Revista Anti-Horário: Soluções na Periferia

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REVISTA ANTI-HORÁRIO

SOLUÇÕES SOLUÇÕES

Hortas urbanas semeiam transformação social

Curso de Jornalismo da UEPB Concepção editorial: 06 06 Expediente 01 Emilly Dantas Reportagem/Fotografia 02 Nathália Aguiar Revisão de texto 03 Gabryele Martins Reportagem/Fotografia 04 Maria Leticia Fernandes Reportagem/Fotografia 05 Letícia Ferreira Reportagem/Diagramação/ Projeto Gráfico 06 David Silva Crônica 07 Maria Eduarda Batista Reportagem 08 Antonio Simões Carta ao leitor/Revisão de texto 09 Eva Leite Reportagem/Fotografia/ Diagramação/Projeto Gráfico 10 Angélica Araújo Reportagem 11 Milena Ferreira Reportagem/Fotografia 12 Matheus Gabriel Lima Poema Revista Anti-Horário Ano III Número 3 Março 2024 Professor Orientador Antonio Simões Editoras Letícia Ferreira Eva Leite Foto da Capa Gabryele Martins 01 01 02 02 03 03 04 04 05 05 07 07 08 08 09 09 110 0 111 1 112 2

CartaaoLeitor

ILUSTRAÇÃO: LETÍCIA FERREIRA

SUMÁRIO SUMÁRIO

TUDO É POSSÍVEL PARA AQUELES QUE SONHAM

08 08

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CRÔNICA

CÁLIDO VENTRE

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COMO A ARTE TRANSFORMA VIDAS NA PERIFERIA

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SUBSTANTIVO FEMININO
TEM VEZ E VOZ
46 “TERRA”,
GALERIA MARGARIDA
DESTAQUES POEMA
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POR: LETÍCIA FERREIRA

POR: LETÍCIA FERREIRA LETÍCIA FERREIRA

As comunidades são agrupamentos de pessoas que vivem dentro de uma mesma área geográfica, rural ou urbana, unidas por interesses comuns e que participam das condições gerais de vida. A exemplo das comunidades tradicionais, como Quilombolas, Ribeirinhos e Indígenas. Na biologia, por exemplo, comunidade é o conjunto de todos os organismos vivos, que habitam em um dado ecossistema.

Após a abolição, os escravizados libertos se instalaram em encostas do Rio de Janeiro Sem recursos e renda para aluguéis ou imóveis, eles construíram as suas próprias moradias em lotes inadequados e íngremes. Mas o “boom” das favelas aconteceu entre a década de 1940 e 1980. Época onde a população brasileira pulou de 40 para 120 milhões, impulsionando ainda mais as ocupações irregulares. No dicionário, a definição de favela se resume a falta de infraestrutura, sendo um termo marginalizado ao longo dos anos e utilizado como sinônimo de criminalidade e precariedade

Em síntese, qualquer parte de uma cidade é uma comunidade. Para muitos, o termo visa amenizar o que não precisa ser amenizado. Por que não ter orgulho de ser favelado? Por outro lado, muitos moradores dizem associar o termo “favela” à violência, tráfico de drogas e desordem. Para quem tem essa percepção, o termo ‘comunidade’ soa melhor, e reflete um olhar otimista, organizado, esforçado e de camaradagem. Coisas que de fato existem nesses locais

COMO AS AÇÕES ABORDADAS NESTA EDIÇÃO SÃO REALIZADAS EM ÁREAS COMO AS AÇÕES ABORDADAS NESTA EDIÇÃO SÃO REALIZADAS EM ÁREAS PERIFÉRICAS DOS MUNICÍPIOS DO NORDESTE, OPTAMOS PELA UTILIZAÇÃO DO PERIFÉRICAS DOS MUNICÍPIOS DO NORDESTE, OPTAMOS PELA UTILIZAÇÃO DO TERMO TERMO PERIFERIA PERIFERIA. . MAS E VOCÊ? QUAL A SUA OPINIÃO? CONTA PRA GENTE: ANTIHORARIOPROJETO@GMAIL.COM

REPÓRTERES: EMILLY DANTAS E MILENA FERREIRA EMILLY DANTAS MILENA

REPÓRTERES: EMILLY E

REPORTAGEM REPORTAGEM
CRIANÇAS REALIZANDO ATIVIDADES LÚDICAS AO AR LIVRE. FOTO: EMILLY DANTAS CRIANÇAS REALIZANDO ATIVIDADES LÚDICAS AO AR LIVRE FOTO: EMILLY DANTAS CRIANÇAS ATIVIDADES LÚDICAS LIVRE. EMILLY

No desenvolver de vários projetos, no sentido de fortalecer a cultura local, o Olho do Tempo foi idealizado como uma alternativa educacional, instigando os moradores ao autoconhecimento através do sentimento de pertencimento aos seus próprios valores e ao processo de encantamento movido pelos sons, movimentos, cores e a própria criatividade individual.

A idealizadora e fundadora, Maria dos Anjos Mendes, mais conhecida como Mestra Doci, 71 anos, nascida em Salvador e moradora de João Pessoa, revela que em torno dos olhos d’água nasceu a Escola Viva Olho do Tempo Lá, despertou, através do ensinar, que sonhar é preciso e se torna algo inerente ao ser humano

Um dos maiores exemplos para acreditar que a arte, a música e a dança devem ser abraçadas vem a partir dos jovens, que começaram participando das atividades pequenos e hoje se tornaram jovens educadores sociais, responsáveis por formar e repassar os saberes às novas crianças que chegam para participar do projeto

“O OBJETIVO DESSA ESCOLA É MOSTRAR QUE VOCÊ PODE, VOCÊ SÓ TEM QUE SER O AGENTE DO SEU PRÓPRIO PROCESSO”.

Como é o caso de Maria da Penha Teixeira, mais conhecida como Penhinha, 32 anos, nascida e criada na comunidade quilombola Mituaçu Ela chegou na escola aos 13 anos e, hoje, atua como coordenadora pedagógica Penhinha conta que a Escola Viva Olho do Tempo a instigou a sonhar, e através desse lugar, buscou ir para uma universidade

“Muita gente está na área das artes, da economia, outros na música, gestão ambiental, moda, pedagogia A gente parou para perceber que as pessoas, tendo acesso à cultura, educação e arte, podem ter o lugar de escolha. Escolher o que eu quero ser, o que eu quero fazer. Antes da escola chegar, a realidade era outra. A Escola Viva Olho do Tempo motivou a comunidade a ir para a universidade”.

“Outro ponto a se considerar, é que alguns dos adolescentes que participam do projeto sofrem de defasagem escolar Este é um problema que transcende o ambiente educacional, afetando negativamente o desenvolvimento cognitivo e emocional dos mesmos A partir disso, a escola desenvolveu como solução uma oficina específica, chamada Letramento Inclusivo e Alfabetização O objetivo é entender essas necessidades e as diversas razões que fizeram essas crianças e adolescentes ficarem excluídos do contexto de aprendizagem”.

M A R I A D O S A N J O S M E N D E S . F O T O : E M I L L Y D A N T A S A A A J E . F M L D A M A R I A D O S A N J O S M E N D E S . F O T O : E M I L L Y D A N T A S

“É responsabilidade da escola, não é nossa. A gente trabalha no contraturno, é uma escola informal. Mas a gente assume esse lugar porque cuidamos do jovem em um sentido integral. Então, se ele tem essa dificuldade de aprendizagem, existe alguma coisa que precisa ser estudada, se foi uma ausência, um medo ou trauma”, conta Penhinha

Ela faz questão de explicar o caso de um adolescente que, até o ano passado, tinha escrito na identidade “não alfabetizado” Neste ano, após uma ação cidadã que levou até a comunidade a Casa da Cidadania, vários moradores tiveram a oportunidade de receber a segunda via da carteira de identidade. Um deles foi o garoto que, depois de passar pela escola, conseguiu assinar o próprio nome.

“Parece algo simples. Mas, antes, mostrar a identidade era sinônimo de vergonha para ele. Hoje, se tornou um orgulho”.

O trabalho desenvolvido pela Escola Viva tem conquistado prêmios de reconhecimento ao longo dos anos, como o apoio recebido pelo Criança Esperança e o título de Projeto de Excelência pelo Itaú Esse projeto representa muito mais do que um ambiente para repassar saberes, é um espaço de reconhecimento Por isso, todos aqueles que participam não querem sair jamais “Eu amo tudo: o recreio, os professores que dão muitas coisas legais e diferentes. Por mim, eu ficaria aqui todos os anos da minha vida”, garante Flora Carvalho, 10 anos de idade, educanda e neta da Mestra Doci.

