mestrado em Enfermagem – Ano Letivo 2014/2015 – UC de Comunicação Pessoal e Interpessoal


2015

ÍNDICE José Carlos Rodrigues Gomes

SAÚDE, FORMAÇÃO EM SAÚDE E DESENVOLVIMENTO: OUSAR UM NOVO PARADIGMA

Celso Silva

O FUTURO É HOJE. ENFERMEIROS DE SAÚDE MENTAL NA COMUNIDADE

Pedro Renca

A FAMÍLIA E O CUIDADO NA SAÚDE MENTAL

Maria José Valente Lopes

ESTRATÉGIAS DE MUDANÇA NO SISTEMA NACIONAL DE SAÚDE: AVANÇOS OU RETROCESSOS? UM AMANHÃ SINGULAR EMERGÊNCIA MÉDICA PRÉ-HOSPITALAR

Sílvia Manuela Pação Alminhas Pedro Miguel Pereira Costa Sérgio Rui da Silveira Lança Carinhas Mónica Ribeiro Anabela Carvalho Ângela Lopes Lina José Dias Ramos Rodrigues Jorge Manuel Ramos Lourenço Marques Artur Manuel Caretas Lopes

UMA MATERNIDADE PARA O FUTURO A SAÚDE É MINHA! A RESPONSABILIDADE É MINHA! A APLICABILIDADE DE PROTOCOLOS E A QUALIDADE EM SAÚDE CONTROLAR AS IACS: UM DESAFIO POSSÍVEL

A GESTÃO INDIVIDUAL DA SAÚDE: PARA QUE HAJA FUTURO É SÓ UMA QUESTÃO DE ARITMÉTICA

Maria José Bule

GESTÃO POR COMPETÊNCIAS

Manuel Filipe Rodrigues Pedreira

SNS – REANIMAÇÃO PELO CONTROLO DE DESPERDÍCIO URGE

Rute Isabel Pires

O FUTURO DO SNS NA ÁREA DA CIRURGIA

Sandra de Jesus Lopes Araújo Miguel Pedrosa Natércia Caramujo

Kátia Furtado Joaquim Telo

PREVENÇÃO E CONTROLO DA INFECÇÃO ASSOCIADA AOS CUIDADOS DE SAÚDE: A HIGIENIZAÇÃO DAS MÃOS POR UM SERVIÇO DE URGÊNCIA MAIS EFICIENTE: QUE FUTURO? DA GESTÃO À MELHORIA DA QUALIDADE DO CUIDAR. UMA PERSPETIVA DO ENFERMEIRO DE CONTROLO DE INFEÇÃO IMPACTO NACIONAL DAS FERIDAS CRÓNICAS INTEROPERABILIDADE EM SAÚDE


Rosa Irene Vilela Tapadas

O QUE IMPORTA PENSAR…

Milene Pires Mendes

A AVALIAÇÃO E REGISTO DA DOR DE MODO SISTEMÁTICO

Joana Santos

O FUTURO DOS CUIDADOS PALIATIVOS

Marília Granada

FUTURO DA ENFERMAGEM

Rui Manuel Semedo Quintino

ENFERMAGEM versus SNS

Isabel Telo João Francisco Roque Crastes Leandro Manuel de Sousa Cardoso

SAÚDE MENTAL INFANTIL PAPEL DO ENFERMEIRO NA SAÚDE OCUPACIONAL

CUIDADOS DE PROXIMIDADE E CONTINUIDADE

SAÚDE, FORMAÇÃO EM SAÚDE E DESENVOLVIMENTO:


OUSAR UM NOVO PARADIGMA José Carlos Rodrigues Gomes (Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde mental e Psiquiátrica, Doutor em Saúde Pública) Diretor e Professor Coordenador da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria Presidente do Conselho de Enfermagem da Ordem dos Enfermeiros Compreender e interpretar saúde é um trabalho complexo e de permanente construção. A definição que a Organização Mundial de Saúde (OMS) lançou em 1948 como sendo um “estado de completo bem-estar físico psíquico e social, e não só a ausência de doença ou enfermidade ”, tornou-se limitativa, pouco operacional e produtora de visões parciais que prejudicam uma visão de saúde centrada no indivíduo e na comunidade que este integra. O conceito da OMS, embora positivo, é estático. Talvez por isso, a cultura dos sistemas de saúde, predominante nos nossos tempos, tem respondido de forma permanente e em primeira linha à doença (num grande esforço financeiro, de recursos e de formação), deixando a saúde num lugar secundário e de muito menor investimento. Mesmo se o saber popular nos diz que a “saúde não tem preço”, só quando deixamos de sentir saúde é que consideramos efetivamente o seu valor. E este não é o caminho certo. No mundo globalizado onde vivemos, em que o que se passa em Bruxelas, em Atenas, em Berlim, ou até em Pequim, afeta o nosso quotidiano, devemos procurar olhar para a saúde reconhecendo novos problemas e necessidades de saúde das comunidades e dos indivíduos. Problemas como o envelhecimento da população, o aumento exponencial das doenças crónicas e os quase 30 % de Europeus que se confrontam, neste momento, com um distúrbio mental e do comportamento. Ou ainda, a crescente urbanização da população e os desafios de uma organização económica competitiva e a crise socioeconómica que afeta o espaço europeu, e muito em particular, Portugal. Estas realidades têm um impacto significativo nas organizações prestadoras de cuidados de saúde, onde os enfermeiros têm um papel central. O futuro trará, necessariamente, o foco na prestação de cuidados de enfermagem nos domicílios e nas comunidades prevenindo internamentos desnecessários e demasiado onerosos para o erário público. Este desafio exige enfermeiros com os conhecimentos, as competências, a confiança, a liberdade e o reconhecimento necessários


para trabalharem sozinhos e assumirem uma função proactiva na adaptação da prestação de cuidados de enfermagem às necessidades das pessoas, das famílias e das comunidades. A rápida evolução do conhecimento e das práticas clínicas em enfermagem, bom como as profundas alterações a que as sociedades têm sido sujeitas em consequência da estonteante globalização atrás referida, obrigam a enfermagem a olhar o futuro centrada em soluções para a garantia da qualidade dos cuidados de saúde prestados à pessoa e às comunidades. A necessidade de recentrar o cidadão no sistema, incluir no sistema de saúde uma vertente salutogénica que promova a capacitação do cidadão e das comunidades e que não desperdice inúmeros recursos para a resposta a vontades e necessidades que não ultrapassam o enquadramento corporativo, são um dos maiores desafios que enfrentamos enquanto sociedade e enquanto enfermeiros. O desenvolvimento de novos indicadores de saúde, centrados nos ganhos em saúde e não no ato; centrados no cidadão e não no técnico; baseados nos ganhos para a comunidade e não para a instituição ou interesse corporativo; direcionado para a promoção da saúde e não apenas para uma mera resposta reativa á doença, é igualmente um desiderato a que os enfermeiros não podem ser alheios. Nesta resposta interessa que a comunidade possa usufruir das imensas competências dos enfermeiros, de cuidados gerais, especializadas e/ou acrescidas, frequentemente menosprezadas pelo poder político e pelas administrações das instituições de saúde, vistas (de forma preconceituosa e redutora) como uma despesa e não como um investimento. Portugal, enquanto país e economia que quer e precisa de crescer, não se pode dar ao luxo de desperdiçar um corpo de conhecimentos na sua estrutura de enfermagem de elevada qualidade, com muitas e variadas competências que são, indubitavelmente, um importante contributo para a melhoria do nível de saúde das populações, se houver ousadia (política e profissional) para as utilizar. Desde a gestão política e estratégica ao cuidado prestado no domicílio em qualquer aldeia perdida no Portugal profundo, a enfermagem tem o direito, e o dever, de se por ao dispor da população e de garantir o contributo que sabe dar para o sistema de saúde. Estes desafios necessitam de um sistema de formação moderno, adequado às rápidas mudanças das necessidades de saúde da pessoas e das comunidades e que saiba criar sinergias entre as diferentes áreas de conhecimento. As competências e as qualidades da formação de nível superior, tais como, o pensamento crítico, a resolução de problemas e a aprendizagem ao longo da vida, fornecem aos enfermeiros a capacidade de responder a estes desafios e a outros já referenciados. Independentemente do local onde exercem a sua profissão, os enfermeiros com formação superior (aos três níveis de formação) estão


profundamente preparados e “equipados” (competências) para, efetivamente, encontrar, usar e criar evidência que possa, não apenas beneficiar a pessoa, a família e a comunidade, mas também o sistema de saúde, a economia e o país como um todo. Infelizmente a formação em saúde em Portugal funciona por ilhas, por vezes com um enorme oceano entre si. Este facto deve-se não só a um sistema binário que é tudo menos o que pretende ser, mas também resulta de estigmas e interesses corporativos que limitam o direito dos portugueses a um Serviço Nacional de Saúde de maior qualidade. Temos de ser capazes de criar um arquipélago destas ilhas, com ligações funcionais e entreajuda recíproca no uso inteligente dos recursos e das competências instaladas em cada estrutura. Com base nestes pressupostos, fomentando igualmente uma prática na resposta às necessidades de saúde dos cidadãos e das comunidades numa filosofia de skill mix, a mudança exige, em primeiro lugar, a criação de estruturas de ensino superior com possibilidade de ensino ao nível do 1º. 2º e 3º ciclo – aquilo que tenho denominado como Escolas Universitárias de Saúde bebendo do princípio do Professor Nuno Grande - onde estejam integradas as diferentes formações em saúde, permitindo um crescimento e desenvolvimento de competências paralelo entre os diferentes profissionais, independentemente do chapéu onde a estrutura se encontre sediada (universidade ou politécnico). Esta mudança de paradigma potencia o desenho de um planeamento efetivo dos recursos humanos em saúde a médio e longo prazo, baseado em projeções demográficas fomentando o reforço da reorganização do Serviço Nacional de Saúde (também numa base geodemográfica) evidenciando os ganhos em saúde para os cidadãos e para a comunidade e uma maior sustentabilidade do próprio sistema. Ousar este novo paradigma é também criar uma ligação efetiva entre instituições de ensino e instituições prestadoras de cuidados de saúde. O divórcio a que temos assistido nos últimos anos, entre ensino e prática clínica, tem diminuído as possibilidades de suporte mútuo entre estes dois tipos de estruturas e dificultado a investigação aplicada e a transferência de conhecimento para as instituições de saúde. A criação destas Academias de Saúde que liguem e responsabilizem, também em termos organizacionais e legais, instituições de ensino e instituições prestadoras de cuidados de saúde, é uma prioridade para garantir, não só a qualidade assistencial, mas também a sustentabilidade do sistema e a criação de um verdadeiro processo de recertificação de conhecimentos e de competências em todos os profissionais de saúde habilitados ao exercício e, ainda, uma efetiva ligação entre evidência e prática (nas duas perspetivas – prática baseada na evidência e evidência baseada na prática (como diz Lawrence Green).


A verdade é que sem saúde não há desenvolvimento, e muito menos desenvolvimento económico; a verdade é que a saúde nasce todos os dias nos locais onde estudamos, onde trabalhamos onde descansamos e onde nos divertimos; a verdade é que a saúde é uma responsabilidade de toda a sociedade (governo central, autarquias, instituições públicas e privadas, organizações não-governamentais e comunidade em geral); a verdade é que construiremos muito mais saúde nestes espaços, com as competências dos enfermeiros, do que em todas as grandes instituições hospitalares recheadas de equipamentos caríssimos e altamente sofisticados; a verdade é que a saúde é mutável, e, por isso, devemos criar um sistema de formação em saúde igualmente mutável - um sistema onde os enfermeiros sejam capazes de despir a “bata branca” e sair das “paredes” dos hospitais e centros de saúde e começar a trabalhar no local onde estão as pessoas: na escola, no trabalho nos espaços de lazer, nas aldeias e nas cidades, no litoral e no interior, na planície ou na montanha. A verdade é, definitivamente, trabalhar com as pessoas e não para as pessoas, num reforço, no respeito e na dignificação do maior sucesso português do pós 25 de abril: o Serviço Nacional de Saúde.


O FUTURO É HOJE. ENFERMEIROS DE SAÚDE MENTAL NA COMUNIDADE Celso Silva Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, EPE

O tipo de assistência dispensado aos doentes mentais tem variado ao longo dos tempos. Esta tem sido fortemente influenciada pelas crenças acerca da causa e natureza dos transtornos do comportamento. Durante as últimas décadas e com os avanços no que respeita a psicofármacos e outras abordagens terapêuticas, tem-se verificado um movimento, a nível mundial, que preconiza o tratamento das pessoas com doenças do foro psiquiátrico, na comunidade. As guidelines internacionais e nacionais sobre a política de Saúde Mental apontam para um aumento da intervenção na comunidade, com o objectivo de manter o utente integrado no seu ambiente, na sua comunidade, e, se possível na sua família. “A abordagem da Saúde Mental Comunitária dá cada vez maior ênfase à manutenção dos doentes na respectiva comunidade residencial, com promoção da sua autonomia e integração social, em vez de os confinar, mais ou menos permanentemente, em instituições psiquiátricas.” – Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016. As estatísticas mostram que as perturbações mentais têm uma expressão significativa na população em geral. “Estima-se que a prevalência de perturbações psiquiátricas na população geral ronde os 30%, sendo aproximadamente de 12% a de perturbações psiquiátricas graves” – Plano Nacional de Saúde 2004-2010. Muitos dos utentes do foro mental necessitam de medicação periódica injectável intramuscular para manterem uma vivência satisfatória. No entanto, constata-se que há um aumento do incumprimento da toma da terapêutica, e não havendo alternativa ao mesmo, é fundamental garantir o seu cumprimento.


As causas para o incumprimento são diversas e passam pelas condições socioeconómicas, dificuldades de transporte e residência longe do serviço de saúde mental de referência. O incumprimento conduz a descompensações da patologia crónica (esquizofrenias e outras psicoses), levando à necessidade de internamento, por vezes compulsivo e prolongado no tempo (mais de um mês), de modo a que o utente retome o seu padrão de normalidade. Acresce o facto dos custos para o erário público dos internamentos e para as famílias (deslocações, absentismo, questões de tribunal, forças de segurança, entre outros). Dito isto, o futuro é já hoje. Os enfermeiros de saúde mental devem apostar na intervenção comunitária de modo a garantir a toma da medicação injectável, a existência de uma relação terapêutica, de modo a que o utente mantenha a sua autonomia. Mas, a intervenção do enfermeiro especialista de saúde mental não se resume à administração de terapêutica – isso seria redutor. Ele deve ser o elo de ligação com o Departamento de Psiquiatria, com o hospital e/ou centro de saúde da área de residência, e com outras instituições na área de residência do utente de modo a manter uma vigilância global do estado de saúde. O enfermeiro especialista em saúde mental adquiriu um conjunto de competências acrescidas às que tinha enquanto prestador de cuidados gerais. Quer isto dizer que o enfermeiro especialista presta cuidados especializados e cuidados gerais, e, nesse sentido está atento a questões do foro psiquiátrico e fora deste, e por isso tem uma visão global do estado de saúde. A intervenção na comunidade passa por: − Educação para a saúde ao indivíduo / cuidador / família para prevenção de recaídas; − Despiste precoce de descompensação da patologia base e/ou de outras (hipertensão, diabetes, obstipação, colesterol…); − Melhoria

geral

do

estado

saúde

do

indivíduo / cuidador / família; − Facilidade no encaminhamento do indivíduo / cuidador / família em caso de necessidade; − Diminuição de um factor de stresse na comunidade; − Facilitar o acesso ao Serviço Nacional de Saúde. O papel do enfermeiro de saúde mental é complexo, na medida em que pressupõe numerosas intervenções técnicas e organizacionais. Para que possa cumprir com a sua função é necessário, antes de tudo, estabelecer com a pessoa cuidada/cuidador/família uma relação de confiança e terapêutica.


O tempo de ficarmos “confinados” às paredes do serviço acabou.

Há vantagens para todos os intervenientes em se apostar nos cuidados de saúde mental de proximidade – na comunidade onde o utente vive. Têm vantagens os utentes, cuidadores, famílias e comunidade porque os utentes estão medicados, vigiados e serão encaminhados adequadamente em caso de necessidade. Tem vantagem a instituição de saúde pois garante uma prestação de cuidados adequada a estes utentes poupando custos.

Alem disso, estabelece-se uma relação terapêutica “base” que serve de âncora a todo o Plano Terapêutico, no âmbito da equipa multidisciplinar.

Lamentavelmente os recursos disponibilizados para a intervenção na comunidade continuam a ser insuficientes para dar resposta às necessidades do utente, cuidador, família e comunidade. Não tem havido por parte dos decisores políticos a vontade de investir nos cuidados de proximidade no âmbito da saúde mental. Basta constatar a ausência (ou quase) de implementação no “terreno” de cuidados continuados de saúde mental.

Esta inoperância relaciona-se com o modelo de financiamento dos serviços de saúde, que no caso do distrito de Portalegre é por capitação. Ora, como o distrito tem perdido população, tendencialmente o financiamento diminui. Penso que temos de discutir o modelo de financiamento dos serviços de saúde no distrito de Portalegre, pois parece-me que o modelo por capitação não serve os interesses das populações.

Temos de discutir, para o futuro, outro modelo de financiamento sob pena de não ser possível garantir o acesso a que as populações têm direito ao âmbito do Serviço Nacional de Saúde, e em particular, os doentes do foro mental.


A FAMÍLIA E O CUIDADO NA SAÚDE MENTAL Pedro Renca Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria Pós-Graduação em Gestão Hospitalar e Serviços de Saúde Mestre em Toxicodependência e Patologias Psicossociais Departamento de Psiquiatria e de Saúde Mental da ULS Guarda, EPE

No percurso de vida de cada indivíduo, é inevitável que os primeiros acontecimentos sejam vivenciados no seio da família enquanto célula fundamental na vida dos indivíduos. É unânime que todos e cada um de nós temos uma família independentemente das circunstâncias e características. Assistimos ainda hoje a uma luta que tem sido transversal ao longo do tempo: a mudança de mentalidade sobre os problemas em saúde mental, que parece inevitável que não se faz por decreto. Tal como a sociedade, a família colocava de parte as pessoas, incluindo os seus familiares, com problemas de saúde mental. Apesar de ter sido uma realidade mais evidente


no passado, ainda hoje se verifica uma vergonha escondida, encobrimento, uma escusa e abandono dos familiares que têm problemas de saúde mental, levando-o a segregação, isolamento e discriminação sociais. Este problema persiste precisamente pelo medo, desconhecimento e ignorância relativa à saúde mental, às doenças mentais e tudo o que a implicam. É inquestionável que um problema de saúde mental num paciente identificado e de alguma forma sinalizado, altera o normal funcionamento da sua família e que implica na maioria das vezes uma reestruturação dos papéis e funções familiares. Neste sentido, a situação de crise de um dos membros exige um reajustamento enorme, com implicações frequentes na dinâmica familiar, surgindo estados de ansiedade, sentimentos de desespero, revolta, frustrações e angústias perante um contexto de doença a que não se sabe nem consegue dar a resposta eficaz e desejável. De facto, para além destas respostas à situação de crise, cuidar de uma pessoa com um problema de saúde mental aporta consigo também a privação social da família e uma sobrecarga dos familiares enorme, aos níveis económico, físico ou emocional. É erróneo falarmos numa pessoa com patologia mental diagnosticada sem que nos preocupemos também com a família e os estados emocionais dos vários elementos que constituem o núcleo familiar. Aos profissionais de saúde mental e psiquiatria, cabe a função de adaptar os seus conhecimentos, competências e intervenções às capacidades e necessidades não só das pessoas com essa problemática mas também às suas famílias, agindo com estas em parceria e verdadeira interação, tendo sempre como alicerce uma abordagem que respeita a pluralidade familiar e assegura uma continuidade de cuidados e tratamentos. Deveremos, pois, programar um conjunto de intervenções e traçar programas de sensibilização e educação que diminuam os efeitos de crenças erróneas, combatendo o preconceito e o estigma associados às patologias e doentes mentais. Será importante que tais programas e medidas levem à tomada de conhecimento, por exemplo, da possibilidade da cronicidade da doença, de como os tratamentos se fazem e da existência de grupos de apoio, não só para as pessoas com problemas em saúde mental mas também para os seus cuidadores. Em termos gerais procurar aumentar a literacia em saúde mental das populações. Estas são estratégias que se poderão perspetivar, com a elaboração de programas anti estigma, tornando percetível que estas pessoas têm direitos e deveres de cidadania, como membros pertencentes a uma comunidade, que, cumprindo os diversos tratamentos (ex:


farmacológico, reestruturação cognitivo-comportamental, a reabilitação psicossocial incluindo o treino de competências sociais, programas de psicoeducação, entre outras intervenções psicoterapêuticas), poderão trabalhar e ser produtivos, conviver e socializarem. Para isso, é necessário, em primeira instância, que a família e a comunidade onde se inserem não rejeitem o familiar e o seu problema de saúde mental. Deste modo, a probabilidade de se tornarem mais autónomos será maior e a sua integração social será uma realidade. Hoje, o avanço das intervenções farmacológicas, atuando em diversos sintomas e com menos efeitos secundários, incrementou a adesão à terapêutica (aspeto este crucial para o sucesso da sua reabilitação). As intervenções psicoterapêuticas são cada vez mais eficazes e, juntamente com o tratamento farmacológico, é possível verificarmos uma visível taxa de sucesso na recuperação da pessoa doente. Os diversos grupos psicoterapêuticos e associações de apoio hoje existentes poderão ajudar no processo da conquista do saber e numa solução, que, para além de responder ao problema de saúde mental do indivíduo, é um espaço em que a família pode expor e partilhar as suas ideias e sentimentos perante o problema. Atualmente, verifica-se que existe junto da família um sentimento e esforço uníssono para que ela seja esclarecida sobre o avanço do tipo de tratamentos e modo do cuidar. Hoje, as intervenções no mundo da saúde mental deixaram para trás termos como “loucos”, “pobres” ou “indigentes”, ou “perda de identidade”. Falamos hoje de pessoas. Colocaramse de parte termos como asilos ou hospícios e falamos agora de abertura à comunidade, Modelos Comunitários, pessoas (re) integradas no seu domicílio, na sua comunidade, em ambientes familiares. Com a aproximação das pessoas com problemas em saúde mental à sua família e à sua comunidade, pretende-se que mantenham as referências à sua origem, à sua família, à sua identidade. De uma psiquiatria antiga à contemporânea, consegue-se perceber uma evolução que se processou em diversas reformas e que englobaram diferentes formas de tratar e cuidar. Atualmente, e espero que assim continue no futuro, as políticas reformadoras em saúde mental primam em favor de uma qualidade de vida humanizante, da PESSOA como parte integrante de uma comunidade. Os maus tratos e as agressões a pessoas portadoras de um problema de saúde mental apresentam nos nossos dias um menor número. Há uma maior consciência na necessidade de passar-se da consideração de pessoas incapacitadas ou inválidas a pessoas produtivas e socialmente bem aceites.


Neste sentido, e como queremos que o entendimento e a aceitação de um problema psíquico por parte da família se transforme num elemento de extrema importância na reabilitação da pessoa, temos de entender, estabelecendo uma relação de ajuda, que a angústia é manifestada por muitas das famílias por não se sentirem protegidas nem preparadas para cuidar dos seus familiares. Será necessário então incutir nelas confiança, valorizando o seu papel na unidade familiar e fazendo-lhes entender que é necessário muita paciência em todo este processo de recuperação. Nenhuma verdadeira melhoria se verifica da noite para o dia. Apesar da existência do conflito interno e da eventual dualidade de sentimentos vividos pela família, a par dos cuidados, sem dúvida que em termos de qualidade de vida se têm vindo a registar melhorias significativas. Acredito que só continuarão a ocorrer transformações na maneira de se encarar o estigma em torno desta problemática quando houver um entendimento global dos problemas em saúde mental e uma sensibilidade integrada no cuidado ao portador do sofrimento psíquico e à sua família. Com todas as dificuldades que ainda persistem e que impedem um maior sucesso, penso que a nova filosofia do cuidar humanizante está a ser implementada junto de uma pessoa que é um ser humano livre, pleno de direitos e deveres A saúde mental traduz-se em qualidade de vida e não só ausência dela.


