Mercado de Capitais

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Ano 1 | Número 4 Junho 2012 Publicação da:

Indexação Surgem novos benchmarks, mas cultura do CDI persiste

Entrevista

Geraldo Soares, do Itaú-Unibanco, fala de cases de sucesso no mercado

A hora e a vez dos

gráficos

Objetividade e timing insuperável fazem do trabalho dos analistas técnicos um recurso cada vez mais necessário para acompanhar os rumos do mercado, principalmente em tempos de alta volatilidade

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SUMĂ RIO

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18 6 Expediente 7 Carta ao leitor 8 Panorama Global 10 Entrevista Foto de Capa: PhotoXpressRF/ Olly

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Geraldo Soares, do ItaĂş-Unibanco, prepara segundo livro sobre investidores que se destacaram no mercado sem seguir tradicionais receitas de sucesso

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15 Eventos

Segunda edição do Rio Investors Day, promovido pela prefeitura do Rio e pela Apimec Rio, reúne 800 investidores e 42 empresas

17 Congresso 22º Congresso da Apimec discute novos desafios dos gestores

18 Capa

Os analistas técnicos e seu timing imbatível em tempos de alta volatilidade nos mercados

25 Articulista convidado

30 Headhunter Maria Cristina Mendes, uma multiplicadora de energia

33 Dicas culturais

Edison Fernandes, advogado

26 Indexação Apesar da criação de novos benchmarks, cultura do CDI resiste na indústria de renda fixa

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EXPEDIENTE

EDITORA

Quadro Diretivo da APIMEC Nacional PRESIDENTE

Lucy Aparecida de Sousa VICE-PRESIDENTE

David Rodolpho Navegantes Neto CONSELHO DIRETOR

Lucy Aparecida de Sousa David Rodolpho Navegantes Neto Alexandre Guimarães - Presidente da Apimec Distrito Federal Célio Fernando Bezerra Melo Presidente da Apimec Nordeste José Domingos Vieira Furtado Presidente da Apimec Minas Gerais Luiz Guilherme Ferreira Dias Presidente da Apimec Rio Marco Antônio dos Santos Martins Presidente da Apimec Sul Reginaldo Ferreira Alexandre Presidente da Apimec São Paulo

DIRETORIAS

JB PÁTRIA EDITORA LTDA. PRESIDENTE Jaime Benutte DIRETOR Iberê Benutte ASSISTENTE DA DIRETORIA Patricia Torre COMERCIAL Otto Bush ADMINISTRATIVO / FINANCEIRO Gabriela S. Nascimento JORNALISTA Kelly Souza

REVISTA MERCADO DE CAPITAIS Publicação mensal da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais CONSELHO EDITORIAL Lucy Sousa, Alessandra Rigos, Alexandre Guimarães, Cristiana Pereira, Francisco Petros, Geraldo Soares, Luiz Roberto Calado, Marco Antônio do Santos Martins, Mauro Cunha, Octavio M. R. de Barros, Ricardo Tadeu Martins PUBLISHER Jaime Benutte EDITORA Maria Alice Rosa PROJETO GRÁFICO E ARTE Belatrix Ltda. DIRETOR DE ARTE Marcelo Paton IMPRESSÃO IBEP Gráfica

Empresa filiada à Associação Nacional dos Editores de Publicações, Anatec.

MARKETING & COMUNICAÇÃO

Alessandra Rigos EDUCAÇÃO FINANCEIRA E SUSTENTABILIDADE

Eduardo Werneck RELAÇÕES COM O MERCADO

Antonio Jorge Vasconcelos da Cruz RELAÇÕES INSTITUCIONAIS

Milton Leobons TÉCNICA

Hélio Darwich ADMINISTRATIVA/FINANCEIRA

A Revista Mercado de Capitais é uma publicação da JB Pátria Editora www.patriaeditora.com.br Dúvidas ou sugestões: mercadodecapitais@patriaeditora.com.br Não estão autorizados a falar pela revista, bem como retirar produtos, pessoas que não constem neste expediente e não possuam uma carta de referência assinada pelo presidente.

Marco Antonio de Almeida Panza

Apoio:

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Carta ao leitor

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trabalho que só avança no Brasil e vem contribuindo com a profissionalização de todo o mercado de capitais do país. Nesta edição, concretizamos a ideia em nossa reportagem de capa. Neste número você também poderá esde o início deste projeto vínhamos planejando fazer uma

reportagem sobre os analistas técnicos. No mercado de capitais brasileiro, para cada analista técnico, também denominado gráfico, existem nove fundamentalistas. Talvez por conta desta diferença, quando falamos em analistas de valores mobiliários é mais comum as pessoas lembrarem dos fundamentalistas. Por isso mesmo havia a necessidade de dedicar uma reportagem que mostrasse a importância do trabalho dos gráficos em nosso mercado. Em junho, a criação do Comitê Consultivo

conferir uma entrevista com o superintendente de Relacões com Investidores do Itaú-Unibanco, Geraldo Soares, sobre o livro em que conta casos de investidores que tiveram desempenho brilhante no mercado sem seguir as velhas fórmulas de sucesso, além de conferir como o mercado analisa as condições para erradicar a chamada “cultura do CDI” entre os investidores do país. Estes e outros assuntos esperam por você nas próximas páginas. Boa leitura!

dos Analistas Técnicos (CCAT) da Apimec só veio reforçar esta vontade de apresentar aos nossos leitores

Lucy Sousa Presidente da APIMEC

uma reportagem sobre a história, as características e peculiaridades de um

Mande suas sugestões e críticas para: mercadodecapitais@apimec.com.br

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PANORAMA GLOBAL

Doherty na IOSCO O superintendente de Supervisão de Mercados da Anbima, José Carlos Doherty, é o novo presidente do SROCC (Self-Regulatory Organization Consultative Committee), o Comitê Consultivo de Autorreguladores da International Organization of Securities Commissions (IOSCO). Ele foi eleito no dia 16 de maio e substitui Yoshio Okubo, do Japão, que deixa o cargo após cumprir mandato de quatro anos. Mais de 60 entidades autorreguladoras de diversos países participam do comitê, que é presidido pela brasileira Maria Helena Santana, também presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O anúncio da escolha de Doherty para a presidência foi realizado durante a 37ª Conferência Anual da IOSCO, em Pequim, na China.

Federação a caminho Avança o trabalho para o lançamento da Federação Latino-americana das Associações de Profissionais de Investimento, que vai ocorrer em novembro, em Buenos Aires. Os representantes dos países que farão parte da entidade estiveram reunidos recentemente na capital argentina para começar a definir o estatuto e uma nova reunião foi agendada para junho, em Madri, na véspera da assembleia anual da Associação Internacional das Entidades Certificadoras dos Analistas de Investimento (ACIIA). Espanha e Portugal também vão integrar a federação. Outros países de língua espanhola ou portuguesa poderão participar na condição de convidados. Isso porque a federação, entre outras funções, aplicará exames de certificação nestes dois idiomas. “É um passo muito importante porque vai ajudar a aproximar os profissionais dos países participantes e contribuir para fortalecer a certificação internacional”, diz Lucy Souza, presidente da Apimec Nacional.

Fôlego imobiliário

O total de recursos destinados ao setor imobiliário no mercado de capitais atingiu R$ 37 bilhões em 2011, um volume cerca de R$ 12 bilhões acima do que foi registrado um ano antes. Os dados são da Colliers International Brasil.

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Perfil do RI A Fipecafi prepara a 6ª pesquisa sobre o perfil dos profissionais de Relações com Investidores. O trabalho será liderado por Marina Mitiyo Yamamoto, que coordena o MBA Finanças, Comunicação e Relação com Investidores da Fipecafi, durante o 14º Encontro Nacional de Relações com Investidores e Mercado de Capitais, promovido pela Abrasca, que neste ano está marcado para os dias 2 e 3 de julho, no Sheraton São Paulo WTC Hotel, em São Paulo (SP).

Decepção na China

22%

das companhias europeias que atuam na China consideram a possibilidade de deixar o país. A informação consta de estudo realizado pela Câmara de Comércio da UE na China. Entre os motivos alegados pelas empresas consultadas pela União Europeia estão as incertezas em relação às regras regulatórias, os altos custos e as barreiras de mercado. Metade das companhias disse ter deixado de aproveitar oportunidades de negócios por conta das barreiras regulatórias e 40% alegaram que a política chinesa para as companhias estrangeiras é “menos justa” do que era dois anos atrás.