MARIA DOS ANJOS MENDES E “NETO”. FOTO: EMILLY DANTAS DOS MENDES FOTO: DANTAS MARIA DOS ANJOS MENDES E “NETO”. FOTO: EMILLY DANTAS

Os princípios transmitidos pela EVOT incentivam a apreciação pelos recursos naturais e pelos valores humanos fundamentais, promovendo uma convivência coletiva enraizada no respeito. Um dos projetos desenvolvidos pela escola está relacionado à preservação do rio Gramame - uma das principais fontes de abastecimento de João Pessoa e também onde muitos ribeirinhos e quilombolas tiram seu sustento.

Essas iniciativas buscam ir além dos muros da EVOT e abranger a comunidade como um todo Um exemplo é a campanha “Rio Gramame é Luxo, não é Lixo”, que junta outras escolas e também instituições responsáveis pela coleta de lixo na cidade Juntas organizam uma caminhada até o rio, com cartazes e sacos de lixo, simbolizando a coleta de resíduos O idealizador desse projeto é Ivanildo Santana Duarte, 45 anos, gestor de Meio Ambiente e coordenador geral da Campanha Permanente “O Rio Gramame quer viver em águas limpas”.

Nascido e criado no Vale do Gramame, durante sua infância teve um contato direto com o rio, ia pescar e tomar banho, mas não imaginava que ele estava contaminado. E a partir das vivências e histórias contadas por seus pais, ele cresceu com uma responsabilidade e um pensamento do que poderia fazer para manter aquele lugar vivo: “Quando eu cheguei na escola, a Mestra me perguntou qual era o meu sonho E o meu sonho foi esse De manter esse lugar tal como ele é: verde, com um rio limpo, com meus amigos indo tomar um banho e saindo sem medo”, conta Ivanildo

A partir disso, com os saberes da comunidade e juntamente com o saber acadêmico, Ivanildo buscou repassar para as crianças, por meio da educação ambiental, da conscientização e da sensibilização, possibilidades, ideias e práticas sustentáveis para a preservação do meio ambiente.

EDUCAÇÃO AMBIENTAL

FOTOS:EMILLYDANTAS

LIMITAÇÕES

Apesar dos esforços para manter vivo o rio Gramame, o retorno para reverter essa situação ainda é muito singelo. Por ter perdido grande parte do seu leito, ações como o desassoreamento e reflorestamento, e a revitalização do rio e das nascentes, ajudariam a reverter o atual estado em que ele se encontra, mas não é algo tão simples de se fazer. No ano passado, Ivanildo conseguiu com que o poder público trabalhasse na construção de um plano de recursos hídricos, incluindo o Gramame, nas bacias de todo o Estado Dessa forma, ele acredita que mais recursos financeiros seriam direcionados para a preservação do manancial Mas, conforme Ivanildo, a implantação de uma política de preservação e conservação ainda é incerta

“Tem que sempre estar instigando para que outras pessoas se mobilizem e também para dar visibilidade Cada um faz sua parte, mas também queremos que enxerguem aquilo (o problema do rio). É um trabalho diário, é o que o pessoal chama de trabalho formiguinha”, afirma Ivanildo.

E, assim como Ivanildo, Penhinha, Flora, Mestra Doci, todos aqueles que participam desse projeto têm um carinho enorme por esse local. A Escola Viva é uma junção de histórias, pessoas, práticas e coragens, é um abraço apertado reconfortante, uma alegria de dar e receber e, principalmente, a amorosidade de agradecer. Conhecer esse lugar é entender o refúgio acolhedor que ele representa, e que a participação ativa e as experiências transformadoras não são apenas incentivadas, mas tornam-se marcos inesquecíveis na jornada de vida de cada indivíduo

QUADRA DE ATIVIDADES RECREATIVAS DA ESCOLA VIVA OLHO DO TEMPO. FOTO: EMILLY DANTAS DE RECREATIVAS OLHO DO TEMPO. DE ATIVIDADES RECREATIVAS DA ESCOLA VIVA OLHO DO TEMPO. FOTO: EMILLY DANTAS

No dia 10 de outubro de 2023, saímos cedo para nossa jornada rumo à Gramame, localizada na região sul de João Pessoa - PB A viagem de carro foi longa, mas a ansiedade de conhecer a Escola Viva, tomava conta Ao chegarmos na porta, um sino avisava a nossa vinda Somos recebidas com a canção “Ô de casa, ô de fora”, e assim começa a acolhida “Cativante” é a palavra que define a Escola Viva Olho do Tempo, a música, o abraço caloroso, o cuidado, o respeito, as pessoas e o local em si, tocaram profundamente nossos corações e com certeza se tornou uma memória inesquecível. O contato direto com a natureza e a oportunidade de escutar os relatos da Mestra Doci, Ivanildo e Penhinha, nos mostraram a importância que esse lugar tem na vida daqueles que fizeram e fazem parte dessa história. Todo o acolhimento que recebemos das pessoas da Olho do Tempo marcaram nossa jornada tanto profissional quanto pessoal. Partimos com o coração cheio de gratidão pela experiência única que tivemos e com a certeza de que as lições aprendidas nos acompanharão para sempre.

FOTO: MILENA FERREIRA FOTO: FERREIRA FOTO: MILENA FERREIRA

REPÓRTER: LETÍCIA FERREIRA

REPÓRTER: LETÍCIA

REPÓRTER: LETÍCIA FERREIRA

Dados do Relatório das Nações Unidas de 2022 mostram que uma em cada quatro mulheres já sofreram violência obstétrica no Brasil.

A pesquisa “Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado”, realizada pela Fundação Perseu Abramo em 2010, afirma que quando existe situação de abortamento, a taxa de violência contra mulheres durante o atendimento sobe para cerca de 53%

O cenário brasileiro de assistência à pessoa grávida é hostil, e as leva de pacientes a vítimas O abortamento inseguro e o atendimento inadequado estão entre as maiores causas de mortalidade materna no Brasil. Porém, essas mortes atingem a população de forma desigual, a depender de fatores econômicos, geográficos e, em especial, os de raça e os de classe.

Apesar de ser um conceito ainda em construção, a violência obstétrica pode ser entendida como a desumanização da mulher, e pode se apresentar através da violação do corpo desta, na episiotomia, no uso da ocitocina, na falta de anestesia ou no “ponto do marido” Também pode ser a violência psicológica, insultando, impedindo que essa mulher expresse dor ou a forçando a ter um parto natural sem condições para tal; a omissão também é violenta e deixa marcas

Nos últimos anos, esse conceito vem tornando-se cada vez mais visível para a comunidade médica e para as mulheres Mas, ainda assim, são poucas as que conhecem seus direitos

Se mulheres brancas de classe média alta sofrem com a violência e dão os primeiros passos para entender todas as facetas da violência obstétrica, o que as mulheres periféricas sabem sobre? Quem dá o suporte a essas meninas e mulheres durante a gestação e parto?

Mulheresqueservem

A palavra 'doula' tem origem grega e significa 'mulher que serve' Hoje, o termo refere-se à pessoa que dá suporte emocional, informacional e psicológico à mulher intraparto

A doulagem tem inúmeros papéis, seja no acompanhamento da gestante no pré-parto, parto e período pós-parto, ou pela informação, encorajamento, conforto e suporte emocional. Entre estes papéis está também o de proteger a pessoa grávida e a criança contra a violência obstétrica; a presença da doula é traduzida para segurança.

As doulas não substituem o trabalho de outros profissionais da saúde, como médicos e enfermeiros, mas têm papel importantíssimo quando falamos em humanização e proteção da pessoa gestante e seu bebê O projeto de lei n° 3 946 de 2021, que regulamenta a profissão de doula, foi aprovado em março de 2022 no Senado, mas ainda segue em análise na Câmara

MÃOS QUE CONCEBEM MÃOS QUE CONCEBEM MÃOS QUE CONCEBEM

Na Paraíba, uma iniciativa realizada de maneira solitária leva, a dezenas de mulheres periféricas, informação, bem-estar e a doulagem O projeto Acolher PB tenta fazer um contraponto às estatísticas apresentadas anteriormente, nas áreas periféricas da capital João Pessoa Josivânia Félix, de 36 anos, é doula e a idealizadora do Acolher, e foi com ela que conversamos

- QUANDO SURGIU O PROJETO?

Eu fiz o curso de doula e educadora perinatal em 2020, durante seis meses. Sou cadastrada na Associação de Doulas da Paraíba O projeto Acolher surge em 2021

- A PARTIR DE QUAL NECESSIDADE O ACOLHER PB NASCE?

