Sustentabilidade, na prática - OpCP28

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www.revistaopinioes.com.br

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ISSN: 2177-6504

FLORESTAL: celulose, papel, carvão, siderurgia, painéis e madeira jun - ago 2012

a sustentabilidade, na prática




índice

sustentabilidade, na prática

Ensaio Especial:

Editorial:

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Marina Silva

Presidente do Instituto Marina Silva

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Visão de Governo:

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Helena Carrascosa von Glehn

Coordenadora do Pacto Restauração Mata Atlântica

Visão de Entidades: Marco Polo de Mello Lopes

Presidente executivo do Instituto Aço Brasil

Visão do Sistema Florestal:

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Renato Moraes de Jesus

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Miguel Antonio de Goes Calmon

Diretor Operacional da Symbiosis

Alexandre Di Ciero

Gerente Executivo de Sustentabilidade da Suzano

Roosevelt de Paula Almado

Gerente de PF e MA da ArcelorMittal BioFlorestas

Visão de ONGs: Assessor de Estratégia da The Nature Conservancy

Luiz Ernesto George Barrichelo Diretor Executivo do IPEF

Visão Científica:

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Luiz Gylvan Meira Filho

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Cristóvão Lins

Professor do Instituto de Estudos Avançados da USP

Eduardo Mário Mendiondo

Professor da Escola de Engenharia de São Carlos-USP

Christiane Holvorcem

Pesquisadora do Lab Ecologia Espacial e Consv-UNESP

Giselda Durigan

Pesquisadora da Estação Ecológica de Assis do MA-SP

Herly Carlos Teixeira Dias

Professor da Universidade Federal de Viçosa

Carlos Clemente Cerri

Professor do Centro Energia Nuclear na Agricultura-USP

Rogério Ribeiro de Oliveira

Professor do Dpto de Geografia da PUC-Rio

Visão Local - Amazônia: Eng agrônomo, escritor, especialista em Amazônia

Fornecedores & Consultorias:

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Gabriela Procópio Burian

Gerente de Meio Ambiente da Monsanto do Brasil

Mônica Cabello de Brito

Diretora da Casa da Floresta Assessoria Ambiental

Roberto Isao Kishinami

Diretor-geral da NRG Consultoria em Energia e MA

Armando Luís Pironel

Diretor da Green Head Industrial e Serviços

Maria José Brito Zakia

Consultora de Meio Ambiente da Práxis

Marco Antonio Fujihara Diretor da Key Associados

Philippe Lisbona Diretor da Verdesa

Cindy Silva Moreira

Gerente de Projetos da DeltaCO2

Mercado, Bancos & Fundos: Roberto Ricardo Barbosa Machado, Bob Gerente de Operações da BBM

André Loubet Guimarães

Diretor da Conservação Internacional do Brasil

Márcio Macedo Costa

Chefe do Dpto de Meio Ambiente do BNDES

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Conselho Editorial da Revista Opiniões: ISSN - International Standard Serial Number: 2177-6504 Divisão Florestal: • Amantino Ramos de Freitas • Antonio Paulo Mendes Galvão • Celso Edmundo Bochetti Foelkel • Helton Damin da Silva • João Fernando Borges • Joésio Deoclécio Pierin Siqueira • Jorge Roberto Malinovski • Luiz Ernesto George Barrichelo • Marcio Nahuz • Maria José Brito Zakia • Mario Sant'Anna Junior • Mauro Valdir Schumacher • Moacir José Sales Medrado • Nairam Félix de Barros • Nelson Barboza Leite • Paulo Yoshio Kageyama • Rubens Cristiano Damas Garlipp • Sebastião Renato Valverde • Walter de Paula Lima Divisão Sucroenergética: • Carlos Eduardo Cavalcanti • Eduardo Pereira de Carvalho • Evaristo Eduardo de Miranda • Jaime Finguerut • Jairo Menesis Balbo • José Geraldo Eugênio de França • Manoel Carlos de Azevedo Ortolan • Manoel Vicente Fernandes Bertone • Marcos Guimarães Andrade Landell • Marcos Silveira Bernardes • Nilson Zaramella Boeta • Paulo Adalberto Zanetti • Paulo Roberto Gallo • Plinio Mário Nastari • Raffaella Rossetto • Roberto Isao Kishinami • Tadeu Luiz Colucci de Andrade • Tomaz Caetano Cannazam Rípoli • Xico Graziano


obrigado!

Agradecemos ao setor florestal pela gentileza dedicada ao nosso trabalho elegendo a Revista Opiniões para receber o Troféu Madeira 2012 na categoria Comunicação Social.

63% das indicações Escolhidos: Comunicador Social: William Domingues de Souza, Revista Opiniões

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FLORESTAL: celulose, papel, carvão, siderurgia, painéis e madeira ISSN: 2177-6504

set-nov 2011

Empresário: José Luciano Penido, Fibria Gestor Público: José Renato Casagrande, governador do Estado do Espírito Santo Líder Nova Geração: Leonel Menezes, Ageflor ONG: Centro de Desenvolvimento do Agronegócio, Vitória, ES Pesquisador: Joésio Deoclécio Pierin Siqueira, STCP Engenharia de Projetos

desenvolvimento e/ou preservação?


editorial

sustentabilidade

real

Uma das novidades mais visíveis atualmente é a revolução no comportamento e nas relações humanas que a tecnologia da informação tem provocado. As plataformas que aproximam milhões de pessoas nas redes sociais criam inúmeras oportunidades para o avanço e o aperfeiçoamento da democracia, para o controle social e para os processos educativos. Sinais promissores de tempos que a humanidade jamais viveu. Mas esses bons ventos colidem com densas nuvens que pairam sobre nosso horizonte comum, num contexto também inédito para a humanidade.

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Mas a melhor explicação para todas essas crises está numa outra crise mais profunda e potente, a crise dos valores. É ela que nos faz desconsiderar o impacto de nossas ações sobre o próximo e sobre as condições que sustentam e promovem a vida no planeta. "

Assim como os rios menores de uma bacia hidrográfica convergem para formar o rio principal, experimentamos vários tipos de crises que convergem e conformam o que eu chamo de crise civilizatória. A crise social é denunciada pelos mais de 2 bilhões de pessoas que agonizam com menos de 1 dólar por dia no mundo. Desses, 15 milhões no Brasil. A crise econômica solapa empregos e recursos públicos, tornando ainda mais vulneráveis as economias nacionais. A crise ambiental tem sua maior expressão na perda de biodiversidade e no aquecimento global, que ameaçam produzir profundas alterações nas condições de vida na Terra. Vivemos também uma crise sinalizada por movimentos espontâneos em todo o mundo como uma reação à estagnação da política, que exilou os sonhos dos jovens e se transformou em mero projeto de poder pelo poder.

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Mas a melhor explicação para todas essas crises está numa outra crise mais profunda e potente, a crise dos valores. É ela que nos faz desconsiderar o impacto de nossas ações sobre o próximo e sobre as condições que sustentam e promovem a vida no planeta. É, aparentemente, mais fácil falar de sustentabilidade em termos pragmáticos. Mas acho que precisamos pensar nesse conceito sob a perspectiva correta, a dos valores. O que esse termo representa para cada um de nós? Oportunidade de negócios? Uma bandeira de contestação? Será que temos consciência crítica do im-

pacto de nossas ações sobre o planeta? Estamos dispostos a mudar? Entendo sustentabilidade como um ideal humano a nos orientar agora e no futuro. O ser sustentável do século XXI precisará fazer as melhores escolhas pensando no coletivo e não apenas na maximização de seus benefícios. A empresa sustentável persegue o lucro admirável e não o que impõe danos à natureza e à sociedade. Como podemos traduzir tudo isso? A discussão sobre o futuro das florestas no Brasil é uma ótima ilustração do conceito de sustentabilidade na prática, ou da falta dele. A conservação e o uso sustentável das florestas é condição fundamental para que nosso país se desenvolva com sustentabilidade social, ambiental, econômica e cultural. Desde que os levantamentos da FAO começaram a ser feitos na década de 60, conseguimos resultados expressivos na luta