ESTRATÉGIAS DE MUDANÇA NO SISTEMA NACIONAL DE SAÚDE: AVANÇOS OU RETROCESSOS? Maria José Valente Lopes Enfermeira Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, EPE Hospital Doutor José Maria Grande de Portalegre

A saúde é um bem a que todos têm direito, independentemente do estrato social, económico ou político. Com a integração do Sistema Nacional de Saúde (SNS), o acesso à saúde deixou de ser um privilégio para quem podia pagar e passou a ser um direito consagrado na constituição, respondendo com qualidade e respeito às necessidades de cada um. O SNS pode definir-se como universal, equitativo e tendencialmente gratuito, e caracteriza-se por uma medicina de proximidade. Com a implementação do SNS os resultados não se fizeram esperar, um aumento na cobertura da população em serviços de saúde e na formação de carreiras profissionais de saúde, que com estas medidas possibilitou o aumento dos indicadores de saúde; a esperança média de vida aumentou e a taxa de mortalidade infantil sofreu uma redução num curto espaço de tempo, o que demonstra a importância das medidas tomadas. A União da Direção Geral dos Hospitais com a Direção Geral dos Cuidados Primários, passando a Direção Geral da Saúde, em 1990, permitiu uma melhor integração entre os cuidados de saúde primários, secundários e terciários. Um dos constrangimentos do SNS foi criar divergências no grupo médico, sendo uma parte dos médicos a favor da medicina convencionada, havendo dualidade no financiamento do Estado. O sector da saúde nunca foi visto como muito importante, havendo falta de investimento e não existindo uma base social e política de apoio. Nos últimos anos o SNS sofre algumas mudanças. A iniciativa privada cresceu muito na área da saúde, deixando os governos de investir no SNS. Isto levou a uma


redução da sua capacidade, permitindo às entidades privadas a possibilidade de se implementarem no mercado. Beneficia-se os interesses privados, reduz-se o financiamento do SNS, diminuindo a sua qualidade e descredibilizando-o para favorecer o sector privado. Estamos perante um sistema de saúde público desvalorizado e um sistema de saúde privado protegido e financiado com dinheiros públicos, respondendo às necessidades do que dele podem usufruir. O acesso à saúde privada é só para quem tem condições económicas para o fazer. O direito à saúde já não é universal e geral como garante a Constituição da República. Também o conceito de medicina de proximidade está cada vez mais longe dos portugueses, com a abolição dos hospitais concelhios, com a fragmentação dos centros de saúde, com a falta de médicos de família, os utentes do SNS acabam por recorrer aos serviços de urgência hospitalar para verem resolvidos os seus problemas de saúde. E todos sabemos que as urgências não estão direcionadas para responder aos cuidados de saúde primários, levando a um fluxo anormal de pessoas a recorrer a estes serviços com problemas de saúde que poderiam e deveriam ser solucionados pelos médicos de família. Para tal o SNS tinha que funcionar. Assim, os utentes que recorrem à urgência estão a consumir recursos mais caros e inadequados às suas necessidades. Tudo isto porque a redução de recursos humanos inviabiliza consultas atempadas, e mais importante ainda, inviabiliza uma medicina preventiva. A solução, para quem não tem possibilidade de recorrer ao privado, é as urgências! Tudo isto porque o SNS que temos actualmente, tem falhas graves. As transferências do Orçamento de Estado para o SNS têm vindo a diminuir, assim como do SNS para os hospitais públicos de “natureza empresarial” (EPE), no entanto temse verificado um aumento das verbas destinadas às Parcerias Público-Privadas (PPP) A crise financeira e os consequentes cortes no sector da saúde, aliados ao desemprego, ao envelhecimento da população e à emigração dos jovens – que leva a um aumento da proporção de idosos, faz com que a saúde dos portugueses piore. A situação socioeconómica atual leva a uma exacerbação das doenças mentais, doenças cardiovasculares, aumento do consumo de álcool, tabaco e drogas, a saúde deteriora-se e a procura dos serviços de saúde aumenta. Os recursos a oferecer no SNS são escassos para a procura, com a redução de recursos materiais, humanos e económicos, limitou-se a sua capacidade de cuidar da saúde dos portugueses. Em contrapartida o sector privado cresce. O impacto da crise limita a capacidade de a maioria dos portugueses recorrerem ao sector privado. Ao reduzir-se o financiamento no SNS põe-se em causa a qualidade dos cuidados de saúde dos utentes. Quem beneficia é o privado e os que podem usufruir dele. Quanto


mais degradado e descredibilizado está o SNS mais se justifica a privatização na área da saúde. Um estudo recente intitulado “O impacto da crise financeira no sistema de saúde e na saúde em Portugal” apresentado em Coimbra a 16 Março deste ano, revela que os cortes orçamentais, as reduções salariais e as condições adversas para gestores e profissionais de saúde podem por em causa a eficiência dos serviços e a qualidade dos cuidados prestados. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Observatório Europeu sobre Sistemas de Saúde alertam que «piorar as condições de trabalho» no Serviço Nacional de Saúde (SNS) pode comprometer a sua sustentabilidade. Os cortes orçamentais fazem com que as listas de espera sejam enormes, haja selecção de doentes para fazer determinados tratamentos, nomeadamente para o cancro, faltam medicamentos, não há enfermeiros nem médicos suficientes, o SNS está um colapso! O referido estudo, centra-se na redução dos custos, na racionalização dos recursos e no aumento das receitas, omitindo o impacto da crise financeira no sistema de saúde e o consequente empobrecimento da população, o que faz com que as taxas moderadoras e os cortes na atribuição de transportes sejam um aumento significativo no orçamento das famílias. A OMS critica a falta de avaliação do impacto da crise na saúde e pede transparência. Existe um desequilíbrio enorme na distribuição dos profissionais de saúde, 72% dos médicos e 81% dos enfermeiros desempenham funções nos Hospitais em detrimento dos Cuidados de Saúde Primários, quando a evidência demonstra que os últimos são mais económicos e eficientes (é mais eficaz prevenir que tratar). Na saúde, é crucial prevenir a doença e para isso tem que haver cuidados de saúde primários eficazes. Desta forma diminuem-se os gastos em medidas curativas, contribui-se para o bem-estar das populações e aumenta-se a qualidade de vida das pessoas. Sem recursos não é possível prestar cuidados de saúde de qualidade e adequados às necessidades da população. O SNS só adquire sustentabilidade se houver crescimento económico e a sustentabilidade do SNS não depende apenas do incremento dos recursos (humanos e materiais) e das transferências do Orçamento de Estado mas também da sua gestão, em termos de eficiência e eficácia. Defender uma utilização eficiente dos recursos no SNS é tão importante como garantir os meios necessários ao seu funcionamento e é nisto que todos temos que nos empenhar. Comemorar os 35 anos do SNS é fazer com que ele funcione de forma eficaz. É


preciso que o estado passe a financiá-lo sem ao mesmo tempo financiar o privado, esta dualidade é prejudicial, dispendiosa e ineficaz. Depois é preciso: Cuidados de Saúde Primários eficazes - com promoção de estilos de vida saudáveis. As Unidades de saúde primárias devem promover o bem-estar, prevenir as doenças e ser o primeiro contacto com as populações. Ensinos, informação atempada, rastreios para promover a saúde e evitar a doença. O rosto do SNS deveria ser os Centros de Saúde! Apostar mais em promover a saúde! O financiamento do SNS assenta muito na doença e pouco na prevenção. O Hospital deveria ser a retaguarda do SNS, o doente que necessita de internamento hospitalar por situações agudas e/ou crónicas descompensadas. A receita seria, à semelhança dos cuidados paliativos: dar primazia ao domicílio do utente! Se não houver doenças, as pessoas têm mais qualidade de vida e o SNS tem menos custos. Médicos de família e enfermeiros suficientes, para uma cobertura de toda a população, com consultas atempadas, ações preventivas para melhorar a qualidade da saúde e assistência na doença. Os Centros de saúde têm um papel fulcral na intervenção comunitária na capacitação e empoderamento das comunidades, incentivando a população a utilizar os seus próprios recursos e conhecimentos, de forma a se tornar um parceiro ativo no processo de prevenção de doença, de promoção da saúde e na tomada de decisão. Para tal temos que disponibilizar recursos e informação. A saúde aprende-se e aprender é uma responsabilidade social. Uma equipa multidisciplinar disponível e com visitas domiciliares aos doentes crónicos. Cuidadores principais treinados pela equipa multidisciplinar. Resposta adequada dos hospitais para situações descontroladas e de urgência. A nível das equipas: premiar as melhores práticas, ser recompensado quando se faz bem, promover o elogio para que os profissionais de saúde sintam que há reconhecimento pelo trabalho efetuado. Estimular a criatividade! Estas são as premissas para o SNS voltar a funcionar. Ir buscar as ideias básicas da sua origem: universal, equitativo e essencialmente gratuito, eliminar os erros e excessos e geri-lo de uma forma equilibrada mas privilegiando sempre a saúde e o bem-estar dos cidadãos.


UM AMANHÃ SINGULAR EMERGÊNCIA MÉDICA PRÉHOSPITALAR Sílvia Manuela Pação Alminhas


Membro de Equipa da Viatura Médica de Emergência e Reanimação e do Helicóptero de Emergência Médica (INEM) - Évora Enfermeira Especialista na Área da Médico-Cirúrgica na Vertente do Doente Crítico Mestre em Saúde e Bem-Estar da Pessoa Idosa

Atuando numa área tão específica e delicada para o bem-estar e sobrevivência dos cidadãos, como é a situação de Emergência Médica do Pré-Hospitalar, onde a optimização e concretização plena de qualquer ideia é baseada em momentos de aprendizagem e de partilha de conhecimentos e experiências, construir uma ideia com a visão do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), ou seja, uma ideia inovadora, sustentável, motivadora e de referência na prestação de cuidados de emergência médica, é o grande objetivo deste trabalho. Assim sendo, ela toca várias componentes que serão descritas ao longo desta temática, com o intuito de uma prestação de socorro diferente, para uma emergência médica pré-hospitalar num amanhã singular, pois é uma constante na nossa realidade. O INEM tem feito esforços consideráveis para melhorar a resposta às situações de emergência médica, sobretudo no que diz respeito aos tempos de resposta, ao acesso a cuidados de emergência e à eficiência da sua atuação. No sentido de dar continuidade ao trabalho desenvolvido é também fundamental melhorar a nossa capacidade de intervenção no terreno, as nossas competências técnicas e atualizar os conhecimentos, de forma permanente e continuada, habilitando todos os operacionais a intervirem da melhor forma possível. Todos aqueles que desempenham funções na emergência médica pré-hospitalar são frequentemente confrontados com situações de doença súbita ou agudização importante de doença crónica, situações graves, habitualmente complexas e que exigem uma atuação segura e tecnicamente adequada. O aprofundar conhecimentos previamente adquiridos e também adquirir novas competências, habilitando-os a uma atuação de teor avançado que poderá fazer toda a diferença na vida daqueles que diariamente assistimos, em cenários muitas vezes complexos e hostis. O INEM conta com todos para garantir uma assistência tecnicamente qualificada, sempre com um elevado respeito e consideração pela vida humana, a todos aqueles que possam eventualmente necessitar do nosso saber e das nossas competências. Por isso, por essa responsabilidade acrescida, temos a obrigação de aproveitar cada dia como uma oportunidade única e irrepetível para aprendermos, para melhorarmos. Passando por todos os cidadãos a responsabilidade de dar o seu contributo, pois ele é primordial em todo este processo de salvar vidas. O inicio da cadeia de


sobrevivência depende de cada um de nós (cidadão) com o reconhecimento da situação e o accionar os meios de socorro através da chamada 112. Contudo, devemos ser mais ambiciosos e envolver os cidadãos no segundo elo da cadeia, de forma a não quebra-la, pois o Suporte Básico de Vida (SBV) iniciado o mais precocemente possível, permite ganhar tempo para salvar essa vida. As vítimas de paragem cardio-respiratória necessitam de SBV imediato, no sentido de preservar, o mais possível, o fluxo de sangue ao cérebro e coração e a outros órgãos vitais, é imprescindível ganhar tempo, enquanto se aguarda socorro diferenciado, realizando gestos simples e práticos para salvar vidas. Aprender a realizar SBV é um processo interativo que requer conhecimentos e competências, mas é ao mesmo tempo um ato de solidariedade, responsabilidade social, consciência cívica, ou seja é um Dever de cidadania. Porque ninguém reanima sozinho, requer um trabalho coordenado de uma equipa, todos os cidadãos devem unir esforços num único objetivo: Salvar Vidas, ou seja a Massificação do Suporte Básico de Vida. Defendo que a sua aprendizagem seja iniciada no 1º Ciclo, como parte integrante do programa escolar, obviamente com as suas recertificações ao longo da vida. Nesta linha de pensamento, obviamente que faço notar, neste momento, a importância dos cursos creditados de formação em SBV e dos mass training para as outras faixas etárias, com o intuito de formar o maior número de cidadãos. Ressalvo outra componente desta ideia que dá continuidade à cadeia de sobrevivência, refiro me ao terceiro elo e à desfibrilhação. Que segundo as guidelines deve ser iniciada também com a maior brevidade possível, tendo linhas orientadoras para os seus tempos limites de eficácia. Como tal, a existência de Desfibrilhadores Automáticos Externos na grande maioria dos locais públicos (centro comerciais, feiras, locais de concertos, estádios, eventos sociais, centro das cidades) que representam um volume maior de pessoas, deveria ser legislado a sua obrigatoriedade, pois o seu rápido e fácil acesso, é uma mais-valia para salvar vidas, uma vez que o sistema operativo está adaptado a leigos. Todos profissionais que desempenham funções na emergência médica pré-hospitalar, têm a perfeita noção de que é, maioritariamente, nesta abordagem inicial da vítima, bem estruturada e sequencial, que muitas vidas podem e devem ser ganhas. Como sabemos a emergência médica é a atividade na área da saúde que abrange tudo o que se passa desde o local onde ocorre uma situação de emergência até ao momento em que se conclui, no estabelecimento de saúde adequado, o tratamento definitivo que aquela situação exige. Baseia-se num conjunto de ações coordenadas que resultam da intervenção ativa e dinâmica dos vários componentes do sistema de saúde nacional, de modo a possibilitar uma atuação rápida, eficaz e com


economia de meios em situações de emergência médica, de forma a garantir aos sinistrados ou vítimas de doença súbita a pronta e correta prestação de cuidados de saúde. Neste âmbito, os Centros de Orientação de Doentes Urgentes (CODU) são Centrais de Emergência Médica responsáveis pela medicalização do Número Europeu de Emergência112. É da competência dos CODU atender e avaliar no mais curto espaço de tempo os pedidos de socorro efetuados através do 112 (chamada gratuita), com o objetivo de determinar os recursos necessários e adequados a cada caso. O seu funcionamento é assegurado, 24 horas por dia, por equipas de profissionais qualificados com formação específica para efetuar o atendimento, triagem, aconselhamento, seleção e envio de meios de socorro. Para o efeito, os CODU dispõem de um conjunto de equipamentos na área das telecomunicações e informática que permitem coordenar e rentabilizar os meios humanos e recursos técnicos existentes. Como vivemos numa era onde predomina o avanço científico, tecnológico e a modernização de procedimentos, vinculados à necessidade de se estabelecer controlo, poderíamos associar a toda essa ciência na área das telecomunicações uma aplicação informática gratuita para telemóveis com um Sistema de Vídeo-Conferência adicionado ao sistema de triagem existente, a cada chamada 112, utilizado como recurso, na eventualidade da necessidade de visualizar a vítima ou a situação de socorro para uma melhor tomada de decisão sobre os meios de socorro e o aconselhamento à população e obviamente optimizando tempos de resposta. Nesta linha de pensamento, o CODU seleciona e prepara a recepção hospitalar dos doentes, com base em critérios clínicos, geográficos e de recursos da unidade de saúde de destino, assim como, a promoção do transporte do doente urgente/emergente até à unidade de saúde mais adequada. No que concerne a este aspeto, com três CODU em funcionamento atualmente, julgo ser mais vantajoso a descentralização dos mesmos, com a criação de novas dependências em áreas geográficas mais periféricas no país, de forma a dar uma resposta mais adequada às situações de emergência em termos de tempo de reposta e meios de socorro, pois o conhecimento mais aprofundado da própria área geográfica e da real capacidade das unidades de saúde da região seria mais benéfico, obviamente sempre que necessário em comunicação com o CODU “central”. Neste contexto e de acordo com o acima citado, os CODU coordenam e gerem um conjunto de meios de socorro (motas, ambulâncias de socorro, viaturas médicas e helicópteros). Os meios são selecionados de forma criteriosa de acordo com a situação clínica das vítimas, a proximidade e a acessibilidade ao local da ocorrência. Não poderia olvidar este ponto relativamente aos Meios de Socorro, eles são fundamentais no desenvolver desta atividade, no meu entender os recursos disponíveis


deveriam ser em número superior, de modo a não se sobrepor a necessidade do mesmo meio e este se encontrar ocupado no desempenho da sua atividade, e assim, serem redistribuídos de acordo com área geográfica, acessibilidade e densidade populacional da referida região, no sentido das oportunidades de socorro serem idênticas para todos os cidadãos. Tendo em conta estas premissas, todas as cidades do interior do país deveriam ser contempladas com uma ambulância de Suporte Imediato de Vida (SIV), têm por missão garantir cuidados de saúde diferenciados, tais como manobras de reanimação, até estar disponível uma equipa com capacidade de prestação de Suporte Avançado de Vida, as mesmas deveriam ser sediadas nos centros de saúde ou unidades hospitalares locais. Quanto as unidades hospitalares mais diferenciadas, também de acordo com os critérios referidos deveriam ser detentoras de todos os diferentes meios e formarem equipas com competências para integrar qualquer meio, gerenciando o CODU o meio mais adequado a cada situação e socorro. Por sua vez essas equipas deveriam direcionar a sua atividade exclusivamente à Emergência Médica Pré-Hospitalar, podendo mesmo ser criada em termos académicos uma especialidade neste âmbito dirigida a médicos e enfermeiros. Atualmente falar de Formação, é falar da constante necessidade de atualização e desenvolvimento, somos permanentemente confrontados com o emergir de novos conhecimentos científicos que nos possibilitam renovadas leituras e interpretação do mundo envolvente e de nós próprios, exigindo-nos um desafio constante de atualização e desenvolvimento do saber adquirido, o qual se reflectirá no nosso próprio crescimento pessoal e profissional, sendo concretizável na forma de ser e estar na profissão, tendo por finalidade última a protecção do cidadão em situação de acidente e/ou doença súbita, na perspetiva de assegurar a segurança e a qualidade dos cuidados de enfermagem no contexto pré-hospitalar. Cada cidadão tem o direito de esperar sempre o usufruto das respostas que os avanços científicos, tecnológicos e do conhecimento humano na saúde e na enfermagem permitem. O caminho que levará a alcançar o nosso objetivo: cuidar o doente no ambiente pré-hospitalar, com a qualidade a que o mesmo tem direito, minimizando os riscos ou falhas humanas, e proporcionando-lhe condições, não só para sobreviver mas, para viver com qualidade; será, sem dúvida, a constituição das equipas, deveriam ser formadas por enfermeiros especialistas na área do doente crítico ou peritos, no mínimo com 5 anos de experiência profissional na referida área. Assim, um profissional competente será sempre aquela pessoa que, possuindo um reportório de conhecimentos e capacidades vasto e diversificado, toma, executa e avalia as decisões que seleciona, em circunstâncias quase sempre imprevisíveis, de modo a que estas se constituam como soluções adequadas, e


socialmente legitimáveis e abertas a constantes reajustamentos para poderem continuar a garantir a sua responsabilidade à instabilidade permanente. Nos tempos que correm e no caminho da qualidade da prática dos cuidados de enfermagem é importante frisar, que a tomada de decisões clínicas é fundamental para a prática de enfermagem, sendo exigido que a enfermeira pense criticamente, analisando e aplicando conhecimento, refletindo sobre a experiência, utilizando protocolos profissionais adequados, resolvendo problemas e tomando decisões clínicas, competências adquiridas pelos enfermeiros especialistas. Esta realidade desafia os enfermeiros a responder com maior rapidez e competência, adoptando uma atitude profissional e uma atuação crítico-reflexiva, baseada na responsabilidade, na criatividade e no espírito crítico de cada profissional. No final, para nós, não são os anos da sua vida que contam, mas a vida nos seus anos.


UMA MATERNIDADE PARA O FUTURO Pedro Miguel Pereira Costa Enfermeiro Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia na ULSNA, EPE

Sérgio Rui da Silveira Lança Carinhas Enfermeiro Especialista em Saúde Materna e Obstetrícia na ULSNA, EPE

Cuidar é a razão de existir da enfermagem. O cuidar ultrapassa a noção de prestar cuidados a…; é dar atenção a…; estar preocupado com…; é sentir-se responsável por…, ou atender às necessidades de…! Cuidar e ajudar caminham juntos numa relação interpessoal. A relação de ajuda pressupõe a existência de um elo de ligação enfermeiro/mulher/casal, implicando a presença do enfermeiro junto dos mesmos, não só física como também a presença deste com todo o seu Ser! Na área da Saúde Materna e Obstetrícia este princípio básico da enfermagem, a relação interpessoal, está ou deverá estar bem presente, colocando-se vários desafios


junto do Enfermeiro Especialista em Enfermagem de Saúde Materna e Obstetrícia para o futuro, em especial na utente/casal que se encontra institucionalizada. Neste sentido será importante que a mulher/casal aquando do internamento se sinta acolhida, tranquilizada, informada, ajudada, escutada, esperando-se de quem cuida que saiba aliviar o sofrimento, tanto físico como moral e espiritual, respondendo às necessidades profundas de cada utente. Deste modo, o ambiente físico em que a mulher/casal se encontra influência a evolução do trabalho de parto e parto. Seria excelente ter uma área de baixa intervenção, com um ambiente o mais natural possível, quase como o de casa, dirigido por enfermeiros, separada da sala de partos tradicional, perto do serviço de obstetrícia e da equipa perinatal de urgência. Esta área de baixa intervenção, deveria ser utilizada como área polivalente, que permitisse realizar todo o acompanhamento do processo de dilatação, parto e pósparto imediato. Similarmente, a mulher/casal deveria elaborar o seu próprio plano de nascimento, que é um documento onde manifesta e escreve os seus desejos e expectativas para o momento do parto e nascimento do seu filho. É preciso evitar a “obsessão“ de um “parto perfeito”. Assim deve informar-se que as expectativas e o plano de nascimento estão sempre sujeitos à situação clínica, pelo que podem existir desvios se a evolução do trabalho de parto assim o exigir. Nas áreas de baixa intervenção deveríamos ter em presença um enfermeiro que preste assistência de forma individualizada (um enfermeiro por cada mulher/casal). Quantas vezes sem nos darmos conta estamos a reduzir a mulher a um simples objeto quando ignoramos a sua identidade, o seu “eu”, e a sua finalidade de vida e experiências, os seus valores, os seus medos e as suas capacidades? Quantas vezes esquecemos que também somos pessoas com sentimentos e emoções, os quais refletem na interação com o outro no momento do cuidar? Quantas vezes no nosso quotidiano esquecemos o significado de “empatia” e dirigimos e tomamos decisões pelo outro sem ter em conta as suas vivências, as suas emoções e sentimentos, impondo a nossa forma de sentir o problema, e ver a situação? Para quê sujeitar a mulher a uma diminuição dos seus movimentos restringindo-a a uma cama durante o trabalho de parto, quando se sabe, por evidência cientifica, que a


posição vertical favorece a grávida, diminuindo a sensação dolorosa, diminuindo a necessidade de analgesia epidural, diminuindo as alterações no registo da frequência cardíaca fetal e diminuindo o tempo da fase latente do trabalho de parto. No próprio período expulsivo, porque não deixar a mulher adotar a posição mais cómoda para si, favorecer a utilização das ditas posições verticais, e no caso de a mulher optar por parir numa cama, utilizar a cama normal de partos, evitando a posição de litotomia. O papel do enfermeiro será oferecer à utente, sem lhe impor, os meios complementares que lhe permitam descobrir ou reconhecer os seus recursos pessoais, que ela utilizaria, à sua maneira, no processo de resolução do problema. Neste âmbito, o enfermeiro terá que ser capaz de criar um clima de confiança, escutar em vez de discursar, compreender e reformular nos momentos oportunos aquilo que a utente verbaliza ou transmite; deve ter vontade de ajudar e uma grande maturidade ligada a um sólido conhecimento de si mesmo, que lhe permitirá observar controlando as suas reações para não falsear o processo. O acompanhamento é fundamental para o bem-estar de qualquer utente fora do seu ambiente familiar. Assim todas as mulheres deveriam ter a companhia de alguém, à sua escolha, em trabalho de parto e parto. O apoio e ajuda contínua demonstraram benefícios: uma menor utilização de analgesia farmacológica, um menor número de partos instrumentados e cesarianas, e uma maior satisfação das mulheres com a sua experiência no parto. Devemos pois, oferecer às utentes instrumentos e estratégias para poderem enfrentar a dor e o stress no trabalho de parto. Todo o ser humano experimenta a necessidade de se sentir acolhido e confortado, mas também de se sentir importante aos olhos dos outros. Num processo de trabalho de parto e parto, o estado de vulnerabilidade aumenta e a mulher para se sentir importante necessita de ser escutada atentamente pelo enfermeiro no sentido de a satisfazer ao mesmo tempo que lhe proporciona um “ambiente favorável”. Devemos estar atentos para não cairmos no erro de só selecionarmos os índices que são favoráveis a nós próprios. Devemos ter presente que a mulher/casal não está ali por causa do enfermeiro, mas sim o contrário.