Risco Espanha O Brasil está acompanhando muito de perto o pacote na Espanha, ao mesmo tempo em que está de olho nos balanços das empresas espanholas instaladas no Brasil. A preocupação é com a estabilidade financeira e a remessa dos lucros.

O tamanho do mercado O mercado de capitais brasileiro responde por apenas 1,9% do total do investimento da economia brasileira (Formação Bruta de Capital Fixo), que em 2011 foi de 19,3% do PIB. Entre 2000 a 2011, a média ficou em 1,2%, ante de uma FBCF de 17,3%. As informações foram divulgadas pelo Centro de Estudo do Mercado de Capitais (Cemec). Para Carlos Antonio Rocca, um dos coordenadores do Cemec, é preciso facilitar o acesso de empresas, principalmente as de menor porte, para explorar o potencial de crescimento no país. Segundo ele, uma das dificuldades para a expansão é que o mercado brasileiro envolve volumes de negociação muito acima da capacidade da grande maioria das empresas.

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ENTREVISTA GERALDO SOARES, Superintendente de RI do Unibanco

O caçador de

mitos Geraldo Soares, do Itaú-Unibanco, prepara o segundo livro sobre casos de investidores brasileiros que tiveram desempenho brilhante sem seguir nenhuma das fórmulas de sucesso do mercado de capitais

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culpa é de Warren Buffett. Ao ler a biografia do megainvestidor americano - escrita por um analista de mercado, diga-se de passagem -, Geraldo Soares, superintendente de Relações com Investidores do Itaú-Unibanco, ficou irritado. Achou o livro superficial, fraco e com poucas informações sobre o que realmente interessava, o mercado. Foi a partir daí que surgiu a ideia de escrever seu próprio livro. “Todos gostam de histórias de cases e estratégias de sucesso, mas faltavam livros sobre empreendedores nacionais”, conta ele. Nasceu então “Casos de Suce$$o no Mercado de Ações – Aprenda com quem venceu nas altas e baixas da bolsa”, escrito em parceria com seu pai, o jornalista e empresário Geraldo Soares Leite, e com o operador independente do mercado de ações Rafael Reis. Lançado em 2010 pela editora Campus/Elsevier, com prefácio do diretor-presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto. o livro acaba de chegar à terceira edição e dará origem a um novo volume, com novos casos e o mesmo modelo: histórias de investidores brasileiros, pouco conhecidos do grande público, de regiões diferentes do país e com estratégias absolutamente distintas umas das outras.

Você vai para o segundo livro. Está surgindo uma nova carreira? Não! (risos) Na verdade, sou formado em Sociologia e sempre gostei de disciplinas da área de Ciências Humanas, como Filosofia, por isso gosto de escrever. Além do mais, meu pai era jornalista. Como sempre gostei de ler biografias, li muitos livros sobre grandes homens de negócios. Um dia, li a do Warren Buffett, e detestei. É muito mal escrito! Além disso, percebi que havia muitos livros desse tipo falando da realidade dos Estados Unidos, onde existe uma cultura de mercado de capitais que não temos por aqui. Então, pensei: Por que não um livro contando casos nacionais? Foi aí que resolvi encarar o desafio.

São quatro brasileiros comuns, com idades parecidas, que atravessaram todas as turbulências econômicas das últimas décadas e cada um deles chegou ao sucesso por um caminho rigorosamente diferente do outro E por que optou por escolher quatro investidores com perfis tão diferentes? Porque detesto as fórmulas de autoajuda dos livros de finanças, que são todas umas bobagens. Escolhi quatro brasileiros comuns, extremamente bemsucedidos, com idades parecidas e que atravessaram todas as turbulências econômicas das últimas décadas no mercado

financeiro, e cada um deles chegou ao sucesso por um caminho rigorosamente diferente do outro. Os investidores precisam de exemplos palpáveis, não necessariamente da história do Eike Batista. Ele é único. Fazer o que ele faz é uma coisa completamente diferente. E quais foram essas estratégias?

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O livro foi publicado em 2010 e está entrando na terceira edição

que poucos analistas possuem (Samuel). E o quarto é um legítimo gentleman (Renato), que circula em meios sociais exclusivos e usa os fragmentos de informações que coleta para traçar sua estratégia. É possível seguir alguma dessas estratégias de investimento? O mais importante é saber que ninguém está certo ou errado.

Ari opera em condições de risco extremas, José Otávio é um gerenciador de riscos, Samuel é estudioso do mercado e Renato, um gentleman que se informa nos meios sociais

Escolhi os quatro porque os conhecia pessoalmente, dos eventos da Apimec, e tinha me tornado amigo deles. E também porque eles tinham não apenas estratégias diferentes, mas também personalidades e estilos de vida completamente distintos. Além disso, a maior parte desses investidores era de fora do eixo Rio-São Paulo. Um deles opera em condições de risco extremas, sempre (Ari). O segundo é um gerenciador de riscos, que só entra no mercado nos momentos de maior baixa e sai quando o mercado sobe, investindo em outras opções, como imóveis ou títulos de CDI (José Otávio). O terceiro é um fundamentalista, um estudioso do mercado, que possui um nível de informação 12

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Esses investidores também foram à falência e deram a volta por cima. Normalmente, os leitores que leem o livro comentam que gostaram mais de um perfil ou de outro, e quando você vai analisar, é simplesmente porque ele tem um estilo parecido. Eu, por exemplo, jamais conseguiria fazer o que o Ari faz. Simplesmente não conseguiria dormir à noite. Quando sai o próximo livro? Estou começando agora e o trabalho deve durar mais ou menos um ano e meio. Existem centenas de possibilidades

no mercado. Agora, vou traçar o perfil de um investidor grafista, que monta sua estratégia a partir da análise gráfica do comportamento das ações; de outro que investe seus recursos em uma carteira com centenas de ações diferentes, de um terceiro que faz investimentos exclusivamente de longo prazo e, por último, de um investidor que só opera com small caps. O que essas histórias podem ensinar aos analistas e aos profissionais de mercado? O profissional de mercado deve sempre avaliar bem a postura do cliente, levar em consideração o estilo de cada um. Ainda mais se quiser atender pessoas desse quilate, que são extremamente bem informadas e capazes de dar um nó em qualquer analista. Além disso, a segmentação é fundamental para se conseguir uma carteira boa de clientes. E não se pode atender todos da mesma forma. O Ari, por exemplo, quando pega um analista no telefone, fica pelo menos meia hora conversando e ele quer esse atendimento, se não procura outro no mercado. O Samuel, por sua vez, não é muito de ficar falando, enquanto o José Otávio gosta de fazer perguntas capciosas, para testar o nível de conhecimento do analista com o qual está lidando.

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O quarteto Os personagens do livro de Geraldo Soares revelam o que consideram imprescindível para um analista de investimentos ter sucesso no mercado de capitais Geraldo Soares entrevistou por 40 horas cada um dos protagonistas de seu livro. E batizou-os com apelidos que refletem seus estilos. Apesar de catarinenses, o administrador de empresas Ari José Hilgert mora em Porto Alegre e é o “Centauro dos Pampas”, um ex-lavrador que entrou para o mercado meio por acaso e se apaixonou, tornandose um investidor de estilo superagressivo. Já o mineiro José Otávio Melo Saraiva é o “Cético das Alterosas”, um investidor superconservador que mesmo diante de uma queda de 70% nas bolsas em 2008, dizia que “ainda não era hora de entrar”. O pernambucano Samuel Emeri Lopes é o “Histórico do Capibaribe”. Ex-médico da Marinha, ex-seminarista, ele acompanha o mercado e as empresas com lupa e sem deixar escapar nenhum detalhe sobre os fundamentos das empresas em que investe. O quarteto é completado pelo paulista Renato Rossetti, o “Gentleman da Pauliceia”, um perfeito e bem relacionado

cavalheiro, que acompanha o mercado e usa fragmentos de informações colhidos em seu meio social para desenvolver suas estratégias de investimento. “Não se trata de informações privilegiadas, mas informações cotidianas, que ele sabe utilizar como ninguém”, ressalta Soares. A estratégia de cada um reflete sua personalidade. “O Renato é o típico bom vivant. Uma vez, estava falido e mesmo assim

comprou um cavalo argentino”, conta Soares. “Já o carro do José Otávio, como não podia deixar de ser, é um Volvo, o carro mais seguro do mundo.” A reação de cada um às crises também é emblemática. “O Samuel para e volta a analisar tudo. Já o Ari, na crise de 2008, estava com tudo em ações. Eu perguntei a ele: ‘Vai vender?’, e ele disse que tinha papeis da CPFL, que tinham caído menos que os outros. Vendeu CPFL e comprou Vale, que tinha caído muito mais, ganhando muito na troca.” Perguntamos aos quatro investidores o que eles consideram fundamental para o sucesso de um analista de mercado. Confira as respostas a seguir:

Renato Rossetti, o Gentleman da Pauliceia Além da capacidade técnica, acho fundamental a noção de tempo e oportunidade. Os analistas têm que ter agilidade e rapidez, pois o mercado exige isso. Essas noções podem ser aprendidas ao longo da carreira, ouvindo os mais experientes e mantendo-se bem informado sobre o que se passa no seu país e no mundo. Também é muito importante prestar atenção nos gestores.”