Opiniões contra a destruição das florestas no mundo, e foi o Brasil o país que mais contribuiu para esse resultado. A redução de quase 80% nas taxas de desmatamento da Amazônia desde 2004 é o resultado de uma política pública erigida sobre os fundamentos da sustentabilidade, que resultou no Plano de Combate ao Desmatamento da Amazônia. Nunca antes dominamos tão bem as técnicas de silvicultura para produzir de forma sustentável tantos bens e serviços das florestas como atualmente. No entanto nunca antes se presenciou tão forte mobilização econômica e política para reverter a tendência de fortalecimento da governança socioambiental. O processo de mudança do Código Florestal foi uma claríssima demonstração desse conflito. No momento em que escrevo este artigo, não sei qual será a decisão da presidente Dilma quanto ao projeto de lei que altera o Código Florestal. Centenas de jovens de todas as idades estão em frente ao Palácio do Planalto, fazendo uma simpática e cívica serenata para embalar a mente e o coração de nossa presidente para ajudá-la a contribuir para que a sustentabilidade seja um valor a orientar nossa caminhada rumo a uma sociedade desenvolvida, justa e fraterna. Curiosamente, o setor florestal, que deveria exercer uma ação proativa na defesa da sustentabilidade, não se posicionou claramente em favor das florestas e sua conservação. A sustentabilidade é um conceito prático, tangível e auditável. Portanto é muito simples verificar sua observância nas condutas individuais, coletivas, empresariais e institucionais. Como é que o setor de florestas plantadas pautará sua expansão para o nordeste brasileiro e como lidará com os remanescentes do bioma cerrado em estados como

atividades econômicas, emprego, renda e divisas, de forma sustentável? E que tal investir para que o Serviço Florestal Brasileiro seja uma instituição robusta, com grande poder de fomentar o crescimento do setor florestal sustentável no País? Afinal, temos ministérios e secretarias de peso voltadas para a pesca, a agricultura, a indústria, mas e para as florestas, que representam 65% do território nacional? Costumo repetir quase como um mantra as instigantes palavras da psicopedagoga gaúcha Nádia Bossa, “a realidade responde na língua em que é perguntada”. Acho que essas são algumas perguntas que não podem deixar de ser feitas à realidade de nosso tempo. A história do setor de florestas plantadas do Brasil é uma das boas provas de que, quando as perguntas são feitas na linguagem certa e comprometida, a realidade sempre está apta a nos dar a resposta. A sustentabilidade não é apenas um conceito prático. Ela nos induz a fazer novas perguntas e a buscar novas respostas. A sustentabilidade é também um estilo, um ideal de vida, é mais que um simples modo de fazer, é uma maneira de ser, que se realiza quando se torna exemplo de vida prático, dos negócios à política.

Marina Silva Presidente do Instituto Marina Silva

Piauí e Maranhão? O que a experiência de expansão da cultura de eucalipto em outras partes do Brasil nos ensina em termos de sustentabilidade? Será que não deveria ser o próprio setor a estar defendendo a realização do zoneamento do eucalipto, para que, num processo democrático e transparente, se estabeleça a zona de expansão dessas culturas, observando a segurança alimentar e a biodiversidade? Não seria coerente se o próprio setor de florestas plantadas assumisse o compromisso voluntário de desmatamento zero? Não seria uma postura sustentavelmente coerente se o governo obrigasse os bancos oficiais a regulamentar a cobrança da taxa de juros de 4,5% prevista em lei para o exercício da atividade florestal? Não seria bom se houvesse um investimento público expressivo no desenvolvimento de silvicultura de espécies nativas, na qual se pudesse gerar

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visão de governo

Opiniões

reserva legal:

oportunidade ou castigo?

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o mito de que as reservas legais devem ser intocáveis lamentavelmente foi tão difundido, que uma atividade que poderia ser considerada uma oportunidade é hoje vista como um castigo "

Helena Carrascosa von Glehn Coordenadora do Conselho do Pacto pela Restauração da Mata Atlântica

Há a percepção generalizada de que a Reserva Legal representa um ônus para os proprietários rurais, que seriam privados do uso de parte de seus imóveis (e de sua renda) em benefício da coletividade. A reserva seria, assim, uma espécie de punição ou sacrifício imposto a alguns para benefício de terceiros. Muitos se esquecem de que a possibilidade de compensação de reservas legais fora do imóvel trouxe racionalidade à sua localização, permitindo evitar conflitos entre a conservação ambiental e a produção agropecuária. Não se trata de substituir 20% da área de cana, café, grãos, laranja, etc., por florestas a serem mantidas intocáveis e, sim, dar destinação adequada a áreas com vocação florestal. Mesmo no estado de São Paulo, com toda a pujança dos agronegócios, há áreas com aptidão florestal em quantidade suficiente para regularizar as reservas legais de todos os imóveis. É possível promover a adequação ambiental sem comprometer a produção agropecuária, e há muitas situações em que a substituição de atuais usos inadequados por florestas traria aumento e não redução da renda. Não há previsão legal para o manejo de remanescentes bem preservados de mata atlântica. Embora haja previsão no Código Florestal para a exploração das reservas, houve o veto dos dispositivos da lei da mata atlântica que tratavam do manejo. Por isso pouco se tem falado sobre a exploração de reservas legais, e, assim, o potencial econômico de florestas plantadas para a regularização de reservas tem sido também desconsiderado. Mais do que uma forma de garantir a preservação da vegetação existente, a Reserva Legal pode ser um instrumento de fomento ao plantio de florestas, que podem ser planejadas para conciliar a exploração com a manutenção das funções ambientais que justificam sua existência. Essa dupla finalidade é plenamente viável, basta que se assuma, como estabelece a lei, que as reservas não são santuários a serem mantidos sem qualquer interferência humana. Havendo clareza dos objetivos das reservas, será possível monitorá-las, limitando a exploração a níveis que não comprometam as suas funções. É preciso adequar as expectativas em relação às reservas, que não são áreas de proteção integral. Aceitando-se prazos mais longos para a restauração dos processos ecoló-

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gicos, o uso temporário de espécies exóticas consorciadas com nativas pode ajudar a assegurar a necessária viabilidade econômica. As iniciativas de implantação de florestas nativas com finalidade comercial são ainda incipientes. Isso porque há grande carência de informações silviculturais sobre espécies da mata atlântica e do cerrado e muitas incertezas em relação a mercados para os produtos e serviços florestais. Essas lacunas impedem uma adequada avaliação econômica da atividade e inibem a contratação de financiamentos. A falta de uma regulamentação capaz de garantir segurança jurídica para a futura exploração das florestas também contribui para o problema. Os proprietários rurais de áreas com vocação florestal não são encorajados a implantar florestas nativas com a finalidade de produzir madeira e produtos não madeireiros, e, em consequência, áreas que poderiam ser produtivas permanecem subutilizadas ou degradadas. Um amplo programa de regularização de reservas legais, nos próprios imóveis ou por compensação, poderia impulsionar a formação de florestas, criando novas oportunidades de produção e renda para produtores rurais em áreas com essa vocação. E, além de receitas pela comercialização de produtos florestais, há, ainda, a possibilidade de remuneração por serviços ambientais, especialmente sequestro de carbono e proteção da água. Viabilizar economicamente as reservas legais é o grande desafio que governos, cientistas e produtores rurais devem enfrentar. Quando florestas nativas forem consideradas uma fonte real de renda para o produtor rural, naturalmente as terras com vocação florestal serão mais bem aproveitadas. Com o aumento dos índices de vegetação, a oferta dos serviços ecossistêmicos será ampliada com benefícios para toda a sociedade, inclusive para os produtores rurais, pois não há produção agropecuária sustentável sem conservação de solo e água, polinizadores, inimigos naturais de pragas, etc. O mito de que as reservas legais devem ser intocáveis lamentavelmente foi tão difundido, que uma atividade que poderia ser considerada uma oportunidade é hoje vista como um castigo. Isso mostra que proteção demais, às vezes, desprotege.



visão das entidades

o crescimento

Opiniões

sustentável

A indústria do aço está associada à história de desenvolvimento do Brasil. Das usinas siderúrgicas instaladas no País, saiu o aço de nossas hidrelétricas, torres de transmissão, edifícios, pontes e viadutos. O aço está nas máquinas e equipamentos que impulsionam o agribusiness e todos os segmentos industriais. O aço é o material usado em todos os meios de transporte e está presente em todos os momentos de nosso dia a dia. Da mesma forma, a indústria do aço também se associou ao esforço para a construção de um futuro sustentável para o planeta. Vem, permanentemente, atuando para a otimização do consumo de matérias-primas e insumos e redução dos impactos sobre o meio ambiente. Em 1992, quando foi realizada a Cúpula da Terra, no Rio de Janeiro, o setor praticamente já havia concluído a maior parte dos investimentos em sistemas “fim de tubo”, abrangendo equipamentos de controle das emissões atmosféricas e estações de tratamento dos efluentes líquidos de suas unidades industriais. Passados 20 anos, o Rio de Janeiro volta, em 2012, a sediar evento da ONU para discutir um novo modelo de desenvolvimento, que propicie a migração para uma economia mais verde e com maior equidade social. No período entre esses dois dos mais importantes eventos mundiais relacionados ao desenvolvimento sustentável, os conceitos e as tecnologias evoluíram. A indústria passou a atuar na sustentabilidade de seus processos, adotando tecnologias mais limpas, buscando maior eficiência energética e reduzindo os descartes no meio ambiente. Os gases de coqueria e de alto-forno gerados na rota a carvão mineral são aproveitados para a cogeração de energia elétrica. 100% das escórias de alto-forno são utilizadas para produção de cimento, em substituição ao clinquer, reduzindo as emissões de CO2 desse processo e o consumo de recursos naturais não renováveis. As empresas produtoras de aço no Brasil participam ainda de projetos consorciados destinados a desenvolver tecnologias inovadoras de redução de emissão de CO2 no processo siderúrgico. Quando a rota tecnológica é a base de carvão vegetal, 80% do total consumido pela indústria do aço provêm de florestas plantadas próprias, 10% de florestas plantadas de terceiros e 10% de resíduos florestais legalizados.