A SAÚDE É MINHA! A RESPONSABILIDADE É MINHA! Mónica Ribeiro Especialista em Enfermagem de Reabilitação; Mestre em Enfermagem de reabilitação Vivemos num panorama, em que a realidade do que são os cuidados de saúde e a definição de saúde se encontram a anos-luz do século passado… alias, da década passada. A sociedade assume os cuidados de saúde como um direito, exigindo acessibilidade e qualidade dos mesmos. O caminho percorrido para dar resposta a tais demandas tem sido não só atribulado, como longo e cheio de obstáculos, e não se pode afirmar que está concluído ou alguma vez estará concluído, no entanto pode-se afirmar que se evidenciam já ganhos em saúde emergentes das preocupações e intervenções do passado.


A bibliografia mundial ressalta o papel dos cuidados de saúde primários como fundamentais para sociedades saudáveis, não obstante, face à filosofia dos cuidados de saúde, a resposta às pessoas tem sido primordialmente centrada na 2ª e 3ª fase dos cuidados. Tal facto prende-se com uma fase primária deficitária, onde os enfermeiros não têm espaço temporal para desenvolver a sua intervenção face ao número de utentes e às realidades sócio-demográficas a que dão resposta. Apesar das inúmeras campanhas mundiais, debatemo-nos com realidades, decorrentes de estilos de vida, como o aumento da obesidade infantil ou o aumento de jovens adultos afetados por doenças crónicas, como a diabetes ou a hipertensão, e por outro lado por jovens e jovens adultos acometidos por afeções e patologias cujas co-morbilidades se arrastarão ao longo de toda uma vida comprometendo a sua qualidade de vida e aumentando das despesas com cuidados de saúde. Caminhamos para uma sociedade onde todas as gerações apresentam elevado grau de literacia e acesso à informação, e neste sentido o seu conhecimento vai aumentar o grau de exigência não só dos cuidados de saúde, como em particular com os profissionais de saúde. As sociedades futuras não exigirão nada menos que a qualidade, que a plenitude. Atualmente falar de enfermagem, não obstante o modelo teórico, a especialidade ou a realidade, passa por falar da pessoa e do cuidador/familiar, passa por enquadrá-lo no seu contexto, na sua realidade, passa, obrigatoriamente, por falar de capacitação e/ou empowerment. Sendo um conceito atual é já uma premissa para os cuidados de enfermagem de todos os profissionais. Partindo dos pressupostos que as pessoas têm mais informação e literacia e que os enfermeiros reconhecem como fundamental a capacitação da pessoa/cuidador/familiar faria todo o sentido que cada indivíduo fosse responsabilizado pela sua saúde, pelas suas opções e pela forma como estas podem influir no seu estado de saúde. Assim, falamos de um futuro onde os cuidados de enfermagem, gerais e especializados, se centrariam na fase primária,

garantindo

o

empowerment

da

pessoa

e/ou

do

familiar/cuidador,

responsabilizando-os pelo seu projeto de saúde. Considera-se uma intervenção enquadrando a pessoa em todas as fases de vida e direcionada à adoção de estilos de vida saudáveis, adaptação às incapacidades, garantia da máxima autonomia e independência, promoção da acessibilidade, adesão a regimes terapêuticos e não terapêuticos. Considerase assim que os cuidados de enfermagem garantem à pessoa as ferramentas para gerir a sua saúde tornando-a responsável pela mesma.


Tal realidade implica um acompanhamento contínuo da pessoa e/ou do familiar/cuidador por diferentes enfermeiros ao longo das diferentes fases de vida. A título de exemplo, fala-se num ciclo de vida acompanhado desde a vida in útero, em que os cuidados gerais e especializados garantem aos progenitores a informação e capacitação necessária a uma gravidez e puerpério culminando num recém-nascido recebido por pais com conhecimentos e competências para a tomada de decisão de cuidados de qualidade. O recém-nascido terá o acompanhamento de enfermeiros e enfermeiros especialistas que não só promoverão a adoção de estilos de vida-saudável como o capacitarão para a adoção dos mesmos. Tal capacitação culmina com um jovem-adulto que pode ser responsabilizado pelo seu projeto de saúde, pelas suas opções e pela forma como influem a sua saúde. Mas não se negligenciam as situações de doença. Os progenitores deverão ser capacitados para intervir face à situação de doença, aumentando a eficácia da intervenção preventiva atempada, reduzindo o recurso à urgência e o recurso a medicação. Face à incapacidade ou doença crónica os progenitores deverão ser detentores do conhecimento com vista à intervenção maximizando a autonomia e independência e prevenindo complicações, a criança deverá desde cedo ser alvo da intervenção geral e especializada de enfermagem visando o seu empowerment, visando um jovem adulto, um adulto, adaptado à sua incapacidade, capaz do autocontrolo da sua doença, empreendedor do seu projeto de saúde. A sociedade terá assim pessoas detentoras do seu projeto de saúde, mas que podem ser vítimas de acidentes ou afeções (crónica ou agudas) incapacitantes. Uma vez mais, face a tais situações, a intervenção de enfermagem não se centrará no tratamento e reabilitação, mas a par destas destaca-se a capacitação. Tal como anteriormente foi referido, emerge a maximização do potencial visando a autonomia ou minimização da incapacidade, promovendo o restabelecimento pleno da funcionalidade ou adaptação à incapacidade, concorrendo para a minimização de complicações e co-morbilidades, limitando custos de saúde associados e representado ganhos em saúde. Teremos assim adultos que se transformarão em idosos mais saudáveis e detentores de conhecimento para dar vida aos anos. No entanto o alongar dos anos leva à consequente perda de autonomia e necessidade de cuidadores (formais ou informais). Preconiza-se que também estes estejam capacitados para uma intervenção eficaz e direcionada às necessidades do idoso. Neste sentido numa fase precoce, deverá ser identificado o futuro prestador de cuidados, para que este possa ser enquadrado nos


cuidados gerais e especializados de enfermagem, capacitando-o para o seu papel de prestador de cuidados da pessoa, dando espaço temporal, para que a pessoa capaz das suas faculdades (físicas e mentais) possa partilhar o seu projeto de saúde com o seu prestador de cuidados. Visa-se um envelhecimento saudável e acompanhado, com minimização das incapacidades e consequente perda de qualidade de vida, com os ganhos consequentes de uma vida plena de adoção de estilos de vida saudáveis. Em suma, ao longo de todas as fases de vida, a pessoa e enfermeiros seriam parceiros num investimento pela saúde. Como em todos os investimentos há investidores, ganhos, perdas e responsabilidades. Os investidores, o Sistema Nacional de Saúde e os Enfermeiros, visam a adoção de estilos de vida saudáveis, minimização do número de doenças e co-morbilidades e consequente redução dos gastos com a saúde, tem como responsabilidade a garantia da prestação de cuidados de qualidade visando o empowerment da pessoa e familiar/cuidador. As pessoas ganham conhecimento para o empowerment da sua saúde assumindo a responsabilidade no seu projeto de saúde, e neste sentido, podendo ser responsabilizadas pelas práticas que comprometam a sua saúde, e como em todos os investimentos o não cumprimento das responsabilidades poderá ser penalizado. Numa sociedade em se exigem cuidados de saúde de qualidade, os prestadores de cuidados de saúde não podem exigir nada menos que a colaboração em pleno para uma saúde de qualidade.


A APLICABILIDADE DE PROTOCOLOS E A QUALIDADE EM SAÚDE Anabela Carvalho Ângela Lopes Enfermeiras Especialistas em Enfermagem Médico-Cirúrgica Centro Hospitalar do Médio Tejo, EPE

O sistema de saúde português sofreu uma grande evolução nos últimos 30 anos. Portugal tinha indicadores de saúde muito aquém dos restantes países europeus, e o acesso da população aos serviços de saúde era muito limitado, foi então criado o Serviço Nacional de Saúde (SNS) como resposta à necessidade de uma cobertura mais extensa e equitativa dos serviços e de um maior acesso de todos os portugueses a melhores cuidados de saúde. Este foi o marco mais importante da história da Saúde em Portugal, tendo sido determinante para o aumento da qualidade de vida dos cidadãos. A melhoria da qualidade dos cuidados de saúde tem sido uma das prioridades em muitos planos de saúde nacionais, e foi também assumido que o seja, no Plano Nacional de Saúde (PNS) 2011-2016. O conceito de qualidade é bastante subjectivo, visto que está directamente relacionado com percepções, necessidades e características de natureza individual. Quando aplicado a cuidados de saúde, há uma dificuldade acrescida: são vários os artigos, relatórios e estudos que indicam existir, por vezes, uma distância significativa entre a convicção de boas práticas por parte dos prestadores e o descontentamento dos seus utentes. Existe pois, necessidade de alinhamento entre os serviços que os prestadores oferecem e as preferências dos utentes. Avaliar a qualidade dos cuidados de saúde é importante para tornar visível o que se passa dentro de uma organização, do nível de qualidade em que está a executar, e o que pode ser feito para melhorar o seu desempenho. Este tem sido um desafio que adoptou cada vez maior relevância no âmbito internacional, manifestando-se não só ao nível dos decisores políticos e das administrações, mas também no seio dos profissionais de saúde e dos próprios utentes. Para a avaliação da qualidade clínica existem as normas de orientação clínica, os protocolos, as instruções de trabalho, as auditorias clínicas, os indicadores e os inquéritos de satisfação dos utentes.


Um indicador de qualidade, no sector da saúde, pode ser definido como um parâmetro que mede as variações de um fenómeno, directa ou indirectamente, e que permite a monitorização da qualidade clínica e organizacional dos serviços para a identificação de problemas ou aplicação de melhorias necessárias. A escolha dos indicadores é portanto determinante. Devem ser válidos, ou seja, identificam problemas de qualidade e incidem sobre os resultados ou áreas com impacto sobre os resultados. Fiáveis, são interpretados da mesma maneira por avaliadores diferentes, úteis para a melhoria de qualidade, são adequados para o nível de responsabilidade de quem avalia os resultados e fáceis de implementar. Neste contexto, o Centro Hospitalar Médio Tejo (CHMT) tem vindo a implementar o Sistema de Qualidade com a introdução de Protocolos, instruções de trabalho, procedimentos, assim como a sua monitorização. O controlo da dor é um direito da pessoa, uma exigência ética ao dever dos enfermeiros e um indicador de boa prática. A dor é assim um problema centrado no utente, sensível à prática autónoma de enfermagem e conducente a ganhos em saúde e optimização de custos. Neste sentido a Direcção Geral de Saúde, instituiu a dor como 5º sinal vital, determinando como norma de boa prática que a dor e a sua intensidade sejam sistematicamente valorizadas, diagnosticadas, avaliadas e registadas. Sendo que o sucesso da estratégia terapêutica depende da monitorização regular da dor em todas as suas vertentes (Ordem dos Enfermeiros, 2006). De acordo com o Plano Nacional Controle da Dor (2008, p 5), “O controlo da dor deve, pois, ser encarado como uma prioridade no âmbito da prestação de cuidados de saúde de elevada qualidade, sendo igualmente um factor decisivo para a indispensável humanização dos cuidados de saúde. De facto, o alívio da dor deveria ser assumido como um dos direitos humanos fundamentais (…).” No serviço de Urgência do CHMT foram implementados dois protocolos em 2013 que conjugados podem-se traduzir em indicador de qualidade para o doente que aí recorre. Os protocolos acima referidos são: “Orientação da Triagem do doente Vitima de Monotrauma”, cujo objectivo é diminuir o tempo de espera e de permanência dos utentes no serviço de urgência. Simultaneamente consegue melhorar-se a qualidade dos cuidados, detectando e intervindo precocemente, contribuindo para a segurança do doente, e o Protocolo de “ Actuação Perante o Doente com Dor Moderada”, cujo objectivo é definir o modo de actuação perante os utentes com dor moderada, nos fluxogramas atribuídos aquando da Triagem de Manchester, sejam Cefaleia, Dor lombar e Problemas nos Membros. A intensidade da dor segundo o Grupo Português da Triagem de Manchester pode ser classificada em três níveis, que são respectivamente: dor ligeira, dor moderada e dor severa. No serviço de urgência da unidade de Torres Novas no 2º semestre de 2014 foram triados 3680 doentes em que o discriminador escolhido na triagem foi de Dor moderada. A maioria dos doentes que recorrem ao serviço de urgência, apresentam dor e, mostram-se insatisfeitos com o tempo de permanência no serviço de urgência. Como se pode verificar no Plano Nacional de Saúde 2011-2016 que faz referência aos primeiros dados ainda não publicados do Sistema Sim - cidadão que permitem caracterizar melhor a natureza das reclamações dos utilizadores do SNS, onde se pode


concluir que ainda são os hospitais as instituições que geram maior número de reclamações e o tempo de espera na urgência é a maior causa de insatisfação. Por esse motivo, foi realizada uma pesquisa da eficácia e eficiência da aplicabilidade dos protocolos acima referidos de forma a reduzir o tempo de permanência dos utentes no serviço. Foram auditados 181 episódios de urgência no 2º semestre de 2014, em que deveriam ser aplicados os dois protocolos em simultâneo, ou seja o doente que recorreu ao serviço nas datas referidas, tinha que ter sofrido um Monotrauma, ser triado pelo fluxograma Problema nos Membros e ter sido escolhido o discriminador Dor Moderada, portanto foi-lhe atribuído uma prioridade Urgente (Amarelo), foi-lhe solicitado pelo enfermeiro da Triagem exame complementar de diagnóstico (Raio X), foram realizadas intervenções farmacológicas protocoladas e intervenções autónomas de enfermagem direccionadas. Assim, do total de episódios de urgência auditados verificamos que houve uma % de conformidade na aplicação dos protocolos entre 55% e 77%, nos meses de Dezembro e Julho respectivamente. Houve uma taxa de conformidade de 66% na aplicação dos protocolos (Monotrauma e dor moderada). Antes da existência destes protocolos os utentes eram triados exactamente da mesma forma, com a mesma prioridade e aguardavam a primeira observação médica. Após esta observação o médico requisitava o Raio X e fazia prescrição de analgesia (nesta situação em estudo). Os utentes após a realização do exame complementar de diagnóstico, aguardava nova observação médica, para a tomada de decisão. Verificou-se que 69% destes utentes tiveram alta após a primeira observação médica, aquando aplicados os dois protocolos, e 31% dos utentes não tiveram alta após a primeira observação médica, porque houve necessidade de prestar mais cuidados, nomeadamente tratamento a feridas ou serem transferidos para outra unidade, para observação pela especialidade. Tendo em conta que ainda existem muitas lacunas na demonstração de evidência no que concerne a estratégias para a melhoria de qualidade, é importante apostar nas que são comprovadamente efectivas e ensaiar outras, é necessário definir os indicadores de qualidade em saúde, monitoriza-los e avaliá-los com rigor. A monitorização dos indicadores de qualidade em saúde permite corrigir e definir acções de melhoria, assim como, evidenciar as boas práticas e divulga-las para que sejam implementadas noutras organizações. Com a monitorização da aplicabilidade dos protocolos Monotrauma e Dor Moderada no serviço de urgência da unidade de Torres novas, apesar de ter sido num curto espaço de tempo e sem termo de comparação de semestres anteriores, pode-se concluir que o tempo de permanência do utente a quem foram aplicados os protocolos diminuiu em relação ao tempo de permanência aquando da não existência dos mesmos. De forma a melhorar a qualidade dos cuidados de saúde é importante que os profissionais de saúde na prestação de cuidados apliquem os protocolos existentes de uma forma conjugada e não isolada, conseguindo assim obter resultados de melhoria da qualidade e consequentemente de satisfação para o utente.


CONTROLAR AS IACS: UM DESAFIO POSSÍVEL Lina José Dias Ramos Rodrigues Enfermeira do Núcleo Executivo do Hospital Doutor José Maria Grande do Grupo Coordenador Local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e Resistências aos Antimicrobianos

As Infeções Associadas aos Cuidados de Saúde (IACS) são um problema de âmbito global e constituem um risco acrescido dos utentes que são alvo de prestação cuidados de saúde em hospitais ou qualquer outra instituição prestadora de cuidados de saúde. As IACS são uma causa de significativa de morbilidade, mortalidade, de elevados custos adicionais em saúde e de custos indiretos como o absentismo no trabalho e a qualidade de vida dos utentes e familiares. Como controlar as IACS? Partindo do próprio conceito de infeção associada aos cuidados de saúde, se são os profissionais a causar este evento adverso, a chave reside nas práticas dos prestadores de cuidados – é fundamental que todos os intervenientes na prestação de cuidados assegurem boas práticas nesta área concreta e envolvam os pares, os utentes e as visitas na prestação de cuidados mais seguros. A perseverança e o empenho dos enfermeiros na prevenção e no controlo das IACS podem contribuir de forma determinante para a melhoria dos cuidados prestados no presente e no futuro, reflectindo de modo irrefutável o papel dos enfermeiros. Os atuais cuidados de saúde trouxeram inúmeros benefícios às novas gerações, nomeadamente aumento do tempo de sobrevivência associado a melhor qualidade de vida, no entanto as conquistas obtidas trazem riscos associados como as IACS, que são atualmente as complicações mais frequentes da prestação de cuidados de saúde.


A considerar também é o facto de as IACS não serem presentemente exclusivas do ambiente hospitalar mas alargada a outros locais de prestação de cuidados como centros de saúde ou unidades de cuidados continuados integrados. Reveste-se de especial importância a articulação estreita e a comunicação interinstitucional entre as diferentes unidades de saúde prestadoras de cuidados entre as quais os utentes circulam. Neste âmbito os enfermeiros têm um papel decisivo na sensibilização dos pares e restantes profissionais de saúde, na prevenção, controlo e deteção de infeções que se manifestam após a alta hospitalar. Os enfermeiros desempenham um papel importante no contexto da prevenção e controlo de infeção, sendo que historicamente esta atribuição está implícita nas responsabilidades dos enfermeiros. Florence Nightingale implementou princípios básicos de controlo de infeção como o controlo do meio ambiente, limpeza e desinfeção de materiais e isolamento dos doentes mais críticos. A Ordem dos Enfermeiros comtempla no Regulamento do Perfil de Competências do Enfermeiro de Cuidados Gerais no item das competências a implementação de procedimentos de controlo de infeção por parte destes profissionais de saúde. Reconhecendo que a responsabilidade da prevenção e controlo das IACS é interdisciplinar, individual e coletiva, constata-se que os enfermeiros têm um papel privilegiado nesta área devido ao elevado número de horas de prestação de cuidados diretos. Neste sentido, os enfermeiros encontram-se numa posição singular que lhes permite incluir na sua práxis, as recomendações baseadas nas evidências e prestar cuidados seguros, eficazes e visíveis. Com efeito há uma preocupação crescente em termos de segurança dos cuidados de saúde prestados e da melhoria da qualidade dos mesmos, sendo que a prevenção das IACS é assumida atualmente como um novo imperativo ético e deontológico pelo que é fundamental que todos os profissionais se consciencializem do papel individual que desempenham na sua prevenção. Reconhece-se atualmente que uma parte importante das IACS são seguramente evitáveis. Neste sentido recomenda-se a aplicação de boas práticas, o investimento em estratégias renovadas de eficácia comprovada que sejam dependentes de aspetos controláveis externamente pelos profissionais de saúde. Os programas de prevenção e controlo de infeção devem incluir alguns elementos cruciais como a abordagem multidisciplinar multimodal, a divulgação de recomendações ou guidelines, educação e formação com componentes teóricas e práticas pluridisciplinares, auditorias, vigilância epidemiológica e feedback de retorno aos profissionais e uma cultura organizacional positiva nesta área particular. A redução das IACS exige que sejam delineadas intervenções baseadas na mudança de atitudes com foco numa colaboração estreita, multidisciplinar e multifacetada que comtemplem medidas simples, eficazes e alicerçadas em evidências de que salvam vidas. A implementação da Campanha das Precauções Básicas de Controlo de Infeção sob a égide da Direção Geral de Saúde constitui uma estratégia primária com reconhecida eficácia na diminuição do risco de infeção. As Precauções Básicas de Controlo de Infeção (PBCI) são atividades básicas da prestação de cuidados a colocar em prática em função dos procedimentos a realizar e dos riscos associados, que têm como objetivo a prevenção da transmissão cruzada de IACS. As PBCI têm por base uma abordagem multimodal que engloba 10 componentes considerados essenciais e que se destinam a garantir a segurança dos utentes, profissionais de saúde e restantes intervenientes em contexto de prestação de cuidados, aplicando-se a todos os utentes independentemente de se conhecer a presença ou não de infeção. Outro aspeto a considerar é a introdução de medidas estratégicas para reduzir de forma significativa as IACS, tais como o cumprimento das orientações emanadas através da sua


aplicação na prestação de cuidados, bem como a participação em formações deste âmbito de todos os grupos profissionais. A formação e a educação nesta área devem ser organizadas em torno dos contextos práticos e da resolução de problemas que causam constrangimentos aos profissionais e que lhes dificultam ou impedem a aplicação de boas práticas no seu exercício profissional. A representação de situações concretas, o treino de práticas (técnica de higienização das mãos) ou roll play, são metodologias pedagógicas muito eficazes em contexto de formação que permitem aos profissionais de saúde experienciar, discutir, envolver-se, consolidar e colocar e prática os conhecimentos adquiridos em controlo de infeção. Recomenda-se a integração e/ou reforço na formação de base dos profissionais de saúde de conteúdos programáticos sobre prevenção e controlo de infeção com o propósito de disseminar a filosofia e a prática baseada na prevenção. É fundamental que os alunos recebam noções básicas de modo a facilitar a assimilação dos conceitos e a implementação de procedimentos de boas práticas em contextos de estágio e enquanto futuros profissionais. Esta é uma forma dos alunos reconhecerem precocemente a complexidade das IACS e as suas implicações nos cuidados prestados. A formação a todos os grupos profissionais no período de integração adequada às competências, com carácter regular é imprescindível na dinamização da adesão dos colaboradores às boas práticas como estratégia promotora da prevenção e controlo de infeção. A contratualização de indicadores entre as Administrações Regionais de Saúde e os hospitais no âmbito da prevenção e controlo de IACS já é uma realidade que é utilizada na sensibilização e na responsabilização dos diferentes níveis de gestão. Outra estratégia a considerar, é a implementação de projectos específicos de redução de IACS como o “Stop Infeção Hospitalar!” patrocinado pela Fundação Calouste Gulbenkian que tem como meta a diminuição dos números relacionados com as infeções adquiridas durante a prestação de cuidados de saúde, utilizando incentivos financeiros como estímulo na implementação e organização de estratégias específicas nesta área concreta. Os enfermeiros devem assumir claramente o seu papel e mobilizar as equipas na tomada de consciencialização da responsabilidade individual – a prevenção e o controlo de infeção exige o contributo colectivo ao desafio constante de colocar em prática as precauções básicas de controlo de infeção. Os enfermeiros encontram-se numa posição singular que lhes permite impulsionar e estimular as equipas pluridisciplinares na mudança de atitudes e comportamentos, através da criação de novas sinergias de forma dinâmica, inovadora e com compromisso pessoal em prol da prevenção e controlo da infeção, na medida em que são detentores de competências específicas capazes de influenciar positivamente pares e restantes profissionais. A conquista do desafio requere o envolvimento de cada profissional: reitera-se a responsabilidade partilhada pelos profissionais de saúde – todos devem assumir-se como parceiros, aos diferentes níveis de atuação, e caminhar juntos e partilhar o dever de implementar na práxis diária a prevenção e o controlo das IACS através do garante de cuidados de excelência pautados pelos mais elevados padrões de qualidade.