Nasce devido a demanda de mulheres que não conheciam seu corpo, que não tinham empoderamento, mulheres que dedicam suas vidas aos seus filhos e maridos e esquecem de si.

- ATUALMENTE, QUANTAS PESSOAS FAZEM PARTE DA EQUIPE DO ACOLHER?

Somos eu e outra colega minha, a Luana Honorato. Mas ela fica responsável pela parte do apoio mesmo e da divulgação e indicação.

- QUAIS ATIVIDADES SÃO DESENVOLVIDAS DENTRO DO PROJETO?

Nós damos palestras nas escolas, creches, em rodas de conversa Tenho parceria com outros institutos e ONGs, como o CDI Christina Wolpert, que atende crianças e pré-adolescentes em situação de vulnerabilidade; nessas palestras, conversamos sobre saúde menstrual, prevenção de DSTs, violência sexual, conscientizamos sobre gravidez na adolescência. Além disso, temos o trabalho de bemestar, onde levamos tratamento de massoterapia e ventosa que geralmente são realizados em oito sessões, para a comunidade, incluindo as gestantes.

- QUANTAS PESSOAS EM MÉDIA JÁ FORAM BENEFICIADAS ATRAVÉS DAS AÇÕES?

Com a doulagem eu já acompanhei cerca de 30 mulheres, mas incluindo tudo, com palestras e sessões terapêuticas, em média 350 pessoas já foram contempladas

- COMO FUNCIONA O SERVIÇO DE DOULA?

O acompanhamento é totalmente gratuito; muitos começam na conversa, antes do parto, na instrução, as mulheres descobrem que eu tenho esse serviço e me cha faz

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FOTO: REPRODUÇÃO/PROJETO ACOLHER

FOTO: REPRODUÇÃO/PROJETO ACOLHER

ENTREVISTA ENTREVISTA ENTREVISTA

- QUAL A IMPORTÂNCIA DESTE ACOMPANHAMENTO FEITO PELO ACOLHER PARA AS MULHERES PERIFÉRICAS?

Muitas mulheres não conhecem o seu próprio corpo, muitas meninas acordam todos os dias sem perspectivas, sem ninguém para ouvi-las Eu acompanhei o caso de uma moça que não era nem da comunidade, tinha acabado de chegar, e foi abusada por um vizinho Ela não sabia o que fazer Eu a acompanhei até a Cândida Vargas, gostaria de ter feito mais, mas são muitas limitações Acompanhei também uma mulher que ficou muito fragilizada após a gestação. A mãe não queria que ela segurasse o próprio filho, tirou a criança dos braços dela, e eu fiz essa intermediação, explicando a importância daquele momento entre mãe e filho. Através da doulagem, também estive com mulheres que perderam os seus bebês. Muitas ficam em um momento de luto e não possuem nenhum apoio psicológico nos hospitais e maternidades, então eu tento dar esse suporte.

- QUAIS AS MAIORES LIMITAÇÕES?

Para nós que moramos em comunidades, as barreiras são gigantes Eu não posso entrar na casa de uma gestante sem permissão, existe uma situação de violência no local, muitos maridos sequer deixam essas mulheres serem acompanhadas Além disso, eu falo sobre empoderamento e higiene corporal para adolescentes que vivem em casas vulneráveis, e que dividem um sabonete com toda família. Uma delas, por exemplo, tem nove irmãos, e vai para o sinal tentar ganhar algum dinheiro, como falar sobre? Outra questão é que a doulagem ainda está ali como se estivéssemos competindo com outros profissionais, muitos julgam e tem medo. Talvez pensem na falta de graduação, né? Isso limita o levar do conhecimento. O poder público também influencia muito. Principalmente por não termos apoio, o projeto não tem um lugar fixo para atuar Nos foi cedida uma sala na UBS às quintas-feiras, mas nem sempre é possível utilizar U ã b d i h

FOTO: REPRODUÇÃO/EXPOFAVELA FOTO: REPRODUÇÃO/EXPOFAVELA FOTO:

- O QUE ESSAS MULHERES RELATAM?

Elas são gratas, mas também sentem muito medo Eu explico os processos fisiológicos do corpo, sobre a amamentação e elas muitas vezes nunca ouviram falar sobre Muitas querem ser doulas, querem fazer o curso, mas são poucos cursos disponíveis de forma gratuita. Costumam ter vagas limitadas e serem distantes. Como essas mulheres vão se locomover para esses espaços se muitas vezes não tem nem comida em casa?

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ATENDIMENTO BEM-ESTAR. FOTO: REPRODUÇÃO/PROJETO ACOLHER

ATENDIMENTO BEM-ESTAR. FOTO: REPRODUÇÃO/PROJETO ACOLHER

PERFIL
DOULAS É MAJORITARIAMENTE BRANCO NO BRASIL, COM EXCEÇÃO DA PARAÍBA, ONDE 57% SÃO PARDAS OU NEGRAS.
DAS

AUTOR: DAVID SILVA

AUTOR: DAVID SILVA DAVID

FOTO:MARIALETICIAFERNANDES

EDUARDA BATISTA EDUARDA BATISTA

Fumaça não só ensina percussão, mas também oferece um refúgio seguro para as crianças e adolescentes da comunidade. Aos 63 anos, ele divide seu tempo entre sua profissão de mecânico e as atividades voluntárias que desempenha com dedicação e paixão

TRANSFORMANDO VIDAS

A história de transformação se manifesta nas palavras de Thálya Millena, ex-aluna e agora professora de matemática Ela é um exemplo brilhante da influência positiva do projeto em sua infância e adolescência. Hoje, com 25 anos, Thálya destaca a importância do Projeto Molecada em sua formação. “O social, o cultural e o pessoal são aprendizados que carrego comigo. O projeto não apenas me ensinou música, mas mostrou meu papel na sociedade, respeito à minha cultura e o poder da dedicação”.

O projeto, originado de aulas de percussão, mantémse há quase três décadas graças aos investimentos do próprio fundador Ao longo do tempo, alcançou notas mais altas, abraçando outras formas de educação O percussionista não se contentou em oferecer apenas lições musicais, mas também implementou ensinamentos sobre respeito, prevenção de abusos e valores fundamentais para o crescimento pessoal dessas crianças.

A trajetória de Thálya é um exemplo vivo da diversidade de oportunidades geradas pelo Projeto Molecada. “O sonho de toda criança na comunidade era participar do projeto. Ele serviu para mostrar que existem outros caminhos, além daqueles que já esta-

vam expostos. Cresci ali, aprendi a tocar pandeiro e outros instrumentos. Naquela época, seguir pelo caminho errado era simples, pois já estava exposto para quem quisesse. O projeto ofereceu outra alternativa, mostrando que existem caminhos melhores a seguir e que a realidade dessas crianças não se resume apenas àquela”, relata a ex-aluna

"Osocial,oculturale opessoalsão aprendizadosque carregocomigo.”
-Thálya Millena
THÁLYA MILLENA E VOLUNTÁRIOS EM AÇÃO DO PROJETO NO DIA DAS CRIANÇAS. FOTO: ARQUIVO PESSOAL DE THÁLYA MILLENA

O desafio persistente enfrentado pelo projeto é a conscientização da comunidade sobre a importância dessas iniciativas.

“O primeiro desafio são as próprias famílias.Algumasaindanãocompreendem completamente a relevância de ações como essa para o crescimento das crianças”,explicaFumaça.