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um dos pontos mais relevantes do “Protocolo de Sustentabilidade do Carvão Vegetal” é o compromisso da indústria do aço de atingir, em até quatro anos, 100% de florestas plantadas para atender à sua demanda de carvão vegetal "

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Marco Polo de Mello Lopes Presidente executivo do Instituto Aço Brasil

Todas as empresas associadas ao Instituto Aço Brasil têm processos de avaliação, qualificação e auditoria desses fornecedores, envolvendo verificações relativas às relações de trabalho e ao cumprimento de todas as exigências legais, incluindo licenças e autorizações dos órgãos ambientais. No início de abril deste ano, o Instituto Aço Brasil e empresas associadas lançaram o “Protocolo de Sustentabilidade do Carvão Vegetal”, no qual ratificaram o compromisso do setor com a produção sustentável desse insumo. Um dos pontos mais relevantes do documento é o compromisso da indústria do aço de atingir, em até quatro anos, 100% de florestas plantadas para atender à sua demanda de carvão vegetal. Outra ação importante listada no protocolo é a implementação de um Programa de Qualificação de Fornecedores. As empresas do setor farão a harmonização dos requisitos para avaliação e qualificação de fornecedores, mantendo relação comercial somente com aqueles que cumpram todas as exigências legais. A indústria brasileira do aço reafirmou, dessa forma, seu permanente compromisso com a sustentabilidade. A concepção de produtos, por sua vez, também vem incorporando, de forma crescente, o ciclo de vida dos materiais, favorecendo aqueles que possam ser reciclados e não causem impactos sobre o meio ambiente ao fim da vida útil. O setor vem de todas as formas enfrentando os desafios para o crescimento sustentável, transformando-os em oportunidades, na expectativa do aumento do consumo doméstico de aço, e considerando os cenários de médio e longo prazos nos quais o desempenho socioambiental será um diferencial importante de competitividade.



visão do sistema florestal

nossos avanços

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são inegáveis e relevantes os avanços que a silvicultura brasileira vem atingindo na formação dos monocultivos ... chega-se, inclusive, a estabelecer uma raça local com altas produtividades e resistência às pragas e doenças "

Renato Moraes de Jesus

Diretor Operacional da Symbiosis

Nas diferentes regiões do País, são inegáveis e relevantes os avanços que a silvicultura brasileira vem atingindo na formação dos monocultivos. Através dos seus programas de melhoramento genético, chega-se ao requinte de se produzir uma biomassa de acordo com as exigências industriais e, progressivamente, com significativos incrementos volumétricos que ainda parecem não chegar aos limites de capacidade produtiva do site. Chega-se, inclusive, a estabelecer, a esse nível, uma raça local com altas produtividades e resistência às pragas e doenças. Em simultâneo, desenvolvem-se não apenas práticas de adubação não limitantes ao arranque inicial dos plantios, mas também com a respectiva manutenção dessas produtividades. Esses são alguns exemplos dessa silvicultura e que se estendem desde o planejamento da formação dos povoamentos até a própria utilização industrial da bioamassa. Na maioria das empresas atuantes na formação desses monocultivos, são destaques, também, independentes dos objetivos, os compromissos trabalhistas com os seus empregados diretos e terceirizados e que se estendem além dos compromissos legais. Contribuem expressivamente para o crescimento sociocultural de todos os envolvidos no processo, o que é irradiado para toda a comunidade e chega a induzir, naturalmente, a adoção de procedimentos semelhantes por empresas com outras atividades na mesma região e, paulatinamente, se estabelece a cidadania. Sem dúvida alguma, ao considerarmos esses dois aspectos, poderíamos afirmar que a silvicultura brasileira de monocultivos estaria caminhando para a sua real sustentabilidade. Não obstante, são ainda sombreadas por ela as atividades de restauração das Áreas de Preservação Permanente e mesmo a recomposição da Reserva Legal, o que não a coloca nessa condição. Independente ao imbróglio da aprovação do Código Florestal, já há muito inexiste nela a mesma energia usada na formação dos monocultivos de atender, pelo menos em toda a sua amplitude, essas não conformidades legais. Sob vários argumentos, ela é protelada e, quando feita, é de forma inadequada, onde até então os resultados são comprometedores e, diante da magnitude da atividade, são inexpressivos. O interessante é que a quem cabe orientar e fiscalizar envereda mais pela geografia política das espécies (como se elas a tivessem) do que pelo contexto da paisagem, do

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aspecto funcional das espécies e mesmo o legal. A maioria se prende a uma xenofobia botânica e começa a dar nacionalidade às espécies em que a palavra “exótica” é o principal bordão. Esse comportamento inibe e dificulta a implantação dos monocultivos, e aí com todas as implicações socioambientais e mesmo as de caráter industrial. Ainda predomina o preceito de se usar madeira daquele “manejo florestal sustentado” do que a originada de reflorestamento. Poderia ser dada a atenção e cobrança devida àquela restauração e mesmo recomposição do que a inocuidade daquele bordão. Atualmente e felizmente, as instituições de pesquisas e ensino já mostram os caminhos mais propícios àquelas práticas e outro bordão, agora por parte dos implantadores dos monocultivos, de que nada se sabe dessas práticas, o que é até mesmo inconcebível. Certamente, ainda não se tem a melhor forma de fazê-las, mas, com certeza, já se sabe como não fazê-las. O aprimoramento virá com o fazer, a exemplo do acontecido com o próprio início dos monocultivos, em que até mesmo o conceito de espécie/procedência era desconsiderado. Na restauração das APPs, existem formas clássicas de se fazê-la e sempre em função da resiliência ecossistêmica de cada site: uma é feita com mudas e/ ou sementes, outra é conjugando essa forma com a própria resiliência, e uma só a considerando, onde o princípio é a indução da regeneração natural por meio do controle efetivo das plantas invasoras, principalmente cipós, bambus e outras gramíneas. Falta, ainda, o fazer em larga escala, o que, certamente, diminuirá os custos dessa prática e trará algum outro refinamento, sempre rateando com os custos dos produtos florestais dos monocultivos. Na essência, considerar que não se está legalizando uma não conformidade legal e sim se ajustando aos preceitos da sustentabilidade. Com relação à recomposição da Reserva Legal, também é começar a fazer e entender, fundamentalmente, que essa prática não se restringe à conservação e ao resgate da biodiversidade, mas também à produção madeireira e outros serviços ecossistêmicos. Nesse segmento, é que as instituições de pesquisa e ensino precisam estar mais focadas e contribuir para a sociedade para resolver um problema não só dos monocultivos, mas também de todas as áreas envolvidas no uso direto do solo.


Opiniões

benefícios ao negócio e à sociedade O ano de 2012 será marcado pelas discussões em torno da sustentabilidade. No âmbito internacional, teremos a realização da Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que marca os 20 anos da Eco-92. Em nível nacional, as discussões do Código Florestal, cercadas de embates políticos, mobilizam diversos setores da sociedade e da imprensa. O setor florestal, em particular as empresas produtoras de celulose, vem participando do debate e buscando contribuir com diversas práticas, algumas iniciadas ainda na década de 1980, quando as discussões em torno do desenvolvimento sustentável não tinham alcançado a grande mídia. Naquela época, foram implantadas técnicas de silvicultura que visavam minimizar a intervenção no solo e intercalar o plantio florestal aos fragmentos de mata nativa. Isso foi feito em paralelo com outras práticas para aumentar a produtividade florestal, mostrando que é possível alinhar a preservação ambiental com a expansão do negócio. Já na década de 1990, com o processo de internacionalização, os clientes passaram a demandar informações sobre cuidados ambientais e sociais que envolviam a operação. As certificações surgiram, então, como uma forma de aprimorar as práticas internas, alinhando-as a padrões internacionais e mostrando aos clientes a preocupação com a sustentabilidade presente na produção. Em 1996, a Unidade Mucuri da Suzano, por exemplo, foi a primeira empresa do hemisfério sul a conquistar a certificação ISO 14001 de gestão ambiental. Em 2004, foi a vez do selo FSC (Forest Stewardship Council), que observa os padrões socioambientais ligados à operação. Hoje, essas certificações são fundamentais para acessarmos alguns mercados, principalmente na Europa. Nos anos 2000, com o aquecimento global na pauta da mídia e da política, o setor passou a tratar do tema. Na Suzano, em 2007, demos início aos inventários de emissão de gases de efeito estufa (GEE) de nossas unidades, retroativos ao ano de 2003, e utilizando a metodologia GHG Protocol. Em 2009, por demanda de um cliente internacional, começamos a quantificação da pegada de carbono de alguns de nossos produtos.

