As Primeiras OrganizaçõesTrabalhistas do Brasil

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Sindicato dos Padeiros de São Paulo - Projeto Memória

As Primeiras Organizações Trabalhistas do Brasil

As primeiras organizações trabalhistas em nosso país remontam o modelo medieval herdado de Portugal - as chamadas corporações ou guildas. Essas corporações profissionais existiam desde a Antiguidade. Na Grécia e em Roma suas funções eram homenagear os membros que morriam, prestar auxílio às viúvas, aos doentes e inválidos e regulamentar o preço dos produtos. A partir dos antigos construtores judeus e romanos, essas 1


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associações se difundiram pela Europa. Entre os séculos XI e XII, existiram nas cidades alemãs, britânicas, francesas e espanholas as guildas, associações com caráter espiritual que associavam trabalhadores de uma mesma categoria profissional. As corporações eram associações autorizadas por lei de profissionais que exerciam o mesmo ofício. Assim, as corporações eram formadas por homens livres com o objetivo de se ajudarem mutuamente tanto no aspecto material como no espiritual. Tratavam-se como irmãos. Nessas corporações, cada confrade tinha a obrigação de contribuir com uma série de taxas para as despesas necessárias à manutenção da organização. Em Portugal, as corporações se organizaram inicialmente em confrarias religiosas. Mais tarde, com o aumento da concentração urbana naquele país, os artífices se reuniam nos chamados “mesteirais” – termo com o mesmo sentido de “corporação”. Essas organizações de trabalhadores passaram a ter grande ascensão na vida das cidades portuguesas a partir das últimas décadas do século XIII. A Era dos Descobrimentos transformou esse cenário, desenvolvendo nas corporações de ofícios características tipicamente lusitanas. Elas se tornam 2


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“Confrarias” e “Irmandades”, o que implicava em uma relação de compromisso entre seus membros. Com efeito, passam a ser regidas por “Compromissos”, isto é, atos voluntários firmados entre os confrades, e por “Regimentos”, um conjunto de normas obrigatórias que normatiza o exercício daquela profissão confirmado pelo rei ou aprovado pela câmara local. Outro aspecto das corporações profissionais portuguesas e que veio se repetir em nosso país é a manutenção de “Hospitais”, que serviam tanto de albergue para viajantes, como de enfermaria, abrigo de pobres e centro de confrarias religiosas e corporativas. As mesteirais lusitanas eram caracterizadas ainda pela “Casa dos Vinte e quatro”, através da qual os “mecânicos” garantiam sua participação no governo municipal. A Casa dos Vinte e Quatro foi criada em Lisboa no reinado dom João I, em 1422 e perdurou naquele país até 1834. Por meio dela, os ofícios eram representados na câmara local, não só regulamentando os diversos aspectos da profissão, mas também auxiliando os vereadores nas questões técnicas relativas à sua atividade e deliberando sobre assuntos da cidade. Era um arranjo genuinamente democrático. Os líderes dos artesãos elegiam anualmente, entre os membros de 3


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sua corporação, 12 ou 24 representantes. Entre estes eram escolhidos quatro que se tornariam os procuradores dos ofícios, com direito a participar das sessões de vereança – as sessões nas câmaras municipais onde os vereadores deliberam e criam legislações. Entre 1481 e 1482, a câmara de Lisboa nas Cortes Gerais determinou que o exame dos ofícios fosse obrigatório, medida que também viria a ser adotada na colônia, meio século depois. Assim, um mestre só poderia exercer determinada profissão se fosse aprovado em um exame que determinava sua habilidade. Na mesma época, a Coroa exigiu que todos os ofícios elaborassem regimentos próprios e que as câmaras escolhessem dois juízes para fiscalizar o cumprimento dessas regras. Esses “juízes de ofício” também eram convocados para dar pareceres de obras públicas e para participar de cerimônias públicas. Era uma posição de grande prestígio social, embora esses juízes de ofício não tivessem acesso a títulos de nobreza. No Brasil, as corporações de ofício adquiriram traços próprios. Aqui, por conta da situação de dependência política, das formas de exploração econômica e do escravismo, não se desenvolveram organizações de ofícios mecânicos no mesmo nível das que existiam em 4


