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CORREIO BRAZILIENSE Brasília, segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Os 50 anos de carreira de Tony Ramos guardam histórias valiosas. Em entrevista ao Correio, o ator relembrou um pouco a trajetória de sucesso na televisão, no teatro e no cinema

Umaprofissãodifícil » PAULA BITTAR ESPECIAL PARA O CORREIO

É

uma unanimidade dizer que Tony Ramos sempre foi um grande ator. Para o público, é homem que se inventa em diversos e inúmeros personagens a que deu vida. A vontade de seguir pelo mundo da dramaturgia surgiu ao assistir no cinema a outro importante ícone, Oscarito. Nas matinês de domin-

go, imaginou um dia também ser projetado na tela. Antônio de Carvalho Barbosa é do Paraná, mas viveu a juventude em São Paulo. Foi criado pela mãe e pela avó., pessoas que apontam como essenciais para sua formação. Deram a base para começar a encenar com apenas 16 anos. A convicção de estar no caminho certo nunca o abandonou. “A dramaturgia serve para discutir a alma humana”, reflete. Ao longo dos 50 anos de profissão, com quase 200 personagens, conquistou o respeito de todos que lhe assistem.

>> entrevista TONY RAMOS Jorge Rodrigues Jorge/Carta Z

um ser liberto. Há que se tomar cuidado com isso. Ali havia um propósito muito claro. Era um filho que recusava toda a fortuna do pai. Frente a isso, dizia que nem a roupa que o dinheiro do pai comprou queria levar. Capítulo 19. A cena foi feita com muito cuidado, por causa da censura feroz da ditadura militar. Mas, quando a dona Janete Clair explicou a sequência ao censor, ele entendeu. É necessário ter sensibilidade para entender o objetivo de uma cena.

Como a dramaturgia surgiu na sua vida? Quando teve a certeza de que queria ser ator? Isso começou desde a minha infância. Sou de uma geração formada no cinema. Na minha infância, tinha o teatro também, mas o cinema era a diversão mais popular. Comecei a ir com a minha mãe e avó. Nas matinês de domingo, assistia a todos os filmes. Foi assim que descobri Oscarito, um dos maiores nomes do cinema brasileiro. Ele veio de uma família tradicional do teatro de circo. Era um grande comediante. Tenho certeza que qualquer jovem que assistir ao Oscarito e ao Grande Otelo hoje vai se rachar de tanto rir. Ao mesmo tempo, havia muita humanidade no que ele fazia, com o que me identifiquei. Brincava com a minha avó e dizia que queria ser um Oscarito na vida. Ela respondia: “Tem que estudar, menino. Para de ficar sonhando com essas coisas”. Segui o caminho que ela queria. Estudei e continuei sonhando com Oscarito.

Você acha que o nu é feito de forma gratuita hoje? O que é melhor é não ter o tabu. Vivemos tempos melhores. Os jovens não queiram saber o que foi censura. É um horror. Acredito que tem que ter compreensão. Por exemplo, não acho que tem que ter sexo frontal às 21h30 em TV aberta. Isso não me classifica como censor. Já uma cena de cama em uma novela à noite não vejo problema. Não podemos ter o pé atrás por pensar que vai denegrir a família brasileira.Vamos parar com esse discurso. Cumpre a todos nós discutir o nu e outros assuntos, como o homossexualismo. Temos que tratar essas questões com seriedade e maturidade. Quando houver exageros, todos temos que discutir se está apropriado ou não. Se alguém me pedir para ficar nu, vou questionar sobre o propósito para a cena. Ficar nu não é um problema, e sim o que motiva essa ação. As pessoas esquecem que o maior perigo é a internet. O perigo é silencioso. Para mim, a televisão tem compromissos com horários. Temos que ter bom senso em tudo e isso passa por ética e estética.

Como surgiu seu primeiro trabalho? No final de 1963, descobri um programa na televisão Novos em foco, na TV Tupi de São Paulo. Era feito ao vivo e dirigido pelo grande jornalista Ribeiro Filho. Ele era uma referência no rádio e foi muito importante com o surgimento da televisão. Ribeiro Filho criava programas de dramaturgia a partir da notícias do jornal diário. De manhã ele lia os jornais, apanhava uma boa história e escrevia um esquete de 20 minutos para apresentar à tarde. Ele dava a chance para novos atores. Fiz o papel e, para minha surpresa, pediu que eu ficasse fixo no programa. O Cassiano Gabos Mendes me viu e fui aprovado para uma novela que seria escrita por George Durst. Depois disso, nunca mais parei.