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Ari José Hilgert, o Centauro dos Pampas Acho que, para um bom analista de mercado ter sucesso, é fundamental estar muito bem informado, ter uma boa visão micro e macro da economia interna e externa e um bom nível de conhecimento a respeito das empresas, além de uma boa dose de paciência para indicar e investir no mercado de capitais.”

José Otávio Melo Saraiva, o Cético das Alterosas Estar capacitado por sua graduação e experiência no mercado, escolhendo as ações a partir da análise das empresas de forma disciplinada e independente, usando as melhores ferramentas disponíveis. Estar permanentemente informado em relação à conjuntura nacional e internacional e às perspectivas dos diversos setores da economia. Ser persistente para ter uma aprendizagem continuada, por exemplo, para se atualizar em relação às inovações técnicas e mercadológicas (high frequency trading, dark pools e ETFs), e saber controlar as emoções. É preciso ter vocação e perspicácia para reconhecer as melhores oportunidades de realização de lucros e aproveitar o momento de melhores condições de investimento.”

Samuel Emeri Lopes, o Histórico do Capibaribe Antes de tudo, o analista deve ter uma conduta ética exemplar. Além disso, precisa ser extremamente responsável, dedicado e disciplinado. E tem de ler muito para conseguir ter a visão mais ampla possível dos diferentes fatores que podem interferir na economia do país, nas empresas e nos setores que está acompanhando. Isso vai permitir ao analista se antecipar aos fatos e tendências. Não é algo natural, mas posso dizer que vem com a experiência e com muito estudo. Eu, no começo, me surpreendia muito, mas com o tempo fui me aprimorando e melhorando minha percepção. Agora, também é preciso ter uma boa dose de humildade e sempre monitorar os dados, para saber se sua percepção de cenário futuro está correta. É isso que vai dar o sinal para avançar ou recuar.”

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EVENTOS

No mapa

financeiro

Segundo Rio Investors Day, que é promovido pela Prefeitura e a Apimec Rio, reúne 800 investidores e 42 empresas de capital aberto

A

movimentação era grande nos salões do tradicional Copacabana Palace para a realização do II Rio Investors Day. Aberto pelo prefeito Eduardo Paes no mesmo momento em que a cidade comemorava o grau de investimento concedido pela agência de classificação de risco Standard & Poor’s para os títulos do município, o evento apoiado pela Apimec Rio contou com a participação de 42 empresas de capital aberto e cerca de 800 investidores, 70 deles do exterior, vindos de Estados Unidos, Reino Unido, China e Cingapura, entre outros.

A presença de estrangeiros mais que dobrou em relação à primeira versão do evento, que é realizado na segunda quinzena de maio. “Foi um sucesso absoluto, bem melhor que no ano passado. Definitivamente, nós reintroduzimos o Rio no calendário internacional de eventos do setor financeiro”, comemorou a secretária de Finanças da Prefeitura do Rio, Eduarda La Rocque. A expectativa da organização é ultrapassar a marca dos 100 convidados estrangeiros na edição do ano que vem, num trabalho que começa oito meses antes da realização do evento. Além de 12 paineis setoriais, o Rio Investors Day 2012 promoveu debates sobre o potencial econômico da cidade, que hoje recebe 25% dos investimentos estrangeiros diretos realizados no país. A agenda

também incluiu reuniões individuais entre investidores e empresas. Luiz Guilherme Dias, presidente da Apimec Rio, se orgulha do envolvimento da associação na organização do evento. “A participação da Apimec dá um selo de tradição de mais de 40 anos ao Rio Investors Day”, afirmou. Hélio Darwich, analista de bancos da LF Rating, considera fundamental a realização de eventos desse tipo para o desenvolvimento da indústria financeira da cidade. “É uma vitrine para o mundo globalizado, que elege cidades como polos ou símbolos de atividades econômicas. Como Paris em relação ao turismo, ou Detroit, mesmo ultrapassada, em relação à indústria automobilística. Colocar o Rio como referência na área financeira é um início importante.”

Eduarda La Rocque, secretária de Finanças da Prefeitura do Rio: “Reintroduzimos o Rio no calendário internacional de eventos do setor financeiro”

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Leme, do Goldman Sachs: Brasil deve crescer abaixo das projeções do ministério da Fazenda e do BC

O consumo, o câmbio e o potencial de crescimento da economia brasileira foram temas presentes em grande parte dos debates. Para o economista Paulo Leme, presidente do conselho de administração do banco de investimentos americano Goldman Sachs, o PIB deve crescer 2,7% este ano, abaixo das projeções de 3,5% do BC e de 4,5% do Ministério da Fazenda. O resultado final dependerá principalmente do desempenho da economia no segundo semestre. No entanto, apesar das dificuldades, Leme ressaltou que a perspectiva de crescimento do Brasil é interessante, relativamente às economias mais avançadas. A disparada do dólar também foi tema de discussões entre investidores, empresas e analistas. Leme afirmou que os players do mercado brasileiro devem se acostumar com um novo patamar de câmbio, entre R$ 1,90 e R$ 2,05. E é preciso estar duplamente atento ao efeito desse novo cenário sobre os diversos setores e empresas. Lucas Lira, diretor de Compliance da Ambev, admitiu que o dólar a R$ 2 deve afetar os resultados da empresa, uma vez que 40% dos custos da companhia de bebidas estão, de algum modo, atrelados à moeda americana. Leonardo Pereira, diretor financeiro da Gol, por sua vez, minimizou o impacto da alta do dólar nas operações da empresa. Segundo ele, a companhia, que já enfrentou a moeda cotada a quase R$ 4, tem cerca de 10% das receitas em dólar, ao mesmo tempo em que a queda do petróleo no mercado internacional retira parte 16

Edição 2012 teve 70 convidados estrangeiros e expectativa da organização é ultrapassar a marca de 100 no evento do ano que vem da pressão sobre os custos da companhia. O potencial de consumo da nova classe média também foi apontado como um fator que chegou para ficar no cenário econômico e deve ser levado em conta em praticamente todas as análises setoriais. O diretor financeiro da estatal de energia mineira Cemig, Luiz Fernando Rolla, observa que a expansão do consumo é um desafio para as empresas do setor. “O poder de compra da população cresceu e com isso aumentou o uso de eletrodomésticos, o que causou um salto no consumo de energia. Temos um grande investimento a ser feito no país”, observou. Do ponto de vista dos estrangeiros, o país ainda é visto como um bom destino para investimentos, mas houve quem alertasse para a repercussão negativa de decisões do governo brasileiro. Segundo Will Landers,

diretor para a América Latina da BlackRock, a pressão do governo para a redução dos juros bancários não foi bem vista pelos investidores estrangeiros e a empresa diminuiu sua exposição nos bancos brasileiros. Ele argumentou que medidas isoladas para ajudar uma determinada indústria ou determinado setor causam temor nos grandes investidores, que não têm tempo para analisar os detalhes dessas regras ou para estudar o histórico do país e, na dúvida, acabam retirando os recursos do mercado. Para Landers, o Brasil não pode esquecer que, apesar das melhorias, ainda é considerado um país emergente de risco para os investidores estrangeiros e por isso deveria se esforçar para criar um ambiente de negócios mais seguro. Um sinal de que o país – e o Rio – ainda têm muitos desafios pela frente.

