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Delimitou-se teoricamente o campo da saúde coletiva e, nessa perspectiva, o estudo do processo saúde-doença teria como foco não mais o indivíduo ou o seu somatório, mas a coletividade (as classes sociais e suas frações) e a distribuição demográfica da saúde e da doença (ESCOREL, 1998). Portanto, o movimento sanitário, entendido como movimento ideológico com uma prática política, constituiu-se a partir dos DMPs em um confronto teórico com o movimento preventivista liberal de matriz americana e com sua versão racionalizadora proposta pela burocracia estatal. O pensamento reformista, que iria construir uma nova agenda no campo da saúde, desenvolveu sua base conceitual a partir de um diálogo estreito com as correntes marxistas e estruturalistas em voga. O ano de 1974 marcou o começo de uma importante inflexão política do regime militar que inicia o processo de abertura, completada pelo último presidente militar (1979-1984). Esses anos são marcados pelas críticas ao regime, que procurou resistir, ampliando, por um lado, de forma controlada, o espaço de manifestação política; por outro, utilizando-se simultaneamente de dois mecanismos voltados para responder às demandas das camadas populares: concessões econômicas restritas e uma política social ao mesmo tempo repressiva e paternalista. Destacam-se, ainda, o ressurgimento do movimento estudantil e o surgimento do movimento pela anistia e do novo sindicalismo, além do início do movimento sanitário (CORDEIRO, 2004). Entre essas políticas, o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND) foi um plano quinquenal voltado ao desenvolvimento econômico e social, o qual continuava ideologicamente orientado pela visão do “Brasil Grande Potência”. Apareciam nele, entretanto, algumas prioridades no campo social: educação, saúde e infraestrutura de serviços urbanos. O diagnóstico apresentado para a saúde pública e, até mesmo, para a assistência médica da Previdência denunciava a carência de capacidade gerencial e estrutura técnica. Para fazer frente a esses desafios, o governo criou o Conselho de Desenvolvimento Social (CDS). O regime precisava lançar mão de políticas sociais para a sua legitimação, por isso investiu, canalizou recursos e priorizou projetos nesses setores. No entanto, não tinha quadros para ocupar todos os espaços abertos e terminou por criar espaços institucionais para pessoas de pensamento contrário, senão antagônicos, ao dominante, em seu setor. Por essa brecha, lideranças do movimento sanitário entraram na alta burocracia estatal, na área da saúde e da Previdência Social (ESCOREL, 1998). A estratégia de distensão política, iniciada pelo governo do general Geisel (1974-1979), possibilitou ao movimento sanitário apresentar propostas transformadoras no sentido de melhorar e democratizar o atendimento à saúde das populações mais carentes. A política

Sistema Único de Saúde

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