PARAHYBA

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associação de moradores regularmente constituida para representar os moradores na Justiça. Como se vê, não bastam as disposições legais para garantir o direito à moradia adequada e a permanência das comunidades e, apesar de claramente contraditória a nossa ordem jurídico-urbanística, permanece a visão de vilas e favelas como “espaços vazios”. Na verdade, não apenas as grandes conquistas citadas anteriormente foram obtidas através das lutas das populações excluídas, como também, para serem consolidadas, necessitam de intensa mobilização destas mesmas populações. Procuraremos citar, a seguir, alguns exemplos de nossa cidade que comprovam esta tese. Na Vila Acaba Mundo, em 2008, uma grande parcela dos moradores esteve ameaçada de despejo, pois 19 lotes estavam em litígio, com ações de reintegração de posse: isto é, os proprietários destes terrenos reivindicavam a expulsão dos ocupantes. A comunidade mobilizada lotou a Câmara Municipal e pressionou para a aprovação unânime de um projeto de lei que determinava a desapropriação de toda a área da Vila e distribuição dos títulos de propriedade para os moradores. A lei foi vetada pelo prefeito Márcio Lacerda, que recentemente ocupara o cargo, mas, em compensação, o prefeito emitiu um decreto que declarava como de interesse público para fins de desapropriação os 19 lotes em litígio àquela época, o que serviu para garantir a segurança da posse dos moradores. Casos mais ou menos semelhantes tem ocorrido em outras vilas e favelas de Belo Horizonte; no Aglomerado Santa Lúcia, situado à beira da Barragem de mesmo nome, onde a Prefeitura está prestes a implantar o Programa Vila Viva, uma forte mobilização tem obrigado a URBEL a fazer seguidas revisões no projeto de intervenção. Depois de uma série de Audiências Públicas com a presença de lideranças comunitárias,

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entidades defensoras dos direitos humanos, do Ministério Público, e de funcionários da URBEL e da Prefeitura, a comunidade conseguiu uma nova proposta que reduzia a zero o número de remoções para fora do aglomerado advindas da implantação do Programa. Aqui, é a mobilização social que garantiu a participação democrática no planejamento urbano, prevista tanto pelo Estatuto da Cidade quanto pelo Plano Diretor de Belo Horizonte. De outro lado da informalidade, estão as ocupações planejadas Camilo Torres, irmã Dorothy e Dandara, as duas primeiras na região do Barreiro, e a última no bairro Céu Azul. Essas comunidades altamente polêmicas ocuparam de maneira organizada terrenos vazios que, a serviço da especulação imobiliária, não vinham cumprindo qualquer função social, e têm sofrido repetidas tentativas de despejo por parte da PBH. Apenas o esforço coletivo em torno de manifestações em frente à Prefeitura, acampamento e tentativas de negociação com o Poder Público tem evitado a expulsão. Todos estes casos, ainda que de naturezas distintas, tem semelhanças patentes, que permitem aferir algumas tendências no que diz respeito ao tratamento das ocupações informais por parte do poder público e da sociedade como um todo. Em primeiro lugar, estes assentamentos tem sua sobrevida permanentemente ameaçada, embora em ocupações mais consolidadas, como o aglomerado Santa Lúcia, essa ameaça seja menos iminente. Como mencionamos anteriormente, as vilas e favelas são vistas muitas vezes como espaços vazios. Vazios de direitos: à moradia digna, à cidade e à participação no seu planejamento, além, obviamente, de saúde, transporte, sanemento básico, etc. Não porque estes direitos não estejam listados em Leis ou na Constituição, mas porque o senso comum tem dificuldade em reconhecer às populações “ilegais” o status de cidadãos. Em suma, tornam-se espaços vazios porque são espaços de anulação da cidadania, como defende a Professora Miracy Gustin (2006) em brilhante artigo.


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