A GESTÃO INDIVIDUAL DA SAÚDE: PARA QUE HAJA FUTURO Jorge Manuel Ramos Lourenço Marques Enfermeiro Especialista em Enfermagem Médico-cirúrgica Responsável da Unidade de Gestão do Risco da ULSNA, EPE Coordenador de Enfermagem da VMER Portalegre A saúde em Portugal tem um antes e um depois da fundação do Serviço Nacional de Saúde (SNS) de que celebrámos os 35 anos em 2014. Se a evolução das taxas de mortalidade infantil, associadas às estratégias de saúde maternoinfantil, mas também, de forma consistente, com as elevadas taxas de adesão aos planos de vacinação, nos quais a Enfermagem teve, e tem, um papel essencial, são repetidamente referidos como das principais conquistas do SNS, não será de mais referir que a essência que permitiu esses e outros êxitos, esteve na decisão politica de impor a universalidade do acesso independentemente dos rendimentos e condição social de cada cidadão. Referimos estes factos, por não ser displicente a ideia de que o SNS foi criado pensando no cidadão, pelo que nestes tempos conturbados em que a necessidade de tornar o SNS sustentável (ideia da maior importância, mas muitas vezes usada para justificar custos para


o cidadão e menos vezes pela vontade/preocupação de caminhar de forma segura para a sustentabilidade do sistema), a responsabilidade de cada membro da sociedade, enquanto individuo, e não só os profissionais de saúde, nomeadamente os enfermeiros, são peça fundamental na discussão e caminho da sustentabilidade do sistema. Só a promoção dos estilos de vida saudável, de um forte investimento nos cuidados de saúde primários, e do envolvimento de cada cidadão nas decisões sobre a sua própria saúde e na adequação dos cuidados de saúde de que usufrui ao longo da sua vida, permitirão que a saúde e os cuidados de saúde sejam entendidos não só como um direito, mas também como um dever. Neste desiderato, o papel da Enfermagem é não só essencial, como, sem dúvida, aliciante, perspectivando-se o enfermeiro como o perito, não só na prestação directa de cuidados de enfermagem, necessários em momentos específicos e desejavelmente breves no tempo de vida, mas principalmente como o consultor do individuo/família/comunidade nas escolhas que faça para si e para a sua saúde. Se quisermos usar terminologia contemporânea o papel do enfermeiro será o de “coaching” para a saúde, o parceiro no processo de vida do individuo, das famílias e das comunidades, que esclarece sem condicionar, garantindo a decisão informada que permita a cada individuo, família e comunidade ter uma vida saudável (uma vida boa). As estratégias colaborativas que o enfermeiro terá de estabelecer como parceiro neste processo terão obviamente que considerar não só o os indivíduos, famílias e comunidades, mas também o papel do enfermeiro nas equipas de saúde, sendo que consideramos essencial que utilizemos uma linguagem cientifica, mas comum aos outros membros da equipa de saúde, sob pena de toda a planificação e discussão nas equipas de saúde sofrer de entropias e incongruências, com origem em processos de comunicação enviesados e disformes. O uso dos instrumentos e ferramentas disponibilizados pelas tecnologias de informação em saúde, poderão diminuir o risco de falhas de comunicação e facilitarão a sistematização e continuidade dos cuidados, mas não deverão ser o centro do sistema: a passagem de um sistema biomédico que temos vindo a conquistar, não pode ser feita para um sistema tecnocêntrico, pois para além de afastar o indivíduo do centro do sistema gerará custos que farão o sistema falir rapidamente… O papel do enfermeiro, parceiro do individuo, família, comunidade, membro da equipa de saúde, será assim, menos dentro das paredes das instituições de saúde e mais junto das pessoas: os estilos de vida saudáveis, em que os aspectos relacionados com a alimentação saudável e o exercício físico adequado a cada indivíduo no seu ciclo de vida, e, concomitantemente, a diminuição do consumo para níveis residuais de substâncias ou produtos aditivos e de substâncias de abuso, levarão os enfermeiros para junto das pessoas: nas famílias e nas comunidades estará o principal campo de trabalho da Enfermagem no SNS sustentável. Sabemos bem que o que está em causa será principalmente as políticas de saúde, e a organização das equipas de saúde, mas também, aí, cada um dos enfermeiros, as escolas, as associações profissionais, os sindicatos e a Ordem, não quererão certamente ser meros espectadores…o futuro dirá. Apesar de todo o investimento nos estilos de vida saudável e na promoção da saúde, pedra de toque da sustentabilidade do SNS, como já referimos, a prestação de cuidados de Enfermagem ao individuo em situação critica, que seja por processo de doença, aguda ou cronica, quer seja por acidente, exigirá equipas de saúde muito diferenciadas. Os enfermeiros terão de ser altamente qualificados, mas altamente competentes também: qualificação e competência terão que estar de forma equilibrada presentes no perfil dos enfermeiros, sendo que a valorização da especialização e o reconhecimento da sua importância nas instituições de saúde, mas também na comunidade, têm de ser


conquistadas e garantidas, quer na prestação de cuidados, quer como garante da Segurança do doente, adoptando estratégias que diminuam o risco clinico associado á prestações cuidados de saúde. Nesta área também o indivíduo, família e comunidade devem ser envolvidos e chamados a participar, sendo que o papel do enfermeiro terá de ser muito diverso: a preparação e apoio de cuidadores informais, a promoção do autocuidado, o estímulo e promoção de cuidados de emergência pela população em geral (nomeadamente no que respeita ao suporte básico de vida, participando na disseminação do conhecimento conforme as mais recentes orientações internacionais), garantindo que cada cidadão possa também se necessário ser um cuidador. Os enfermeiros estão, e terão de continuar, muito próximos das pessoas, e as pessoas são o seu principal foco. A sustentabilidade do SNS deve ser uma preocupação sempre presente em cada enfermeiro, devendo cada um nós como parceiro do individuo, família e comunidade, ser o gestor dos processos que permitam o SNS sobreviver e o individuo ter uma vida boa e auto determinada: mais que um prestador de cuidados, o enfermeiro deverá ser o parceiro, competente e qualificado em que se confia, e garante a segurança no que aos cuidados de saúde respeita.

É SÓ UMA QUESTÃO DE ARITMÉTICA


Artur Manuel Caretas Lopes Enfermeiro Chefe, Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica Serviço de Urgência da Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano Quando, na década de 70, o Dr. António Arnaut começou a idealizar aquilo que viria a ser o Sistema Nacional de Saúde, estaria longe de imaginar que iria gerar um dos melhores sistemas de saúde do mundo. Portugal vivia os primeiros anos de uma democracia arrancada a ferros de 48 anos de ditadura implacável. Os portugueses sonhavam com um mundo diferente daquele que conheciam há décadas. Os políticos eram os heróis da altura. Depois do primeiro impacto para da instauração da democracia, levado a cabo pelos militares, chegaram os políticos, aqueles que tinham lutado por ideais socias e económicos fundados no pensamento democrático e na sociedade pluralista. Eram pessoas com ideais e convicções sérias, algumas tinham sentido no corpo as consequências de pensar e falar na democracia, na igualdade e no direito à livre expressão. Foi elaborada uma constituição que se desvinculava da, até aí, existente. A nova constituição fundamentava os pilares de uma sociedade democrática. Igualde de acesso à educação, ao emprego e à saúde para todos os portugueses. À sociedade portuguesa não bastava ter uma nova constituição era necessário operacionalizá-la. Os políticos trataram de fazer essa operacionalização. Sim…os políticos. Nessa altura ainda se podia acreditar naqueles que alguns anos mais tarde se viriam a manifestar inúteis. António Arnaut, em 1978, ocupava o cargo de Ministro dos Assuntos Sociais no II Governo Constitucional, liderado por Mário Soares. A alteração do sistema de saúde era um imperativo ético e de justiça e, ao mesmo tempo, uma imposição jurídicoconstitucional. O povo esperava ansiosamente pela mudança apregoada. A maioria dos profissionais de saúde e das camas hospitalares diferenciadas estavam no litoral. O interior pouco ou nada tinha. Eram as misericórdias que, com recursos pouco diferenciados, de forma muito deficitária, garantiam os pobres cuidados às pobres populações. Apesar de a democracia já ter cerca de 4 anos pouco tinha mudado até aí. Quem era pobre sujeitava-se ao que havia. Quem tinha posses conseguia aceder a melhores cuidados de saúde nos hospitais do litoral. Não era essa a resposta que os portugueses, principalmente aqueles sem posses esperavam. Era preciso mudar as coisas. António Arnaut idealizou um sistema de saúde universal e gratuito que, conforme a constituição, se aplicava a todos sem exceção, independentemente das posses económicas.


Em entrevistas António Arnaut expressa que cedo começou a oposição ao sistema que tinha sido criado. Não podemos esquecer que o II Governo Constitucional tinha na sua constituição membros do CDS, força política alinhada à direita e, obviamente, já na altura, com interesses privados também para a saúde. A verdadeira oposição viria da classe médica. Este Sistema Nacional de Saúde colocava o cidadão no centro do processo e não o médico. Os médicos, sem que lhe tivesse sido retirada a importância que mereciam, saíram do centro do sistema para uma posição de fornecedores de cuidados o que não agradou pois era entendido como uma perda de importância social. Felizmente o Sistema Nacional de Saúde deu frutos. A mortalidade infantil diminuiu para números idênticos aos dos países mais desenvolvidos, a esperança média de vida aumentou, a tuberculose recuou a taxa de vacinação aumentou substancialmente. A grande aposta do SNS foi nos cuidados de saúde primários com criação de centros de saúde em todos os concelhos. Privilegiaram-se programas de saúde escolar, de vacinação, de acompanhamento de mulheres grávidas. O aumento da alfabetização e da instrução escolar dos portugueses ajudou à compreensão das populações para a necessidade de implementar estilos de vida saudáveis o que, a par com um mais fácil acesso aos cuidados de saúde, fez com que fosse visível, para os portugueses, que valeu a pena o novo SNS. As vozes de oposição ao SNS tiveram, na altura, pouco eco. E porquê? Porque os homens políticos que estavam no poder ainda continuavam fiéis às suas ideias e ao povo que os elegeu. Não demoraria muito tempo até que os políticos se deixassem de convicções e começassem a ver na política um futuro pessoal para si e para os seus. Primeiro com alguns arrufos sociais e agora de forma completamente despudorada. O acesso de todos os portugueses aos cuidados de saúde de forma gratuita começou a trazer dificuldades de sustentação económica do sistema. Se por um lado a população portuguesa começou a envelhecer e, por isso, a necessitar de mais cuidados de saúde, por outro lado a evolução tecnológica e a necessidade de dotar os hospitais e as unidades de saúde de recursos humanos e técnicos com a diferenciação desejável fez com que o sistema nacional de saúde, gratuito, começasse, logo na década de 80, a dar os primeiros sinais de fraqueza em termos de sustentabilidade económica. Cedo se verificou ser necessário repensar o SNS. Não era a ideia da universalidade que estava gasta mas sim a da gratuitidade. “Inventou-se” a ideia de um sistema de saúde tendencialmente gratuito o que, em minha opinião baralhou tudo. “Nem sim nem sopas”. Dá para tudo e de tal forma que a porta se abriu os grupos económicos privados que já tinham “batido” várias vezes mas sempre lhe tinha sido negada a entrada. De um ápice um dos


melhores sistemas nacionais de saúde do mundo ficou infestado pelo poder dos grupos privados. A promiscuidade entre o interesse privado e público que tanto se tentava debelar ficou ingovernável e deu no que se vê. Um sistema deixou de ser gratuito, e com uma oferta desequilibrada entre o litoral e o interior o que, a par com a deterioração social dos últimos anos, deitou a baixo a possibilidade dos mais carenciados acederem a todos os níveis de cuidados. Os técnicos de saúde, principalmente os médicos, começaram um êxodo para os grandes centros, contrariando o que o sistema de nacional de saúde pensado por Arnaut tinha conseguido que foi o incentivo para os médicos se fixarem no interior. Os grupos privados à espreita, há muito, começaram, face à ineficiência do estado para resolver as questões da procura de cuidados de saúde, a oferecer os seus préstimos e, de tal forma tem sido a oferta, que neste momento não se sabe muito bem quem manda no quê. Sabe-se que é preciso repensar o SNS mas não dá jeito. Está muito bem assim. Os políticos não o dizem mas escondem a cabeça na areia. A situação atual é outro cenário que António Arnaut não imaginaria há 35 anos. Ele não imaginaria que, por via do vazio mental dos políticos para com as questões sociais dos portugueses, o sistema nacional de saúde que tantos frutos deixou caísse em desgraça e deixasse os portugueses outra vez numa situação quase idêntica à existente há 4 décadas atrás em que só aqueles que podiam tinham acesso aos melhores cuidados de saúde. Sim porque hoje quem recorra a uma urgência de um hospital entre taxas moderadoras paga tanto como ir a um privado e nalguns casos mais. De facto o tal repensamento do SNS não aconteceu, apenas se “escancararam a portas” para permitir a entrada da iniciativa privada na saúde o que não trouxe nada de novo. É minha opinião que não faz qualquer sentido repensar o sistema nacional de saúde com os mesmos atores de há 35 anos. O país mudou, a sociedade alterou-se, os portugueses atingiram, apesar de tudo, níveis de literacia e de educação inegáveis. Aquilo que se entende por estado também se modificou. No nosso caso piorou pois temos um estado inerte em que a instituições funcionam mal, são lentas, pesarosas e ineficazes. As instituições privadas já conseguiram provar que também sabem fazer coisas e conseguem-no fazer de forma mais eficaz. É preciso repensar o futuro do Sistema Nacional de Saúde contando com todo o capital existente seja ele privado ou público. Mas com regras. Regras claras, justas e consertadas e ao mesmo tempo flexíveis de forma a adaptarem-se aos vários contextos sociais e económicos dos portugueses. É preciso um Sistema Nacional de Saúde que comtemple como ator o poder local pois é ele que conhece a realidade social das comunidades e, pelo facto de exercer um poder de


proximidade, consegue uma representação dos reais interesses das populações. Esta ideia, não sendo nova, é, em minha opinião, basilar num sistema nacional de saúde. As autarquias são quem está mais vocacionado, enquanto interlocutor das populações, para ter um papel fundamental no planeamento, definição e monitorização daquilo que, em matéria de cuidados de saúde, os seus munícipes precisam. Apostar, como há 35 anos, na prevenção através do incentivo aos estilos de vida saudáveis. Aproveitar o potencial existente nos enfermeiros que, nas últimas 2 décadas, se muniram de competências estruturais e técnicas que os tornam uma força de elite dentro de qualquer sistema de saúde. O nosso caso é paradigmático. Quando, há 35 anos, o SNS foi criado, os Enfermeiros eram escassos e meros assistentes do médico, desprovidos de qualquer autonomia técnica e científica. Hoje, reconhecidamente, os enfermeiros são autónomos nas decisões que tomam e conquistaram um espaço próprio que, deixem-me dizer, algumas vezes receio que possamos perder se continuarmos a adotar instrumentos que comprovadamente nos deixam a falar sozinhos. Mas isto é assunto para outra conversa… Acima de tudo, a reforma do SNS tem de passar por continuar a fazer sentir nos portugueses que a proteção na saúde continua a ser um direito fundamental das populações independentemente de o fornecedor ser público ou privado. A promiscuidade entre o público e o privado só acontece quando as regras não são claras ou não estão estabelecidas. Não é preciso inventar um novo sistema de saúde. Basta repor o que de melhor tinha o SNS quando, há 35 anos, foi pensado, somando-lhe o potencial que existe em termos de recursos humanos para a saúde e subtraindo-lhe a inércia a incompetência e a maleficência da maior parte daqueles que, abraçando essa nova profissão de político português, teimam em continuar a destruir o que de melhor a democracia conquistou para os portugueses. É só uma questão de aritmética!

GESTÃO POR COMPETÊNCIAS Maria José Bule Professora Adjunta – Universidade de Évora – Escola Superior de Enfermagem de S. João de Deus (UÉ-ESESJD) Doutoranda em Ciências da Educação –UÉ


Mestre em sociologia – UÉ Especialista em Enfermagem de Reabilitação Pensar o futuro do SNS é um desafio para o qual não se deve partir sem considerarmos os indicadores relativos às tendências da população e da economia. Partimos assim para as questões relacionadas com o envelhecimento, com a doença crónica e com a maior sobrevida de doentes vítimas de acidentes, que retornam para a comunidade mantendo necessidades de cuidados de saúde. No pilar da economia registam-se os aspetos dos custos com a saúde, dos ganhos em saúde e da eficácia dos cuidados. O cenário é por isso complexo, denso e, sobretudo muito imprevisível. Os acontecimentos de 2014 reforçam o impacto da variável imprevisibilidade com os acontecimentos que esgotaram a capacidade de resposta às necessidades de cuidados das populações. Este retrato do futuro foi descrito com traços demasiado gerais ao ponto de o considerarmos um esboço inicial ou a paisagem que envolve um elemento que propositadamente colocamos no centro: Os enfermeiros. A atualidade caracteriza-se por mudanças sociais e organizacionais intensas que colocam a profissão num estatuto de obra inacabada. Esta perceção decorre do impacto que os Decretos-lei número 247 e 248 de 22 de setembro de 2009 que regulamentam a carreira e a carreira especial de enfermagem, têm na dotação de enfermeiros nos serviços de saúde, e na relação que esta dotação deveria ter com os títulos atribuídos pela Ordem, resultantes da qualificação profissional. Em concreto, o título de enfermeiros especialistas. Esta consideração reforça a crença de que no futuro os enfermeiros enfrentarão o desafio de gerirem as respostas em cuidados de saúde a partir das competências que possuem ou de que dispõem na organização. A categoria de enfermeiro tenderá para um grupo muito heterogéneo de profissionais com capacidade para cuidados especializados em diferentes áreas. Esta primeira ideia de que no futuro os enfermeiros serão capazes de gerir as necessidades de cuidados a partir das competências instaladas e não essencialmente pela racionalidade do número de horas de cuidados necessárias vs número de enfermeiros merece ser enquadrada no esboço inicialmente tecido a partir dos pilares população e economia. Envelhecer com ou sem doença crónica, ter maior ou menor literacia em saúde, viver em solidão ou com companhia são determinantes vulgares aos quais se atribuem diferentes necessidades e diferentes funcionalidades. Estas condições só por si fazem-nos antever conjuntos de necessidades de cuidados diferentes e também nos trazem a convicção de que não seremos todos igualmente competentes para responder a essas necessidades ou seja, especialistas em diferentes áreas darão respostas mais eficazes ou serão melhores gestores dos processos de cuidados. Com o intuito de reforçar a ideia aludimos ao momento da morte para considerar que se ao longo do processo de envelhecimento foram mais eficazes o enfermeiro especialista em saúde comunitária que erigiu a sua atuação no sentido da adoção de estilos de vida saudável, o enfermeiro especialista em enfermagem de reabilitação após o AVC, o fim da vida deve deixar lugar á intervenção do enfermeiro especialista em cuidados paliativos. Em prol da sustentabilidade do SNS no futuro acreditamos que os enfermeiros farão a gestão das equipas a partir das competências instaladas ou pretendidas, no sentido das melhores respostas. No cruzamento desta ideia com o segundo elemento do esboço encontramos o pilar da economia e dele escolhemos custos e ganhos em saúde e a eficácia dos cuidados. Os estudos disponíveis comprovam as dificuldades em controlar estes elementos e é graças a eles que se descreve a não sustentabilidade do SNS no futuro. Estamos certos de que há custos com a saúde que são incontornáveis e que muito provavelmente evoluirão a ritmos diferentes dos da inflação ou mesmo da recuperação da economia. Os estudos mais


recentes indiciam que em Portugal os custos atribuídos á saúde estão fortemente associados aos avanços tecnológicos os quais são introduzidos no SNS sem efetivo controlo da relação custo vs benefício. A eficácia dos cuidados e os ganhos em saúde devem ser considerados numa perspetiva que não seja meramente económica. Para os enfermeiros os indicadores de qualidade de vida, funcionalidade, perceção de saúde, controle de sintomas servem para demonstrar a eficácia dos cuidados e comprovam ganhos em saúde. Na miríade de fatores que concorrem para a aferição dos ganhos em saúde os mais mediáticos continuam a ser o número de internamentos, os episódios de agudização das doenças crónicas, a demora média em internamento, entre outros e a ideia concorre para que também outros dados sejam considerados em paridade com os que atualmente são difundidos. Gerir os cuidados de enfermagem e as equipas pelas competências permite que a cada contexto de cuidados seja dada a melhor resposta em cuidados de enfermagem e desta forma os enfermeiros no SNS responderem positivamente aos conceitos de ganhos em saúde e eficácia dos cuidados. Parecendo uma ideia simples porque se expressa em duas palavras: gerir por competências, ela encerra inúmeros desafios relacionados com as condições necessárias ao seu desenvolvimento. Emerge a necessidade dos enfermeiros utilizarem na sua prática instrumentos válidos para registo de dados. Estes instrumentos devem ter indicadores que documentem resultados sensíveis aos cuidados de enfermagem. Estamos convictos de que estes instrumentos devem ter uma linguagem universal mas também partilhada e dominada pelos diferentes grupos profissionais e pela comunidade científica. O sistema de registo dos dados deve assegurar para além da simplicidade no processo, a importação e exportação de informação entre pares como forma de consultadoria. Outro elemento central à gestão por competências é a investigação e a prática baseada na evidência. Olhamos para a investigação e para a prática baseada na evidência segundo duas perspetivas, a primeira e talvez a mais difundida é a que tem maior impacto na relação custo/eficácia. É imperioso que cada vez mais os enfermeiros portugueses estejam capacitados para integrarem grupos de investigação nacionais e internacionais e comunidades científicas no sentido do desenvolvimento da enfermagem. O SNS vai requerer que cada vez mais os cuidados que oferece sejam comprovadamente os mais adequados e os que demonstrem eficácia. O sistema não pode oferecer recursos baseados em práticas tradicionais ou em crenças individuais de que determinado recurso é o mais adequado. Repetimos a menção aos estudos que revelam o impacto económico da tecnologia na saúde e a falta de estudos que comprovem a eficácia desta introdução. Esta é uma ameaça em particular para os cuidados de enfermagem pois em algumas áreas a investigação que relaciona diagnósticos, cuidados e resultados é ainda bastante incipiente ao contrário do que acontece por exemplo com as feridas. Uma outra perspetiva de olhar para a prática baseada na evidência é a da sua utilização. Comunidades científicas divulgam resultados de investigação e organizações mundiais aprovam guidelines que recomendam como boas práticas mas, a sua transposição para as práticas de enfermagem é ainda muito pouco expressiva. Encontramos contextos onde os cuidados seguem uma cultura local de práticas sem que haja adoção das recomendações ou das evidências. Ilustramos esta perspetiva com o impacto percebido nas práticas relacionadas com a incontinência em confronto com as guidelines difundidas em diferentes línguas. Em síntese os enfermeiros enfrentarão o desafio do futuro do SNS demonstrando a sua capacidade para responder com excelência às necessidades de cuidados das populações, através de um modelo de atuação que tem por base as suas competências. Adequarão a cada contexto as melhores respostas, serão capazes de propor e fundamentar recursos necessários usando para tal indicadores que demonstram ganhos em saúde e eficácia das


suas práticas. Serão igualmente capazes de incrementar práticas de evidência científica e ganharão destaque internacional à medida que passam de utilizadores para produtores de conhecimentos e integram comunidades e projetos de investigação. Importa referir que este modelo pressupõe não só a qualificação profissional mas também a qualificação académica necessária para o reconhecimento nacional e internacional. Finalizamos com o espectro da economia pois tal como se disse, há custos em saúde que são incontornáveis logo os enfermeiros têm pela frente um percurso de reconhecimento científico que forçosamente será académico, necessário para concorrer a projetos e desta forma poderem obter financiamento que torne possível o desenvolvimento da enfermagem.


