Olhai os Lirios do Campo

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seus apetites. E ele saciava-os solitariamente, no silêncio do quarto, cheio de medo, de vergonha e de um trêmulo e ansiado prazer. Vinham-lhe depois tremendas lutas de consciência. Os professores faziam circular entre os alunos livros de educação sexual, em que havia pavorosas ameaças para os que se entregavam àquelas satisfações solitárias e pecaminosas. A Natureza castigava os que transgrediam as suas sábias leis. Eugênio lia e relia as torvas ameaças e já se considerava perdido, a caminho da imbecilidade, incapaz para o estudo e para a vida. Consultava o espelho. Via manchas arroxeadas em redor dos olhos. Sentia a cabeça umas vezes oca e outras pesada como chumbo. Doíam-lhe as costas. A memória era fraca. Não havia dúvida. Os sintomas que o livro dava... Era preciso emendar-se antes que ficasse completamente desgraçado. Atufavase no estudo, fugia das revistas onde houvesse gravuras eróticas, procurava espantar os pensamentos maus, evitava os colegas que gostavam de conversar obscenidades. Só não conseguia era fugir aos seus desejos, ao seu corpo. E naquela manhã ele sentia como nunca esse corpo. Ele pulsava por baixo das roupas leves e ásperas, estava vivo e aos poucos ia-se enchendo de uma força tão grande, tão quente e tão estranha, que Eugênio tornava a achar que era possível que estivesse mesmo doente. Do campo de desportos, onde alguns rapazes batiam bolas, vinham gritos trazidos pelo vento, pelo vento perfumado que arrepiava a pele de Eugênio , que lhe lambia o rosto, despertando-lhe pensamentos lúbricos. Para fugir às imagens pecaminosas, ele pensou em Margaret. O amor que tinha por ela era diferente. Ele queria mesmo que fosse diferente. Amava-a desde o ano anterior. Passara três meses de férias desejando a volta para o internato, pensando na menina, cheio de uma saudade esquisita, que era temperada de esperança, desconfiança, temor e suave desespero. Ela nunca chegaria a saber daquele amor... Tão loura, tão delicada, tinha os olhos azuis de boneca, uma vozinha doce, um jeito de figura. Sim, de figura. Ele não achava outra comparação, por mais que procurasse. Margaret não era bem real: era uma pintura. Como aquela moça corada dos cartazes do sabonete Ross.


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