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Fomos a primeira indústria de celulose no mundo e a primeira empresa na América Latina a quantificar a pegada de carbono da celulose utilizando a metodologia PAS 2050 e obtendo a certificação Carbon Reduction Label, concedida pelo Carbon Trust. A pegada de carbono, por possuir uma abordagem de Análise de Ciclo de Vida (ACV), é a medida mais eficaz e precisa para mensurar as emissões de GEE de um produto e serve como uma importante ferramenta para o desenvolvimento de estratégias de redução desses gases ao longo da cadeia. Para garantir a imparcialidade da pegada de carbono dos nossos produtos, buscamos fundamentos e instituições que assegurassem os resultados. A ICF, consultoria internacional, realizou o levantamento e a quantificação dos gases, tendo como base a metodologia PAS 2050, que, à época, era a única mundialmente publicada. A diferença básica entre a pegada de carbono de um produto e o inventário corporativo de emissões de uma empresa está nas fronteiras de cálculo que definem o escopo de cada uma das abordagens. Enquanto a pegada de carbono quantifica as emissões de GEE associadas a todas as etapas do ciclo de vida de um produto, o inventário quantifica as emissões de uma determinada etapa da cadeia de produção. Ao submeter as pegadas de nossos produtos à auditoria do CarbonTrust, que concedeu à Suzano a certificação Carbon Reduction Label, buscávamos mais do que um selo que atestasse a precisão dos cálculos, mas uma forma de evidenciar nosso compromisso com a redução das emissões. Isso porque o selo exige que, a cada dois anos, a empresa comprove que reduziu essas emissões. Foi o que fizemos no final de 2011, mostrando reduções nas pegadas, comprovadas durante o processo de verificação da CarbonTrust. Todas essas iniciativas exigem recursos financeiros e humanos para acontecer. Mas os resultados que conseguimos até aqui, principalmente junto aos clientes, mostram que vale a pena seguir por esse caminho. E, mais do que isso, valem a pena pelo resultado que trazem para a sociedade e para o meio ambiente, em nível local e mundial.

fomos a primeira indústria de celulose no mundo e a primeira empresa na América Latina a quantificar a pegada de carbono da celulose utilizando a metodologia PAS 2050 e obtendo a certificação Carbon Reduction Label, concedida pelo Carbon Trust " Alexandre Di Ciero

Gerente Executivo de Sustentabilidade da Suzano Papel e Celulose

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visão do sistema florestal

Opiniões

planejando o futuro A silvicultura sustentável é uma atividade de grande risco devido às intempéries climáticas, ambientais e de proteção florestal. Assim, questões como a identificação de resistência em plantas, a adaptação de genótipos e a mitigação de determinados efeitos que possam inviabilizar a atividade silvicultural tornam-se fundamentais na linha de P&D. Portanto o grande desafio da silvicultura atual frente à sustentabilidade será o de manter e aumentar o nível das produtividades atuais, e isso só será possível unindo a pesquisa genética com a pesquisa silvicultural, aplicando-as de forma adequada em operações planejadas no campo. Definir precisamente sustentabilidade e manejo florestal sustentável é difícil, devido à complexidade de conceitos e fatores científicos envolvidos nas mais diversas especialidades nas quais a atividade florestal se desenvolve, mas, segundo o Dicionário da Floresta (Helms), a sustentabilidade florestal é definida como “a capacidade das florestas em manter sua saúde, produtividade, diversidade e integridade global em longo prazo no contexto da atividade e do uso”. Particularmente, entendo que o setor florestal nacional evoluiu na área ambiental, mostrando que o “termo sustentabilidade florestal” tem passado da teoria à prática, isso desde a Rio-92. Um exemplo de progresso na última década são os programas internacionais aos quais as nações estão voluntariamente se agregando, para documentar e reportar seus progressos frente a metas mensuráveis de sustentabilidade. Destaco o Processo de Montreal, no qual as tendências e desafios ambientais estão sendo medidos através de critérios e indicadores específicos para assuntos econômicos, biológicos, valores culturais, sociais e espirituais para a silvicultura (Oliver et al.). Outro exemplo que caracteriza a passagem da teoria à prática no manejo florestal está nas certificações, como o FSC, que são designadas para garantir que padrões específicos de desempenho relativos ao manejo florestal sejam conseguidos pelos silvicultores. A tendência da empresa florestal para a busca da sustentabilidade é caminhar para o manejo cada vez mais participativo, no qual a comunidade é informada e convidada a tomar assento à mesa de discussões e decisões que irão afetar técnica, econômica, ambiental e socialmente a todos. A empresa sustentável assumirá, divulgará e comunicará a sua política e gestão ambiental de suas atividades, processos e produto às partes interessadas, buscando um importante canal de conhecimento e confiança que permitirá a sua perpetuidade na comunidade, resultando em benefícios econômicos, ambientais e sociais em longo prazo.

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a tendência da empresa florestal para a busca da sustentabilidade é caminhar para o manejo cada vez mais participativo, no qual a comunidade é informada e convidada a tomar assento à mesa de discussões e decisões " Roosevelt de Paula Almado

Gerente de PF e Meio Ambiente da ArcelorMittal BioFlorestas

Na linha da sustentabilidade, é fundamental a capacitação e o treinamento de funcionários e terceiros em noções básicas sobre educação, proteção e gestão ambiental, para resultar em estímulo a ações ambientais sustentáveis que, na maioria das vezes, serão exemplificadas em melhoria de desempenho e redução de custos, em que as boas experiências deveriam ser mais compartilhadas no setor florestal. O magnífico ato de plantar árvores e conservar a biodiversidade é um valor ambiental especial nosso, e devemos valorizá-lo estendendo-o a uma visão ecoeficiente em todas as etapas do processo produtivo florestal, devendo estar em processo dinâmico de aperfeiçoamento. Hoje, com a dificuldade de mão de obra encontrada, as pessoas devem ser ainda mais valorizadas e estimuladas à participação nos projetos ambientais e nos programas em desenvolvimento. A empresa sustentável deverá ter uma referência real com a qualidade ambiental, por isso garantirá a manutenção de algum selo de certificação de manejo florestal, de preferência com padrões nacionais, sendo responsabilidade de todos os empregados mantê-la, assumindo a gestão ambiental florestal de sua Unidade Gerencial. O zelo pela manutenção das boas práticas ambientais voltadas para o manejo, onde a efetiva comunicação deverá ser fator multiplicador entre funcionários e partes interessadas, deverá ser considerado pela empresa sustentável. A sustentabilidade deve ser tratada como uma oportunidade para manter a rentabilidade financeira da empresa, por isso a empresa sustentável deverá agregar valor ao negócio florestal através de projetos de carbono onde vários PDD’S (Project Design Document) tramitam no Executive Board da UNFCC-ONU. A sustentabilidade no setor produtivo estará relacionado também ao aumento dos plantios. Especificamente no setor de ferro gusa, estimando os consumos médios do estado de Minas Gerais para os próximos 5 anos, seriam necessários plantios em torno de 70.000 ha/ano para atendimento a 100% da demanda. A sustentabilidade passa pelo ato de planejar para o futuro, buscando incansavelmente a melhoria das condições de desenvolvimento da floresta, através da definição da base genética, preparo de solo, fertilização, tratos culturais, manejo e colheita. A silvicultura sustentável gerará riquezas, educará o homem, conservará os recursos naturais e a cultura local; cabe a nós buscar esse caminho que, indubitavelmente, consolidará o setor florestal do nosso país.



visão científica

Opiniões

a única alternativa possível

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sustentabilidade, para mim, implica legarmos para as futuras gerações um mundo em que elas tenham pelo menos as mesmas oportunidades que nossa geração teve "

Luiz Gylvan Meira Filho

Professor Convidado do Instituto de Estudos Avançados da USP

A minha abordagem do tema é sob a óptica da mudança do clima. Sustentabilidade, para mim, implica legarmos para as futuras gerações um mundo em que elas tenham pelo menos as mesmas oportunidades que nossa geração teve. Em particular, a sustentabilidade engloba necessariamente legarmos um clima estável, ou seja, somente com a sua variabilidade natural e não com um aquecimento progressivo e sem limite, como atualmente. Voltar ao clima da época pré-industrial já não é mais possível, a oportunidade foi perdida. Trata-se, agora, de mantê-lo sob controle, ou seja, com condições estáveis, ainda que em um nível diferente daquele pré-industrial. Nossos líderes, em Copenhague, em 2009, decidiram que, em conjunto, faríamos com que a mudança do clima ficasse limitada a um aumento de dois graus Celsius na temperatura média global da superfície do planeta, no ano de 2100. Para lograr esse objetivo, será necessário fazer com que as emissões antrópicas globais de gases de efeito estufa, no ano de 2050, sejam reduzidas em 60% em relação aos seus níveis de 1990 (e, portanto, em mais de 70% em relação aos níveis atuais, uma vez que as emissões globais aumentaram desde 1990). Essa redução será necessária, ainda que se decida estabilizar o clima em outro nível que não o de dois graus Celsius. O professor Robert Socolow, da Universidade de Princeton (EUA), realizou interessante estudo sobre os aspectos tecnológicos e econômicos associados às diferentes formas de reduzir as emissões de gases de efeito estufa. A conclusão é de que as reduções necessárias podem ser obtidas com tecnologias já desenvolvidas, mas ainda não usadas em grande escala, e a um custo suportável. Sua conclusão é de que será necessário recorrer a medidas em vários setores. Em particular, o plantio de árvores é um componente essencial da sustentabilidade do planeta sob o ponto de vista climático. O crescimento de árvores plantadas em terreno onde não há vegetação de porte significativo representa uma transferência líquida de carbono da atmosfera, onde está na forma de dióxido de carbono, para a matéria