SNS – REANIMAÇÃO PELO CONTROLO DE DESPERDÍCIO URGE Manuel Filipe Rodrigues Pedreira Enfermeiro Especialista em Enfermagem Médico- Cirúrgica Pós Graduado em Gestão Hospitalar e Serviços de Saúde O Serviço Nacional de Saúde (SNS) é um dos três sistemas coexistentes que compõem o Sistema de Saúde em Portugal, sendo que os restantes dois são os regimes de seguro social de saúde especiais de determinadas profissões, também entendidos de subsistemas de saúde, e os seguros de saúde privados. Sabendo que o SNS deve oferecer uma cobertura universal a toda a população portuguesa e aos estrangeiros e apátridas que não residam legalmente no país mas que façam prova de que se encontram em Portugal há mais de noventa dias, mesmo que sem capacidade contributiva para (co)custear os cuidados de saúde a que foram acometidos. Sabendo que é também facto que a este (SNS) recorrem aqueles que (já) não podem pagar e os que não têm os cuidados de que necessitam contemplados nos sistemas por si contratualizados (seguros). Não esquecendo que Portugal está perante uma população envelhecida e com múltiplas patologias, as quais carecem de maiores e melhores cuidados médicos, bem como estamos perante um êxodo muito relevante de população jovem, a qual vem agravar a situação por deixar de ser contributiva, facilmente percebemos que o SNS está a asfixiar e necessita que se olhe para ele de forma estruturada, que se faça um correcto, profundo e apartidarista diagnóstico de situação para posteriormente melhor decidir sobre qual a melhor forma de o revitalizar. Aqui e antes de mais é importante que o Estado Português redefina as suas políticas actuais, objectivamente, no que ao SNS concerne, é vital de se defina qual o papel do Estado Português – Intervencionista ou regulador?, a fim de poder-se (dever-se) criar legislação orientada para as reais necessidades dos beneficiários do SNS, sendo que esta deve ser prática e resolutiva. Atendendo ao facto de sistema de saúde português, maioritariamente constituído pelo SNS, ter mundialmente provas dadas e reconhecidas da sua qualidade e eficácia, é inconcebível não optar por reanimar o mesmo. É sabido que estamos perante um SNS que caminha a passos largos para a sua insustentabilidade, pese embora não se considere que este tenha que ser financeiramente autossustentável, dada a conjuntura atual. Temos então que apostar na optimização da eficiência do SNS, mas não a qualquer preço, dado que se tem de ter uma perspectiva também de longo prazo. Tal terá de passar, como já referido, por alterações nas políticas e


leis existentes, bem como pela necessidade de apostar num modelo de gestão adaptado a era do conhecimento, empreendedor, com atenção verdadeiramente centrada no utente. Uma das formas mais rápidas de potenciar a eficiência do SNS, sem prejuízo da qualidade será naturalmente atender ao controlo do desperdício. Para tal o modelo de contratualização do financiamento deve ser repensado, o actual não é sustentável como facilmente se percebe pelo permanente crescimento da dívida no SNS, nem é aceitável nos dias de hoje. Não deve caber aos hospitais definir os seus objectivos mas sim às administrações regionais de saúde (ARS) baseadas nas melhores práticas, nas necessidades das populações abrangidas e nas reais ofertas dos hospitais, dado que não deve um hospital ser financiado por exemplo como se de central se tratasse, quando na realidade o não é por inexistência constante/pontual de valências e/ou quando estas existam estas não sirvam as reais necessidades. Deve estar presente uma orçamentação orientada para o (real) desempenho e para a qualidade. Uma nota para a necessidade de responsabilizar economicamente os restantes sistemas que compõem o sistema de saúde português quando “drenam” para o SNS os utentes que a eles recorreram e que apresentaram complicações não resolúveis naqueles (infecções associadas a cuidados de saúde, cuidados em fim de vida mesmo que em ambiente de cuidados intensivos, entre outros). Aqui entendemos a cobrança deficitária como um desperdício. O modelo de gestão, como já referido deve ser adaptado à era do conhecimento, mais horizontalizado de que o tradicional, voltado para o empreendedorismo, onde devemos observar uma liderança de execução. Deve-se estimular a inovação bem como se deve dar relevância à gestão do conhecimento, com busca constante de actualização e inovação orientada para os resultados (medicina baseada na evidência), com visão de médio a longo prazo, em que este conhecimento não deve ser centralizado numa pessoa (acabar com as “quintinhas” e o “senhorio” dentro de departamentos dos hospitais), deve-se gerir com atenção realmente centrada no utente, sem esquecer a satisfação de todos os colaboradores bem como dos demais operadores. Deixa-se nota para a necessidade de avaliar a eficiência dos modelos de gestão implementados e alterar os mesmos, ou seus agentes, sempre que se comprove a sua ineficiência. Daqui surge a questão de devermos ter administrações hospitalares apartidárias, com possibilidade de planear e executar acções sem estarem dependentes dos calendários eleitorais, mas também sujeitas a avaliações objectivas e uniformizadas e consequente responsabilização ou reconhecimento. É de suma importância que exista um sistema de informação uniformizado, que permita partilha de informação entre os mais diversos recursos que compõem o sistema de saúde, mais objectivamente o SNS, o que possibilitaria a consulta da história clínica completa de um determinado utente, com eventual melhor controlo dos exames de diagnósticos pedidos, logo evitando duplicação de exames. Também poderia possibilitar a consulta de prescrição terapêutica médica, o que permitiria reduzir a duplicação de prescrição/toma de medicação com todo o impacto já conhecido no que concerne à polimedicação. Não menos importante, com a uniformização dos sistemas de informação, logo de registos por parte dos agentes, seria optimizada a possibilidade de realização de comparações entre instituições e/ou serviços com maior rigor, tal iria permitir benchmarking e consequentemente adoptação das melhores práticas, bem como o fim da especulação e venda de sistemas de informação que acabam por não se mostrar efectivos para as necessidades globais do SNS, apenas servindo, nem sempre da melhor forma a organização onde existem. Releva-se a importância da fidelização do capital humano mediante mecanismos de reconhecimento e de recompensa, não necessariamente pecuniária, devidamente disseminados pela organização. Um colaborador motivado e que se sente valorizado é indubitavelmente mais eficiente daquele que não se encontra motivado. Cabe aqui salientar-


se o impacto negativo, quer para os pares, quer para a própria instituição, do recurso reiterado a empresas de fornecimento de prestadores de cuidados. Sabe-se que eventualmente se consegue alocar um colaborador através de tais empresas a um custo menor (nem sempre), contudo também se sabe que este colaborador produz menos e de menor qualidade do que aquele que se encontra fidelizado a uma instituição com um modelo de gestão como o supra apresentado, quanto mais não seja por não conhecerem os fluxos de trabalho, os sistemas de informação existentes, entre outros demais exemplos que aqui poderíamos enunciar. Importa ter uma atenção especial para a promiscuidade que ainda se verifica entre os hospitais do SNS e os dos demais sistemas de saúde, muito fruto dos agentes de uns também serem agentes de outros. Caberia aqui novamente ao Estado regular para impossibilitar esta situação, mediante o fazer cumprir o já legislado sobre o subentendimento de certa exclusividade dos agentes do Estado. Aqui deixamos nota da incompreensão pelo facto de ainda se verificar que algumas classes profissionais mantêm contratos de exclusividade, com incremento remuneratório por tal, quando legislação o obriga, logo não deveriam ser alvo de diferenciação entre os próprios pares e também não deveriam agentes de uma classe serem tratados de forma diferente de outros, o que pode levar a descontentamento e consequentemente eventual perda de produtividade dos agentes descontentes. Julgamos que os salários dos agentes dos hospitais do SNS, assim como dos restantes hospitais/instituições de saúde deveriam ser revistos e equiparados, com cumprimento do legislado no que à remuneração concerne. Em forma de finalização referir que culturalmente estamos voltados para uma medicina curativa quando, como a evidência o demonstra, se nos orientarmos para uma medicina preventiva conseguiremos viver mais anos com vida saudável, o que indubitavelmente traria associado um menor custo económico, logo maior capacitação de sustentabilidade do SNS e consequente menor desperdício na saúde.


O FUTURO DO SNS NA ÁREA DA CIRURGIA Rute Isabel Pires Enfermeira Especialista em Enfermagem Médico-Cirúrgica a exercer funções no Serviço de Cirurgia Geral do Hospital do Espírito Santo de Évora, E.P.E. Mestre em Intervenção Sócio-Organizacional na Saúde com Especialização em Políticas de Administração e Gestão de Serviços de Saúde Ao longo dos últimos 35 anos, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) permitiu, de uma forma geral, o acesso de todos os cidadãos a cuidados de saúde, para todas as patologias, independentemente da sua condição económica e social. No entanto, não passou à margem da crise económica e financeira que afetou o país nos últimos anos, bem pelo contrário, a evolução recente do SNS é sobreponível à da restante economia portuguesa. Há uns anos atrás, a situação financeira do SNS era de tal forma deficitária e as dívidas acumuladas de tal forma elevadas, que os fornecedores ameaçavam suspender os fornecimentos, pondo em causa o funcionamento e a sua própria existência e continuidade. Contudo, o balanço dos 35 anos do SNS é claramente positivo. Na verdade, os indicadores de saúde mostram que, na sua globalidade, o SNS teve êxito: a taxa de mortalidade infantil diminuiu drasticamente, a taxa de mortalidade materna também, e a esperança média de vida à nascença aumentou expressivamente. Na área da cirurgia, por exemplo, que é onde trabalho, as listas de espera têm sofrido uma significativa evolução positiva, muito embora devido à forte pressão popular e à influência da comunicação social que tem obrigado os governos a adotarem medidas organizativas e de gestão.


A existência de listas de espera é um dos aspetos mais controversos no funcionamento de um sistema, na medida em que constitui, do ponto de vista económico, um mecanismo de racionamento da procura alternativo ao preço. Neste sentido, está em curso desde 2004 o Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), que tem como principal objetivo minimizar o período entre o momento em que o utente é encaminhado para a cirurgia e a realização da mesma garantindo, deste modo, e de uma forma progressiva, que o tratamento cirúrgico decorre dentro do tempo clinicamente admissível, em função da respetiva patologia. Este é um sistema que visa garantir a todos os utentes do SNS a igualdade/equidade no acesso ao tratamento cirúrgico, programado em tempos máximos estabelecidos para todas as patologias, servindo-se de instrumentos de avaliação e controlo da atividade cirúrgica realizada a nível nacional para rentabilizar a capacidade instalada do SNS, aumentando, consequentemente, a sua eficiência. Para além do SIGIC temos atualmente a Cirurgia de Ambulatório, que é um tipo de intervenção que permite ao utente regressar a casa no mesmo dia em que é operado, com toda a segurança e sem se afastar muito tempo do seu ambiente familiar podendo, no entanto, em algumas situações, ser necessário pernoitar na unidade de internamento, para uma recuperação mais completa. Neste tipo de cirurgia, a ligação do cirurgião ao utente é mais curta mas mais intensa, na medida em que o pouco tempo de permanência no hospital é inversamente proporcional à preocupação que se tem de ter com o pósoperatório imediato, já fora do controlo da equipa que o operou. A curta permanência dos utentes implica uma estrutura montada que minimize as falhas, mas que custa dinheiro e consome recursos humanos e onde, o Enfermeiro desempenha um papel fundamental. Os utentes têm de ser estudados cuidadosamente antes da intervenção, e a alta tem de ser dada muito criteriosamente, pelo cirurgião e pelo anestesista, antecipando complicações longe do seu alcance. No entanto, a vertente económica, tão importante que foi no seu estabelecimento (evitando o pagamento da diária de internamento), continua a constituir um problema para os prestadores, neste caso para o SNS, já que cada intervenção é paga a cerca de um terço do valor gerado pelo internamento, por muito curto que seja, o que faz com que a cirurgia de ambulatório só seja rentável se feita em grande quantidade e sem complicações. Ora apenas algumas patologias podem e devem ser propostas para a realização de cirurgia em regime de ambulatório (i.e. varizes, hérnias e cataratas), embora algumas patologias mais complexas também já o sejam. É evidente que se podem realizar com segurança algumas intervenções cirúrgicas em regime ambulatório em utentes previamente selecionados, mas a meu ver, isto


torna-se particularmente relevante quando há pouco pessoal qualificado disponível, sobretudo enfermeiros, e um número limitado de outros recursos (humanos e materiais), que dificultam a realização de cirurgias pela via convencional, as quais não podem ser realizadas em ambulatório. É evidente que a cirurgia de ambulatório permite aumentar a percentagem de utentes operados, conduzindo a uma redução da lista de espera, mas só de algumas patologias, o que não reflete a real necessidade de intervenção por parte da população em geral. Não me parece ético aumentar a cirurgia em ambulatório simplesmente em busca de números e percentagens em prol de outros que necessitam ser operados em cirurgia convencional, deixando-os à espera, quando muitas das vezes a sua patologia é mais prioritária. E ainda por cima, ignorando os custos indiretos e induzidos disso, com reflexo na economia nacional da saúde. Para além disso, é frequente observar que muitas dessas cirurgias são realizadas por profissionais menos experientes, dum modo geral mais lentos ou com maior rapidez, resultando em menor número de utentes operados ou em maior número de complicações no pós-operatório. Outras vezes, porém, são realizadas por profissionais mais experientes, que abandonaram definitivamente a via convencional em prol de outros, com menos experiência. São indiscutíveis as vantagens do SIGIC e da Cirurgia de Ambulatório, desde que realizados nas condições adequadas, no entanto, não devem constituir o único objetivo/fim dos hospitais ou do governo, uma vez que a meu ver não constituem a solução para o sistema de saúde do país e não vão salvar, por si só, o SNS. Aliás, antes da sua implementação e desenvolvimento, deveriam ter sido criadas as condições necessárias para o seu funcionamento, nomeadamente, número de salas suficientes, adequado número de Enfermeiros nos serviços de apoio, os quais viram e muito o seu trabalho duplicar com consequente redução da qualidade dos cuidados prestados. Como é que os governantes podem, atualmente, colocar a tónica na qualidade e segurança dos cuidados prestados e duplicar o número de utentes admitidos por turno/por Enfermeiro nas tardes de SIGIC? Para terminar, gostaria de deixar uma pequena reflexão relativamente ao atual sistema de financiamento muito assente no doente e pouco na cura. É preciso não nos esquecermos que se não houver doentes, as pessoas têm mais qualidade de vida e o SNS tem menos custos. Penso que no futuro seria importante passar a financiar a promoção de estilos de vida saudáveis e a prevenção da doença e complicações em vez de financiar tanto o número de cirurgias e consultas realizadas. Por exemplo, no caso de utentes com obesidade não será mais benéfico apostar no ensino e na educação para uma alimentação saudável do que incentivá-los/reencaminhá-los para o Programa de Tratamento Cirúrgico da Obesidade?


Isto torna-se particularmente importante no atual contexto de envelhecimento da população, das doenças crónicas que daí decorrem e dos custos associados às mesmas. Os centros de saúde devem procurar assumir, ainda mais, um papel proeminente na promoção do bem-estar e na prevenção das doenças, sendo a porta de entrada do SNS. Frequentemente, isso não acontece muito por culpa da reorganização da rede com o encerramento de muitos centros, sobretudo no interior, onde as urgências se tornaram a “porta de salvação mais próxima”. Em suma, o futuro do SNS vai depender muito da ação das autoridades de saúde portuguesas e dos governantes, mas também, do compromisso social que as suas medidas venham a alcançar, o que só será possível com a motivação e participação de todos.


PREVENÇÃO E CONTROLO DA INFECÇÃO ASSOCIADA AOS CUIDADOS DE SAÚDE: A HIGIENIZAÇÃO DAS MÃOS Sandra de Jesus Lopes Araújo Enfermeira Especialista Médico-Cirúrgica Unidade Cuidados Intensivos Polivalente, Hospital do Espírito Santo, EPE.

A infeção associada aos cuidados de saúde (IACS) constitui uma das maiores preocupações atualmente em saúde pública e, consequentemente, da segurança do doente e qualidade em saúde. Neste contexto, pretende-se refletir sobre a importância da higienização das mãos enquanto medida preventiva na transmissão da infeção cruzada e a sua adesão por parte dos profissionais de saúde. De acordo com a Recomendação do Conselho da Comissão das Comunidades Europeias (2009), “uma segurança dos doentes insuficiente constitui um grave problema de saúde pública e representa um pesado ónus económico para recursos de saúde limitados”, pelo que “parte dos acontecimentos adversos é passível de prevenção”, defendendo-se a criação de “soluções e intervenções eficazes. A segurança dos doentes deve fazer parte integrante da educação e formação dos trabalhadores do sector da saúde, na sua qualidade de prestadores de cuidados”. Torna-se, então, necessária a criação de uma política de qualidade de cuidados, por forma a prevenir, tanto quanto possível, o aparecimento de IACS, onde a higiene das mãos é considerada a primeira medida de prevenção e controlo e que, portanto, deve ser continuamente refletida e reforçada. A prestação de cuidados de saúde melhora a sobrevida e qualidade de saúde dos doentes, no entanto, verifica-se o aumento da vulnerabilidade destes doentes face à transmissão de infeções que os próprios estão sujeitos nos locais de prestação de cuidados. Este facto, já


amplamente estudado e documentado, torna-se assim, uma das maiores preocupações em saúde pública e, consequentemente, da segurança do doente e qualidade em saúde. Segundo Lopez et all (2006), as IACS são atualmente consideradas um problema maior para a segurança dos utentes de instituições de cuidados de saúde, sendo que a monitorização e prevenção destas deve ser uma prioridade nas políticas de saúde. O impacto de IACS tem implicações a nível do prolongamento do tempo de internamento, no incremento dos encargos com a saúde, a nível do doente em si mas também da família dada a desestabilização e os gastos indiretos inerentes, no aumento da taxa de morbilidade e mortalidade, no aumento da resistência dos microrganismos aos antibióticos. Nota-se que a magnitude do problema é particularmente relevante nos locais onde as medidas básicas para o controlo de infeções é baixo ou praticamente inexistente, tal resulta de uma combinação de fatores de risco como a falta de higiene e/ou saneamento básico, falta ou limitados equipamentos básicos, estruturas desadequadas, a sobrelotação das instituições de saúde, entre inúmeras outras, contudo os relatos de IACS muitas vezes não coincidem com estes fatores, o que se relaciona com a preocupação (ou não) que os hospitais têm com a problemática. A Organização Mundial de Saúde (OMS) assume a IACS como um problema de saúde no mundo, que dificulta o tratamento adequado e eficaz do doente e que, consequentemente, contribui para o aumento da morbilidade, mortalidade e custos em saúde. Foi, deste modo, que a OMS lançou um desafio (2005-2006) através da World Alliance for Patient Safety (WAPS) que desse resposta ao problema que constitui a IACS, e cuja mensagem é: Clean Care is Safer Care (DGS in Programa Nacional de Prevenção e Controlo da Infecção Associada aos Cuidados de Saúde, 2007). No que concerne ao sucesso da implementação das recomendações sobre a higienização das mãos em instituições de saúde, registaram-se, segundo a WHO (2009), progressos muito significativos desde a criação e validação de um conceito onde devem constar estratégias promocionais, numa perspetiva multimodal. Considerando as mãos como o principal veículo de transmissão do agente infecioso, logo a mais importante fonte de IACS através de contacto direto, admite-se que, segundo Sax et all (2007) a higienização das mãos representa um dos elementos base para proteger os doentes contra as infeções associadas a cuidados de saúde e da colonização dos doentes com microrganismos multirresistentes. Sendo a higienização das mãos um gesto simples, rápido e barato continua a ser muitas vezes negligenciado.