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22º CONGRESSO APIMEC

Novos

O

Jorge Simino, da Fundação Cesp e um dos debatedores do evento, diz que o nível atual dos juros reais exige dos gestores uma nova composição das carteiras de investimentos

desafios

s debates e paineis do 22º Congresso Nacional da Apimec, que será realizado nos dias 30 e 31 de agosto, vão ocorrer em um contexto econômico bem mais complexo do que o da edição anterior. Neste ano, o aprofundamento da crise financeira internacional e mudanças importantes na economia brasileira impõem novas questões para o mercado responder. “A taxa de juros reais em padrões historicamente muito baixos, como se vê hoje, vai exigir dos gestores brasileiros uma busca de retorno com ativos de maior de risco.

mesmo a questão do investimento É nesta composição nova do no exterior, que não é uma portfólio, com uma classe tradição do investidor brasileiro. de ativos com nível de risco Temos o private equity, mas superior ao da renda fixa, fora deste foco específico não há tradicionalmente de título uma tradição”, afirma. No mundo soberano, que está a essência do inteiro, diz ele, os investidores desafio dos gestores brasileiros atuam em mercados de fora de nos próximos anos”, diz Jorge seu território de origem, enquanto Simino, diretor de Investimentos o Brasil tem praticamente e Patrimônio da Fundação investimento zero. “É um momento Cesp e um dos debatedores do rico de reflexão e o Congresso será tema “Perspectivas do Mercado um momento importante neste de Capitais em Relação às processo”, diz ele. Ofertas Públicas, Estratégias Com o tema “O Brasil no de Investimento e Gestão de Longo Prazo” de carro-chefe, o Carteira”, que será apresentado no Simino, da Fundação Cesp: é preciso discutir a questão do investimento no 22º Congresso vai abordar em último dia do Congresso. exterior, que não é uma tradição brasileira seus paineis aspectos como Segundo ele, muitos são os os projetos de infraestrutura aspectos a serem abordados para o crescimento do país e suas alternativas de entre as alternativas para uma nova composição das financiamento, os cenários macroeconômicos e carteiras de investimento, em vista das condições políticos e sustentabilidade na tomada de decisão de econômicas atuais. “A natureza deste desafio, as investimentos, entre outros assuntos. alternativas que existem em relação a isto e até MERCADO DE CAPITAIS - mercadodecapitais@apimec.com.br

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CAPA

Analista em

tempo real Objetividade que caracteriza a análise técnica é cada vez mais demandada em tempos de alta volatilidade, o que tem valorizando cada vez mais os profissionais que captam o rumo do mercado com um timing imbatível

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Foto: 123RF

o filme norte-americando Margin Call - O Dia Antes do Fim, logo no início um jovem analista de risco percebe, ao verificar dados em seu computador, que algo muito grave está para acontecer: o limite de risco assumido pela instituição financeira em que trabalha está para ser rompido, o que, sem uma chamada de margem, fará disparar uma bomba no mercado financeiro global. A situação é comunicada ao chefe da área no banco, que, ao ver os gráficos no computador, diz a um subordinado: “Sabe que não sei ler estas coisas. Traduza para mim.”

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Primeiros tempos da profissão foram marcados por preconceito no mercado, que via pouca exigência técnica em relação à outra escola de análise, a fundamentalista

Na tela, o que o chefe vê é apenas um gráfico. No gráfico, o que o analista lê é a iminência de uma hecatombe nos mercados. Esta cena do filme, baseado na quebra do Lehman Brothers e o estouro da crise financeira mundial que veio na sequência, embora envolva profissional exclusivamente da área de risco, ilustra bem a realidade dos analistas técnicos, também denominados gráficos: o que para os leigos é um desenho mudo, para eles é um filme falado, transmitido diretamente do mercado, em tempo real. “O que vejo no gráfico é uma massa de indivíduos em constante movimento, com suas características, peculiaridades, ambições, medos. É o espelho da guerra diária entre comprados e vendidos”, diz Fausto de Arruda Botelho, sócio-fundador da Enfoque e pioneiro da análise técnica no Brasil, área em que atua há cerca de 35 anos. Com a alta volatilidade dos mercado nesses tempos de crise global, esta capacidade de perceber de maneira rápida o rumo

que o mercado está tomando tem sido cada vez mais demandada por investidores, gestores e instituições financeiras, o que vem tornando o trabalho dos analistas técnicos mais conhecido e valorizado. Já era tempo. É verdade que esta popularização do trabalho já vem de muitos anos. Hoje todas as grandes instituições do mercado de capitais trabalham com análise técnica, assim como sites e publicações voltadas para o mercado de capitais exibem gráficos por toda a parte. Mas ainda há alguns obstáculos a serem vencidos para que esta escola de análise de valores mobiliários seja plenamente reconhecida. O principal deles é o desconhecimento sobre o trabalho por parte do mercado em geral, motivo de um certo preconceito que marcou muito a profissão nos primeiros tempos. “Até hoje muita gente desdenha do trabalho, mas é muito menos”, afirma Botelho. “Quando comecei a trabalhar na área de juros e câmbio, ainda nos anos 90, havia uma certa MeRcado de Capitais - mercadodecapitais@apimec.com.br

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fotos: Flavio R. Guarnieri

Fausto Botelho, da Enfoque: “No gráfico, vejo uma massa de indivíduos com suas características, peculiaridades, ambições, medos. Ali está o espelho da guerra diária entre comprados e vendidos”

restrição. O pessoal não gostava, achava que gráfico só podia ser usado na área de commodities”, conta Silvia Zanotto, analista técnica da Prosper Corretora. “Muito tempo depois, quando ainda não era tão disseminada, a análise gráfica se transformou exatamente em um diferencial do meu trabalho para os investidores”, conta. Mais objetiva e rápida de fazer que a análise fundamentalista, a outra escola de pensamento na atividade dos analistas, a análise técnica é muitas vezes vista como um trabalho que exige pouco do profissional. E esta suposta facilidade acabou por colocar em dúvida para muitos a sua eficácia, alimentando o preconceito. “Parece fácil, mas não é. Há uma série de critérios e peculiaridades que exigem uma certa capacidade de discernimento para que seja feita a análise adequada”, afirma Leandro Martins, analista-chefe da Walpires. “Pode ser mais simples, mas não é mais fácil”, corrobora Silvia Afonso, analista gráfica do Banco Santander. São métodos diferentes de analisar o 20

mercado de ativos. Para a presidente da Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais (Apimec Nacional), Lucy Sousa, que tem formação fundamentalista, se havia alguma dúvida sobre a importância do analista gráfico em relação ao fundamentalista para o mercado de capitais, ela foi desfeita com a Instrução 483, da Comissão de Valores Mobiliários - que conferiu

à Apimec a função autorreguladora dos analistas -, ao enquadrar as duas especialidades nas mesmas exigências. Na corrente fundamentalista, o profissional se aprofunda na análise de todos os aspectos que envolvem o preço de uma ação, como os dados sobre a companhia emissora, o setor em que ela está inserida e a economia como um todo. “Ele considera os fundamentos para ver como eles vão influenciar a ‘massa’. Procura se adiantar aos movimentos do mercado. Faz a precificação da ação e percebe, por exemplo, que ela está cotada a 40, mas deveria custar 60”, diz Botelho. Neste processo, está uma das principais diferenças em relação à análise gráfica: o tempo necessário para chegar à conclusão. “O timing da análise fundamentalista é muito ruim, para não dizer inexistente. Porque, enquanto a massa de

Filipe Botelho, da ComStop: semelhança entre curvas da crise da Nasdaq, em 2001, e a do subprime, em 2008, acabou com as dúvidas sobre eficácia da análise gráfica

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indivíduos que atua no mercado não chegar à mesma conclusão do analista, o mercado não vai para 60. Este é o problema: o mercado pode até ir para 60, mas no caminho ele dá uma passadinha nos 30”, diz. Em compensação, são os fundamentalistas que reúnem as condições para detectar futuro mais distante em um papel que hoje, nos gráficos, é inexpressivo. “A análise fundamentalista é mais o stock pick, enquanto a análise técnica é mais o timing”, define Botelho. O analista gráfico é quem capta a “passadinha” da ação pelos 30, antes de confirmar a previsão de 60 - para usar a hipótese citada. Ele se concentra no histórico do preço desenhado no gráfico. “O preço desconta tudo”, define a máxima do mercado, que é citada na abertura do livro “Análise Técnica na Prática Um Método Intuitivo para Comprar e Vender Ações”, de Eduardo Matsura, analista técnico da Souza Barros. “Em tese, o analista técnico não precisa acompanhar as notícias para saber o rumo que o mercado vai tomar. Não importa o que movimenta o preço, mas como o mercado reage a estes fatores. É o próprio comportamento do preço que vai indicar isso na hora em que a mudança estiver acontecendo”, afirma Matsura. A interferência de notícias é até prejudicial à análise técnica, na opinião de Martins, da Walpires, pois pode poluir os dados que os gráficos revelam e afetar a capacidade de discernimento do analista. Nas linhas desenhadas na tela também podem aparecer situações recorrentes. “Muitas vezes o analista espera a formação de um padrão para ter a indicação de uma reversão do movimento. É um processo que chamamos de ‘identificação de padrões’ que levam à alta ou à baixa. É isso que a gente busca.” Filipe de Arruda Botelho, diretor da ComStop e filho de

