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Rascunho do espaço de apresentação de

RASCUNHO DO ESPAÇO DE APRESENTAÇÃO DE ADAMACHINE #1 NO CENTRO DE ARS SANTA MONICA

O público era ali colocado em uma situação desconfortável, em um lugar não preparado para haver uma presença física, mas pouco a pouco foi encontrando um lugar para se acomodar, onde não entrasse na frente da projeção. O público era o único corpo no espaço e suas reações evidenciavam um certo estranhamento. Alguns entravam e saíam da sala como se esperassem que a qualquer momento alguém entrasse e a apresentação começasse. Embora não tenhamos tido a chance de conversar com os presentes sobre suas sensações, nos parece interessante causar esse lugar do desconhecido que coloca o público em outro lugar, mais precisamente em um lugar sem lugar a ser descoberto por todos neste momento.

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Havia cinco fontes de áudio distintas pela sala: uma no centro, onde música e som eram controlados por mim, e outras quatro mantidas embaixo de cada tela, de onde saía o áudio direto de cada uma das transmissões de vídeo.

A única luz que havia era dos próprios projetores, que revelavam uma cena de um lugar comum, e com ele vinha também sua luz específica: da luz forte da cozinha de Virgínia; a luz avermelhada do quarto de Thiago, a luz azulada do banheiro de Andrea e a luz bem baixa que vinha de Cinthia, alojada na sala de máquinas do elevador do próprio espaço da apresentação.

Laura Malinverni caminhava pela sala com uma câmera de vigilância, ela era o corpo e os olhos de quem não estava presente. As imagens de Laura iam para nosso sistema de streaming e poderiam ser vistas por qualquer pessoa conectada. As imagens de Laura eram vistas também pelos performers, que direcionavam os movimentos de Laura. Em alguns momentos, quando queriam ver algo mais perto, como alguém da plateia que se encontrava escondido, Laura ia a esse encontro e lhes mostrava o que pediam. Laura era o único corpo presente da narrativa proposta, mas se comportava como se não estivesse ali, caminhando sem presença no espaço.

A performance inicia, cada projetor é uma janela para outro espaço, mas que divide o mesmo tempo e, ali no Centro de Ars Santa Mônica,

se conectam no espaço. Alguns jogos audiovisuais são propostos para compor a narrativa, mas delays de transmissão impossibilitam alguns. Na tela do computador de cada performer, eles podem ver a todos os 4 performers que estão online, mas não podem ver o espaço total, sem saber se suas imagens estão sendo projetadas naquele momento. Eu influencio na narrativa, hora tirando, hora inserindo as imagens dos performers e hora acrescentando filtros nessas imagens, tornandoas distorcidas, ou mesmo indiscerníveis. Também controlo o áudio, o que faz que o público seja direcionado para alguma tela em determinado momento. Embaixo de cada projeção, existe uma caixa de som referente àquela tela. E assim se passam os 20 minutos da performance, entre a tensão da instabilidade da rede e o empenho dos jogos dramatúrgicos em criar novas presenças, afetuosas, com o público presente, e o espaço que reúne a todos. A performance encerra com os performers aplaudindo o público, os corpos presentes. Ao evocar a presença de corpos que não se encontram em sua materialidade, nos aproximamos de discussões sobre o pós-humano e chegamos a Paula Sibilia, que indica que já vivemos na época do pós-orgânico, onde a própria compreensão do que é “vida” tem sido ampliada e modificada. Intuitivamente pensamos que a presença vem de algo que tem vida, mas como sentir a presença de alguém ou algo que não compartilha o mesmo espaço físico?

Que tipo de saber é este que entende o corpo humano como uma configuração orgânica condenadobsolescência e o converte em um objeto da pós-evolução? … trata de uma tecnociência de vocação fáustica, cuja meta consiste em superar a condição humana. Por isso, nos saberes hegemônicos contemporâneos, fulguram certas tendências neo-gnósticas, que recusam o caráter orgânico e material do corpo e humano e pretendem superá-lo, buscando um ideal asséptico, artificial e imortal.(Minha tradução) 28

SIBILIA, Paula (2005: p.43)

Se evocar uma presença pressupõe evocar uma forma de vida, e vida é um conceito em transformação, este trabalho nos parece muito pertinente quanto à compreensão de nossos corpos sobre tantas teorias.

Trabalhos telemáticos buscam, de uma forma geral, expandir nossas possibilidades de consciência e estar no mundo, unindo tecnologias e afetos.

28 Original: ¿Qué tipo de saber es el que entiende al cuerpo humano como una configuración orgánica condenada a la obsolescencia y lo convierte en un objeto de la post-evolución? ...trata de una tecnociencia de vocación fáustica, cuya meta consiste en superar la condición humana. Por eso, en los saberes hegemónicos contemporáneos fulguran ciertas tendencias neo-gnósticas, que rechazan el carácter orgánico y material del cuerpo humano y pretenden superarlo, buscando un ideal aséptico, artificial, virtual e inmortal.