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orgânica das árvores em crescimento, o que equivale a uma emissão negativa durante o crescimento das mesmas. Além disso, se a biomassa for utilizada para substituir o uso de combustíveis fósseis e se a floresta for replantada sempre que colhida, temos o benefício adicional de trocar a emissão de dióxido de carbono de origem fóssil por aquele renovável da biomassa plantada com rotação. Isso é verdade, na realidade, não somente para florestas, mas também para outros tipos de vegetação de crescimento rápido. É o caso, por exemplo, do etanol feito com cana-de-açúcar, bem como do carvão vegetal feito com eucalipto, capim-elefante ou bambu. No Brasil, o carvão vegetal renovável feito com eucalipto é especialmente importante. As propriedades mecânicas desse carvão vegetal permitem o seu uso em altos fornos, enquanto aquele feito com capim-elefante está limitado à fração que possa ser injetada em altos fornos. Mas há ainda aplicações a desenvolver. O uso de biomassa renovável na fabricação de briquetes para fins energéticos ainda está engatinhando. É interessante o fato de que a expansão das florestas plantadas para fins energéticos de fato contribui para a preservação da mata nativa, pois aumenta a oferta de biomassa renovável, o que eventualmente ajuda a diminuir a pressão sobre a mata nativa. Na Europa e na América do Norte, a demanda por biomassa para fins energéticos, inclusive por parte das ferrovias, provocou uma importante diminuição das florestas nativas. Na África e na América do Sul, inclusive no Brasil, isso ainda ocorre. O problema só será equacionado e resolvido quando forem oferecidas alternativas para o suprimento de energia, que hoje é feito com biomassa de vegetação nativa – floresta ou cerrado. As florestas plantadas são a única alternativa possível. As regras existentes, ao exigir que as florestas plantadas sejam acompanhadas de proteção de vegetação nativa, além do interesse na presença desta para fins de conservação do solo e disponibilidade de água no solo, fazem com que a contribuição das florestas plantadas para a sustentabilidade estenda-se além da proteção do clima, para incluir também o cuidado com a biodiversidade, a flora e a fauna.



visão científica

"Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara." José Saramago, Ensaio sobre a cegueira. Como avaliar quanto de água se necessita para o crescimento de uma floresta? Por um lado, contabilizando a água no ciclo de precipitação, seu armazenamento no solo, para posterior evapotranspiração. Por outro, os recursos hídricos dos rios, lagos e aquíferos. No primeiro caso, atribui-se a convenção de "água verde"; no segundo, de "água azul". Como a floresta se beneficia de ambos, podemos somar esses dois grupos. Mas, se, para enxergar melhor, tornamos essa avaliação um processo que deixa uma única opção de cálculo? Por exemplo, o próprio manejo da floresta produz remoção de sedimentos e de nutrientes do solo que alcançam os rios. Para diluir essa quantidade de cargas poluidoras, necessitam-se quantidades extras de água. É apropriado somar essa água de diluição, essa "água cinza", àquelas águas para o crescimento da floresta? Podemos adotar formas de avaliar demandas de água como um todo? Se a resposta for não, então não tem sentido fazer um balanço de cargas poluidoras em áreas onde há negócios florestais. Mas, se a resposta for sim, como aceitar que essas "demandas coloridas" sejam somadas para que esse balanço seja simplificado? Eis um conceito que trata da essência do ciclo hidrológico. A pegada hídrica atende a esses critérios de somar essas "cores". Mas somá-las não responde a outra questão: como avaliar a sustentabilidade das demandas e como ter medidas de compensação a esses impactos? A pegada hídrica se analisa tanto sob a ótica do produtor como a do consumidor. Seu cálculo, como soma “verde-azul-cinza”, é indicador de vulnerabilidade relativa. Sua comparação com a disponibilidade de recursos hídricos locais indica impactos com medidas de adaptação e compensação. Só o cálculo da pegada hídrica não resolve o problema. Precisamos entender os riscos dos ciclos e a resiliência aos consumos para um bom manejo ambiental e para dar solvência dos projetos. Do lado do produtor, necessitamos entender que a pegada hídrica contribui com um novo olhar. E, a partir desse novo olhar, entender melhor o ciclo hidrológico e os ciclos associados, inclusive do homem e sua relação com a floresta. Uma parte desse problema é definir a escala de estudo. No Brasil, e por lei, a unidade de planejamento e gestão territorial é a bacia hidrográfica. Desde 1991, isso é parte do arcabouço legal do estado de São Paulo, e, desde 1997, em todo o território nacional. Um fator crucial para o cálculo de pegada hídrica é ter um monitoramento detalhado e sistemático desses balanços.

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Do lado do produtor, necessitamos entender que a pegada hídrica contribui com um novo olhar. E, a partir desse novo olhar, entender melhor o ciclo hidrológico e os ciclos associados, inclusive do homem e sua relação com a floresta. " Eduardo Mário Mendiondo

Professor de Hidráulica da Escola de Engenharia de São Carlos-USP

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Para isso, é preciso ter um cadastro coerente de usuários e entender melhor o instrumento de outorga de recursos hídricos. O outro fator é determinar como cada componente hidrológica e cada elemento físico-químico tem facilidade de ser produzido na bacia, transportado e exportado dela. Pesquisadores do IPEF, ESALQ e EESC/USP estão verificando como a relação entre precipitação e escoamento afeta a quantidade de elementos químicos que a bacia armazena e exporta. Traduzindo: como a componente de "água cinza" pode ser regulada, se for realizado um apropriado manejo da floresta, e, por consequência, da “água verde” e “água azul.” Isso é valorizar os serviços ambientais da floresta. Eles se incorporam ao processo de assimilação de água e de nutrientes no solo até a sua transpiração e perda para a atmosfera. Mas as captações de água, os consumos específicos e os lançamentos de efluentes contam nessa equação. E são alvo da política de cobrança pelo uso dos recursos hídricos na bacia. Então, para cobrar, é preciso entender os limites desses balanços, hídrico e de nutrientes. No estado de São Paulo, cada Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHIs) tem o plano de bacia que permite avaliar as áreas prioritárias para projetos de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA-Água). Um outro exemplo é o Programa Produtor de Água para o Território Nacional. Ele incentiva o produtor rural a conservar e a recuperar as matas ciliares, que ajudam a conter a erosão dos solos e diminuem os sedimentos que chegam aos rios. Isso equivale a diminuir a “água cinza” que seria necessária para diluir essa erosão. Para o novo Código Florestal, esses conceitos melhoram o diálogo entre usuários de uma bacia e os órgãos licenciadores. Uma área promissora para a pegada hídrica é não somente associar sua avaliação de sustentabilidade à eficiência de projetos MDL e Certificação Ambiental, com fundos de seguros frente a mudanças climáticas, a regulamentar a partir da Política Nacional de Mudança do Clima (Lei 12.187), como também verificar a conformidade quanto à norma ISO 14046, que avalia ciclos de vida de atividades industriais com base na pegada hídrica. Na analogia de José Saramago, corroborar a sustentabilidade da pegada hídrica é aceitar que precisamos olhar melhor para as demandas hídricas e, quando queremos, ver e entender o balanço hídrico. E quando, de fato, é urgente reparar em nossas bacias hidrográficas.


Opiniões

sinergia gera novos conhecimentos Colaboração: Milton Cezar Ribeiro e Alessandro Marques Ao longo de 2009, o Fórum Florestal do Sul e Extremo Sul da Bahia chamou a atenção para o fato de que não existiam informações detalhadas sobre a evolução temporal da cobertura florestal das bacias setentrionais do extremo sul da Bahia. Essa lacuna dificultava o entendimento quantitativo dos processos de dinâmica da paisagem e o planejamento de ações de conservação da biodiversidade. A discussão foi levada ao Subcomitê da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica do Extremo Sul da Bahia e ao Conselho Gestor do Mosaico de Áreas Protegidas do Extremo Sul da Bahia, resultando em uma deliberação sobre a importância da realização de um estudo dessa natureza. A Veracel Celulose lançou, em 2010, um edital público com o objetivo de selecionar instituições para realizar um estudo de monitoramento da evolução temporal da cobertura florestal em uma área contínua de 2,3 milhões de hectares, que inclui as áreas de influência atual ou prevista da empresa. Para a realização do estudo, a Veracel cedeu sua base de imagens de satélite SPOT 5 (2006), Formosat (2007) e Landsat (1990, 2001-2), assim como ortofotos (1995-6), de modo a permitir um mapeamento refinado para as diferentes datas e também a comparação entre diferentes épocas. Um consórcio formado pelo Instituto BioAtlântica (IBio), pela empresa de consultoria ambiental ECONAMFI e pelo Laboratório de Ecologia da Paisagem e Conservação (LEPaC/USP) e com a colaboração do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação (LEEC/ UNESP) foi selecionado para executar esse estudo de monitoramento. A fim de garantir que a sociedade civil fosse representada em todas as etapas do projeto, foi estabelecido um comitê de acompanhamento dos trabalhos, cujos membros foram indicados pelos três colegiados já mencionados. Esse comitê também foi encarregado de zelar pela transparência de todo o processo e difundir, na sociedade e nas organizações da região, o conhecimento gerado pelo projeto. O trabalho de interpretação visual das imagens foi realizado ao longo de 2011 por duas equipes locais, uma em Ilhéus e outra em Porto Seguro, que foram capacitadas no início do trabalho. Os critérios de classificação dos tipos de vegetação e de cobertura do solo nas imagens de satélite foram construídos utilizando dados de