Silvia Zanotto, da Prosper: análise gráfica não foi bem recebida pelos investidores no início da carreira, mas depois virou um diferencial

Escolha dos dados que servem de base para a análise é uma das variáveis que distinguem o estilo de trabalho de um profissional e outro Fausto, diz que já teve a oportunidade de conferir vários exemplos desses padrões. Mas um é especial. Ele conta que, em 2008, acompanhando o S&P 500, a certa altura a linha começou a se aproximar do mesmo ponto de resistência que demarcou o momento em que a Nasdaq despencou 50% em 2001. “Pensei: se este negócio de análise técnica realmente fizer sentido, este é o ponto mais importante a ser observado. Pois bem, quando chegou exatamente naquele nível, pronto: houve uma queda forte e a gente ouviu falar, pela primeira vez, em subprime”, conta o hoje analista gráfico “convicto”. E o que descrevia aquelas linhas não tinha nada a ver com coincidência, mas

com a lógica do comportamento humano. Escaldados com 2001, os investidores passaram a ter medo de a alta bater naquele ponto. E o medo de a derrocada se repetir os levou exatamente a causar uma nova derrocada: “Quando chegou naquele nível, passaram a se desfazer dos papéis por medo de perder e deu no que deu.” Ele diz que teve muitos outros exemplos da eficácia da análise gráfica, mas aquela situação foi um marco em sua vida profissional. Filipe, 30 anos, custou a ingressar na mesma área do pai. Em parte por querer estar seguro de que escolhia ele mesmo o seu caminho e em parte porque só despertou para a especialidade quando teve um contato prático MeRcado de Capitais - mercadodecapitais@apimec.com.br

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Eduardo Matsura e seu livro sobre análise técnica: “Em tese, o analista não precisa acompanhar as notícias para saber o rumo que o mercado vai tomar”

com o trabalho, o que aconteceu somente dez anos depois de se formar economista pela USP. Até hoje ele não entende como, durante toda a faculdade de Economia, não teve uma única aula sobre análise gráfica, nem teórica nem prática. Assim como ele, outros analistas só despertaram para o trabalho

atual a partir de uma experiência prática, ao verem concretizadas as indicações dos gráficos. “A análise gráfica é muito mais objetiva, mais eficiente que a fundamentalista. Isso pude comprovar não só como profissional e professor, mas também como investidor”, diz Martins, também autor do livro “Aprenda

a Investir - Saiba Onde e Como Aplicar Seu Dinheiro” e criador do site Seu Consultor Financeiro (www. seuconsultorfinanceiro.com.br) . Os acertos também passam, muitas vezes, uma ideia equivocada do trabalho. “Tem gente que diz: ‘parece mágica, bola de cristal’, o que está errado. Não é futurologia. O que fazemos é ler as informações que o mercado está passando para a gente”, explica Silvia Afonso, do Santander. Sem conhecer minimamente este mundo dos gráficos, é difícil imaginar que aquelas linhas na tela possam ser tão vibrantes, como demonstram os profissionais. Muitos imaginam que a exatidão dos gráficos faz com que o trabalho do analista esteja mais para uma constatação do que para uma análise, o que é um grande equívoco. Só a seleção dos dados que serão observados já guarda em si uma visão própria. Existem analistas gráficos que, além de observarem os preços e os volumes, também consideram outros indicadores para entender o momento econômico. Outros preferem acompanhar somente

Um comitê só para analistas técnicos A criação do Comitê Consultivo do Analista Técnico (CCAT) da Apimec Nacional, no dia 1º de junho, deu início a um processo mais definido e direcionado para os profissionais do segmento, que hoje correspondem a 10% de todos os analistas de valores mobiliários do Brasil. Em uma reunião na sede da Apimec, os integrantes do Comitê, todos credenciados pela Apimec, escolheram Fausto de Arruda Botelho, da Enfoque, para coordenar o CCAT. “Como existe muito mais analistas fundamentalistas em atuação, o trabalho de análise no mercado de capitais acabou ficando muito formatado com a cara do analista fundamentalista. Então sentimos a necessidade criar o comitê para

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discutir sobre o conteúdo, os relatórios de análise, as características próprias do trabalho, buscando uma capacitação e profissionalização cada vez maior”, diz Lucy Sousa, presidente da Apimec Nacional. Outra decisão importante foi a de elaborar um texto de recomendação de boas práticas específico do analista técnico, a exemplo do que já está sendo feito pelo comitê similar dedicado aos analistas fundamentalistas, o CCA. Além disso, foram apresentadas muitas sugestões à área de certificação da Apimec. “Era um grupo que não estava sendo escutado adequadamente, o contato era muito informal. Agora, com o comitê consultivo, os analistas técnicos poderão fazer

deliberações, debater e encontrar soluções para o que necessitam”, diz Francisco D’Orto Neto, superintendente de Certificacão da Apimec. Confira a composição do Conselho: Coordenador: Fausto de Arruda Botelho - Enfoque Eduardo Koiti Matsura - Souza Barros Filipe Stein - ComStop Hugo Simas Carone - Ativa José Faria de Azevedo Filho - Lopes Filho Leandro Martins - Walpires Raphael Figueiredo - ICAP Brasil Sergio P. Veloso - Direto aos Pontos Silvia C. Zanotto - Prosper Silvia Afonso - Santander

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os preços. “Não vejo nenhum indicador econômico, não vejo volume, não vejo nada. E levei 30 anos para chegar a este ponto”, diz Fausto Botelho. Ele diz que, além da experiência, os estudos que fez para obter o Certified Financial Technician (CFTe), com destaque para a leitura dos livros de John Murphy, têm grande peso nesta técnica que lhe permite analisar o mercado somente por meio dos gráficos de preços. As impressões digitais dos autores das análises gráficas também são definidas pelo seu estilo de trabalho e sua capacitação profissional. “Em primeiro lugar, é preciso separar muito bem o aspecto emocional do racional. É aí que muita gente peca. Já nos critérios técnicos, é preciso saber diferenciar escala, confiar menos em indicadores e mais em formação do preço, entender o que está por trás dessa formação e não dar muita

Leandro Martins, da Walpires: “É preciso separar muito bem o aspecto emocional do racional. E é aí que muita gente peca”

importância às notícias.” No fim das contas, o obstáculo que ainda precisa ser derrubado é o que vê nestas diferenças entre as análises fundamentalista e gráfica uma oposição. Elas

Silvia Afonso, do Santander: “Pode ser mais simples, mas não é mais fácil”

são complementares, dizem os analistas técnicos, no que parecem ter a concordância do mercado, uma vez que vem aumentando a dobradinha entre analistas técnicos e fundamentalistas nas instituições financeiras. “Hoje em dia há muitos cursos e eventos sobre análise gráfica, o pessoal que está saindo da faculdade agora tem uma curiosidade muito grande pelo assunto e os próprios colegas de outras áreas nas instituições se interessam em conhecer o nosso trabalho”, conta Silvia Zanotto, da Prosper. Não por acaso, em junho foi criado um comitê específico na Apimec para os analistas técnicos (ver reportagem na página 22). “É o reconhecimento da importância destes profissionais no mercado de capitais e do quanto eles podem contribuir com suas ideias em diversas áreas importantes para nós, como a certficação”, diz Francisco D”Orto Neto, superintendente de Certificação da Apimec. No gráfico dos profissionais do mercado de capitais, a linha que representa os técnicos, como se pode ver, é ascendente. MeRcado de Capitais - mercadodecapitais@apimec.com.br

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CAPA

O momento da crise,

segundo os gráficos

A

virada de maio para junho foi pródiga em más notícias sobre - e para - a economia global. Se pouco meses antes o mercado via sinais de que a crise europeia já teria produzido seus maiores estragos e a recuperação parecia a caminho, naquele momento ficou sabendo que talvez tivesse sido otimista demais. Nos Estados Unidos, a perspectiva de retomada foi frustrada por um avanço de apenas 1,9% no PIB do primeiro trimestre. Na China e na Índia, mais dados apontando desaceleração.