Teve algum momento que pensou em desistir ou reavaliou se queria seguir como ator? Desistir jamais. É o que eu gosto de fazer há 50 anos e quatro meses. É a minha sobrevivência. Criei a minha família dessa maneira. Tenho maior orgulho de fazer parte dessa turma e respeito muito meus colegas. Sei o quão difícil a profissão é e quanto as pessoas imaginam glamour por detrás disso. Imaginam certa sofisticação e vidas de prazeres. Isso é um engano. Dizem que artistas causam e descasam mais. O artista está mais exposto a curiosidade pública. Mas quantos advogados e engenheiros que se casaram várias vezes e ninguém sabe? São anônimos.

Você tinha 16 anos quando estreou a primeira novela. Era muito jovem. Quais eram os seus sonhos naquela época? De ser um ator reconhecido e não deixar de estudar. Tinha a consciência disso. Ouvia muito os meus colegas da época dizer que ator burro não dava. Era uma brincadeira que se fazia. Continuei estudando, apesar de trabalhar o dia inteiro. Tinha uma perseverança mesmo sabendo que era uma carreira muito difícil. Antônio de Carvalho Barbosa é seu nome de batismo. Como surgiu o nome artístico? Ribeiro Filho me disse que Antônio era um nome muito formal para minha idade, na época. Ele me perguntou se Tony estava bom para mim. Aceitei. Ele falou que, de todos os nomes da minha família, o Ramos era curto e funcionava. Lembro como se fosse agora que respondi: o senhor é quem sabe. Não teve nada a ver com numerologia.

Não acredite no tapinha nas costas e em prêmios. Não é isso que tem que te motivar, mas sim o respeito de quem te assiste” Arquivo/TV Globo

Carlos Silva/CB/D.A Press - 29/5/95

O primeiro papel na TV foi como filho de Vida Alves e Juca de Oliveira, os protagonistas da novela A Outra (1964). Ter contracenado com eles soa como presságio do sucesso que você é hoje. O que significou essa experiência? Eu prestei muita atenção neles. Ouvia muito o que DonaVida e o querido Juca falavam. Ele deve estar com uns 70 anos e eu estou com 66. Hoje, diferença não é tão grande como naquela época. Com apenas 16 anos, olhava para o Juca já um ator consagrado. Sabia que eu tinha que beber daquela fonte. Eu os pertubava muito, no bom sentido. Queria saber se a cena estava boa e ouvir o que eles tinham a dizer. E, por tabela, também aprendi com os colegas, como Walmor Chagas, Georgia Gomide, Elias Gliezer, Lima Duarte e Laura Cardoso. Olha os professores que tive.

www.correiobraziliense.com.br Confira os principais personagens vividos por Tony Ramos.

O ator na novela Baila comigo: galã

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Você protagonizou o primeiro nu em uma novela brasileira com o personagem Márcio Hayalla em O astro, de Janete Clair. Como você vê esse marco para a história da dramaturgia na TV? Os pudores ainda existem. Essa questão é muito discutida. Não é por estar nu que é

Acredita que essa curiosidade pela vida pessoal é uma das mazelas da profissão? Hoje, anda tudo muito banal. Um ator mordendo uma empada é notícia. Escrevem que os atores são iguais às pessoas normais. Claro que são como todo mundo! Têm unha encravada, dor de dente, alegria, sofrimentos. É como qualquer ser humano. Banalizou-se isso. Estou vacinado já. Não tenho Facebook nem Twitter. Não sigo ninguém. Uso o computador da maneira mais racional e lógica. Mas não acredito que essa curiosidade seja um problema. Acredito que as dificuldades são as mesmas de quando comecei. É preciso ter perseverança e determinação. Saber que o sucesso é irmão do fracasso. Sempre digo ao jovem ator que, se ele estiver atrás do sucesso imediato e definitivo, para mudar de profissão. Mas, se quiser desenvolver a sua alma, o corpo e o intelecto a serviço de personagens inquietantes na carreira, prossiga. Não acredite no tapinha nas costas e em prêmios. Não é isso que tem que te motivar, mas sim o respeito de quem te assiste.

Em A próxima vítima: sucesso na tevê

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