Recentemente, o termo de “lavagem das mãos” foi substituído por “higienização das mãos”, envolvendo três técnicas essenciais: a lavagem simples das mãos, a fricção com solução antissética, e a preparação cirúrgica das mãos. Considera-se que as mãos dos profissionais de saúde estão em perfeito estado de higiene se se apresentarem sem soluções de continuidade, com as unhas curtas, limpas, sem verniz e/ou unhas artificiais, não se observar o uso de adornos como anéis, pulseiras, relógios (WHO, 2009). A OMS na adesão ao desafio lançado em 2005 - Clean Care is Safer Care - para a segurança do doente adotou recomendações fundamentais que se traduzem no modelo dos “Cinco Momentos” que constituem pontos de referência temporais para os profissionais de saúde: 1 – Antes do contacto com o doente; 2 – Antes dos procedimentos limpos ou asséticos; 3 – Após risco de exposição a fluídos orgânicos; 4 – Após contacto com o doente; 5 – Após contacto com o ambiente envolvente do doente. Estas indicações têm como propósito facilitar a compreensão das oportunidades em que existe o risco de transmissão de microrganismos através das mãos, a sua memorização e a sua integração no exercício da prestação de cuidados de saúde (DGS, 2010). As IACS constituem um importante problema de saúde pública a nível mundial uma vez que estão associadas ao aumento das taxas de mortalidade e morbilidade. (Locks et all, 2011; Chicas, 2013; Gómez, 2011; Hermández-Orozco et all, 2010; Pina et all, 2010). De acordo com Chicas (2013), Gómez (2011) & Pina et all (2010), vários estudos apontam que nos países desenvolvidos, cerca de 5 a 10% dos doentes hospitalizados adquirem uma infeção associada aos cuidados de saúde e que esta percentagem acresce nos países em desenvolvimento. O risco de transmissão de IACS ocorre em qualquer momento da prestação de cuidados, conforme assegura Pina et all (2010). A este facto acrescem fatores como a sobrelotação dos serviços hospitalares, a ausência de profissionais que prestem cuidados específicos a doentes infetados e/ou colonizados, à frequência de transferências realizadas entre instituições de saúde e o internamento de doentes críticos em unidades de cuidados especializados. Segundo Chicas (2013), citando a OMS, a IACS é “qualquer patologia microbiológica ou clinicamente reconhecida, que afeta o doente como consequência do seu ingresso no hospital ou o profissional de saúde como consequência do seu trabalho”. A IACS é, portanto, uma “epidemia silenciosa”


(Pina et all, 2010), que acarreta resultados negativos para o doente e suas famílias em particular, e para os sistemas de saúde em geral. “As principais medidas de prevenção e controlo assentam por um lado, no cumprimento das boas práticas: precauções básicas (como higiene das mãos, uso adequado de equipamentos de proteção individual, controlo ambiental) e isolamento e, por outro, no uso racional de antimicrobianos”. (Pina et all, 2010) Os estudos concluem, assim, que a higiene das mãos constitui a medida mais eficaz de prevenção e controlo das IACS, para além de ser uma medida simples, de fácil acesso e adesão e de baixo custo, promovendo a segurança do doente e, consequentemente, a qualidade de cuidados em saúde. As mãos dos profissionais de saúde constituem o veículo de contaminação mais comum responsáveis pela transmissão de infeções cruzadas relacionadas com as IACS. Contudo, os profissionais de saúde, nomeadamente médicos e enfermeiros, recorrem à higiene das mãos menos de metade das vezes do que deveriam na sua prática diária. (Pina et all, 2010). Locks et all (2011) demonstraram que a higiene das mãos era uma técnica negligenciada, uma vez que apenas 64% dos profissionais de saúde a realizava antes da entrada no local de trabalho, e que apenas cerca de 50% destes a efetivava antes de qualquer procedimento e/ou cuidado a prestar. Um facto interessante a referenciar é que a adesão à higiene das mãos é grande depois da prestação de cuidados ao doente, quase a totalidade dos profissionais de saúde. (Locks et all, 2011 & Hernández-Orozco et all, 2010) Hernández-Orozco et all (2010) explicam esta realidade considerando a higiene das mãos como uma medida de protecção para os próprios profissionais de saúde. De acordo com Edward set all (2012), as IACS e o aumento das resistências aos antimicrobianos colocaram como principais iniciativas a ter para a melhoria da qualidade dos cuidados em saúde, a prevenção e o controlo das infeções. No entanto, e de segundo os mesmos autores, estudos demonstram que diretrizes e políticas instituídas a nível institucional com o objetivo de padronizar a melhoria das práticas de saúde se tem evidenciado de fraca adesão, nomeadamente em relação à higiene das mãos. A qualidade dos cuidados de saúde e, consequentemente, a segurança do doente, é resultado da interação de vários fatores tais como, o doente, os profissionais de saúde e a instituição de prestação de cuidados enquanto estrutura organizacional. Daí que a eficácia de qualquer intervenção para a prevenção e controlo da infeção deva abranger todos os elementos desta cadeia, e deva ter uma abordagem sistemática e contínua. (Pina et all, 2010 & Chicas, 2013)


Na atualidade, a OMS tem instituída uma abordagem multimodal capaz de mudar e/ou moldar o comportamento dos profissionais de saúde e na qual estão associadas as intervenções: formação e educação dos profissionais de saúde, divulgação e/ou informação nos locais de trabalho, envolvimento e apoio por parte da administração, monitorização e controlo do cumprimento da prática de higiene das mãos, avaliação dos resultados do desempenho profissional. Esta abordagem interventiva tem evidenciado, de acordo com os estudos, resultados favoráveis da diminuição das taxas de IACS. É de sublinhar o papel da administração das instituições de saúde como instrumento promotor de mudança e sustentabilidade face à prática da higiene das mãos dos profissionais de saúde, responsável pela adesão a esta prática e pela eliminação das barreiras/obstáculos a ela associadas. O desafio de uma prevenção e controlo de infeções associadas aos cuidados de saúde é urgente, e passa por acreditar que a higienização das mãos a pode evitar.

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POR UM SERVIÇO DE URGÊNCIA MAIS EFICIENTE: QUE FUTURO? Miguel Pedrosa Enfermeiro no Serviço de Urgência do HESE, E.P.E. Mestre em Intervenção Sócio-Organizacional na Saúde com Especialização em Políticas de Administração e Gestão de Serviços de Saúde Aluno da 5.ª Pós-Licenciatura de Especialização em Enfermagem Médico-Cirúrgica (UE/ESESJD) Perspetivar o Serviço Nacional de Saúde (SNS) para 25 – 30 anos consiste num processo intelectual complexo, dinâmico e, simultaneamente muito restritivo, tendo em conta o atual contexto socioeconómico vigente em Portugal, num quadro de restrição orçamental, com escassez de recursos (humanos e materiais), mobilização inadequada ou indevida de recursos e alterações demográficas significativas, traduzidas por impactos negativos no Setor da Saúde. Perante este cenário macroeconómico e, de acordo com as atuais contingências a nível político, social e económico, verificou-se nos últimos anos, à definição de planos estratégicos para cinco anos com metas a três anos, por oposição às planificações anteriores mais alargadas. Em meu entender este facto possibilita uma gestão do setor mais eficiente, adequada no tempo e local, permitindo uma restruturação estratégica, quer a nível local, regional e nacional, de acordo com o modelo de financiamento dos cuidados de saúde existente, de modo a rentabilizar recursos, diminuir custos e, fundamentalmente obter ganhos significativos em saúde. As consequentes alterações demográficas verificadas nas últimas décadas, as quais se traduziram na modificação e, algumas vezes na inversão das pirâmides etárias, refletindo o envelhecimento da população, acarretam desafios complexos para os Governos, famílias e cidadãos, os quais não se encontravam preparados para tal. Perspetiva-se, para 2050, uma população mundial superior a dois bilhões de pessoas com mais de 60 anos, sendo que 80% dessa população residirá em países em vias de desenvolvimento. Concomitantemente às diferenças sociais, culturais, económicas e


financeiras, a Europa apresenta uma tendência/modelo de envelhecimento comum, com índices de envelhecimento elevados. De facto, apesar do grau de envelhecimento populacional constituir um processo inevitável e inquestionável para o futuro, a sociedade em geral e os consumidores de cuidados de saúde, em particular, não conseguiram adaptar-se às oportunidades decorrentes dos ganhos com a esperança média de vida. Parece-me fundamental refletir um pouco acerca desta questão que, em meu entender encerra a problemática associada à ineficácia e ineficiência do atual Sistema de Saúde (setor público e privado) e, consequentemente do SNS. No que concerne ao SNS, mais especificamente à realidade da Urgência e Emergência, em Portugal, este problema coloca-se diariamente, reporta elevados custos associados à prestação direta de cuidados de saúde, alocação de uma maior quantidade de recursos (inexistentes na atualidade), mais horas de cuidados necessários, maior despesa no setor relacionada ao preço por GDH, quando na realidade deveríamos apostar na promoção e prevenção, prestação de cuidados de proximidade, com produção de indicadores, isto é, cuidados partilhados com empoderamento do doente, pela procura de índices de satisfação mais elevados. O processo de envelhecimento, o qual abordei anteriormente, bem como as alterações que ocorrem, quer a nível da estrutura familiar quer a nível do estado social, proporcionaram novas necessidades de cuidados de saúde. Isto leva-me a concluir acerca de qual o melhor modelo para os cuidados de saúde. Mais uma vez, devemos trabalhar

em

conjunto

para

a

promoção

de

cuidados

partilhados

(de

proximidade/domiciliários), gerindo a doença crónica de forma mais alargada, no entanto, de que tipo de necessidades se está a falar (procura)? Respondem a determinados objetivos estratégicos? Respondem às minhas próprias necessidades de prestação de cuidados (oferta/eficiência/lucro)? Temos dinheiro para o fazer? Vamos pagar o quê? A quem? Que recursos? Quais as prioridades terapêuticas a assumir? Este é o principal desafio que se coloca a qualquer modelo de cuidados de saúde, principalmente quando se prospetiva para um horizonte de 25 – 30 anos, perante a realidade dos Serviços de Urgência do nosso país, onde se procura responder às deficiências (incapacidades) de cada cliente e, também de cada um de nós. São vários os fatores que influenciam o binómio saúde/doença – desde a educação, com as


questões relacionadas com a literacia em saúde, o ambiente de trabalho, a sociedade, a economia, o atual contexto socioeconómico vigente no país até à competência dos diversos profissionais de saúde em geral e dos enfermeiros, em particular, relativamente à qualidade e segurança dos cuidados prestados pelos mesmos – limitando o processo prospetivo, num horizonte de 25 – 30 anos constituindo, a interação entre os diversos fatores, o processo de configuração do futuro. Perante este quadro que se prospetiva será que o SNS tem condições (recursos e financeiras) para fazer face a estas necessidades? Será um SNS autossustentável ou terá que ser privatizado? Relativamente às novas tecnologias, aos avanços da robótica e da biotecnologia, das tecnologias de informação (TI) e dos sistemas de informação (SI) pouco sabemos ou conseguimos prever. Na minha opinião, os Serviços de Urgência terão que se adaptar a esta nova realidade, reajustar os seus níveis de dotação, realocar recursos, procurar novas alternativas ao processo de prestação de cuidados e, fundamentalmente procurar capacitar o cliente/doente e família de novos poderes e competências para a prestação de cuidados partilhados e de proximidade. Teremos Serviços de Urgência lotados, sem capacidade de resposta a médio e longo prazo e bastante limitados por um orçamento muito restritivo. Contudo, prevejo e defendo uma solução para esta problemática. A urgência deve constituir um último recurso à oferta de cuidados de saúde, tal como foi preconizada, isto é para a prestação de cuidados agudos e emergentes. Do ponto de vista económico, financeiro e de gestão, é inconcebível gerir um Serviço de Urgência que dê resposta a todos os níveis de cuidados, tornando-o insuficiente, desorganizado e completamente desestruturado. Não há dinheiro nem recursos que garantam uma resposta eficiente, adequada e em tempo útil a todas as necessidades de cuidados de saúde, quanto mais quando nos referimos ao setor público do estado, independentemente de ter alguma intervenção/participação empresarial. A saúde é um negócio, cada vez mais caminha nesse sentido e, portanto tem obrigatoriamente que gerar lucro. Sendo o SNS tendencialmente gratuito, os Serviços de Urgência não se incluem no lote de dividendos do sistema, atendendo a uma população cada vez mais dependente, isenta de quaisquer responsabilidades económicas (i.e. consumo de recursos isentos de pagamento/taxas). Privatizamos o SNS? Priorizamos quem


atendemos nos Serviços de Urgência, uma vez que só temos dinheiro para tratar alguns grupos de doentes, apenas com alguns recursos? Ou transferimos responsabilidades? A solução parte desta última questão, ou seja o estado deve apostar em cuidados partilhados, de proximidade e com empoderamento do doente (responsabilidade individual), incentivando a participação das autarquias e transferindo o poder da própria prestação de cuidados para a rede de cuidados de saúde primários, os Centros de Saúde. A solução é objetiva, pragmática e passa, essencialmente por saber gerir recursos e melhorar o investimento (i.e. rentabilizar o investimento), mediante um conjunto de reformas e transferência de competências. É crucial que os enfermeiros promovam o autocuidado, o empoderamento do doente e, fundamentalmente que sejam portadores de capacidade/vontade política individual, produzam indicadores (de modo a dar visibilidade aos cuidados de enfermagem) e, assim, atribuir valor às suas ações, aos seus cuidados, isto é, desenvolver sistemas de financiamento dos cuidados de enfermagem.


DA GESTÃO À MELHORIA DA QUALIDADE DO CUIDAR. UMA PERSPETIVA DO ENFERMEIRO DE CONTROLO DE INFEÇÃO Natércia Caramujo Enfermeira Especialista em Enfermagem Médico-cirúrgica, Pós-graduada em Controlo de Infeção e Saúde Enfermeira do Grupo de Coordenação Local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos do Hospital do Espírito Santo de Évora E.P.E. A história mostra-nos que a infeção hospitalar remonta à origem dos hospitais. Durante séculos os doentes foram tratados sem se ter em conta a nosologia de cada um. Os doentes em restabelecimento das suas situações permaneciam lado a lado com outros doentes com toda a diversidade de doenças inclusive infeciosas. As infeções disseminavam com elevada rapidez e, não raro, um doente era admitido no hospital com determinada doença e acabava por morrer de cólera, febre tifoide ou outra infeção. Desde Semmelweiz (1847) o primeiro a demonstrar a eficácia da higiene das mãos na prevenção da infeção hospitalar, Florence Nightingale (1863) que descreveu uma série de cuidados e estratégias relacionados com os doentes e com o meio envolvente, com o objetivo de diminuir o risco de infeção hospitalar, promovendo ambientes mais limpos e orientando para a construção de hospitais estruturalmente mais adequados à intensão de aumentar a separação física entre os doentes. Passando pela introdução da penicilina por Fleming, em 1941, com pouco mais de uma década da sua utilização ao surgimento das primeiras resistências. Até às infeções, surtos e epidemias por microrganismos multirresistentes que caracterizam o estado atual das infeções hospitalares foi um pequeno passo.


Atualmente, Portugal é dos países europeus com maior taxa de prevalência de infeção hospitalar bem como de utilização de determinados antibióticos. Esta situação é particularmente relevante pelo facto das resistências das bactérias se verificarem, em sentido crescente, aos antibióticos que usualmente serviriam para as combater, restringindo as opções terapêuticas para essas infeções. Para fazer face a esta situação, em Portugal, foi criado o PPCIRA (Programa de Prevenção e Controlo da Infeção e das Resistências aos Antimicrobianos) que resulta da fusão do anterior Programa Nacional de Controlo de Infeção com o Programa Nacional de Prevenção de Resistências aos Antimicrobianos. A este programa foi atribuído o caráter de programa prioritário que nas unidades de saúde deve funcionar em articulação com as estruturas de Segurança do Doente e da Gestão de Risco. As estruturas de controlo de infeção das unidades de saúde em Portugal, desde 2013, que está regulamentada por despacho do Ministério da Saúde. Estas devem ser constituídas por equipas multidisciplinares com no mínimo um enfermeiro em dedicação completa, independentemente do nível de cuidados, a que acresce mais um enfermeiro por cada 250 camas adicionais. Por outro lado, a norma para o cálculo de dotações seguras dos cuidados de enfermagem, da ordem dos enfermeiros, é explícita e indica que o enfermeiro de controlo de infeção deve ser especialista e com competências reconhecidas em controlo de infeção. Considerando as competências específicas das diversas especialidades é com a especialidade de enfermagem médico-cirúrgica que se confirmam as competências para a gestão dum programa de controlo de infeção. Este passo deve ser dado a nível nacional, regional e a nível das unidades de saúde. O enfermeiro de controlo de infeção no Serviço Nacional de Saúde (SNS) em Portugal deve ter um papel de gestor de cuidados, não só por ser o único elemento das estruturas de controlo de infeção com dedicação a tempo completo mas também pela natureza das suas tarefas e competências. O estado atual do controlo de infeção em Portugal impõe uma necessidade de mudança do seu paradigma para uma maior eficiência da gestão do processo de saúde – doença em duas vertentes. A primeira vertente impõe uma estratégia nacional ao nível dos sistemas de informação que permitam num único sistema a consolidação de toda a informação de vigilância epidemiológica quer de infeções, consumos de antimicrobianos quer dos perfis de resistência dos microrganismos. A atual panóplia de sistemas de informação não é eficiente


por dispersar recursos. Para cada um dos processos de vigilância epidemiológica obrigatórios existe um sistema informático e metodologias diferentes, além das bases de dados locais para as restantes infeções, não permitindo ter uma visão geral do problema das infeções hospitalares nem das resistências aos antimicrobianos. A segunda vertente passa por reconhecer ao Enfermeiro de Controlo de Infeção maior autonomia de decisão. As atividades diárias de vigilância epidemiológica, e investigação epidemiológica, conferem um acesso privilegiado às determinantes da saúde-doença, sobre as quais deve ser premente a atuação para fazer face às necessidades identificadas. É estabelecida uma análise dos resultados microbiológicos, diariamente, com uma tomada de decisão face aos mesmos. Deverá caber ao Enfermeiro de Controlo de Infeção a decisão relativamente à necessidade de efetuar rastreios de contactos (outros doentes da mesma enfermaria) e principalmente ao isolamento do doente de acordo com as vias de transmissão do microrganismo, com o próprio agente em causa e/ou condição tendo em conta os recursos disponíveis. Trabalho integrado do enfermeiro de controlo de infeção nas equipas multidisciplinares é fundamental para assegurar Cuidados seguros e de qualidade. A prevenção e controlo de infeção e de resistências aos antimicrobianos é, atualmente, um dos pilares fundamentais dos conceitos atuais de governança clínica com um papel de melhorar a qualidade dos cuidados que prestamos no Serviço Nacional de Saúde. Já, Séc. IV ac, Hipócrates fazia referência à necessidade de tratar os doentes sem lhes fazer mal. Tal como atualmente, a melhoria da qualidade no cuidar é um imperativo.

IMPACTO NACIONAL DAS FERIDAS CRÓNICAS Katia Furtado Enfermeira Consulta Externa HDJMG | ULSNA Coordenadora Regional da Área das Feridas Crónicas | ARSA Especialista em Enfermagem de Saúde Comunitária Pós-graduação | Tissue Viability and Wound Management Pós-graduação | Leg Ulcer Management Presidente da Direcção | Sociedade Portuguesa de Feridas


O envelhecimento da população e a morbilidade a ele associada, têm contribuído para um aumento da prevalência de feridas, no contexto atual dos cuidados de saúde. O impacto destas na qualidade de vida das pessoas, e a dimensão dos reflexos económicos e sociais associados, constituem hoje, pela sua grandeza, um grave problema de saúde pública. A sua prevenção e tratamento estabelecem assim, uma área por vezes bastante complexa que requer não só uma abordagem holística aos seus portadores, como uma intervenção clínica interdisciplinar, baseada nas melhores práticas, única forma de obter ganhos em saúde. As feridas complexas, mais correctamente feridas de difícil cicatrização, raramente se encontram em pessoas saudáveis. Na realidade os indivíduos que possuem feridas crónicas têm associados outros problemas sistémicos, tais como a diabetes, doença venosa crónica, obesidade, doenças cardiovasculares, ou outras patologias que interferem no normal funcionamento do organismo. O termo co-morbilidade refere-se à associação entre duas ou mais doenças distintas no mesmo indivíduo. Como resultado desta associação, o impacto das feridas complexas (crónicas), encontra-se diminuído. Muitas vezes as feridas são encaradas de uma forma díspar: quando falamos de um ‘mal perfurante plantar’ este é encarado como mais uma complicação da diabetes; quando falamos de úlcera venosa, esta é vista como complicação da doença venosa crónica. Este facto faz com que a entidade “ferida crónica” seja ‘mascarada’, não sendo valorizada como problema de saúde pública. Doenças como a tuberculose são consideradas um problema de saúde pública, pois em Portugal anualmente existe um registo considerável de casos. No entanto, quando nos referimos a feridas complexas, não possuímos quaisquer indicadores da sua prevalência a nível nacional, mas seguramente terá sido muito superior aos casos de tuberculose. É evidente que não é possível comparar uma doença transmissível, como a tuberculose, com as feridas complexas que, regra geral, não são transmissíveis. Todavia se contabilizarmos os custos imputáveis ao tratamento destes distintos problemas, facilmente se verificaria que as feridas complexas contribuem com uma despesa muito superior à do tratamento da tuberculose. Entre as diferentes patologias responsáveis pelo aparecimento de feridas, importa destacar a Diabetes. Mais de um milhão de pessoas sofre, atualmente, de diabetes, em Portugal, considerando-se esta patologia uma das principais causas de morbilidade crónica e de perda de qualidade de vida. Tal facto, entre outros, classifica a diabetes como um problema de saúde pública de elevada magnitude, sendo previsível que constitua uma das principais causas de morbilidade e incapacidade total ou parcial durante o século XXI.


Face à nosologia diversa e complexa com que se apresenta, a diabetes coloca, inevitavelmente em diálogo uma plêiade de especialidades médicas e outras, desde a medicina geral e familiar à medicina interna, desde a oftalmologia à cirurgia, da cardiologia à obstetrícia, da pediatria à cirurgia vascular, da enfermagem à nutrição, deixando ainda espaço para a intervenção urológica, sexual, renal, ortopédica, neurológica, psicológica, não esquecendo a anestesia. O envelhecimento global da população (em que Portugal não é excepção), associado ao desenvolvimento de doenças crónicas, como é o caso da Diabetes, irá necessariamente aumentar o ónus com as feridas crónicas, que se poderá vir a traduzir num impacto muito relevante, a nível socioeconómico nos próximos anos. A nível nacional não existem quaisquer dados epidemiológicos que revelem a prevalência dos doentes que recebem cuidados relativos ao tratamento de feridas complexas, nem tampouco quais os custos associados a estes tratamentos. Porém, se extrapolarmos os dados de um recente estudo dinamarquês, poderemos estimar gastos na ordem dos 200 milhões de euros por ano. A exemplo de outros países industrializados, também no caso de Portugal, o aumento progressivo da longevidade determina a necessidade de dar respostas adequadas, a patologias crónicas do idoso nomeadamente no que concerne ao tratamento de feridas. Muitas destas: as úlceras de perna, as úlceras por pressão e as associadas ao pé do diabético, apresentam uma cronicidade que nalguns casos se encontra ligada a comportamentos e estilos de vida, traduzindo um problema de Saúde Pública. Esta cronicidade das feridas, associada às suas complicações, nomeadamente a infecção, contribui para um agravamento das despesas relacionadas com o seu tratamento e para uma diminuição da qualidade de vida dessas pessoas. Por outro lado, a evolução tecnológica que desde o século passado tem vindo a enriquecer as ciências médicas, tem tido repercussões em grande escala nesta área do cuidar. O mercado tem vindo a ser invadido por uma enorme variedade de produtos de alta qualidade para o tratamento de feridas. No entanto esta multiplicidade de produtos dificulta, na prática, uma selecção e utilização adequadas. Acresce que na actualidade a filosofia dos cuidados pretende dar respostas humanizadas e, cada vez mais, no próprio domicílio do doente, pelo que os enfermeiros dos Cuidados de Saúde Primários serão seguramente os interlocutores privilegiado na relação com o cidadão portador de ferida.


Uma das condições fundamentais para uma resposta adequada ao cidadão portador de ferida, é a utilização de boas práticas, pelos prestadores de cuidados, quer ao nível dos Cuidados de Saúde Primários, quer a nível Hospitalar. Todavia, alguns estudos demonstram que, por vezes, os conhecimentos em prevenção e tratamento de feridas são insuficientes e a utilização do material de penso é inadequada, limitando os seus benefícios e gerando custos desproporcionados. Estes custos reflectem não só a utilização inadequada do material para tratamento de feridas, como também o tempo consumido pelos prestadores de cuidados, para não falar nos custos sociais inerentes ao cidadão com ferida (absentismo, deslocações, etc.). A literatura parece indicar que a implementação de boas práticas através da formação e da criação de linhas de orientação na prevenção e tratamento de feridas tem demonstrado uma melhoria na qualidade dos cuidados e uma consequente obtenção de ganhos em saúde. Vários estudos apontam ainda como estratégia de contenção da despesa a implementação de guidelines de boas práticas, apostando numa perspectiva de desenvolvimento de centros de excelência no tratamento de feridas, onde a investigação-acção constitui a prática diária. Da nossa parte - e é isso que nos convoca para este tema - observamos, hoje, que a circulação do conhecimento entre as diferentes profissões, torna o contexto onde se exerce a clínica um espaço de guerrilha onde cada profissão procura ampliar e cimentar os seus poderes, num exercício narcísico onde o doente, por vezes, não tratado nem referenciado, se perde. E, pensamos: e se os vários saberes fossem partilhados, rentabilizados e harmoniosamente incorporados no tratamento do doente? E se, harmoniosamente conjugados, fossem deslocados das profissões para o doente e transformados em ganhos em saúde? Seguramente um projeto ilusionante, a invocar e construir…


INTEROPERABILIDADE EM SAÚDE Joaquim Telo Enfermeiro especialista e Enfermagem Reabilitação A Saúde é de todos e para todos logo deve ser inclusiva e não exclusiva, nos tempos que correm a infoexclusão é um risco pois os grandes avanços alicerçam-se no avanço tecnológico, um grande passo do SNS nos últimos anos é a PDS (Plataforma de Dados de Saúde). Esta plataforma é o acesso estratégico à informação partilhada entre os diversos contextos de cuidados de saúde, ficando acessível aos diferentes profissionais com acesso ao registo de saúde eletrónico. A interoperabilidade em Saúde passará pela exploração da informação de saúde constante da PDS e a seu efetivo uso como forma de planear/gerir cuidados de saúde ao cidadão porque se esta não for real nunca passaremos de indicadores que mais não são que resultados de melhores ou piores desempenhos profissionais, sem evidência da participação ativa de todos os intervenientes. Contudo num país envelhecido, com índice de envelhecimento de 133,5% em 2013 (Pordata) com restrições económico-financeiras, o papel do enfermeiro na prevenção da doença e promoção da saúde, bem como a sua natural envolvência com utente e família permite-lhe funcionar como “gestor de saúde” e elo primordial no processo formativo do cidadão no uso das novas tecnologias em saúde. Dotar os cidadãos da capacidade de reconhecer qual o papel que é efetivamente destinado aos organismos e unidades de saúde que diariamente concretizam a política de saúde no terreno e que, direta e indiretamente, são os grandes produtores e consumidores de informação. É importante clarificar e especificar quais são os papéis: •Dos organismos centrais - como a DGS ou o INFARMED – que são a génese de regras, procedimentos e classificações, que importa incutir e disseminar de forma precisa e consistente e são também agregadores de informação.