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campo coletados em mais de 3.700 pontos distribuídos por toda a região de interesse. O resultado dessa análise foi uma legenda de vegetação e uso do solo extremamente detalhada, com 28 classes de cobertura. Um dos principais resultados do projeto foi o mapeamento da cobertura vegetal e do uso do solo na área de interesse, para o período 2006-2007, com uma escala de 1:20.000 (utilizando imagens com resolução de 2,5 m), que é significativamente mais refinada do que mapeamentos anteriores da mesma região. Esse mapeamento cobre uma área milhares de vezes maior do que mapeamentos anteriores de resolução espacial comparável em outras partes da Mata Atlântica. Foi também realizado um mapeamento na mesma escala em uma área de 1,1 milhão de hectares, utilizando ortofotos do período 1995-1996, o que permitiu quantificar as mudanças ocorridas na paisagem entre 1995 e 2007. Uma análise similar foi realizada na escala de 1:50.000, utilizando imagens de satélite com resolução de 30 m, tomadas em 1990 e em 2001-2002. Os resultados do projeto fornecem uma caracterização mais detalhada e precisa da distribuição dos diferentes tipos de vegetação e de uso do solo na região e deverão fornecer subsídios para ações de conservação e restauração florestal, manejo de paisagens, incremento da conectividade de fragmentos florestais, sequestro de carbono, planificação territorial, etc. Essa iniciativa inédita no Brasil resultou de uma sinergia entre uma grande empresa do setor florestal e membros da sociedade civil organizada e da comunidade científica e produziu novos conhecimentos que serão úteis a todos os atores envolvidos. O apoio da Veracel Celulose foi essencial: um mapeamento tão extenso em alta resolução dificilmente teria sido possível utilizando apenas fontes convencionais de financiamento à pesquisa. Além disso, o projeto teve outras características desejáveis, como a construção participativa e a transparência de todo o processo, a qualificação e a atuação de técnicos locais no mapeamento e o treinamento de membros de organizações que atuam na região no uso dos produtos gerados pelo projeto. Fica assim demonstrado o quanto se pode avançar em pouco tempo quando o setor florestal, a sociedade civil e a comunidade científica trabalham juntos em direção ao entendimento de questões que afetam todas as partes envolvidas.

O apoio da Veracel Celulose foi essencial: um mapeamento tão extenso em alta resolução dificilmente teria sido possível utilizando apenas fontes convencionais de financiamento à pesquisa. " Christiane Holvorcem

Pesquisadora do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação-UNESP

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visão científica

Opiniões

o que pode ser manejo sustentável em RL?

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para este momento da história ambiental brasileira, em que se busca conciliar produção e conservação da natureza, a manutenção ou o restabelecimento das funções protetoras da vegetação deve ser prioridade "

Giselda Durigan Pesquisadora Científica da Estação Ecológica de Assis do MA-SP

Tanto o velho quanto o novo Código Florestal, que se anuncia, preveem a existência da Reserva Legal (RL) nas propriedades rurais, em percentual variável entre regiões. Ambos os textos definem RL como uma fração da propriedade que tem como primeira função assegurar o uso econômico sustentável dos recursos naturais e, adicionalmente, auxiliar a conservação e a reabilitação dos processos ecológicos, promover a conservação da biodiversidade e oferecer abrigo e proteção às fauna e flora nativas. É o uso econômico sustentável, essencialmente, o que diferencia as Reservas Legais das Áreas de Preservação Permanente (APPs). A questão que se coloca é: quais práticas de exploração podem ser consideradas sustentáveis economicamente e admitidas porque não comprometem a contribuição da RL para a conservação da biodiversidade e dos processos ecológicos? As respostas hão de ser múltiplas – porque múltiplos são os biomas no Brasil – e divididas em dois grupos para cada bioma: 1) práticas de manejo sustentável de ecossistemas naturais, para remanescentes de vegetação nativa; 2) modelos de plantio e manejo para áreas que vierem a ser recuperadas. Cabe lembrar que, na Mata Atlântica, não é admitida a exploração econômica sustentável, nem mesmo de árvores mortas, de modo que o regime de APP estende-se também à RL quando se tratar de vegetação nativa. O extrativismo de produtos não madeireiros é permitido em todos os biomas, mas só é viável economicamente para regiões específicas, nas quais o acesso às plantas de interesse e aos mercados é possível. Entre as práticas de manejo sustentável de ecossistemas naturais, merecem destaque as técnicas desenvolvidas para exploração madeireira na Floresta Amazônica. Para a Caatinga e o Cerrado, estudos sobre exploração madeireira sustentável são, todavia, raros. As poucas pesquisas existentes apontam como alternativa viável o corte raso em módulos, de forma que o mesmo módulo só seja novamente explorado após o tempo necessário para que a vegetação readquira, naturalmente, a biomassa original. Esse tempo varia entre regiões, mas são sugeridos ciclos que variam entre 15 e 30 anos. Para ecossistemas em que as gramíneas são o componente dominante da paisagem – como é o caso dos Campos Sulinos, das fisionomias campestres e

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savânicas do Cerrado e de parte do Pantanal –, a pecuária extensiva baseada nas gramíneas nativas, preservando a vegetação lenhosa esparsa, parece ser a forma de exploração mais viável, que concilia a produção e a conservação da biodiversidade, da estrutura e dos processos ecológicos. No Cerrado, os resultados de um experimento monitorado por sete anos, em Assis-SP, têm mostrado que o pastoreio em densidade inferior a uma unidade animal por hectare mantém a vegetação praticamente estável no tempo. Por outro lado, sabe-se que a exclusão total do gado e do fogo no Pampa e no Cerrado desencadeia, no ecossistema, transformações que podem culminar na extinção de espécies endêmicas e modificação total da estrutura da vegetação. As respostas sobre viabilidade econômica e ecológica para quem busca modelos de recuperação de RL em áreas que hoje não possuem vegetação nativa ainda são hipotéticas. Para os ecossistemas não florestais, pouco se pode contar com o suporte da ciência à proposição de modelos. Para as regiões de floresta, já é possível formular modelos com base nos conhecimentos existentes em silvicultura (de espécies nativas ou exóticas), heveicultura, fruticultura e sistemas agroflorestais ou silvipastoris, aliando-os aos amplos conhecimentos gerados nas três décadas de pesquisas em restauração florestal, particularmente desenvolvidas para a Mata Atlântica. Estimar a lucratividade desses modelos, sem que se possa prever com segurança como será o comportamento das espécies ao longo do tempo em sistemas manejados, complexos e biodiversos, requer, entretanto, uma boa dose de ousadia. Adotar esses modelos sem que tenham sido testados experimentalmente requer otimismo e resignação. Para este momento da história ambiental brasileira, em que se busca conciliar produção e conservação da natureza, a manutenção ou o restabelecimento das funções protetoras da vegetação deve ser prioridade. Buscar caminhos para que, aos serviços ambientais, se somem os benefícios econômicos e pelo menos parte da biodiversidade previamente existente é uma meta sensata e factível. Perseguir a reconstrução do ecossistema original como meta, especialmente para a recuperação da RL, seria um grave erro estratégico.



visão científica

Opiniões

técnicas práticas de sustentabilidade Para ser real, a sustentabilidade deve fazer parte de uma cultura. Se dissermos que é a maneira de se desenvolver sem comprometer os recursos naturais para o futuro, e para isso o desenvolvimento de qualquer setor deve ser viável economicamente, correto ecologicamente e justo socialmente, então esse conceito deveria nascer junto com qualquer iniciativa de desenvolvimento. Para o setor florestal, algumas iniciativas na área de produção da floresta para os diversos fins estão sendo desenvolvidas na tentativa de tornar o setor ainda mais sustentável. Alguns países já praticam a floresta de produção aliada a técnicas conservacionistas, ampliando os efeitos positivos do caráter permanente das culturas. O manejo de bacias hidrográficas procura aperfeiçoar o uso dos recursos naturais disponíveis para a produção das florestas plantadas, tomando como suporte prioritário a própria bacia hidrográfica. Para programar o manejo da bacia e para atingir seus objetivos com sucesso, torna-se necessária a compreensão dos limites da bacia, o que existe de recursos naturais disponíveis no interior dos limites, como esses recursos se integram e como é possível modificar essas integrações para se produzir sustentavelmente. Assim, a hidrologia florestal é fundamental para o entendimento da dinâmica da água e da relação atmosfera-solo-floresta na bacia hidrográfica. Por isso temos desenvolvido pesquisas a partir de monitoramento hidrológico em bacias hidrográficas com florestas plantadas por meio do Laboratório de Hidrologia Florestal. Tem-se também, a partir desses estudos, iniciado a busca de técnicas de conservação de solo e água, adaptação e criação de novas técnicas, para compor o manejo das bacias hidrográficas florestadas. Dessa forma, podem-se citar alguns trabalhos como casos de sucesso. Na bacia hidrográfica do Ribeirão São Bartolomeu, bacia que abastece parte da população de Viçosa e a Universidade Federal de Viçosa integralmente, instalou-se um experimento onde foi testada uma prática de conservação que normalmente é indicada para pastagens e culturas agrícolas, em um plantio de eucalipto típico do que é feito nas encostas dos morros da região. O cordão de contorno nada mais é do que um terraço de base muito estreita, mas que tem grande efetivação na redução da energia cinética da água que desce morro abaixo. Isso diminui a erosividade da chuva e a erodibilidade do solo. Embora a floresta plantada apresente seus mecanismos de proteção do solo por meio da cobertura promovida pelas copas e pelo litter, verificamos que essa técnica reduz cerca de 50% do escoamento superficial de águas livres nas encostas dos morros com eucalipto.