Outro ponto desafiador está em consolidar a rotina do trabalho pessoal do fundador com os horários para as aulas, o que acaba sendo um desafio, pois não é sempre que ele consegue estar em um horário previamente marcado com as crianças. No entanto, a certeza que essas crianças têm é que o local onde acontecem as aulas de percussão estará aberto toda semana entre uma a duas vezes. Os recursos também são escassos; a renovação do material conta com os custos do próprio bolso do fundador e com o apoio de voluntários e doações para melhoria dos equipamentos

Conversamos com Maria Helena Bezerra, mãe de uma das personagens que participaram do Projeto Molecada. Helena compartilhou conosco um pouco de sua visão sobre a importância do projeto na vida de sua filha e das crianças envolvidas: “Eu acredito que o projeto Molecada teve uma influência significativa na vida da minha filha Na época, eu precisava trabalhar fora diariamente, e ela ficava em casa com seu irmão, cuidando um do outro Por ser uma criança um tanto briguenta, me causava preocupação porque ela gostava de ficar na rua O projeto Molecada teve um papel social crucial, acolhendo, ensinando a tocar instrumentos e a lidar com outras crianças. Isso foi fundamental para a vida dela. Sou grata ao projeto por tudo que ela vivenciou. Se não fosse por isso, ela poderia ter seguido um caminho menos positivo, assim como outras crianças da nossa vizinhança. Essa iniciativa oferece uma solução para os desafios enfrentados por essas crianças. Reconheço a importância do projeto para a nossa comunidade. O tempo que elas passam lá é uma alternativa para evitar que se envolvam em atividades ruins nas ruas O projeto tem feito um papel muito bom na vida de cada criança e adolescente da nossa redondeza ”

VALDENICE PEREIRA DE MACENA (FUMAÇA) E A MOLECADA DO PROJETO. FOTO: MARIA LETICIA FERNANDES
“Transformando barreiras sociais em sons altos de esperança”

A palavra que ecoa nas entrelinhas dessa história é transformação. Transformação de vidas, transformação de perspectivas e transformação de uma comunidade. O Projeto Molecada, sob a liderança incansável de Fumaça, continua a ser uma fonte de esperança e oportunidade, mostrando que o poder da música e da educação pode transcender os limites das realidades periféricas.

O Projeto Molecada é mais do que aulas de percussão; é uma escola de vida. Fumaça, como mentor, não só ensina acordes e ritmos, mas também valores cruciais para o desenvolvimento humano. Promove a cidadania e o respeito ao longo dos anos, impactando positivamente a vida de inúmeras crianças Aqui, o pandeiro é um instrumento não apenas de música, mas de esperança, respeito e solidariedade

ALUNOS DO PROJETO. FOTOS: MARIA LETICIA FERNANDES

Embarquei nessa jornada de me encontrar com Fumaça, no bairro do José Pinheiro, Zona Leste de Campina Grande, no dia 13 de novembro de 2023. Para mim, esse encontro prometia não apenas uma entrevista, mas uma viagem no tempo onde a música, a fé e o voluntariado se entrelaçam. “Nasci e criei” nesta região, como costumamos dizer, e conheço as nuances, os desafios dessa comunidade Tive a oportunidade de estar envolvida em algumas ações no Projeto Molecada durante minha adolescência, participando como voluntária em ações como o Dia das Crianças e atividades evangelísticas, e isso abriu meus olhos para a importância vital dessas iniciativas em comunidades como a nossa

Fumaça, com sua alegria contagiante de sempre e seu famoso bordão quando perguntamos como ele está, ele responde: “Só Alegria!”, compartilhou conosco não apenas sua história, mas a história de muitas crianças que encontraram na percussão uma ponte para oportunidades Registramos a atmosfera das aulas de percussão, onde crianças e adolescentes se entregam ao poder da música.

As paredes calejadas testemunham não apenas as batidas dos instrumentos, mas o ressoar de sonhos que se desdobram. Conversamos sobre os desafios enfrentados, não apenas por Fumaça, mas pela comunidade. A conscientização sobre a importância desses projetos é uma batalha constante, mas Fumaça, com sua resiliência, continua a ser uma âncora de esperança. Ao longo da noite, compreendi que o Projeto Molecada não é apenas sobre percussão, mas sobre proporcionar oportunidades diferentes para crianças que, de outra forma, poderiam ser esquecidas. Essa experiência reforça a ideia de que o bem genuíno está vivo, não apenas nos sons dos pandeiros, mas nas ações altruístas que moldam vidas Ao encerrar este diário de bordo, me sinto grata por ter sido testemunha de uma iniciativa que vai além da música: é uma melodia de transformação social, conduzida pelo compasso firme de Fumaça e ecoada pelos corações de uma comunidade que ousa sonhar

VOLUNTÁRIOSREGANDOAPLANTAÇÃONAHORTADANDARA.FOTO:GABRYELEMARTINS

REPÓRTER: GABRYELE MARTINS MARTINS

Estamos na Avenida Jardim Brasília Do lado ímpar da via, encontramos um conjunto arquitetônico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) O antigo prédio que abrigava o Matadouro Industrial de Olinda, hoje dá lugar ao Centro Cultural e Desportivo Nascedouro de Peixinhos, mas desde a inauguração, em 2006, o lugar, que é administrado pela prefeitura do Recife, sofre com a falta de atenção do poder público

Basicamente, por estar localizado entre os limites das cidades irmãs, nenhuma das gestões quer assumir o investimento no espaço, que inevitavelmente beneficiaria moradores da outra cidade, ou seja, não contribuintes. Da ideia do Nascedouro, o que ainda resiste é o campo de futebol de terra batida e a biblioteca, que conserva a arquitetura original e tem vista privilegiada para a Horta Agroecológica Dandara.

FOTO:GABRYELEMARTINS
VISTADAAVENIDAJARDIMBRASÍLIA, EMPEIXINHOS,RECIFE.

PLANTAR COMIDA PLANTAR COMIDA PLANTAR COMIDA

A horta surgiu em 25 de agosto de 2020, durante a pandemia da Covid-19, numa iniciativa de mulheres da comunidade, que posteriormente ganhou assessoria do Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá, que há trinta anos incentiva a agricultura familiar e a agroecologia. Maria Letícia Menezes, que trabalha na assessoria de comunicação do Centro Sabiá, contou que o projeto de hortas foi fruto de uma emenda parlamentar que fomentou a agricultura em ambientes urbanos, utilizando espaços outrora ociosos e que quinze hortas foram contempladas, além da Dandara: “Esse diálogo com a cidade por parte do Centro Sabiá vem dessa história do combate à insegurança alimentar, da autonomia pras pessoas plantarem sua própria comida sem veneno, né? De fomentar também o comércio local ”

As atividades do Centro, em suma, abrangiam as áreas rurais do estado de Pernambuco Com o passar do tempo foi se notando a necessidade de avançar para os centros urbanos. Mesmo antes da pandemia, o país provou dos efeitos da dependência das rodovias para transportar comida para os locais onde não se planta, como na greve dos caminhoneiros de 2018, que certamente atingiu com mais força lugares com maiores índices de vulnerabilidade social. O Brasil ter retornado ao mapa da fome trouxe à tona questionamentos sobre o acesso à alimentação de qualidade, e a agricultura urbana, sobretudo em áreas ociosas, é uma das formas de resolver esse problema

Embora o trabalho do Centro Sabiá tenha sido fundamental para a Dandara, ela não existiria sem as mãos das pessoas que lavram a terra, cultivam as sementes, irrigam e colhem O grupo de voluntárias conta hoje com cerca de vinte mulheres e um homem, que passam os dias entre mutirões e muito aprendizado para lidar com plantações. Elas são, em maioria, negras, maduras, mães solo e vivem em situação de vulnerabilidade.

Para quem está chegando pela primeira vez na Dandara, a horta pode parecer um amontoado de matos. A explicação disso foi dada pelo técnico em

IRRIGAÇÃOTAMBÉM ÉUMTRABALHOCOLETIVO.FOTOS:GABRYELEMARTINS

agroecologia Gabriel Hirata, que trabalha no Centro Sabiá e está auxiliando a horta de Peixinhos há poucos meses. Ele contou que o sistema de agroflorestas, utilizado pelo Centro, imita a natureza e por isso não tem aquela cara de plantação: “Cobertura do solo é primordial, você meio que reproduz um ambiente mais natural possível, pra conservar a umidade e preservar [o solo] da erosão”

A mureta de cimento e a cerca em estilo alambrado logo chamam a atenção Só há paredes nos limites do terreno do Nascedouro, mas em algumas partes, parece que elas são feitas de plantas. Uma grande cisterna pode ser vista logo após o portão de madeira. Indicando que a comunidade sofre com o insuficiente abastecimento de água.

Viver em Peixinhos, aliás, nunca foi fácil. O bairro, ocupado majoritariamente por pessoas pretas, pardas e pobres, carrega em sua história as marcas da violência, da pobreza, do tráfico de drogas e da ausência de infraestrutura que deveria ser fornecida pelo poder público Em 2020, a coisa piorou, tanto para a comunidade, quanto para o próprio Nascedouro Para além das mazelas que já os acometiam, a emergência sanitária intensificou o desemprego e os sintomas de insegurança alimentar Porém, a excelente parceria entre a Horta Dandara e o Centro Sabiá, veio para conferir ainda mais autonomia às pessoas que trabalham ali, capacitandoas para melhor produzir o próprio alimento e educando-as para que possam tocar o trabalho sozinhas. Assim, garante geração de renda e assegura oportunidades para comercializar a produção.

