cultura-digital-br

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hoje já estão cansadas de ver uma imagem bem produzida. Uma imagem que é tremida, desfocada etc. parece ser uma imagem mais realista do que uma imagem bem acabada, bem feitinha. Então, na verdade, sempre que aparece uma coisa nova, isso gera muitas vezes um certo antagonismo. Mas, certamente, esse novo não é uma coisa que está completamente desligado do que se produzia antes, porque tudo isso que foi surgindo, num certo sentido, estava de alguma maneira já presente na cultura. O digital não surgiu do nada e não caiu do céu, por isso que eu não temo algumas tecnologias: porque eu não acho que elas sejam desencarnadas dos processos de produção de subjetividade. Ou seja, os dispositivos, as máquinas trazem consigo, elas exprimem a cultura aonde isso foi produzido da mesma forma que um quadro, um livro, um romance, ou algo do gênero. Não dá para eu me desconectar do que se produz tecnologicamente, como se aquilo fosse inventado do nada. No fundo é o contrário disso: já havia uma necessidade de uma demanda, que ainda não era talvez consciente, mas que já estava lá. Dessa forma, talvez já houvesse uma série de questões na própria cultura que apontavam para essas mudanças que ocorreram depois, tecnologicamente. Quando a gente fala do digital é preciso pensar que, por exemplo, se eu estou falando de uma simulação captacional, ela não se reduz ao digital. O digital é apenas um suporte. A simulação é uma outra coisa. Se eu uso a simulação para pensar o clima, a tecnologia, as mudanças climáticas e outros fenômenos, ou mesmo se eu uso a simulação computacional para produzir um carro e vou testar sua aerodinâmica. Porque muita gente diz o seguinte: quando eu produzo uma imagem de síntese que é fruto de uma simulação computacional, essa imagem de síntese não diz mais respeito a uma realidade preexistente. No entanto, ela tem a ver ainda com o processo de representação, ao contrário do que se pensa. Por quê? Porque se eu testo um protótipo virtual, eu não faço mais um protótipo de carro que é físico, eu faço ele virtualmente e testo ele num computador. Mas se ele vai funcionar depois, é porque justamente esse protótipo virtual representava uma série de fenômenos físicos. O que eu quero dizer com isso é o seguinte: antigamente se pensava com que instrumentos? Muito antigamente usando o mito, usando narrativas. Depois passou-se a testar usando lógica – e a lógica já suponha a escrita. Eu não posso fazer um tratado de geometria se eu não tiver escrita, porque eu 169


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