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a espécie tem se mostrado bastante interessante para concentrar água de chuva em seu tronco e, assim, no solo a seu entorno, devido a sua arquitetura de copa, que é semelhante à de um funil " Herly Carlos Teixeira Dias Professor de Hidrologia Florestal e Manejo de Bacias Hidrográficas da UF-Viçosa

Em outro experimento, como ação socioambiental, além do monitoramento hidrológico de uma bacia hidrográfica, busca-se testar uma técnica de manejo da bacia, já em uso na Europa, denominada Manejo em Mosaico, em que o corte da floresta no âmbito da bacia é feito de forma sequencial e estratégico, buscando distanciar a idade dos mosaicos, além de evitar o corte raso nessa unidade. Ressalta-se que, além do Manejo em Mosaico, estão associados procedimentos conservacionistas no processo produtivo, como a permanência de resíduos, galhos, folhas, casca na área após corte; a não utilização de queimadas; caixa de coleta de água nas estradas; afastamento de APPs superior ao que consta na legislação; manutenção de RL conforme consta na legislação; manutenção de aceiros; monitoramento da fauna silvestre; e outros. Interessante também é a ação das instituições de ensino, pesquisa e extensão no desenvolvimento de cultivos florestais sustentáveis e alternativos para o setor agropecuário do País. Nesse sentido, tem-se trabalhado na domesticação da macaúba, palmácea com grande potencial para produção de óleos e subprodutos como carvão a partir do endocarpo. Essa espécie tem uma ocorrência abrangente no País, porém a pouca viabilidade de seus frutos impediam o desenvolvimento do seu cultivo. Recentemente, uma equipe de pesquisadores da UFV desenvolveu a técnica de produção de sementes germinadas, o que proporciona a produção comercial de mudas. A partir de então, uma série de trabalhos vêm sendo realizados para se determinar a melhor forma de condução dos cultivos, espaçamento, adubação, irrigação, consórcio com outras culturas. Paralelo as esses estudos, têm-se desenvolvido experimentos com técnicas de conservação de solo e água e consequentemente o monitoramento do efeito do seu plantio nos recursos hídricos da bacia hidrográfica. A espécie tem se mostrado bastante interessante para concentrar água de chuva em seu tronco e, assim, no solo a seu entorno, devido a sua arquitetura de copa, que é semelhante à de um funil. Apresenta também um baixo índice de escoamento superficial de água de chuva quando em consórcio com pastagem, feijão e associada ao cordão em contorno. Essas iniciativas tornarão as florestas plantadas mais sustentáveis, porém nada disso será suficiente se os empreendedores não as adotarem. Acredito que chegará um tempo em que, por necessidade, mudaremos as expectativas mais pessimistas em relação à sustentabilidade do planeta, equilibrando a curva de crescimento populacional e disponibilidade de recursos naturais. Para isso, o manejo das bacias hidrográficas deve ser ampla e naturalmente aceito e implantado nos setores produtivos.



visão científica

a pegada de carbono

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Os países importadores já anunciaram as suas exigências para a compra dos produtos do agronegócio brasileiro. Essa talvez seja a próxima barreira que nossas exportações terão que enfrentar, e, por isso, precisamos ser proativos e nos preparar, para não sermos pegos de surpresa "

Carlos Clemente Cerri Professor do Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP

É premissa para o cálculo do carbono footprint ou “pegada de carbono” de qualquer produto quantificar a emissão de gases do efeito estufa de todas as fases de sua produção, uso e descarte. No caso dos produtos do agronegócio, são três os principais gases: CO2 (gás carbônico), CH4 (metano) e N2O (óxido nitroso). A unidade de expressão dos resultados é o equivalente em CO2 (eq CO2), que facilita a comparação das pegadas de carbono dos vários produtos. Uma unidade derivada do eq CO2 é o equivalente em carbono ou eq C, que corresponde à proporção de carbono na molécula de CO2. Daí o surgimento do termo “pegada de carbono”. Uma das primeiras dúvidas que surgem quando é feito esse tipo de cálculo diz respeito ao valor a ser adotado para o Potencial de Aquecimento Global (PAG) de cada gás emitido para o ambiente durante as etapas de produção. Medidas cada vez mais precisas vêm modificando o valor dos PAGs ao longo dos anos, o que faz com que o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change) também vá alterando os valores usados em seus cálculos de inventários das emissões de gases do efeito estufa. A “pegada de carbono” de um mesmo produto, calculada com base em PAGs diferentes, pode levar a resultados finais diferentes. Por isso é preciso estar bem atento aos valores que estão sendo adotados nos cálculos quando se pretende comparar estudos conduzidos por diferentes grupos de pesquisa. A determinação do valor da pegada de carbono de um produto é o primeiro passo para as ações subsequentes. A partir dele, os técnicos podem direcionar suas ações aos principais focos de emissão de gases do efeito estufa na tentativa de reduzir as taxas associadas aos produtos do agronegócio. Essas ações mitigadoras devem estar em conformidade com as boas práticas agrícolas, de modo a manter a produtividade. Agindo assim, o produtor contribui diretamente para a sustentabilidade do planeta, pois, de um lado, ele estará atenuando as causas do aquecimento global e, de outro, agregando valor aos seus produtos.

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Os países importadores já anunciaram as suas exigências para a compra dos produtos do agronegócio brasileiro. Essa talvez seja a próxima barreira que nossas exportações terão que enfrentar, e, por isso, precisamos ser proativos e nos preparar, para não sermos pegos de surpresa, ou termos nossos produtos desvalorizados, ou, pior ainda, declarados impróprios para exportação. Cálculos da “pegada de C” de produtos do agronegócio brasileiro, elaborados por equipes do exterior, sobretudo da Europa, começam a ser publicados em revistas de grande circulação internacional. A maior parte desses cálculos não está correta porque se baseia em dados não condizentes com a realidade brasileira. Cálculos feitos com dados padrão (default) chegam a inviabilizar a exportação de nossos produtos, como é o caso do biodiesel da soja. Felizmente, o Brasil possui corpo técnico e conhecimento científico análogo ao dos países desenvolvidos e, por isso, tem bases para rebater essas afirmações incorretas e, assim, viabilizar as nossas exportações. O agronegócio brasileiro tem dado, ultimamente, o suporte econômico necessário ao desenvolvimento do País. Não podemos, portanto, permitir que novas barreiras, como a ambiental, nos sejam impostas pelos importadores, prejudicando nosso desenvolvimento. A saída para esse iminente impasse é o contínuo apoio às instituições de pesquisa nacional, para que elas possam produzir e divulgar as informações técnicas condizentes com a nossa realidade. Dessa forma, nosso agronegócio estará mais protegido, assim como o bem-estar de nossa sociedade. No que tange ao ambiente, não devemos estar preocupados somente com a questão da mitigação dos gases do efeito estufa. Outros indicadores da sustentabilidade ambiental, como, por exemplo, o aumento da quantidade de carbono do solo através do processo de sequestro, o uso racional da água e, sobretudo, a preservação da biodiversidade do solo e vegetação, ao mesmo tempo em que são riscos, são também oportunidades para a valorização do setor empresarial.


Opiniões

o machado e a floresta

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A atual busca de alternativas de plantio sustentável das chamadas florestas para produção de energia deve atentar para o fato de que sustentabilidade é um conceito plural: que sustentabilidade se busca? A ecológica? A social? A econômica? "

Rogério Ribeiro de Oliveira Professor do Departamento de Geografia da PUC-Rio

Uma pesquisa recente feita no interior do Parque Estadual da Pedra Branca, localizado na zona oeste do Rio de Janeiro, revelou, em plena floresta, a presença de vestígios de 170 antigas carvoarias. Localizadas em uma área de cerca de 200 hectares, o fato não teria maior repercussão se elas não estivessem localizadas no meio de uma densa floresta atlântica. Onde se julgava ser uma floresta madura, na verdade, trata-se de uma área que havia sido intensamente desmatada no século XIX. Os carvoeiros eram, em sua maioria, ex-escravos. Sem a subsistência provida pelos seus donos, esses ex-escravos se viram, de uma hora para outra, tendo que sustentar suas famílias. Sem acesso à terra ou aos meios de produção, um caminho “fácil” foi se tornar carvoeiro. Para isso, tudo o que precisavam para fabricar o carvão era de um machado e de fósforos. A proximidade desse maciço com a cidade do Rio de Janeiro foi responsável por transformar a floresta em um polo de fabricação de carvão. Mas qual a finalidade de tanto carvão? Junto com a lenha, ele era a matriz energética da cidade do Rio de Janeiro, de meados do século XIX até o início do século XX. Além do consumo doméstico (para cozinhar e passar roupas), o carvão alimentava também as caldeiras a vapor das indústrias e das locomotivas, que começavam a aparecer. Na cidade, carruagens e bondes eram puxados por cavalos e burros, que usavam ferraduras. Estas eram feitas nas ferrarias de fundo de quintal, cujas forjas funcionavam a carvão. Mas havia também outro uso pouco conhecido, que consumiu muito mais carvão: a construção civil. Até hoje, o centro histórico da cidade, assim como numerosos bairros, tem suas calçadas de pedra, além dos pórticos e fachadas dos sobrados antigos. A quantidade de carvão usado nessa arte é gigantesca. Por exemplo, para se construir um metro linear de um pórtico, o artesão usa uma marreta e cerca de 30 ponteiros de ferro, que ficam rapidamente cegos e não podem ser afiados em esmeril para não perder o fio. Têm que ser levados à forja para serem malhados na bigorna. Essas forjas, alimentadas a carvão, se multiplicaram para dar conta do crescimento da construção civil da cidade na virada do século XIX.