•Das Administrações Regionais de Saúde: com funções de responsabilidade consagradas nos modelos de saúde, mas também na adequação dos meios e contextos adequados ao seu cumprimento; •Dos hospitais, que numa rede complexa e heterogénea, a inovação e a criatividade não são passiveis de centralização, sob pena da sua aniquilação. Sobretudo, na convicção de que os prejuízos resultantes do que se deixa de produzir serão substancialmente maiores do que os ganhos nos cortes. •Das entidades e unidades de saúde, privadas e de natureza social que, numa ótica de centralidade no cidadão, são elos importantes na rede, já que são simultaneamente clientes e produtores de informação, designadamente de natureza clínica dos cidadãos que servem, seja numa perspetiva individual, seja na perspetiva dos dados consolidados, para usos científico e epidemiológicos. O desenvolvimento de aplicações específicas para cada uma destas áreas, resultou na existência de uma multiplicidade de sistemas e aplicações autónomas, com necessidades de partilha de dados, informação e integração de sistemas, não adequadamente cobertas. Pelo que, a interoperabilidade poderá ser uma ferramenta facilitadora da consolidação e manutenção da informação do cidadão, da gestão das unidades e dos serviços, e consequentemente à disponibilidade, em tempo útil, de informação completa, fiável e rastreável, indispensável para um adequado suporte à decisão e a uma gestão eficiente. A implementação de standards globais ao longo de toda a cadeia de valor da saúde poderia salvar entre 22 a 43 mil vidas humanas e evitar a incapacidade em 0,7 a 1,4 milhões de pacientes, segundo o relatório da McKinsey, “Strength in unity: The promise of global Standards in Healthcare”. Há que traçar objetivos e realizar auditorias às instituições e a todos os profissionais envolvidos no sistema, por forma a garantir a fiabilidade da informação produzida tendo em vista a sua eficácia e inovação. As tecnologias de informação e comunicação e eletrónica jogarão um papel privilegiado ao ajudar a centrar os sistemas de saúde no cidadão, dando a informação, o acesso e os meios de partilha que lhe permitirão a troca e a transação de informação que influenciará a sua qualidade de sua vida futura. Os enfermeiros pela sua proximidade, envolvência e poderão ser os “gestores de saúde”, por exemplo na reconciliação da terapêutica nos momentos de transferência e de transição de cuidados, no desenvolvimento de mudanças comportamentais tendo em conta as determinantes de Saúde ao longo do ciclo de vida.


Bibliografia: Sousa, Paulino (2006) –Sistema de partilha de informação de Enfermagem entre contextos de cuidados de saúde, Formasau. Associação para a Promoção e Desenvolvimento da Sociedade da Informação (2013) INTEROPERABILIDADE NA SAÚDE.

O QUE IMPORTA PENSAR… Rosa Irene Vilela Tapadas Enfermeira Graduada, UCC AMMAYA- Portalegre; Coordenadora da ECL Portalegre da RNCCI Desde 2003 que se fala em Cuidados Continuados em Portugal, muito já foi escrito, muito já foi feito. A Legislação existe, o trabalho tem vindo a ser desenvolvido e os registos são evidência de que a RNCCI (Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados) é uma realidade e uma necessidade. De salientar o papel que as Unidades de internamento têm vindo a ter desde que a RNCCI foi criada, tanto ao nível da saúde, como ao nível social. A sua importância na reabilitação de doentes, que até então, eram dados como incapazes. No entanto na minha opinião a RNCCI começou “ pelo telhado”, foram criadas estruturas físicas, dadas todas as condições humanas e materiais às chamadas Unidades de Cuidados Continuados das várias tipologias e “esquecidas” as Equipas de Cuidados Continuados Integrados (ECCI) que ficaram à quem das necessidades. No projecto inicial (Decreto - Lei Nº 281/2003, de 8 de Novembro) era clara a intenção de que fosse prioritário a manutenção do utente sempre que possível no domicílio. Com o Decreto – Lei Nº 101/2006 de 6 de Junho, formaliza-se a criação da RNCCI, onde podemos ter acesso a uma visão global do que é a RNCCI. E ao comparar o que foi


desenhado e a realidade deparamo-nos com algumas incongruências, nomeadamente a grandiosidade das Unidades de internamento e a falta de recursos das ECCI’s. Quando nesse mesmo Decreto no seu Artigo 27 podemos ler: “ A ECCI….de cuidados médicos, de enfermagem, de reabilitação e de apoio social ou outros…” e nos deparamos com realidades de ECCI’s que não têm médico atribuído, que os profissionais de Enfermagem são os mesmos que simultaneamente efectuam vários papeis nas diferentes Unidades Funcionais dos Centros de Saúde, os Técnicos de Serviço Social têm 9 ECCI’s para dar apoio com equipas que têm desde 5 a 25 utentes, a Psicologia está repartida entre consultas, utentes de ECCI e Unidades de Internamento, a fisioterapia é assegurada 4 h semanais, compreendemos a dificuldade destas Equipas em darem resposta ás necessidades dos doentes em casa. Por exemplo para 25 utentes em ECCI, com esta realidade de profissionais, num concelho alentejano com uma área de 447,14 Km2 de área, com 21.868 habitantes, 7 freguesias, onde apenas 2 freguesias são urbanas, é complicado “ competir “ com a panóplia de técnicos e materiais que foram dados ás Unidades da RNCCI. E quando se diz competir, quer – se dizer, oferecer dignidade, bem – estar e cuidados de qualidade aos doentes. Doentes esses a quem é oferecido, e muito bem, todas as condições nas Unidades de internamento. De modo nenhum, a intenção deste meu artigo quer tirar mérito ás Unidades de internamento, apenas se pretende chamar a atenção para uma realidade e … “ o que importa pensar…” é o que ainda não foi feito e tentar dar contributos para a melhoria dos cuidados. Importa, igualmente pensar que se pede um cuidador, presente, capaz, disponível, quando a realidade é população idosa que se cuida, parentes capazes que trabalham e por vezes vivem com a ajuda dos que necessitam ser cuidados. Deveria ser possível dar condições económicas, físicas e psicológicas para levar os cuidadores a cuidar no domicílio. Quando penso em cuidadores e domicílio, não consigo deixar de dar importância aos cuidadores e doentes do foro mental. Apesar da legislação existir no que respeita a estes doente, a realidade é termos os cuidadores completamente esgotados sem respostas para estes doentes. Na RNCCI foi criada uma circular informativa que tenta salvaguardar a necessidade destes doentes poderem necessitar de cuidados continuados, mas quando tentamos dar resposta a essa mesma circular deparamo-nos com falta de seguimento da psiquiatria a estes doentes e cuidadores. A circular é específica quando diz que para os doentes do foro mental poderem ter acesso á RNCCI tem que existir um especialista responsável que segue o doente na sua patologia mental previa, por forma a poder ser assegurada a assistência especializada sempre que estes estejam internados e a mesma se revele necessária a fim de se evitarem episódios de agudização por falta de acompanhamento. Mas, o problema de base de muitos destes doentes é este mesmo, não ter um seguimento, não terem um especialista que os siga. A maioria dos casos em que existe solicitação por parte dos cuidadores desesperados, estes doentes tiveram vários episódios, recorreram á urgência que contacta o especialista de serviço, são medicados e encaminhados para as consultas, mas com tempos de espera de meses. E voltam a recorrer á urgência e são feitos acertos de medicação umas vezes pelo mesmo especialista, outras vezes por outro especialista que muda a medicação e após algumas


tentativas de controlar as situações umas vezes conseguem controlar, outras nem por isso! Há tempos houve uma caso de uma cuidadora que me dizia, “ Quando ouvimos na televisão, que matou a mulher e a seguir suicidou-se, fica tudo de boca aberta, e a dizer que anda tudo maluco. Não sabem o quanto maluco se fica, não sabem a quantidade de pessoas que resiste a tanta coisa, a morte é por vezes a coisa mais fácil!” … Importa pensar, que estas pessoas não podem esperar que as condições estejam todas reunidas para a RNCCI tenha as equipas e as infra-estruturas prontas para os receber. Quem fala nos doentes de patologia mental, fala nos doentes paliativos. Outra lacuna no sistema. Sim! E já muito foi feito. Temos consciência disso, mas e o domicilio? De que serve ter Unidades de internamento, que dão resposta se depois quando é necessário enviar para casa falta quase tudo? E vamos sempre ter ao mesmo problema, criaram-se condições para dar respostas, mas o incentivo de cuidar em casa foi deixado de lado. Enquanto não se olhar para as equipas domiciliárias no mesmo patamar que as outras equipas, tudo o resto tem o peso que tem. E funciona, mas funciona com uma grande lacuna. E toda a gente sabe o que falta fazer, mas não se faz! Importa pensar …porquê?

A AVALIAÇÃO E REGISTO DA DOR DE MODO SISTEMÁTICO Milene Pires Mendes Enfermeira Serviço de Medicina 4 CHLC - Hospital de Santa Marta


A Avaliação e registo da dor são aspetos importantes no cuidado diário ao doente. Tal como referem Cordeiro & Carvalho (2011), o problema da dor constitui, sem dúvida um dos objetivos das Ciências da Saúde que tratam de conhecer e aliviar o sofrimento humano. Pelo que, avaliar e registar pode constituir o primeiro passo para ser reconhecida como uma experiencia sensorial muito complexa, modificada pelas características da memória, das expectativas emocionais de cada um. (Pereira & Sousa, 1998) A Dor pode ser definida de diversos modos, sendo unânime que é algo subjetivo e que se apresenta sob a forma de sinais e sintomas. A “International Association for the Study of Pain” (IASP), citada por Cordeiro & Carvalho (2001), definiu dor como “uma experiência sensitiva e emocional desagradavel, associada a lesão tecidular ou potencial descrita em termos dessa lesão.” Sousa (2002) refere que a avaliação e registo da dor são extremamente importantes no contexto clínico, pois torna-se impossivel resolver um problema dessa natureza sem ter medida sob a qual basear o tratamento ou a conduta terapêutica. Neste sentido são fundamentais instrumentos multidimensionais e unidimensionais que nos ajudem a avaliar a dor. Os primeiros são utilizados para avaliar as várias dimensões da dor a partir de diferentes indicadores de respostas e das suas interações (a dor pode ser caraterizada, de acordo com o Portal da Saúde do Ministério da Saúde, quanto à sua intensidade, qualidade, duração, localização, etiologia, natureza e frequência). Por sua vez, os instrumentos unidimensionais são designados para quantificar apenas a severidade ou a intensidade da dor e são frequentemente usados nos cuidados de saúde de modo a obterem-se informações rápidas, não invasivas e válidas sobre a dor e a analgesia instítuida. De acordo com a Circular Normativa Nº 9/DGS de 14/06/2003 “O Controlo eficaz da Dor é um dever dos profissionais de saúde, um direito dos doentes que dela padecem e um passo fundamental para a efetiva humanização das unidades de saúde.” Tendo em conta estas directivas, o Enfermeiro como prestador de cuidados deve, em todos os turnos e sempre que se justifique, avaliar a dor dos doentes pelos quais está responsável e proceder ao registo, no processo clínico, de todas as caraterísticas da mesma. Deste modo o plano de cuidados será adequado a cada doente, tendo em vista a promoção do seu bem-estar e conforto. Verifica-se entao que a dor encontra-se entre as experiências humanas mais destabilizadores, pois envolve sempre dimensões físicas e emocionais. Por ser algo tão importante, a Dor foi considerada o 5º Sinal Vital e implementado o Plano Nacional de Luta Contra a Dor. Assim, torna-se imperativo mudar consciências, sensibilizar e formar todos os profissionais de saúde acerca desta temática para prestar cuidados de qualidade, assegurando a continuidade e comunicação no trabalho realizado entre profissionais.


Assim penso ser importante refletir sobre aspetos como: - A utilização correta da escala numérica (ou outras); - A uniformização das escalas de dor utilizadas no serviço/instituição para que possa existir uma avaliação correta da sua intensidade assim como a continuidade de cuidados; - A uniformização do local onse se regista a dor; - Apesar da folha de registo de dor em uso atualmente no serviço estar de acordo com as indicações da Circular Normativa Nº 9/DGS de 14/06/2003, considero importante que esta seja revista no que diz respeito ao gráfico de registo da dor, pois neste devem corresponder os valores numéricos aos parâmetros da escala de avaliação utilizada, de modo a não comprometer a continuidade de cuidados e a qualidade das intervenções no doente com dor. - A realização de formação em serviço sobre esta temática para sensibilizar as equipas de Enfermagem a atualizar saberes na área da prevenção, controlo e registo da dor. Deste modo, considero fundamental continuar a refletir em equipa na importância da avaliação e registo para o controlo da dor, bem como nas intervenções efetuada. Parece igualmente importante para que a avaliação da dor seja uma prática diária o envolvimento da equipa multidisciplinar.

O FUTURO DOS CUIDADOS PALIATIVOS Joana Santos Enfermeira Unidade de Cuidados Continuados Castelo Branco Santa Casa da Misericórdia de Castelo Branco Os cuidados paliativos pretendem ser uma resposta técnica e humanizada aos problemas e sofrimento gerados pela progressão das doenças graves, crónicas e incuráveis. (OMS: 2002,2004). Assim, o sofrimento associado aos cuidados paliativos surge devido à multiplicidade de perdas, de adaptações e de sintomas que vão surgindo e tem impacto sobre os cuidadores familiares próximos.


As demências constituem um dos principais problemas de saúde pública deste século, não só pela sua dimensão mas sobretudo pela forma como afetam o doente e aqueles que o rodeiam. Estima-se que existam atualmente em todo o mundo, cerca de 30 milhões de pessoas com demência, com 4,6 milhões de novos casos todos os anos. Em Portugal, e à semelhança de outros países ocidentais, estima-se uma prevalência de 5% acima dos 65 anos com risco para virem a ter uma demência, sendo a Doença de Alzheimer responsável pela maioria dos casos. Estes factos conjugados com o envelhecimento e a longevidade da população crescente da população (entre os 90-94 anos), a demência atinge 1 em cada 3 pessoas, bem como o elevado impacto que a doença tem sobre os cuidadores, justificam largamente a necessidade de oferecer cuidados paliativos de qualidade a esta faixa da população com este diagnóstico. Providenciar cuidados paliativos no decurso destas doenças é hoje uma necessidade reconhecida por muitos autores, pois como diz Neto (2010), nas situações de cronicidade, a dicotomia cuidados curativos/cuidados paliativos tende a esbater-se, estando essa mesma concepção até ultrapassada, no sentido de cada vez mais se adequar as respostas assistenciais às necessidades dos doentes e famílias. Neste sentido recomenda-se a integração precoce das ações paliativas no curso da doença e a manutenção de algumas práticas ditas de intuito curativo nas fases avançadas, se aquelas se revelarem benéficas para os doentes e seus cuidadores. No entanto, quando se assume que não existe possibilidade de cura, mas que ainda há muito a fazer pela pessoa, necessitando de se centrar na promoção do conforto, controlo dos sintomas, promoção da qualidade de vida e da dignidade da pessoa doente. O não reconhecimento da demência avançada como doença terminal tem consequências prejudiciais a vários níveis: o doente não recebe os cuidados apropriados, mas sim intervenções desproporcionadas destinadas a situações de reversibilidade reconhecida, como na doença aguda, com consequente manutenção do sofrimento e aumentos dos gastos com as intervenções técnicas sem eficácia; a família vê prolongada a situação angustiada do doente que está em sofrimento, com


grande sobrecarga física e emocional, e não pode preparar-se adequadamente para a partida do seu ente querido. Cuidar de um doente com doença de Alzheimer assume, para os que o rodeiam, e particularmente para o cuidador principal, enorme sobrecarga do ponto de vista físico, emocional, social e financeiro. O cuidado a alguém com demência está associado a níveis mais elevados de stress, quando comparado com a prestação de cuidados a alguém com incapacidade funcional resultante de qualquer outro tipo de doença crónica. A família constitui, um recurso essencial à prestação de cuidados às pessoas em situação de dependência, permitindo que estas permaneçam no seu domicílio pelo maior período de tempo possível e não sofram as consequências da institucionalização precoce ou não desejada. É fundamental que a família reconheça a doença de Alzheimer como uma doença incurável e terminal para que não existe um aumento do sofrimento trazendo consequências negativas para o doente, daí ser fundamental os familiares terem informação sobre a evolução da doença, sobre o tratamento e os sintomas associados. Deste modo há necessidade de incluir na abordagem de cuidados paliativos o apoio à família, monitorizando desta forma o stress associado à prestação de cuidados ao doente, avaliar a sobrecarga e a necessidade de existir um internamento de curta duração do doente para descanso dos cuidadores. Os cuidados paliativos deverão ser parte integrante do sistema de saúde, promovendo uma intervenção técnica que requer formação e treino específico obrigatórios por parte dos profissionais que os prestam, tal como a geriatria, a pediatria, a cirurgia ou outra área específica no âmbito dos cuidados de saúde. Estes cuidados previnem um grande sofrimento motivado por sintomas (dor, fadiga, dispneia), pelas múltiplas perdas (físicas e psicológicas) associadas à doença crónica e terminal, e reduzem o risco de lutos patológicos. Devem assentar numa intervenção interdisciplinar em que pessoa doente e família são o centro gerador das decisões de uma equipa que idealmente integra médicos, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais e outros profissionais. Têm como objetivo ajudar os doentes terminais a viver


tão ativamente quanto possível até à sua morte (e este período pode ser de semanas, meses ou algumas vezes anos), sendo profundamente rigorosos, científicos e ao mesmo tempo criativos nas suas intervenções. Os cuidados paliativos centram-se na importância da dignidade da pessoa ainda que doente, vulnerável e limitada, aceitando a morte como uma etapa natural da VIDA que, até por isso, deve ser vivida intensamente até ao fim. Constituem hoje uma resposta indispensável aos problemas do final da vida. Em nome da ética, da dignidade e do bem-estar de cada Homem é preciso torná-los cada vez mais uma realidade.

FUTURO DA ENFERMAGEM Marília Granada Enfermeira Especialista em Saúde Comunitária Mestre em Enfermagem


ULS Castelo Branco – UCSP Alcains Os diferentes tipos de materiais e equipamentos de enfermagem têm evoluído com o avançar dos anos. Antigamente o trabalho de enfermagem era feito do mesmo modo contudo não tão rápido, como é o exemplo do medidor da tensão arterial. Prestamos cuidados com maior qualidade e eficiência. No futuro, na minha opinião da enfermagem penso que poderá haver uma grande evolução não só no que diz respeito aos equipamentos mas também ao material para a realização de pensos, que facilite o nosso trabalho bem como beneficiar favoravelmente a qualidade de vida dos doentes. O Cuidar em enfermagem dependerá sempre do enfermeiro, sendo para isso necessário haver profissionalismo e conhecimento científico e técnico. Assim seria bom no futuro promover a oportunidade de todos os enfermeiros investirem na sua formação, fazendo especialidades e/ou mestrados que lhes proporcione mais conhecimentos para garantir a qualidade e a excelência dos cuidados aos doentes. Neste momento a carreira de enfermagem está estagnada, desejo que num futuro próximo a mesma nos traga aquilo que ainda não nos foi dado, visto todos os que investem na profissão diariamente neste momento não terem qualquer tipo de expectativa a não ser a atualização de conhecimentos para favorecer as pessoas que cuidam.

ENFERMAGEM versus SNS Rui Manuel Semedo Quintino Enfermeiro Chefe da ULSNA, EPE

No momento em que estou a iniciar este “devaneio” ...”35 anos do SNS, 35 ideias para o futuro” dando seguimento à visão de que “Os enfermeiros têm competências políticas para influenciar com as suas ideias e a sua força de trabalho um futuro melhor


para o Serviço Nacional de Saúde”, não posso deixar de olhar para um passado, que seguramente não está assim tão distante… Penso que qualquer cidadão sente que a saúde é o bem mais precioso, logo mais valorizado, e já em 1948 a Declaração Universal dos Direitos do Homem no seu artigo 25º afirmava que “toda a pessoa tem direito a um nível de vida suficiente para lhe assegurar, e à sua família, a saúde e o bem-estar…”. A história tem-nos mostrado, que apesar dos direitos estarem bem definidos, a sua concretização depende normalmente da convergência de múltiplos fatores… Mas, o nosso tem central passa pelo SNS, e uma questão se coloca. Qual a razão ou razões que em 1979 estiveram na “criação” do SNS? Segundo António Arnaut, a sua criação resultou, para além de um imperativo ético e de justiça, de uma imposição jurídico-constitucional, nomeadamente a expressão prática e operacional do Artigo 64º da Constituição da República, o qual, inquestionavelmente constituiu a mais sólida realização social, humanista e gestionária do nosso regime democrático. Mas terão sido só estas as razões da sua criação? Seguramente não, pois as novas realidades sociais, económicas e acima de tudo políticas existentes à época terão gerado as condições necessárias à sua criação. Não irei falar dos múltiplos benefícios que o SNS trouxe à nossa sociedade nestes últimos 35 anos. Mas a sua “compreensão” penso ser pertinente, razão pela qual o devemos perspetivar como um Serviço dinâmico, que teve obrigatoriamente que se adaptar às constantes alterações que ocorreram nestes últimos 35 anos, o qual procurou sempre encontrar respostas aos desafios e às novas realidades que lhe foram surgindo…, mas uma coisa tem sido a sua adaptação, outra, será o fato de este ter estado sujeito a constantes “agressões”, mais acentuadas nesta última década, as quais têm provocado uma deterioração progressiva de toda a estrutura do SNS, com implicações sérias na sua capacidade de resposta... A gestão do SNS, direi, Sistema de Saúde (terminologia resultante da publicação da Lei nº48/90), nomeadamente das múltiplas Unidades de Saúde que o integram, tem sido e continuará a ser sem dúvida o principal enfoque…


Será legítimo afirmar que existem gestores competentes e gestores incompetentes, mas o que efetivamente teremos que questionar, são os objetivos dessa gestão … pública ...privada… A confusão existente entre os conceitos de gestão pública ... e gestão privada ..., nomeadamente no que diz respeito aos seus objetivos é perfeitamente esclarecida por Federico Tobar: . a gestão privada existe para maximizar o património dos acionistas e a gestão pública existe para atingir uma missão que é considerada socialmente valiosa; . o rendimento da gestão privada é obtido a partir da venda de bens e produtos e a receita da gestão pública é obtida a partir de um sistema tributário e de doações; . na gestão privada o resultado financeiro é o critério de bom desempenho e na gestão pública o critério de bom desempenho são a eficiência e a efetividade no cumprimento da missão; . e, finalmente, na gestão privada é procurada a identificação de capacidades para a criação de valor e na gestão pública são identificadas as melhores alternativas para cumprir a missão.” Pelo que, facilmente se pode inferir, que nos últimos anos tem persistido uma grande “confusão” na gestão do SNS … a qual sem dúvida se mantém… Relativamente à questão que nos foi colocada. “Os enfermeiros têm competências políticas para influenciar com as suas ideias e a sua força de trabalho um futuro melhor para o Serviço Nacional de Saúde”? Sem dúvida que os Enfermeiros têm competências e conhecimentos necessários…, pois são os principais prestadores de cuidados de saúde tanto no contexto hospitalar como comunitário, mas… no que diz respeito às competências políticas, seguramente estas têm demonstrado ser “escassas”, pois se atendermos “ao peso” que a Enfermagem assume no SNS ..., a sua intervenção efetiva na definição de políticas de saúde e na tomada de decisão, tem sido praticamente nula. Será pois, imprescindível alterar este paradigma, para tal será fundamental que os enfermeiros, em particular os gestores de enfermagem assumam de uma forma CONSISTENTE os seu “défices” no que diz respeito ao seu envolvimento nas políticas institucionais/políticas de saúde.