“Essa autonomia pra elas é interessante, tem que ser Porque o Sabiá mesmo não vai estar aqui pra sempre, então elas têm que chegar e aí já saber o que têm que fazer, né?”, completou Gabriel

MÃOS LAVRAM A TERRA MÃOS A LAVRAM A TERRA

A maior parte das pessoas que se voluntariam no espaço são mulheres. Há apenas um homem entre as agricultoras; ele garante que respeita e aprende muito com as colegas de labuta Clayton Santos está na Dandara há um ano e seis meses e já palestrou em vários intercâmbios feitos com outras hortas urbanas Mas, para ele, o aprendizado maior está no dia a dia:

“Cada mutirão é um aprendizado Amo esse verde aqui [ ] O cuidado que a gente tem com a terra, sabe? Esse toque com a terra, que é uma terapia para nós, melhora a mente, melhora a nossa vida Esse convívio aqui, essa troca de saberes que a gente tem nesse coletivo”, disse Clayton.

Ele não é o único a mencionar os efeitos terapêuticos da horta Dandara. Muitas das mulheres relataram problemas de família, violência doméstica, exploração

no trabalho, desemprego, doenças e o não acesso ao lazer. Infortúnios que acabam sendo mitigados quando se está com as mãos na terra.

Dona Maria José da Silva, mais conhecida como Nalva, é uma das mulheres que está na horta desde o princípio; antes disso, trabalhava como empregada doméstica. Ela ajudou na fundação em 2020, passou todos os perrengues do início das atividades e resiste até hoje na Dandara É, de longe, a mais falante do grupo, e foi quem mais contou histórias Dela mesma, sobre Peixinhos e o projeto: “Para mim, foi uma terapia, porque eu tive depressão, eu tive AVC, tive logo dois, um atrás do outro Então isso aqui está sendo importante para mim, aqui na horta Eu acho que foi não só foi um estudo que eu aprendi, [ ] eu estou aprendendo, eu ainda estou aprendendo.”

REGADAPLANTAÇÃO.FOTO:GABRYELEMARTINS

“Issoaquiéaprendizadopramuitamulherquenão tem nada em casa. Mas quando chega aqui, tem alguma coisinha, a gente dá. Eu mesmo, eu dou [...]

As banana mesmo eu divido. Toma aí. Tem dois meninos? Tem filho? Olha aí… [...] é dando que se recebe,né?”-DonaNalva

FOTO:GABRYELEMARTINS

LUTA PELA ÁGUA

Dona Nalva não nasceu em Peixinhos, mas se criou no bairro e o conhece como a palma das mãos que usa para lidar com a terra. Veio ainda muito jovem da cidade de Bezerros, no agreste pernambucano, para o litoral No interior, a família trabalhava com a terra, a avó plantava e o avô era dono de uma casa de farinha Ela conta que na “cidade grande” não tinha plantação e que chegou a trabalhar no antigo matadouro Apesar das dificuldades, garante que não troca o lugar por nenhum outro: “Eu não me mudo de Peixinho pra algum lugar, trocando por dinheiro não Eu gosto daqui Eu gosto muito daqui Eu digo ao meu filho, ‘a senhora quer se mudar daqui?’ Quero nada! Quero morrer aqui mesmo. O cemitério de Olinda é aqui bem pertinho. Tudo bem pertinho. Tem de tudo. Tem de tudo o que você quiser, bom ou ruim, mas tem.”

Já que não iria se mudar de Peixinhos, restavam duas opções para Nalva: se conformar com o lugar ou pensar num meio de transformá-lo, resolvendo, mesmo que numa pequena amostragem, problemas que afetavam a comunidade Foi assim que, em 2020, ela e outras mulheres começaram a retirar o lixo jogado na lateral da biblioteca e deram início à horta

Maria das Graças é outra mulher que está desde o começo na Dandara Ela é negra retinta, mais madura e de sorriso fácil Passou a manhã contando histórias e piadas, fazendo todo mundo rir. Entre as muitas dificuldades de iniciar a horta, ela lembra da limpeza do local, que se tornou um lugar de desova após o descaso da prefeitura do Recife com o Centro se intensificar. Na área, segundo ela, eram descartados restos de coisas, de bicho e de gente. No total, seis caçambas de lixo foram retiradas de lá.

Superada a limpeza, a horta sofreu com a ação das mudanças climáticas Mesmo que Olinda seja a quinta cidade mais populosa do estado e esteja numa região que não é atingida pela estiagem, sofre muito com a falta d'água É habitual nas comunidades, os moradores passarem dias e até semanas sem água na torneira, tendo que recorrer a cisternas, poços e bombas

No início, elas contavam com mais ou menos 25 mulheres, que se revezavam carregando baldes e puxando carroças. Depois, ganharam os materiais para fazer a cisterna e as próprias mulheres fizeram a obra: “Não tinha essa cisterna, não tinha poço A gente teve que pedir água ao vizinho, a gente carregava carroça, com balde na cabeça, na mão, [ ] a gente aguava pra não deixar morrer, mas a gente não desistiu não Depois veio a cisterna O Centro Sabiá nos presenteou com a cisterna ” , contou Maria das Graças, que diz ainda sentir dores nas costas

VOLUNTÁRIAFAZLIMPEZADOLOCAL.FOTO:GABRYELEMARTINS

Numa das muitas chuvas que castigam o litoral religiosamente todo ano, a horta foi alagada e muito do que se tinha plantado se perdeu: “Na época, deu uma cheia, aqui alagou tudo. A gente tinha acabado de plantar [...] deu muita lama, a gente chegou aqui e atolou o pé na lama Muitos pés [de planta] a gente perdeu, a gente tinha acabado de plantar ” , acrescentou Maria das Graças

O protagonismo na Dandara é feminino Tudo que é visto no lugar foi levantado e feito pelas mulheres A cerca, o muro, a cisterna que é abastecida com água da chuva que cai de um cano alto A horta mudou de fato a vida delas e dos que a cercavam, garantindo além de uma ocupação e geração de renda, acesso à comida de qualidade, sem veneno, variada e em sintonia com a natureza

Entre o que já foi colhido pelas agricultoras podemos citar: banana, mamão, tomate, coentro, berinjela, macaxeira, batata, inhame, pimentão, algumas variedades de pimentas, beterraba, amendoim, pepino, milho, maracujá e ervas num geral. A colheita possibilitou à comunidade ter acesso também a coisas que eles nunca tinham comido, ou nem sabiam da existência, como a folha da mostarda, a rúcula e o açafrão. As receitas sempre são repassadas entre elas e tem doce, chás para todas as exigências e até lasanha feita com vegetais.

AHORTACOMOUMLUGARDEAFETO.FOTOS:GABRYELEMARTINS

PRA NÃO DIZER QUE (SÓ) FALEI DAS PRA NÃO DIZER QUE (SÓ) DAS NÃO DIZER QUE (SÓ) FALEI DAS FLORES FLORES FLORES

Apesar de tudo o que o grupo conquistou com a Dandara, a luta para manter uma horta na cidade é grande O trabalho é duro e demanda muita gente Mas, nem sempre aparecem pessoas em número suficiente para otimizar os trabalhos. Isso prejudica a produção. “No começo a gente alimentava muito a nossa família, agora tá diferente”, lamenta Maria das Graças. A quantidade, que antes produziam, alimentava a família das agricultoras (e de Clayton), sobrando para vizinhos e conhecidos. Hoje, oscila e acaba por apenas complementar o prato.

Além disso, mesmo estando num ambiente urbano, há conflitos por terra Já tentaram, por exemplo, retirar a horta do local várias vezes Numa delas com a intenção de fazer um estacionamento: “Queriam tomar isso aqui da gente pra fazer estacionamento A gente brigou, foi pra luta”, completou Dona Maria das Graças Como se não bastasse, as ruínas do matadouro e a grande quantidade de árvores no local auxiliam a ação de criminosos.