Na Zona do Euro, uma possibilidade maior de a Grécia sair do bloco e a Espanha colecionando cada vez mais indicadores negativos, como o dos títulos da dívida pública, que atingiram quase 7%. No Brasil, a BM&FBovespa fechava em maio seu pior mês desde outubro de 2008, marco do início do agravamento da crise global. Nenhuma destas informacões, porém, foi necessária para os analistas técnicos chegassem à conclusão de que a crise estava se aprofundando naquele momento. “Estamos no ápice da crise”, afirmava Silvia Zanotto, da Prosper, no dia 1º de junho. “Estamos no meio da tendência de baixa no mercado”, dizia Fausto Botelho, da Enfoque. “Pelo gráfico, a gente pode ver que a força vendedora está mais forte que a força compradora. Então a tendência é de que esta queda continue. Mas a qualquer momento pode surgir um fato novo capaz até inverter esta situação”, atestava Eduardo Matsura, da Souza 24

Barros, advertindo que não estava fazendo uma previsão, mas apenas informando para onde apontavam seus gráficos naquele momento. Na visão de Silvia Zanotto, que também observa vários outros indicadores em suas análises, um dado em especial chamava a atenção. “O gráfico mais interessante talvez seja o do ouro lá fora”, afirmou. Segundo a analista, em 2008/2009, no começo da crise atual e então o auge da crise nos Estados Unidos, o mercado começou a comprar ouro para se proteger. No dia 1º de junho, porém, o ativo estava próximo de um suporte muito importante, que, se fosse rompido, poderia inverter a tendência de alta iniciada em 2008. “Se entrar em tendência de queda, é porque as pessoas estão precisando se desfazer de suas posições - onde buscavam proteção - porque estão precisando de dinheiro

para pagar os prejuízos em outros ativos, outras áreas.” Já Botelho, que não utiliza indicadores em suas análises, observando exclusivamente o comportamento dos preços no mercado de capitais, diz que a segunda quinzena de maio marcou uma batalha intensa entre compradores e vendidos, com o quadro pendendo para os vendidos ainda no dia 1º de junho. Segundo ele, o gráfico estava exatamente no nível de um ponto muito importante atingido em outubro do ano passado. “É possível ver que o mercado está travando uma batalha em torno de um nível importante, que chamamos de ‘suporte’ (na parte de baixo do gráfico. Quando é na parte de cima, chama-se “resistência”). Ao observar este nível sendo rompido, entendo, lógica e claramente, que os vendiodos ganharam esta batalha em maio. E isso implica que uma batalha maior está em curso e deverá ser ganha também pelos vendidos”, explica.

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Articulista convidado |

Edison C. Fernandes

O custo-benefício da transparência

O

padrão internacional de demonstrações financeiras, conhecido pela sigla IFRS, pretende ser mais do que um sistema contábil, tendo como um dos seus principais objetivos “oficializar” a contabilidade gerencial, o que quer dizer que todas as informações econômicas, financeiras, jurídicas e de desempenho necessárias à gestão da empresa devem ser apresentadas nas demonstrações contábeis. Nesse contexto, o IASB e o FASB iniciaram sua “parceria” pelo estabelecimento de padrões para o reconhecimento da receita. Pela proposta conjunta sobre o assunto, colocada em audiência pública, há uma significativa mudança na classificação das receitas a serem reconhecidas na contabilidade. Fica preservado, de certa maneira, o momento para o reconhecimento da receita: quando a relação jurídica estiver definitivamente concluída, ou seja, quando houver a transferência dos riscos e benefícios dos bens, serviços ou direitos; mas se cria a exigência de que as receitas sejam alocadas de acordo com as diversas prestações constantes no contrato. Tome-se um exemplo bastante simples e genérico: uma empresa que venda produtos a prazo com garantia de manutenção, pode ter que demonstrar, na contabilidade, a respectiva receita nas três categorias – receita de venda, receita financeira (juros embutidos) e receita de prestação de serviços de manutenção. Conquanto esse procedimento contábil seja mais transparente,

ele pode causar alguns impactos negativos, dentre os quais se destacam a inconsistência com outras normas contábeis, a exposição de questões estratégicas e a dúvida sobre adequação legal. Seguindo com o mesmo exemplo, a parcela destinada à manutenção do produto vendido, durante um prazo determinado, atualmente, pode ser assegurada pela constituição de uma provisão para garantia e o registro da sua consequente despesa, segregando parte do lucro para o cumprimento dessa prestação. Por outro lado, se a vantagem competitiva da empresa residir na capacidade de aproveitar os tempos de compra (à vista) e venda (a prazo) e, com isso, maximizar o seu ganho pela cobrança desse tempo (juros), a divulgação da receita financeira embutida na venda exporá aos concorrentes sua estratégia de negócio. Finalmente, a divulgação da receita financeira também pode se tornar uma questão legal, já que o Código Civil limita a cobrança de juros por empresas comerciais. A pretensão do IASB e do FASB é pertinente, tanto no sentido de que a contabilidade seja, efetivamente, a base para a tomada de decisões quanto, em decorrência disso, a exigência de que as empresas precifiquem cada item do contrato firmado. Ocorre que a informação contábil não pode se sobrepor à tomada de decisão em si e à estratégia das empresas. De qualquer forma, mesmo com a mudança proposta, as demonstrações contábeis continuarão baseadas no julgamento da administração, que decidirá quando e como reconhecer suas receitas, tendo como freio e contrapeso, a favor dos demais stakeholders, a divulgação dos critérios de tal julgamento.

Edison C. Fernandes, advogado e professor da Fundação Getúlio Vargas – FGV

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INDEXAÇÃO

CDI, Apesar da criação de novos benchmarks, cultura do CDI resiste como principal parâmetro de risco e rentabilidade na indústria de renda fixa, atrapalhando os planos de desindexação do governo

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o inabalável

A

palavra de ordem na área econômica do governo brasileiro é desindexar o mercado financeiro. Para isso, será preciso superar uma barreira incômoda: o CDI, Certificado de Depósitos Interfinanceiros, herança dos tempos de inflação descontrolada que resiste como principal parâmetro de risco e rentabilidade das aplicações na indústria de renda fixa. Ao contrário das operações de overnight, lastreadas em títulos públicos remunerados pela Selic, o CDI reflete o risco de crédito do banco tomador. No entanto, como se tratam quase sempre de operações diárias, o indicador acaba acompanhando muito de perto a Selic.

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Em abril,

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Foto: Agência Brasil

89,5%

indexadores a que estão atrelados rentabilidade diária Diariamente, a os títulos (prefixados, IPCA, IGP-M, praticamente sem risco, Cetip, onde todas as do total das pós-fixados), e eventualmente os investidores procuram operações de DI são dívidas privadas segmentados segundo o prazo de investimentos de renda fixa registradas, divulga estavam seus componentes. vinculados ao DI, reforçando a Taxa DI Over, média vinculadas ao Os índices IMA são mais a indexação. calculada com base nas indicador voláteis no curtíssimo prazo e, O hábito dos investidores transações do mercado em consequência, a atuação dos é tão arraigado que, mesmo interbancário no dia. É essa gestores acaba sendo avaliada quando estão investindo em média que é usada como também num prazo curtíssimo, fundos prefixados, atrelados a indexador de outras operações semanal ou no máximo mensal. outros indicadores, muitos clientes da indústria financeira. Segundo Por isso, a substituição do CDI por ainda comparam seus resultados dados da Associação Brasileira outros índices como a principal com o CDI, afirma Paulo Pereira dos Mercados Financeiro e de referência de investimentos seria Miguel, sócio e economista-chefe da Capitais (Anbima), em abril 89,5% das benéfica para os profissionais Quest Investimentos. Ele compara dívidas privadas, sejam debêntures, do mercado no longo prazo. “O o comportamento do CDI ao do CDBs ou operações compromissadas, mandato dos gestores estaria mais IMA (Índice de Mercado Anbima). estavam vinculadas ao CDI. alinhado ao perfil dos papéis, com Conforme definição da Anbima, o O governo tenta fazer sua aumento da volatilidade no curto IMA é “uma família de índices que parte, reduzindo o percentual de prazo, mas com um horizonte representa a evolução, a preços títulos pós-fixados remunerados mais longo para a avaliação de de mercado, da carteira de títulos pela Selic (LFTs) na dívida pública resultados”, afirma Miguel. públicos e serve como benchmark e aumentando o volume de títulos Se há uma certa resistência por para o segmento. Com o objetivo prefixados, na tentativa de parar parte dos investidores em abandonar de atender às necessidades dos de alimentar esse ciclo. O ministro diversos tipos de da Fazenda, Guido Mantega, investidore e das suas declarou recentemente que essa respectivas carteiras, fatia já caiu bastante e as LFTs Mantega mira no CDI, mais o IMA é atualmente são ruins justamente porque têm ainda não subdividido em quatro um indexador natural, enquanto o certou no alvo subíndices, de acordo governo quer desindexar a economia. com os indexadores Os próprios fundos ligados ao dos títulos – governo foram proibidos de fazer prefixados, indexados aplicações em LFTs e os papéis que ao IPCA, indexados estão vencendo não vêm sendo ao IGP-M e pósrenovados. fixados (Taxa Selic)” . Só que o CDI se recusa a sair de Enquanto o IMA-Geral cena. Quase 20 anos depois do fim da é composto por todos hiperinflação, ainda serve de baliza os títulos elegíveis, para grande parte dos investidores, representando o gestores e analistas na hora de avaliar comportamento do o desempenho dos fundos do setor, mercado como um mesmo com juros no nível histórico todo, os demais são mais baixo desde a criação da taxa determinados pelos Selic. Acostumados ao padrão de