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Portugal ou, de um modo geral, na Europa, embora tenham conservado algumas das funções para as quais foram criadas na Europa. Esse aspecto particular pode ser visto na definição que Gilberto Freyre faz das corporações de ofício de Pernambuco. Em Sobrados e Mocambos, o sociólogo pernambucano define as corporações como “associações formadas por oficiais mecânicos, nas quais os mecânicos organizados em irmandades ou dirigidos por juízes de sua escolha tomavam parte na organização do Regimento e na taxação dos preços das respectivas obras”. Assim, no Brasil, grosso modo, os profissionais se organizavam em “irmandades”, uma instituição fundamental para o estudo dos trabalhadores brasileiros, em geral, e os da construção, em particular. Herdadas de Portugal, as irmandades seguiam o modelo das organizações de ofícios medievais europeias, embora adaptada à realidade colonial repleta de restrições impostas pela metrópole. As Irmandades de Ofícios Em Portugal, as irmandades surgiram nos séculos X e XI, associadas ao desenvolvimento das cidades e das atividades artesanais e comerciais. Eram forças auxiliares do Estado português, ao mesmo tempo em 5


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que buscavam avançar os interesses de um determinado local ou categoria profissional. Dessa forma, embora se organizassem a partir das estruturas administrativas da monarquia, as irmandades respondiam aos interesses de diversos grupos sociais – no caso, dos oficiais mecânicos – da localidade. Essas confrarias, que agrupavam os leigos no catolicismo tradicional, eram um dos principais elementos agregadores da sociedade portuguesa e do Brasil colonial, onde surgem ainda no início desse período, tornando-se mais presentes nos séculos XVII e XVIII. Foram, com efeito, um dos pilares da ocupação portuguesa tanto na Ásia, como na África e na América. Eram essencialmente associações de caridade através das quais os irmãos se ajudavam mutuamente nas dificuldades, prestando aos seus membros desde um enterro digno e missas por ocasião da morte, até empréstimos em dinheiro em vida. As condições para o ingresso nessas fraternidades e até mesmo o comportamento dos irmãos eram estabelecidas nos compromissos das irmandades, os quais eram redigidos pelos irmãos. O culto em comum a um santo era um elemento fundamental dessas instituições. Assim, como em todas 6


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as irmandades, as que os oficiais da construção fundaram tinham um santo patrono que possuía afinidade com o ofício. É outra tradição que remonta à Antiguidade e à Idade Média. As irmandades eram regidas por um Compromisso Amigo (ou “Compromissos”), ou seja, sem confirmação do rei. Esse compromisso era votado democraticamente e nem mesmo os juízes de ofício, escolhidos pelos irmãos para representar seus interesses na câmara municipal, podiam alterar o documento sem a anuência dos confrades, pois isso poderia interferir nos direitos dos mestres e ameaçar sua autonomia. Além dos compromissos, as irmandades de ofícios produziam um Regimento, o qual regulamentava diversos aspectos das profissões. Esse estatuto, escrito e democraticamente “confirmado” por voto secreto, era submetido ao governo real para aprovação. Essas regulamentações do exercício do ofício eram respeitadas pelo resto da sociedade e protegiam os membros da categoria evitando interferências na sua atuação. Algumas Irmandades tiveram papel importante na luta pela independência do Brasil. Os membros da como a Confraria e Irmandade de São José do Ribamar dos 7


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Quatro Ofícios Anexos, que congregava mestres carpinteiros, pedreiros, marceneiros e tanoeiros no Recife colonial, tiveram destaque na Revolução Pernambucana de 1817, que declarou a independência de Pernambuco e separou o resto da província do Brasil. Fundada no século XVII, a Irmandade era associada à Academia do Paraíso e a outras sociedades secretas envolvidas na Revolução Pernambucana.

Direito reservados: Sindicato dos Padeiros de São Paulo, 2012 Este artigo pode ser reproduzido para fins educativos; a fonte e o autor devem ser citados

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