Em março de 2022, o Ministério Público do Estado realizou uma reunião com órgãos da prefeitura do Recife, na intenção de tornar o espaço do Nascedouro um Centro Municipal da Paz (COMPAZ), o que restauraria o conjunto arquitetônico e garantiria investimento público na região, com cursos e atividades de fomento à cultura O relatório do MPPE cita a horta e não faz menção a retirá-la de lá

Entramos em contato por email e por telefone com a gestão de patrimônio da Prefeitura do Recife, para saber a versão deles sobre a situação do local, mas não houve respostas O Batalhão de Polícia responsável pelo bairro também não nos atendeu

AIYÊ AIYÊ

“Aiyê”, do yorubá “Terra”, do português Substantivo feminino: parte branda do solo própria para o cultivo. As mulheres da Horta Dandara, impactadas pela experiência do cultivo urbano, reconhecem a necessidade de passar para frente os saberes aprendidos com a terra: “O que eu aprendi, eu entrego pros meus sobrinhos, pros meus primos, pros meninos

pequenininhos Isso é que é importante: a gente multiplicar o que a gente sabe pros novos que estão nascendo agora, vindo agora ” , explicou Dona Nalva Há quem diga que a terra é mulher, partindo de uma ideia cisnormativa complicada, que envolve gênero, binaridade e concepção. Mas, no caso da Horta Agroecológica Dandara, localizada na Avenida Jardim Brasília, s/n, no bairro de Peixinhos, na Zona Norte do Recife, a terra é certamente mulher e é mulher negra.

D A S C O I S A S Q U E F L O R E S C E M . F O T O : G A B R Y E L E M A R T I N S
“Foi embora um fruto, mas a árvore ficou. E suas raízes são muito fundas paratentaremarrancar”.

Itamar Vieira Junior – Torto Arado

H O R T A D A N D A R A . F O T O : G A B R Y E L E M A R T I N S

Peixinhos faz parte da minha vida. Sempre fez. Parte da minha família ainda mora lá. Minhas lembranças das minhas avós maternas são todas lá, Carmelita na rua do mutirão e Delbanice na rua São Luís. O coração se descompassa indo para a entrevista. Eu cresci tão perto do Nascedouro. 950 metros, para ser mais específica. Me lembro, quando criança, de subir na grade do terraço de casa só pra olhar aquela torre amarela e bonita que destoava da paisagem – muito antes de terminar História, sonhar com Jornalismo ou saber o que era um prédio tombado – e sobre a qual minha mãe me disse: “É o matadouro de Peixinhos”.

Matadouro onde meu avô paterno, Amaro Oliveira, trabalhou durante muitos anos como pintor e era assim que sustentava a família: minha avó e os cinco filhos que eles tiveram. Ele faleceu quando minha mãe estava grávida de mim. Entre nós, sempre houve um rio. O Rio Beberibe, ou [possivelmente] Rio dos Peixinhos para minha bisavó, também permeou a minha família. Dona Antônia Martins, mãe de Seu Ari, a quem tenho o privilégio de chamar de avô, lavou muita roupa nas águas, àquela época limpas, do Beberibe. Ouvi também histórias sobre o curtume, as fábricas de papel e de fosfato e sobre o matadouro.

Naquele 7 de novembro, o céu não estava nada bonito, as nuvens cinzentas o cobriam por completo e fazia muito calor. Até se ensaiou uma chuva, mas ela só trouxe o mormaço. Peguei carona com a minha mãe, que auxiliou na produção dessa reportagem. A Avenida Brasília seguia como eu me lembrava e eu sorri lembrando da possibilidade de estar em dois lugares ao mesmo tempo. O Nascedouro parecia surpreendentemente mais abandonado e intimidador, com os tijolos expostos, o mato crescendo.

A horta é um espaço lindo, que destoa e muito do que o restante do Nascedouro se tornou. Nessa parte, há muitas flores, plantas, sementes e, sobretudo, muitas histórias. Vi minhas avós naquelas mulheres. Mulheres negras como elas. Mulheres das comunidades do bairro de Peixinhos, como Dona Lita e Dona Deda um dia foram. Há tantas ferramentas naquele lugar. Pás, enxadas, regadores, carros de mão, mas o instrumento maior são as mãos que aram a terra. Sigo emocionada com as histórias que tenho o privilégio de contar e sou grata por poder dar voz àquelas mulheres.

Após visitar a Horta Dandara, tenho certeza que o matadouro, lugar que um dia simbolizou a morte, pode ser cada dia mais Nascedouro (ou compaz, como queiram chamar). Aquele lugar que um dia abrigou tanta morte, teima demais e insiste em abrigar vida.

Castelosperiféricos

Sufocando conhecimentos rasos

Tentaram racionar certos saberes

Aqueles que não se encontram em livros

Mas são pichados em paredes

Em ruas que alagam

Mas trazem rimas enxutas

Em vozes que não se calam

E defendem nossas lutas

O meu lugar é vida

O meu lugar é harmonia

O meu lugar é alegria

O meu lugar é a periferia

É o funk, é o samba, é o rap

Floresta de pedra com povo feroz

Poetas marginais gritando alto

Ecoando nosso timbre e nossa voz

Iluminamos o céu

Como se a noite virasse dia

Rabiscamos o papel

E palavras se tornam poesia

Onde barracos se tornam castelos

Pois moram rainhas nessas vielas

Onde sonhos se camuflam em becos vazios

E a arte se expande para além destas janelas

Autor:MatheusGla

POEMA POEMA
ILUSTRAÇÃO: LETÍCIA FERREIRA

REPÓRTERES: EVA LEITE E ANGÉLICA ARAÚJO

REPÓRTERES: EVA LEITE E ANGÉLICA ARAÚJO

REPÓRTERES: EVA LEITE E ANGÉLICA

FOTO:DIVULGAÇÃO/TRT-13

Os dados revelam uma narrativa preocupante: a população feminina continua a enfrentar obstáculos no mercado de trabalho, desde a desigualdade salarial, à dupla jornada de trabalho e estigmas culturais. O cenário é ainda mais desafiador para mulheres e meninas de periferias e comunidades marginalizadas

Os esforços para combater a desigualdade de gênero são pauta constante nos setores sociais e órgãos mundiais, e refletem alguns dos objetivos da Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU) As metas estabelecidas através dos ODS 5 e 10 são eliminar as formas de violência, discriminação e desigualdade de gênero contra as mulheres e meninas em toda parte, buscando assim empoderar e promover a inclusão social, econômica e política de todos, independentemente da idade, gênero, deficiência, raça, etnia, origem, religião, condição econômica ou outra. Na Paraíba, em meio a este cenário, o Tribunal Regional do Trabalho da 13º Região (TRT-13) busca, por meio da Assessoria de Projetos Sociais e Promoção dos Direitos Humanos (ASPROS), reforçar a missão de apoio e valorização do ensino e do trabalho, contribuindo para a construção de autonomia e potencial dentro das comunidades marginalizadas Numa de suas ações mais expressivas, reconhecida nacionalmente, meninas e mulheres negras, indígenas, quilombolas e periféricas são as protagonistas.

SEMENTES DE OPORTUNIDADES SEMENTES SEMENTES DE OPORTUNIDADES

Na 4º edição do projeto Emprega Margaridas, realizada no final de novembro de 2023, as meninas das comunidades indígenas de Baía da Traição e do Conde, carinhosamente chamadas de “Margaridas", chegavam ao prédio do Centro Integrado da Justiça Social (CIJUS), no qual, após dois dias de treinamento, sairiam daquele espaço devidamente encaminhadas para o mercado de trabalho.

Para tanto, foi preciso unir aspectos valiosos e requisitados para uma empregabilidade assertiva, mas que, no entanto, diante da realidade das comunidades participantes, não são de fácil acesso O TRT-13 abraçou essa missão e seus diversos públicos destinados, como conta Jamilly Rodrigues, coordenadora da ASPROS: “Estamos na quarta edição, já trabalhamos com quatro territórios quilombo-

las, duas áreas de periferia e agora dois territórios indígenas, com ações de formação tanto nesse campo do empoderamento como também das questões mais práticas ligadas ao universo do trabalho. Falamos sobre ética no trabalho, sobre questões ligadas aos processos seletivos e sobre assédio moral, para que essas jovens se empoderem e entendam o que pode e o que não pode acontecer dentro de um espaço laboral É um projeto com bastante sucesso, seja no processo de formação e nos depoimentos que nós ouvimos, seja no encaminhamento à aprendizagem e ao mercado de trabalho”

MARGARIDASRECEBEMENCAMINHAMENTOAOTRABALHO DIGNOESEGURO.FOTOS:EVALEITE

Meninas e mulheres dos territórios indígenas Baía da Traição e Conde participam da quarta edição do Emprega Margaridas.

FOTO:EVALEITE

Pensar em iniciativas como essa parte de uma análise cuidadosa sobre os aspectos inerentes à inserção de mulheres no mercado de trabalho, considerando fatores de gênero, identidade, pertencimento, igualdade, entre outros A partir disso, a edição trouxe uma reflexão sobre o papel da mulher, desde a construção social e naturalizada da maternidade e do trabalho doméstico, às mudanças e oportunidades de conquistar cada vez mais espaço em outras posições sociais, seja no trabalho ou nas localidades em que residem. Os bate-papos foram liderados por um time de profissionais e estudantes parceiros do Tribunal, que apresentaram olhares de esperança e entusiasmo sobre o futuro do público feminino com o emprego digno e em carreiras nas áreas de empreendedorismo, computação e tecnologia da informação.