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Fotos: divulgação

Castro, do Santander Asset Management: “Adequar o perfil de risco do investidor a algo que não seja o CDI já é possível.

o CDI, também há um tanto de acomodação por parte da indústria financeira. “Não se trata exatamente de resistência premeditada. Mas certamente é mais difícil discutir risco com o investidor se o CDI apenas sobe ”, afirma Eduardo Castro, superintendente-executivo do Santander Asset Management. Essa característica é a herança de um instrumento criado em tempos de hiperinflação para reter a liquidez no setor financeiro e evitar um movimento de dolarização da economia ou de criação de moedas paralelas, que resiste mesmo depois da morte do “dragão”. Para que essa herança seja finalmente desmontada, a permanência dos juros reais em um nível baixo e – principalmente – estável é considerada um elemento indispensável, ainda que não suficiente, para mudar o panorama dominado pelo CDI. Para Eduardo Castro, a convergência dos juros para um patamar compatível com o de outros países emergentes começa a fazer efeito. Ele acredita que a preocupação dos investidores com a rentabilidade de suas aplicações deve levá-los a assumir mais riscos e, com o tempo, a procurar outros benchmarks na renda fixa, que passa por um momento de 28

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transição. “Adequar o perfil de risco do investidor a algo que não seja o CDI já é possível. Hoje, há desde opções mais conservadoras a outras, mais agressivas do ponto de vista de duration”, diz. Nesse novo cenário, os benchmarks teriam um perfil mais parecido com o da taxa Libor, prefixada. Há alguma movimentação nesse sentido, além da adoção de índices da família IMA, que Poso, do vem ganhando HSBC: “Se a popularidade. Um mudança for desses sinais é feita na base da canetada, o lançamento de terá pouca fundos híbridos, chance de referenciados no êxito” CDI e no IMA-B. Ou de fundos que oferecem uma rentabilidade do CDI acrescida de uma taxa pré, criando um misto de fundo pós e prefixado. “No futuro, talvez não seja mais comum acompanhar a rentabilidade diária do CDI e tenhamos CDIs de 30, 60, 90,

180 e 360 dias, refletindo as taxas negociadas com base nesses prazos”, especula Castro. Quaisquer que sejam os mecanismos adotados, no entanto, o fato é que abandonar o referencial pós-fixado permitiria prever com exatidão o volume a pagar no vencimento dos títulos. E isso facilitaria imensamente o planejamento financeiro, com um efeito positivo especialmente para o mercado de dívida privada. Os especialistas também acreditam que a mudança para um padrão prefixado seria favorável para os profissionais financeiros. “Isso torna o ambiente de negócios mais seguro”, avalia Gilberto Poso, superintendenteexecutivo de Gestão de Patrimônio do HSBC Brasil. É que eventuais aumentos de juros provocados por choques macroeconômicos não teriam efeito sobre o volume da dívida dessas empresas. “Isso aconteceu nos anos 90, durante a crise da Ásia, quando a Selic pulou de 19% para 45%, elevando também o CDI, e dobrando o serviço

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das dívidas pública e privada de uma Bandeira, hora para outra”, lembra. da Órama Álvaro Bandeira, economista-chefe Investimentos: imobilismo e sócio da Órama Investimentos, dos clientes por outro lado, observa que a ajuda a volatilidade no curto prazo e o alimentar a cultura do CDI aumento da exposição ao risco vão exigir uma capacidade mais acurada dos analistas de renda fixa. “Vai ser preciso uma avaliação cada vez mais detalhada de cada fundo e de sua composição, de acordo com os grupos de risco de cada categoria. Quase como o trabalho de um analista de ações”, compara. Evidentemente, aponta Bandeira, o aumento do mercado de dívida privada nesse cenário também exigirá mais atenção dos profissionais financeiros, assim como ferramentas de investimento que vão se tornando o mercado de títulos públicos será o mais difundidas, como os FDICs e os principal motor dessa transformação CRIs. “Será preciso avaliar muito bem no segmento de renda fixa. Para o risco de cada uma dessas emissões”, ele, enquanto o governo, principal diz o economista, que acredita que emissor de títulos do mercado, esse cenário futuro pode favorecer mantiver a taxa Selic como referência o modelo de negócio de gestores importante, o quadro pouco vai se independentes e de boutiques de alterar, mesmo que os juros reais investimento. permaneçam baixos. Mas, apesar Mas a Selic não é a das vantagens única peça importante Cerca de proporcionadas no tabuleiro. Outro pelo ocaso do CDI, fator que pode ajudar aparentemente a a mudar o panorama dos cotistas de migração para os do mercado de renda fundos dos bancos títulos prefixados e fixa são os investidores de varejo mantêm para as novas referências institucionais. Em busca investimentos de mercado continuará de um alinhamento atrelados a ocorrer lentamente. “O entre o rendimento de ao CDI juro baixo seria o caminho suas aplicações e suas natural para isso, mas, ao metas atuariais, vinculadas natural, quanto tempo vai a índices de inflação, os levar?”, pergunta Miguel. Para fundos de pensão têm ele, a criação de índices como os aumentado sua exposição em IMAs foi um primeiro passo. “Agora títulos atrelados a índices de é preciso generalizar o seu uso.” preço, como o IMA-B. Alguns deles, Poso, por outro lado, acredita antecipando o movimento de queda que não adianta querer acelerar de juros, promoveram a troca de demais o processo. “Se a mudança papéis referenciados em DI por outros, for feita na base da canetada, terá prefixados, com maior duração, em pouca chance de êxito”, avalia. O operações bastante lucrativas. “A superintendente do HSBC aposta que participação dos fundos de pensão

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em um mercado de renda fixa que apresenta mais volatilidade diária ajuda o investidor comum a se ambientar a essas variações”, avalia Castro. Mais difícil é mudar a cultura dos cerca de cinco milhões de cotistas da indústria de fundos. Hoje, cerca de 80% deles mantém seus recursos nos fundos dos bancos de varejo, em investimentos atrelados ao inevitável CDI. “Isso acontece por puro imobilismo”, avalia Bandeira. Ele aposta, no entanto, que o cenário de juros baixos vai começar a movimentar essa massa de clientes, fazendo muitos deles questionarem a razão pela qual os fundos em que aplicam não batem a inflação. “Se esses clientes saírem do imobilismo, pode haver uma forte migração em busca de mais rentabilidade, por isso alguns bancos já estão reduzindo taxas de administração que realmente eram absurdas em certos casos.” Como se vê, pelos motivos certos ou errados, para o bem ou para o mal, o processo avança, ainda que aos trancos. E, de morte morrida ou matada, o CDI terá de sair de cena – ou pelo menos deixar o centro do palco – para que a desindexação da economia brasileira seja realmente completa.

