Mímesis e Ficção

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Sônia L. Ramalho de Farias

O falso mentiroso. Ela evidencia-se, como foi dito atrás, a partir mesmo da problematização da dicotomia falso/verdadeiro pelo título paradoxal do romance. Este reconfigura a questão do fingimento literário, reatualizando o mesmo paradoxo já formulada por Sartre (2005, p. 49) nas páginas de sua autobiografia: “O que acabei de escrever é falso. Verdadeiro. Nem verdadeiro nem falso, como tudo que se escreve sobre os loucos, sobre os homens”. As palavras de Sartre, desconstruindo o logocentrismo platônico, inaugurador do “controle do imaginário” na tradição ocidental, traduzem o questionamento do filósofo moderno acerca da linguagem como detentora da verdade. A aparente indecidibilidade (DERRIDA, 1972) do filósofo francês, contida no paradoxo, trai, no entanto, um desejo de autenticidade ou um compromisso com a exatidão do relato, que ele sabe, de antemão, impossível de alcançar num registro memorialista, semantizado como “delírio”: Relatei os fatos com a exatidão que minha memória permitia. Mas até que ponto creio no meu delírio? Esta é a questão fundamental e, no entanto, não sou eu quem decide sobre ela. Vi posteriormente que podemos conhecer tudo em nossas afeições exceto a sua força, isto é a sua sinceridade. (SARTRE, 2005, p. 49).

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