Na prática, as participantes também desenvolveram técnicas de comunicação e oratória, além da elaboração de currículos Para além da montagem do documento, que elenca informações acadêmicas e profissionais, questões como vivências sociais, histórias de vida e aspirações para o futuro são um destaque e diferencial que o TRT-13 considera, a par-

tir do “Currículo Social”. A iniciativa tem o intuito de valorizar as experiências pessoais dessas jovens e procurar entender como elas podem associar essas questões, de maneira positiva, à construção de suas carreiras As informações são incluídas no banco de dados do Tribunal, que providencia o encaminhamento dos currículos sociais das participantes para as oportunidades de trabalho

Os resultados dessas experiências floresceram entre as “Margaridas”. Em meio a tantas adversidades e obstáculos impostos a essas mulheres, o conhecimento é o solo fértil do qual brota a esperança de dias melhores. Para a jovem Aynara Ciriaco dos Santos, 14 anos, moradora da aldeia São Francisco, em Baía da Traição, o projeto tem sido como uma bússola apontando para o seu futuro: “Fui encaminhada para o projeto através da diretora da escola onde estudo, e o Emprega Margaridas me ajudou bastante a compreender muitas questões e problemas que eu não entendia antes, está me dando um encaminhamento maravilhoso para uma profissão que eu queira ocupar algum dia”, afirma a adolescente Assim como Aynara, Maria Eloyza também é potiguara da Baía da Traição A jovem, de

JAMILLYRODRIGUESAPRESENTAAPROGRAMAÇÃO ÀSMARGARIDAS.FOTO:EVALEITE

18 anos, tem o desejo de cursar Direito, e conta que se sentiu ainda mais instigada a partir do bate-papo sobre a Constituição, os direitos das mulheres, ética e moral Ela observa, com entusiasmo, a importância de oportunidades de aprendizado como essa, que as permitem alçar vôos maiores tanto nos estudos, quanto no mercado de trabalho.

O Emprega Margaridas não só capacita meninas e mulheres, forma cidadãs conscientes, responsáveis e responsivas em ambiente laboral, que são munidas de conhecimento acerca dos seus direitos e deveres, e instruídas para identificar as melhores oportunidades de emprego, afinal, não é só sobre dinheiro, mas também sobre dignidade: “É importante que as jovens saibam o que é um trabalho decente e digno, que na hora de procurarem um emprego, elas não procurem qualquer ambiente de trabalho, só por conta de salário A gente sabe que o salário é importante, mas que elas possam procurar um local onde serão tratadas de forma digna”, ressalta Francineide Dias, integrante da ASPROS. A servidora, que realizou um bate-papo sobre rotinas administrativas e ética no tra-

balho, foi uma das palestrantes da quarta edição do programa, e acredita na educação e no conhecimento como agente transformador: “Isso abre um leque de oportunidades Nem todo mundo, nem todas as jovens que vão entrar no mercado de trabalho sabem alguns conceitos que a gente abordou nesta edição, então isso é muito importante, elas conseguem ter um diferencial”.

Das quatro edições já realizadas, três foram em João Pessoa, com populações das regiões periféricas e quilombolas Alto do Mateus, Paratibe e Muçumagro, e uma em Campina Grande, em São José da Mata Só em 2023, mais de 160 meninas e mulheres foram diretamente beneficiadas com o projeto, sendo inseridas no mercado de trabalho de forma imediata ou encaminhadas às vagas de emprego Desde então, o projeto vem ganhando espaço para além das barreiras entre centro e periferia, e o impacto positivo, observado nas experiências das jovens participantes, também pode ser traduzido em resultados. O TRT-13 tem se destacado no cenário nacional por sua abordagem inovadora e comprometida com a justiça

O TRIBUNAL CELEBRA INICIATIVAS QUE PROMOVAM A DIVERSIDADEEINCLUSÃO.FOTO:DIVULGAÇÃO/TRT-13

social e os direitos humanos, o que conferiu à entidade o recente prêmio de Inovação Social 2023, com o programa Emprega Margaridas, no Prêmio de Inovação Judiciário Exponencial 2023, evento realizado a partir das iniciativas de órgãos do sistema judiciário de todo o Brasil na busca por melhorar o acesso e o desempenho do serviço público A conquista marca o primeiro ano da gestão da ASPROS, reconhecendo sua importância social, formando lideranças femininas e empregando mulheres em situação de vulnerabilidade, além de impulsionar o desenvolvimento dos programas da pasta para atingir públicos mais diversos.

A democratização dos espaços, alinhada às iniciativas de promoção da igualdade de gênero e implementação de políticas públicas que envolvam diretamente os direitos do público feminino são aspectos de grande importância que refletem nos números negativos mostrados em pesquisas No boletim da Pnad referente ao 4º trimestre do ano passado, das 90,6 milhões de mulheres com 14 anos ou mais, 42,8 milhões estavam fora da força de trabalho, e 1,9 milhões delas eram consideradas desalentadas. O termo, segundo a pesquisa, caracteri-

za mulheres que possuem o desejo de trabalhar, mas que se deparam com a falta de estímulos na procura, por acreditarem que não encontrarão vagas Os motivos que justificam a existência e persistência desse sentimento entre o público feminino são inúmeros, e perpassam desde a falta de incentivo à escolaridade, à exaustiva jornada do trabalho materno e doméstico, ou à discriminação que ocorre ainda nas entrevistas de emprego. Quando já inseridas num ambiente de trabalho, além da desigualdade salarial, as mulheres enfrentam obstáculos no desempenho de suas carreiras, sendo impedidas de chegar aos cargos de alta gestão, como direção e gerência de empresas.

Nesse sentido, acreditar que é possível mudar o campo, e mostrar isso, na prática, vai muito além da reafirmação da potência feminina e do cumprimento dos direitos e deveres dessas cidadãs Com isso em mente, as atividades do Tribunal se desdobram para além do Emprega Margaridas, abraçando o público feminino de outras faixas etárias, em diferentes cenários e projetos, nos quais discutem inovação, ciência, empreendedorismo, sustentabilidade, tecnologia, mercado de trabalho e empoderamento

“PENSANDO NOS PROJETOS DE FORTALECIMENTO E DE PROTAGONISMO FEMININO DENTRO DO TRIBUNAL, HOJE, 50% DAS MULHERES OCUPAM CARGOS DE GESTÃO, ESSA REALIDADE ERA BEM DISTANTE NO INÍCIO DO ANO. SÃO TEMAS QUE PRECISAM SER DISCUTIDOS, RESPEITANDO AS CONSTRUÇÕES DE CADA GRUPO”

- JAMILLY RODRIGUES

FOTO:DIVULGAÇÃO/TRT-13

PERIFERIA: ONDE FLORESCE A PERIFERIA: A

PERIFERIA: ONDE FLORESCE A ESPERANÇA

Ancorados na Agenda 2030 da ONU, que pauta o desenvolvimento sustentável, e comprometidos em promover a dignidade humana garantida pela Constituição Federal, o TRT-13 abre as suas portas para toda a população paraibana: “Entendendo que a Paraíba é um Estado, no qual existe uma população quilombola, indígena e cigana significativa, e que infelizmente segue o ritmo do Brasil no que tange às questões de violência ligadas à população LGBTQIA+, sobretudo a população trans, entendemos que é importante uma atuação mais direta”, afirma Jamilly Rodrigues De acordo com a assessora, a ideia de criar uma unidade dentro da gestão, voltada para o planejamento e desenvolvimento de ações sociais, é fortalecer projetos que tenham como público participante pessoas em situação de vulnerabilidade social, de modo que o Tribunal possa contribuir, de maneira mais efetiva e humanizada, com a cidadania dessas pessoas Com base nisso, a ampliação do campo de atuação da gestão recebeu o selo diamante, prêmio concedido aos tribunais que exercem sua função com resultados expressivos

OUTROS PROJETOS DA ASPROS:

EMPREGABILIDADE NA DIVERSIDADE EMPREGABILIDADE NA DIVERSIDADE NA

O projeto visa acolher, capacitar e encaminhar pessoas em situação de vulnerabilidade social ao mercado de trabalho, e faz parte das ações promovidas pelo Programa Trabalho Seguro, da Justiça do Trabalho. Na primeira edição, em 2023, o tema proposto foi “Democracia e Diálogo Social como ferramentas para construção de meio ambiente de trabalho saudável e seguro”, com o público LGBTQIA+, no qual foi obtido alcance de 20 pessoas participantes, dentre as quais 8 foram contratadas

Projeto itinerante pela Paraíba, é voltado para o público em situação de vulnerabilidade social, periferias, territórios indígenas, quilombolas e imigrantes, e busca promover espaços de diálogo, sensibilização e empoderamento, através de atividades que tratam de temas como direito do trabalho, assédio moral, violência doméstica, sustentabilidade e serviços sociais de tecnologia, inovação e saúde, com atendimentos médicos e odontológicos.