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Kiki Mendes,

uma multiplicadora de energia

Quando chega de manhã na Ativa para mais um dia de trabalho, a gerente de Produtos Maria Cristina costuma estar com a disposição em alta. Pudera: naquele momento, ela já correu cerca de dez quilômetros na orla da zona sul do Rio 30

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aria Cristina Mendes, a Kiki, tinha 21 anos e estava na metade da faculdade de economia quando conseguiu seu primeiro emprego no mercado de capitais, no começo dos anos 90. Admitida como trainee na área de análise, ela chegou ao prédio do fundo de pensão da Vale, o Valia, para fazer sua estreia profissional com ansiedade e confiança. Até que ingressou na sala de trabalho...E não entendeu mais nada. “Todos estavam olhando televisão. Eu perguntava para a pessoa que ia ser minha chefe: ‘Escuta, o que eu tenho que fazer?’ E ela respondia: ‘Minha filha, leia e veja televisão porque nem eu sei o que vou fazer.’” Ao chegar em casa, no fim do dia, ainda estava impressionada: “Mãe, as pessoas não trabalham. Elas só vEem televisão.”

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A história bem poderia ser um sonho angustiado da jovem trabalhadora, mas na verdade foi o pesadelo de muito mais gente: naquele dia o recém-empossado governo Collor anunciava um confisco nas contas correntes e na caderneta de poupança dos brasileiros. “Foi inesquecível”, conta, às gargalhadas, a hoje gerente de Produtos da Ativa. De lá para cá, muita água rolou, mas o bom humor com que revisita suas experiências fica evidente em poucos minutos de conversa. É uma “marca” de sua personalidade que virou motivo de brincadeira entre os amigos. “Seu bom humor de manhã cedo ‘irrita’”, costumam dizer. É que às 9 horas, quando chega na Ativa, por exemplo, ela já viveu boa parte do seu dia. Kiki é daquelas pessoas que não precisam dormir muito para recarregar suas baterias. “Com cinco ou seis horas de sono já estou ótima.” Moradora do Leblon, no Rio de Janeiro, acorda “de segunda a segunda” às 10 para as 6, desce até o calçadão e faz uma corrida até o Arpoador ou vai de bicicleta até o Leme, alternando entre um esporte e outro a cada dia, sem falhar nem quando chove. Cerca de dez quilômetros depois, quando volta para casa, por volta das 7h/7h30, já está totalmente animada para cumprir os compromissos do dia. E é esta energia que ela acaba transmitindo a tudo o que faz, o que não é pouco. Mãe de Cristiane, de 8 anos, ela também é diretora-adjunta da área administrativo-financeira da Apimec Nacional, além de trabalhar na Ativa há três anos, quando foi convidada a integrar um projeto da corretora, que na época planejava se transformar em uma grande boutique investimentos, com produtos que não eram característicos do segmento. Nesta área, Kiki tem a oportunidade de explorar não apenas o que aprendeu nos cerca de 20 anos de atuação no mercado, mas também outros pontos fortes de seu perfil profissional, como a facilidade de comunicação. Foi este aspecto, inclusive, que a levou a mudar de área depois de 12 anos no Valia, quando então era analista sênior. “Foi uma excelente escola. Mas eu achava que teria um ganho profissional melhor em uma instituição. Além disso, eu era diretora de Relações com Investidores da Apimec,

falava muito com o pessoal do mercado, e comecei a sentir vontade de desenvolver mais este meu lado comunicativo” - Kiki tem participação intensa há 19 anos na Apimec do Rio e também, mais recentemente, na Nacional. A oportunidade de mudança surgiu no BMG. Desta vez, uma nova estreia, agora na área comercial, trabalhando com fundos de pensão e pessoas físicas na faixas denominadas “qualificadas e superqualificadas”. Quatro anos depois, com o nascimento da filha, Cristiane, Kiki passou a querer um trabalho mais tranquilo, em que não precisasse viajar tanto e tivesse mais tempo livre. Foi então para o FRG, o fundo de pensão de Furnas. Foram três anos na área de mesa operacional. No último ano, o marido tinha passado a

“Hoje o que se vê é uma turma muito nova com um background incrível. Falam várias línguas, têm MBA, etc., mas falta um pouco esta parte de networking”

Kiki e sua bicicleta: ela corre do Leblon ao Arpoador ou Leme todos os dias, mesmo que esteja chovendo

trabalhar em Londres e, com o tempo, foi ficando difícil conciliar o casamento, a maternidade e o trabalho no Rio. “Decidi que me dedicaria à parte educacional e fui para Londres estudar. Fiz um MBA na London Business School e, neste ínterim, meu marido foi chamado de volta ao Brasil”, lembra. A família voltou e Kiki foi para a Máxima Asset, onde foi diretora comercial na área de fundos de investimento. Foi quando surgiu a proposta da Ativa. “Ter sido analista me ajuda muito no que faço hoje. Por exemplo, em um IShare de empresas com baixa emissão de carbono, consigo vislumbrar melhor quais têm

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este tipo de preocupação, posso analisar um rating ou a situação dos bancos médios no momento atual. São recursos muito úteis no meu trabalho.” Assim como a vantagem de saber lidar com pessoas. “Hoje o que se vê no mercado é uma turma muito nova, com um background incrível. São profissionais que falam várias línguas, têm MBA, etc., mas falta um pouco esta parte de networking”, afirma. Na história de Kiki vida pessoal e profissional vão se misturando naturalmente. Um exemplo simbólico disso é o próprio nome. Até ingressar no time da Ativa, ela sempre foi chamada de Maria Cristina no ambiente de trabalho. No entanto, ao usar o apelido até então só conhecido entre familiares Kiki com seu para batizar seu “Pop Fone”: por influência MSN profissional na de Cristiane, Ativa, passou a ser sua filha de chamada de Kiki. 8 anos, ela passou a “Ouvir ‘Maria Cristina’ gostar de hoje é engraçado gadgets porque nem meus amigos mais antigos de mercado me chamam mais assim. É Cristina ou Kiki.” As rotinas de trabalho e da maternidade andam em paralelo o tempo todo. “Procuro conciliar tudo da maneira mais prática, dentro do possível”, conta. Um exemplo: um dia ela precisou fazer uma visita profissional no Leblon perto do horário da filha pegar o transporte escolar. “Passei em casa e fomos juntas até a porta da van. Fiz o que normalmente faria se não estivesse trabalhando, e depois fui para meu compromisso. Eu e ela valorizamos para caramba todos estes momentos em que podemos estar juntas.” 32

Para ter o fôlego necessário para a agenda tão atribulada, a atividade física é fundamental, diz ela. “Antigamente eu fazia exercícios como uma obrigação, mas hoje é puro lazer. É o único momento em que estou sem meu celular. É uma hora, uma hora e meia do meu dia que tenho para ouvir música, cantar, ver a natureza.” Depois disso, geralmente ela leva a filha ao inglês, balé ou natação, dependendo do dia da semana, e na sequência passa a resolver problemas pendentes por telefone, até chegar à corretora. “Se por algum motivo não faço minhas corridas, fico com a sensação de

que estou lenta para tudo no resto do dia”, explica. O mais importante, diz ela, é o efeito que este hábito produz para compensar uma rotina em que é preciso estar sempre a mil para dar conta de tudo. “Acho que a vida da gente precisa ser um pouco mais simples. Às vezes você se preocupa em fazer tanta coisa - no nosso mercado tem muito isso, tudo gira em torno do dinheiro -, e algo tão simples como dar uma volta na praia, ainda mais neste cenário incrível que é o Rio de Janeiro, acaba sendo um superprograma. Para mim, é como um alimento”, diz.

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DICAS CULTURAIS

Está chegando a São Paulo, no Sesc Pinheiros, a exposição Tutto Fellini, que vi no Rio. É magnífica!” Francisco Petros economista

Sem Limites (Limitless), é um filme sobre uma droga capaz de fazer você utilizar 100% da capacidade de seu cérebro. O personagem principal abandona a carreira de escritor e utiliza desta droga e do mercado financeiro para enriquecer, criando um algoritmo que identifica os movimentos de mercado antecipadamente. Não é nada muito pesado, profundo, mas é legal para quem trabalha no mercado.” Bruno Gonçalves analista de investimentos

“Foi lançado recentemente o primeiro livro da trilogia Getúlio Dos anos de formação à conquista do poder (1882-1930), de Lira Neto, pela Companhia das Letras, quer aborda a formação educacional de Getúlio Vargas e a trajetória política que o leva ao comando da revolução e à conquista da Presidência da República em 1930. É enorme a importância de Getúlio Vargas na política brasileira do século XX e conhecer seu legado ajuda muito a entender nossa vida política atual.” Walter Mendes gestor de investimentos

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