Podemos dizer que não, argumentando com múltiplas razões ..., mas todos sabemos que os atuais gestores de enfermagem passam uma grande parte do seu tempo a fazer gestão operacional ..., a qual se assume muitas vezes como a sua zona de conforto, “impedindo” estes de assumir novos papéis que possam contribuir para a definição de políticas, de metas e consequentes resultados aos diferentes níveis do SNS. Mas será que é assim tão fácil? Não, mas seguramente é uma obrigação, pois a Enfermagem deve ser proactiva, em vez de passiva ou direi mesmo apática ..., fazendo tudo o que estiver ao seu alcance para reforçar a sua capacidade de participar efetivamente no desenvolvimento de políticas e nas decisões a todos os níveis, para benefício da sociedade. E seguramente, estamos numa posição claramente privilegiada, por todo o histórico que nos caracteriza. Mas outras questões devem ser respondidas..., nomeadamente: O que está a enfermagem a fazer relativamente ao desafio de prestar cuidados de qualidade no atual contexto, onde os modelos de gestão se baseiam quase exclusivamente em critérios de natureza economicistas? De que forma a cultura e os valores da enfermagem foram afetados pelas mudanças ocorridas nos últimos tempos? Qual o valor que a sociedade atribui à enfermagem? Qual o valor que os enfermeiros atribuem à enfermagem? Qual o poder da enfermagem no SNS? Não tenho dúvidas da real importância que a Enfermagem, pode, e deve assumir no SNS, nomeadamente na sua sustentabilidade e acima de tudo na qualidade dos serviços disponibilizados ao cidadão. Mas estas, e outras questões, a enfermagem terá que obrigatoriamente dar uma resposta em tempo útil, de uma forma consciente, onde deverá ter a “inteligência” de assumir todos os seu pontos fortes e pontos fracos, de forma a estruturar uma resposta geradora de consensos, e simultaneamente socialmente útil. Os Enfermeiros, enquanto prestadores de cuidados/gestores não se podem demarcar do facto de os atuais modelos de gestão, se assumirem como um desafio, à compatibilização com a visão humanista e universalista dos cuidados de saúde.


A globalização, a competitividade, a diversidade da força de trabalho, a explosão de informação e de tecnologia e ainda as perturbações económicas e sociais, têm implicado uma necessidade incontornável das organizações se adaptarem aos novos paradigmas que constantemente lhe estão a “bater à porta”. A não adaptação das organizações poderá implicar a sua desagregação com todas as consequências daí resultantes para os seus clientes e profissionais... Perante as “convulsões” que têm afetado a saúde em Portugal, onde se têm verificado alterações profundas, as quais têm gerado incertezas de uma dimensão assustadora, nos profissionais..., e na própria população... enquanto utilizadores dos cuidados de saúde. A Enfermagem, como profissão nuclear na área da saúde, deverá ter a capacidade de se “recriar”, assumindo de uma forma efetiva um papel ativo a todos os níveis de decisão, de forma a conseguir assegurar um serviço, onde a equidade, qualidade e eficiência sejam a sua preocupação major, independentemente das alterações “legais” que possam estar a ocorrer. Se conseguirmos dar este pequeno passo… o SNS irá sair altamente valorizado.


SAÚDE MENTAL INFANTIL Isabel Telo Enf. Especialista de Psiquiatria e Saúde Mental/ Terapeuta Familiar Quando olhamos para a criança, na maioria das vezes, a nossa visão recai no paternalismo, nas ideias reconstruídas de tempos que já foram, nas ilusões impensadas, no mundo da fantasia e o “era uma vez” mergulha em paraísos de ternura…este olhar não se encontra com a realidade, nem com o “tal” comum de acusação, onde a agressividade, o despotismo e a delinquência se fazem ouvir, como sendo o mal que assola a sociedade de hoje, sem que do passado se retirem responsabilidades. Sabemos que a criança não é “boa” ou “má” por natureza, mas é como é, porque sabe fazer as suas aprendizagens de contexto. A nossa época parece ignorar ou mesmo negar o talento da infância e a sua capacidade de poder ser individualmente, como ser único, num caminho de crescimento, onde todos somos participantes. Quando contextualizamos a criança com problemas, no espaço da saúde mental, com facilidade passamos do desconhecimento dos mesmos para a medicalização da vida quotidiana, sem reparar que a estamos a excluir da sua capacidade de existir, porque não permitimos o seu mau estar, o sofrimento e a frustração, retirando-lhe as ferramentas indispensáveis para aprender a estar na vida. E se as funções parentais merecem uma reflexão cuidada, a função clínica/ intervenção dos cuidados de saúde mental também. Ao dar aos pais, perdidos nas suas frustrações, normas, indicações de como atuar, de como exercer a sua autoridade protetora sem percebermos de onde nos vem este conhecimento e este saber, percorrendo um caminho indefinido de


competências, de aconselhamento vago e impreciso, é preciso, de facto, repensar a intervenção. Sem a reflexão necessária e a intervenção adequada corremos o risco de deparar com insucesso escolar, abuso de substâncias, violência e uma patologia de desenvolvimento…e, um adulto que sofre irá surgir no futuro, sem capacidade para uma existência satisfatória. Identificar problemas de saúde mental infantil e juvenil é um mundo de complexidade real e efetiva, que constitui sempre um desafio para o profissional de Saúde, pouco habituado ao jogo “de cima para baixo” e “de baixo para cima”, num diálogo onde a criança tem tanto para dizer do seu sentir, como o adulto do seu olhar para ver e entender. O mundo da criança é cheio de uma criatividade e fantasia que facilmente esquecemos, por ter sido nosso e porque entretanto ficamos convencidos que sabemos tudo de tudo, pelo nosso próprio processo de maturação e desaprendemos a função vital do questionamento constante, ao longo da vida. É tão fácil saber quando uma criança tem febre como identificar sintomas ou dar mais atenção a manifestações excessivas de medo, tristeza, ansiedade ou alterações súbitas de comportamento, basta para isso a aquisição de competências e o gosto pela área de função, no sentido de uma valorização cuidada do desenvolvimento da criança e do acompanhamento dos pais, escola e demais estruturas de apoio/intervenção. Prevenir, minimizar e intervir…cuidar! Para entender esta realidade basta ver os relatórios efetuados recentemente, que apontam para uma prevalência de 10 a 20 % de crianças com problemas de saúde mental e apenas 1/5 receberem o tratamento apropriado. Esta realidade leva-nos a pensar que, de facto, existe um vazio grande quer a nível de estruturas direcionadas para, que o despertar para esta constatação ainda não aconteceu – pela competência adquirida/desenvolvida – que a articulação entre o fundamental para debelar e resolver ainda não é uma realidade, em termos mundiais e muito menos uma preocupação consistente dos decisores políticos e intervenientes sociais. Olhar de cima para baixo não chega quando olhar não se cruza com quem olha de baixo para cima, á procura de orientação, interesse, proteção e vontade de crescer saudável como direito fundamental adquirido. Hoje mais do que nunca, ouvem falar da inexistência de futuro e fica-lhes colada a desmotivação e inquietude dos que os rodeiam e em quem acreditam…


E nesta esquizofrénica rede de cuidados de saúde e de saúde mental e infantil onde todos sabemos o que sobra e o que falta, nada acontece. Planos nacionais, indicações internacionais, diretivas e orientações, palavras e intenções muitas, organização á volta desta problemática pouca. Sabemos muito pouco de saúde mental infantil e o que sabemos não tem evidência suficiente para se impor como prioridade. Perante isto, a profissão de enfermagem pelo seu desígnio cuidar, deixa cair esta área para o tal vazio de intervenção, acompanhando os sinais dos tempos e o olhar de ternura e paternalismo, em vez de uma aposta seria e coerente de produzir evidencia, para uma intervenção prioritária, como é esta do cuidar a saúde mental das crianças. Existe este cuidar especializado e nesta área da saúde, mas a concentrar-se cada vez mais nos grandes centros populacionais, enquanto vamos falando de proximidade. Se a família já é o paciente esquecido dos sistemas de saúde, a criança com problemas de saúde mental acompanha este esquecimento. Prevenir, minimizar e intervir…cuidar! Um serviço nacional de saúde com maturidade devida precisa apostar no amanhã para garantir o hoje, ser nacional para deixar a tendência de ser apenas de alguns e para outros tantos e com acesso a todos. O cuidar em enfermagem não pode manter-se preso apenas num discurso recorrente que aposta na visibilidade do tratar e não na efetividade do cuidar que deixa vazias, áreas de suma importância, sem espreitar áreas de oportunidade e apostar na evidencia, mais do que evidente.

PAPEL DO ENFERMEIRO NA SAÚDE OCUPACIONAL João Francisco Roque Crastes Mestre em Enfermagem, Especialista em Enfermagem Comunitária


Enfermeiro nas Consultas Externas do Hospital Dr. José Maria Grande em Portalegre.

O Enfermeiro de Saúde Ocupacional deve deixar claro que o seu trabalho é fundamental para aumentar a produtividade, diminuir os acidentes de trabalho, faltas/tempo perdido de trabalho, diminuindo assim os custos diretos e indiretos da instituição. Para além disso, pode ter um papel de destaque na reabilitação do funcionário e seguimento da atividade da seguradora/médico assistente. A sua forma de trabalhar é geralmente sigilosa para os restantes intervenientes, sendo difícil perceber por vezes os diagnósticos suspeitos/concretizados, exames, tratamentos e prognósticos, sendo ainda desejável que tenha um bom conhecimento da legislação laboral que lhe permita fazer uma correta gestão dos casos. O próprio acompanhamento direto do trabalhador, via telefone ou por visita domiciliária, facilita a cura, aumenta a satisfação do funcionário e encurta a ausência ao trabalho e eventuais limitações profissionais posteriores. É também da sua competência antecipar os principais problemas laborais que previsivelmente ocorram no futuro, como o envelhecimento dos trabalhadores e a evolução global dos mercados, por exemplo. Bem como determinar as áreas em que poderão ser diminuídos os custos de saúde, de forma a aplicar tais valores em áreas mais carenciadas. Pode, ainda, inserir-se em projetos diversos, mesmo que não totalmente dentro do seu ramo de atuação, de forma a demonstrar o seu empenho, capacidade de trabalho e valor para a entidade empregadora, pelo que, deverá estar presente nas reuniões mais importantes, ainda que não convidado inicialmente, deve informar a entidade empregadora do seu desejo em participar e ser aceite. Por último, dado o teor dos assuntos existentes entre funcionário e entidade empregadora, parte dos quais alvo de sigilo médico, o Enfermeiro de Saúde Ocupacional está em posição privilegiada para, sem nunca quebrar esse ponto, defender os interesses de todas as partes, sobretudo quando contraditórios. Por vezes, em reuniões que os envolvidos estão presentes, a sua mediação permite resolver a questão, expondo tantos detalhes quanto as partes envolvidas queiram e reunindo consensos.


Assim, para melhor assegurar e clarificar o seu papel, o Enfermeiro de Saúde Ocupacional, deve delimitar a sua área de trabalho para diminuir conflitos interprofissões ou insatisfação com os resultados da parte da entidade empregadora, criar expectativas/metas a atingir pertinentes para os objetivos da empresa e para os trabalhadores, negociar a interação com os outros departamentos da instituição e adquirir os meios/espaço necessários à execução das tarefas. Paralelamente, deverá criar medidas/variáveis que permitam quantificar/avaliar facilmente o valor do seu trabalho, quantificando todos os custos, antes e durante a sua atuação e apresentando estatísticas dos resultados obtidos por exemplo, número de

consultas

dadas,

número

de

referenciações,

número

de

alterações

comportamentais/redução do risco), traduzindo os benefícios económicos para a empresa. Só assim poderá ser erradicado o falso conceito de que contratar empresas externas prestadoras de serviços ocupacionais fica mais económico ainda que o trabalho sumário desenvolvido não se compare ao que os profissionais de saúde internos produzem. Infelizmente nem todas as instituições conseguem perceber que a ausência de um programa organizado de Saúde Ocupacional é extremamente dispendiosa, aliás, estima-se até que os custos indiretos, muito frequentemente esquecidos, são cerca de cinco vezes superiores aos diretos, segundo alguns estudos. Portanto, é vital tentar quantificar aproximadamente estes valores para cada empresa, pois o que não é medido não chama a atenção e não se pode gerir o que não foi medido logo, demonstrando e provando bons resultados, a equipa de Saúde Ocupacional conquista o apoio necessário da gestão da empresa cliente. São muitos os programas que podem ser desenvolvidos pelos Enfermeiros de Saúde Ocupacional, é desejável que, antes mesmo do programa se iniciar, exista um documento escrito da empresa, onde esteja descrito o programa e se explique o porquê da sua existência. O Enfermeiro de Saúde Ocupacional poderá ter um papel fundamental, completo e integrativo, numa equipa de Saúde Ocupacional, desde que bem explorado. Deve-se analisar a forma de trabalhar do Enfermeiro de Saúde Ocupacional em diversos países, tirando os aspetos mais positivos de cada local e adapta-los á realidade Portuguesa,


para que se construa o melhor perfil de competências. Contudo, são também necessárias ações de sensibilização para as empresas prestadoras de serviços nesta área e para as instituições clientes no sentido de estas perceberem esta potencialidade e assim se criar a necessidade real de existirem profissionais com estas caraterísticas no mercado. O rápido desenvolvimento dos serviços para a saúde no trabalho, em parte, também foi impulsionado pelo programa em expansão da legislação da UE nas áreas da saúde, segurança e proteção ambiental, bem como pela necessidade dos empregadores em responder a essa legislação. Além disso, os serviços para a saúde no trabalho prestados no local de trabalho para dar resposta às necessidades de cuidados de saúde das populações ativas foram identificados como sendo um componente importante da estratégia de saúde pública. Estes serviços também podem dar uma contribuição significativa a outras iniciativas governamentais, como por exemplo a redução das desigualdades na saúde, redução da exclusão social e absentismo por doença e, através da proteção e promoção da saúde da população ativa, os serviços para a saúde no trabalho podem ajudar a reduzir o impacto global da falta de saúde na Europa. Os enfermeiros do trabalho, sendo destacadamente o maior grupo de profissionais de saúde envolvidos na prestação de cuidados de saúde no local de trabalho, responderam a estes novos desafios. Elevaram os seus padrões de ensino e formação profissional, modernizaram e expandiram o seu papel no local de trabalho e, em muitas situações, emergiram como sendo a figura-chave central envolvida na prestação de serviços para a saúde no trabalho de elevada qualidade às populações ativas da Europa. Os enfermeiros do trabalho, a trabalhar de forma independente ou como parte de uma equipa multiprofissional mais alargada, estão na linha da frente para ajudar a proteger e a promover a saúde das populações ativas. Os Enfermeiros do Trabalho tem ainda um papel preponderante que é a sensibilização da classe politica demonstrando que vale a pena apostar na prevenção e promoção da saúde dos trabalhadores, para tal basta que o Ministério da Saúde e à ACT – Autoridade para as Condições de Trabalho faça cumprir todas as leis e orientações emanadas a nível europeu pelos vários estados membros.



CUIDADOS DE PROXIMIDADE E CONTINUIDADE Leandro Manuel de Sousa Cardoso Enfermeiro Especialista em Enfermagem Comunitária Assistiu-se nos últimos anos da história do SNS Português a uma tendência marcada para a centralização dos cuidados de saúde por motivos de vária ordem, nomeadamente devido às políticas económicas e à distribuição geográfica da população. Dentro desta centralização dos cuidados de saúde pode-se também notar uma evidente aposta nos cuidados hospitalares mais diferenciados, que podemos denominar de “hospitalocentrismo”. Os cuidados de saúde prestados à população são focados no tratamento da doença, apostando-se na criação de grandes centros altamente especializados nas diversas áreas médicas sediados nas principais cidades do país. Este tipo de políticas permite um grande desenvolvimento dos centros hospitalares, que absorvem grande parte das verbas destinadas aos cuidados de saúde. Como consequência, verifica-se uma desvalorização dos cuidados de saúde primários, já tidos como determinantes essenciais na saúde da população nos finais dos anos 70 aquando da criação do Sistema Nacional de Saúde Português. Esta sobrevalorização dos cuidados de saúde diferenciados atinge o seu auge numa altura em que surgem estudos e evidência noutros países que sustentam a importância dos cuidados de saúde primários, bem como os ganhos económicos que estes podem trazer quando devidamente valorizados pelas políticas de saúde. Em Portugal, um país com ainda alguma dispersão geográfica e com evidentes desigualdades de acesso aos cuidados de saúde no seu todo parece inato surgirem questões relativas aos conceitos de proximidade. Naturalmente, os cuidados de saúde primários assentam no conceito de proximidade, de personalização dos cuidados, no conhecimento das características de uma comunidade específica. A adaptação dos programas de saúde às comunidades e o estabelecimento de relações de proximidade são uma das chaves para a implementação eficaz desses mesmos programas. O envolvimento de uma comunidade nos cuidados de saúde só pode ser conseguida quando essa comunidade se identifica com as equipas de saúde locais e lhes atribui valor como parceiro da melhoria da saúde da comunidade. Essas equipas de saúde devem ser multidisciplinares tentando alcançar uma visão ampla dos diferentes espectros da comunidade. Neste sentido, os profissionais de Enfermagem têm uma posição privilegiada pois são o grupo profissional com competências mais amplas e que, pela natureza dos cuidados que prestam, podem estar mais próximos das comunidades, exercendo uma influência decisiva nas relações de saúde. A relação de proximidade entre Enfermeiro e utente constitui o principal instrumento de trabalho dos cuidados de saúde primários, validado pela disponibilidade e multiplicidade de conhecimentos deste profissional de Saúde.


Mesmo atendendo à recente criação de diferentes equipas nos cuidados de saúde primários, salienta-se sempre a figura central do Enfermeiro como profissional de referência da comunidade onde a equipa se encontra inserida. O estabelecimento de políticas de saúde que apostem nos cuidados de saúde primários é uma necessidade fundamental quer para o reconhecimento do SNS perante a população, quer como um dos melhores investimentos económicos que qualquer país pode fazer. Não desvalorizando a importância dos cuidados especializados, há a necessidade de rever o sentido das políticas de saúde reforçando os meios humanos e materiais dos cuidados de saúde primários, apostando da promoção da saúde e prevenção da doença e reconhecendo os Enfermeiros como vetores de implementação dessas mudanças. Aproximando os cuidados de saúde das comunidades deparamo-nos com o conceito de continuidade, intimamente ligado ao anterior e não de menor importância. Continuidade de cuidados é um conceito aparentemente novo mas que já merece a atenção das diversas autoridades de saúde mundiais há algumas décadas. Este conceito apresenta a sua maior complexidade no facto de envolver todos os níveis de cuidados de saúde, ou seja na sua transversalidade. A transição do utente entre os diferentes níveis de cuidados de saúde tem de garantir que esses cuidados sejam assegurados com uniformidade e de forma contínua. Provavelmente, o fator mais importante na continuidade de cuidados de saúde será a comunicação. Não existe continuidade se não existir comunicação de informação, evidentemente de quantidade e qualidade próprias. Assiste-se a uma evidente divisão dos diferentes cuidados de saúde, barreiras criadas pelas políticas de saúde e pelos profissionais de saúde, que favorecem o isolamento e não partilha do conhecimento. Os cuidados de saúde só podem ser assegurados na sua plenitude quando o utente atravessa os diferentes níveis de cuidados e todos os elementos envolvidos têm o mesmo acesso a toda a informação acerca daquele processo de saúde ou doença. Recentemente surge em Portugal a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados que é criada com o objetivo de colmatar algumas das carências existentes ao nível da continuidade de cuidados, nomeadamente ao nível dos cuidados pós hospitalares e de reabilitação. Esta plataforma veio dar resposta a muitas das carências que existiam relativamente às necessidades de saúde após internamento hospitalar embora existam ainda muitos processos de saúde/doença que são assegurados na sua transição pelas equipas de cuidados primários. Esta rede assenta no conhecimento multidisciplinar e favorece a partilha de informação entre diferentes equipas abrangendo equipas hospitalares e de cuidados de saúde primários, bem como equipas de unidades prestadoras desses cuidados de continuidade. Estas diferentes equipas são constituídas por diferentes profissionais embora funcionem centradas nos cuidados de Enfermagem, dando relevância ao papel centralizador e abrangente das competências do Enfermeiro. Usando a Rede de Cuidados Continuados Integrados maioritariamente o método de trabalho por gestão de caso, podemos verificar que o Enfermeiro é quase sempre o gestor de casos escolhido pela equipa prestadora de cuidados. A gestão de casos é um dos exemplos da capacidade e amplitude das competências do Enfermeiro bem como do papel integrador da Enfermagem em relação a outras profissões. Os Enfermeiros são agentes de continuidade e de tomada de decisão responsáveis e com um papel determinante e direto na qualidade dos cuidados de saúde. Continuidade e proximidade parecem ser conceitos teóricos distantes mas que, analisados de forma crítica e construtiva, se mostram pilares essenciais na definição das políticas de saúde. São conceitos chave a nível económico, permitindo uma melhor gestão de recursos humanos e materiais, bem como são um fator predominante na satisfação das comunidades em relação aos cuidados de saúde que lhe são prestados.


O futuro do Sistema Nacional de Saúde Português deve ter em conta estes processos e promover planos que envolvam estes fatores como determinantes de saúde da população. Há que repensar a estratégia de centralização dos recursos bem como esbater as barreiras existentes entre os diferentes níveis de cuidados de saúde. Equidade e acessibilidade em saúde pressupõem proximidade, personalização e continuidade dos cuidados prestados ao indivíduo, família ou comunidade, assegurando os cuidados mais adequados a processos de saúde/doença específicos. É evidente a relevância dos profissionais de Enfermagem nestes processos, como agentes de grande amplitude de competências presentes em todos os níveis e equipas de processos, sendo também profissionais de referência nas comunidades abrangidas pelas equipas onde estão inseridos. Políticas de saúde eficazes são políticas que envolvam quer as comunidades onde exercem a sua influência quer os profissionais que nela estão implicados. A valorização das equipas que se encontram numa posição de maior proximidade com a comunidade é uma aposta na garantia de uma melhor saúde da população de um país. Só é possível garantir melhores cuidados de saúde quando se permite que a saúde se encontre equitativamente acessível de forma transversal e personalizada a todos em todos os momentos do ciclo de vida.


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