TRT-13 EM MOVIMENTO TRT-13 EM MOVIMENTO TRT-13 EM MOVIMENTO FOTOS :DIVULGAÇÃO/TRT-13

Cientes de sua grande diversidade e das lacunas sociais presentes em todo o território nacional, o TRT13 promove ações focadas na conscientização, valorização e respeito aos indivíduos No entanto, ainda existem entraves para a realização dos projetos. Para Jamilly Rodrigues, é necessário mudar a visão que as populações têm, sobretudo as de periferia e em situação de vulnerabilidade social, acerca da justiça social no Brasil: “Elas entendem a justiça muitas vezes como uma instituição muito punitiva. Então, nós estamos abrindo caminhos, e para isso, foi muito importante criar, dentro da unidade, um laboratório de escuta ativa Todas as nossas ações são dialogadas A gente escuta as demandas para depois pensar nas ações E isso tem sido muito importante porque nós fomos abrindo os caminhos, nos apresentando”, ressalta a assessora Com a abertura de mais vagas e oportunidades para mulheres, pessoas com deficiência, negras e trans trabalhando no Tribunal, além da repercussão positiva dos projetos e programas sociais, o cenário vem mudando, e a expectativa é que essas ações possam ser levadas cada vez mais para o interior do Estado. Ainda, na perspectiva do TRT-13, é preciso um pouco mais de visão social por parte do setor privado, bem como das autoridades públicas. É preciso, além de furar a bolha do sistema de produção capitalista, lutar contra o machismo e o racismo estrutural.

É um trabalho cuidadoso que perpassa pela educação e conscientização, para que só então ocorra quebra de paradigmas: “O problema é profundo e complexo É preciso que cada pessoa, cada órgão e setor da sociedade assuma a responsabilidade pela mudança”, ressalta o presidente do TRT-13, desembargador Thiago de Oliveira Andrade.

Ser vista, ouvida e reconhecida, sem distinção étnica ou de gênero é, hoje, sobretudo na realidade da população feminina de origens periféricas, na Paraíba, sinônimo de conquista e liberdade, tanto no estímulo ao ensino básico e superior, à capacitação e empreendedorismo, assim como a valorização de identidades, histórias de vida e habilidades inovadoras O feminino resiste e persiste na busca por um espaço digno e justo, no qual possam expressar seus objetivos e auxiliar suas próprias localidades E, através do desenvolvimento constante das atividades da ASPROS, que reafirmam o compromisso do Tribunal na promoção dos direitos humanos através de ações próprias e em parceria com outras instituições, o órgão mostra que essa é uma realidade possível, especialmente para as Margaridas. Caminhando lado a lado com o público, chegando às periferias e populações socialmente vulneráveis é

FOTO:DIVULGAÇÃO/TRT-13

DIÁRIO DE BORDO

Conhecer o projeto Emprega Margaridas foi uma grata surpresa. Não só ele como tantas outras iniciativas encabeçadas e apoiadas pelo Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região, por saber que pessoas e órgãos públicos estão ligados e cientes de que o conhecimento e as oportunidades podem mudar o futuro daqueles que, naturalmente, são podadas por uma sociedade injusta, machista e preconceituosa. Dentro do possível e com algumas limitações, é verdade, o Emprega Margaridas age como uma bússola apontando para o futuro, mas não só isso: o projeto dá o caminho. E um dos pontos de partida está no prédio do CIJUS, que cheio de cores e sorrisos, abraça a esperança daqueles que lá entram, e abriu as portas para o Anti-Horário o conhecer de pertinho. Em 28 de novembro de 2023, ocorreu a visita às instalações do CIJUS. Em cada sala e laboratório, existiam grupos participantes dos projetos, sendo capacitados e ouvidos pela equipe da ASPROS, que leva muito à sério o lema da diversidade e inclusão. Ouvir suas histórias de vida, conhecer seus planos e limitações, ouvir as vozes de quem faz e participa, algumas sob o relato cuidadoso da assessora Jamilly Rodrigues, nos fez querer ainda mais transmitir a dimensão desse recorte de esperança que atravessa o caminho de centenas de meninas, mulheres e, importante e igualmente, tantos outros cidadãos.

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ANTI-HORÁRIO NA MÍDIA ANTI-HORÁRIO NA MÍDIA ANTI-HORÁRIO NA MÍDIA

Já desde a primeira edição, lançada em março de 2023, a Revista Anti-horário vem ganhando espaço na mídia local, em premiações pelo Brasil, e até no cenário internacional do Jornalismo de Soluções. Confira os destaques:

MATÉRIA DA MATÉRIA DA

EMBRAPA EMBRAPA SOBRE O ESTUDO DESENVOLVIDO SOBRE O ESTUDO DESENVOLVIDO O POR UM DOS PESQUISADORES DA POR UM DOS PESQUISADORES DA POR UM

EMPRESA, ENTREVISTADO PELAS ENTREVISTADO EMPRESA, ENTREVISTADO PELAS REPÓRTERES LETÍCIA FERREIRA E NATHÁLIA LETÍCIA REPÓRTERES LETÍCIA FERREIRA E NATHÁLIA

AGUIAR: AGUIAR: AGUIAR:

DESTAQUES DESTAQUES DESTAQUES

DEPOIMENTO DA PROFESSORA CRISTIANE F. COSTA SASSI, COORDENADORA DO PROJETO “CORAL EU

DEPOIMENTO PROFESSORA F. COSTA SASSI, COORDENADORA “CORAL EU

DEPOIMENTO DA PROFESSORA CRISTIANE F. COSTA SASSI, COORDENADORA DO PROJETO “CORAL EU CUIDO”, QUE FOI NOTICIADO NA 2º EDIÇÃO DA REVISTA ANTI-HORÁRIO: CUIDO”, QUE FOI NA º CUIDO”, QUE FOI NOTICIADO NA 2º EDIÇÃO DA REVISTA ANTI-HORÁRIO:

“Parabenizo aos idealizadores da revista, com reportagem importante sobre a diversidade da Paraíba Como coordenadora do projeto do Coral Eu Cuido, quero parabenizar, em particular, aos alunos que nos entrevistaram Todos com muito entusiasmo, atentos aos detalhes da fala de cada um de nós e foram fiéis aos relatos Reflexo de uma matéria recheada de conteúdo informativo e fidedigno. Ficamos todos impressionados com o resultado da reportagem. Informo que usei a revista como uma fonte de pesquisa em minha disciplina Bases para Educação Ambiental, ofertada aos alunos do curso de Engenharia Ambiental, da UFPB”.

DUAS REPORTAGENS DA REVISTA ANTI-HORÁRIO, 1º E 2º EDIÇÃO,

DUAS REPORTAGENS DA REVISTA ANTI-HORÁRIO, 1º E 2º º E 2º EDIÇÃO,

FORAM FINALISTAS NA CATEGORIA JOVEM JORNALISTA, DO 2º

FINALISTAS CATEGORIA JOVEM JORNALISTA, DO º

FORAM FINALISTAS NA CATEGORIA JOVEM JORNALISTA, DO 2º PRÊMIO MOL DE JORNALISMO PARA A SOLIDARIEDADE: DE JORNALISMO PARA PRÊMIO MOL DE JORNALISMO PARA A SOLIDARIEDADE:

O prêmio é uma iniciativa do Instituto MOL, com o intuito de reconhecer o trabalho de profissionais e estudantes da comunicação de todo o Brasil, destacando temas importantes para o exercício da cidadania em nosso país. As estudantes de Jornalismo da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), e integrantes do projeto de extensão Anti-horário, representaram a instituição com as reportagens: “Sereias da penha: a arte de transformar mulheres”, das repórteres Emilly Dantas, Milena Ferreira e Rillery Venâncio; e “Bendito árido”, da repórter Letícia Ferreira A conquista foi destaque na imprensa local, com reportagem na TV Paraíba e notícia no site da UEPB

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