A reforma Passos, feita em 1903, representou uma vigorosa mudança na malha urbana da cidade. Avenidas e centenas de edificações surgiram no centro, dando o seu atual contorno. No entanto um pilar (no sentido mais literal da palavra) foram os trabalhos em pedra. As fachadas, os portais e as calçadas eram todos feitos por esses artesãos, demandando quantidades gigantescas de carvão para afiar suas ferramentas. Não era, portanto, desprezível o consumo de carvão no Rio de Janeiro do fin de siècle. No entanto as implicações ecológicas da exploração da lenha para a produção de carvão não apresentaram efeitos negativos expressivos. A floresta retomou, de forma vigorosa, as áreas desmatadas pelos carvoeiros, a ponto de justificar a criação, em 1974, do Parque Estadual da Pedra Branca. Se utilizarmos o jargão de hoje, poderíamos dizer que se tratava de uma produção sustentável, uma matriz energética baseada no uso da biomassa. Mas há um desfecho nessa história ligado à sustentabilidade. Apesar do desmatamento, a sustentabilidade ecológica do período de fabricação do carvão foi um fato. Mas e a sustentabilidade social dessa atividade? São pouquíssimas as informações disponíveis sobre os carvoeiros, esses atores sociais que forneciam energia à cidade do Rio de Janeiro. Poucos se beneficiaram do seu trabalho, enquanto muitos lucraram com ele. A grande maioria de seus descendentes habitam as favelas do Rio de Janeiro. São, até hoje, invisíveis do ponto de vista social. As florestas naturais sempre foram as principais fornecedoras de matéria-prima para energia. A atual busca de alternativas de plantio sustentável das chamadas florestas para produção de energia deve atentar para o fato de que sustentabilidade é um conceito plural: que sustentabilidade se busca? A ecológica? A social? A econômica? A história desses carvoeiros ilustra uma história de injustiça social, maquiada por uma aparente “exploração sustentável”. Levou progresso, mas não trouxe desenvolvimento à cidade, pois a sustentabilidade ecológica seguiu caminho diverso da sustentabilidade social.

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sustentabilidade, na prática É chegado junho de 2012: estamos vivendo a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20) e a consequente inserção na agenda do País, em todos os setores, sem exceção, da questão da sustentabilidade – na prática. Projetos-pilotos ou modelos de um novo desenvolvimento são demonstrados e avaliados em relação ao potencial de replicação e aumento de escala. Nesses últimos dezoito meses, diversos setores da sociedade trabalharam proativamente pelas metas de biodiversidade do País. E, se ainda estamos longe de um processo ideal, com certeza estamos vivenciando o início de uma nova era: época de diálogo e construção conjunta de uma visão para 2020 (no caso das metas de biodiversidade ou metas de Aichi) ou mesmo a visão para 2050 (nesse caso, a visão que o setor empresarial tem desenhado dentro do processo capitaneado pelo CEBDS - Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável para o ano de 2050). Em ambos os casos, vale ressaltar o papel diferenciado que o setor privado brasileiro vem desempenhando rumo a uma nova economia, avaliando metas desafiadoras e, ao mesmo tempo, reais. Nesse processo, o setor tem participado desde iniciativas multistakeholders, parcerias com ONGs (Organizações Não Governamentais), iniciado o processo de mapeamento e integração da biodiversidade com seus negócios, até o entendimento de serviços ecossistêmicos e valoração da biodiversidade. Ainda temos um longo caminho pela frente, e as expectativas em relação a um país megabiodiverso como o Brasil naturalmente tendem a ser elevadas (tanto interna quanto externamente), o diálogo começa (ainda que timidamente) a permear a sociedade - e isso deve ser salientado. Temos, em todos os setores deste país, um papel de liderança natural nesse novo cenário internacional que começa a surgir, mas, para exercê-lo, é fundamental que encontremos pontos comuns nas diversas agendas internas, de modo a contribuirmos em fóruns internacionais de maneira mais significativa – sobretudo em relação a critérios que internalizem as externalidades e trabalhem pela regulamentação do mercado. Já há alguns anos, o setor florestal nacional tem sido um excelente exemplo na busca por sustentabilidade na prática.

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se muito esse setor brasileiro tem avançado, devido sobretudo à capacidade de reinventar-se, a hora agora é de ampliação dos pactos, numa busca pela otimização de processos e ampliação do alcance dos avanços conquistados " Gabriela Procópio Burian Gerente de Meio Ambiente da Monsanto do Brasil

Com base em diálogo entre as diversas partes, avaliações de novas oportunidades e potenciais riscos, as particularidades das comunidades do entorno no dia a dia e novos arranjos com a cadeia produtiva têm sido considerados parte das soluções. Tudo isso tem permitido maior conservação regional, e, hoje, é crescente o reconhecimento interno no Brasil e no cenário internacional pela constante busca do setor florestal de um equilíbrio no tripé econômico, social e ambiental. Como um dos exemplos, podemos citar o sistema agrosilvopastoril – entre outros, já instalados em diversas localidades, que têm transformado realidades, incluído comunidades e preservado áreas na prática. Se muito esse setor brasileiro tem avançado, devido sobretudo à capacidade de reinventar-se, a hora agora é de ampliação dos pactos, numa busca pela otimização de processos e ampliação do alcance dos avanços conquistados. Com base nesses anos de trabalho, o setor pode assumir, e deve mesmo liderar, uma agenda positiva regional inclusiva que considere as diversas áreas de negócio atuantes em cada uma das regiões, visando à integração entre as cadeias do "berço ao berço" – minimizando uso de recursos naturais, reduzindo desigualdade e valorando ativos ambientais, de modo alinhado com a estratégia de atuação de governos locais e nacionais para discussão internacional. A construção desse novo cenário exige, por um lado, conhecimento da prática em nível local e, ao mesmo tempo, posicionamento firme em fóruns de negociação internacionais. Apenas setores que têm trabalhado por essa agenda na prática têm o peso político necessário para conseguir fazer a soma dos diversos interesses em uma mesma direção e atuar de modo estratégico nas negociações internacionais. Esse é o papel que cabe ao setor florestal brasileiro em 2012: ultrapassar suas fronteiras e liderar uma agenda efetiva em direção a um equilíbrio econômico e socioambiental, com base em suas conquistas e avanços na prática desse megabiodiverso País rumo à visão que temos para 2050!



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monitoramento da fauna Monitorar fauna e flora em fragmentos de vegetação nativa, inseridas em mosaicos com florestas plantadas, é hoje uma realidade na maioria das empresas do setor florestal no Brasil. Muitas, pela simples exigência em razão da certificação florestal, enquanto outras vão além, buscando compreender os impactos positivos e negativos gerados pelas operações florestais, num entendimento mais visionário da real necessidade de manutenção da biodiversidade. O monitoramento de fauna e flora, quando utilizado com o segundo objetivo, responde a diversas questões relacionadas ao manejo florestal do eucalipto, do pinus e de outras culturas, por exemplo: é possível mudar algo no manejo florestal, sem que isso onere os custos, beneficiando a conservação da biodiversidade? A experiência de 12 anos junto ao setor florestal mostrou-nos que o monitoramento é muito mais do que termos, ao longo dos anos, respostas sobre populações de espécies de fauna e qualidade da vegetação em fragmentos. O monitoramento é, de fato, uma ferramenta de gestão que pode minimizar custos e aperfeiçoar operações florestais, só assim ele tem uma razão de ser. Para tanto, não basta apenas monitorar uma única espécie da fauna ou ainda a vegetação de forma isolada, pensando que isso trará as respostas que representem as operações florestais. Essas respostas só são possíveis desde que o monitoramento seja feito com um olhar para a complexidade do ambiente, estudado numa análise conjunta entre fauna, flora e aspectos sociais associados. Um exemplo claro disso é quando encontramos dois fragmentos com uma boa estrutura florestal, e um deles não apresenta a fauna que deveria estar ali. A resposta, muitas vezes, está do “lado de fora”, no entorno, onde há a prática de caça. Logo, os projetos de conservação dessas matas passam, obrigatoriamente, por um trabalho socioambiental. Dizemos que, para ir à floresta para monitorá-la, é preciso estar munido de vários óculos, que nos deem uma visão sistêmica da situação encontrada.

e flora

Não basta descrevê-la. É preciso achar soluções viáveis que, ao mesmo tempo, contribuam para a conservação da biodiversidade e não inviabilizem o negócio florestal. O fracasso na restauração de florestas nativas é outro exemplo claro. Temos visto milhões serem gastos na tentativa de restauração ambiental, sem que haja sucesso na efetividade dessas florestas. É aí que o monitoramento entra como ferramenta, que possibilita a elaboração de listas de espécies da flora mais apropriadas e melhoras técnicas de restauração, adequando-as a diferentes situações ambientais e a diferentes biomas. Para restaurar um ambiente, não há fórmulas, há peculiaridades que fazem a diferença em cada situação. Outro aspecto importante é a representatividade das áreas monitoradas em relação às áreas plantadas, que é de fundamental importância. Para isso, hoje há métodos que cruzam informações sobre o meio físico, as fitofisionomias e a biota, para que sejam encontradas diversas situações ambientais, que indicarão as áreas a serem monitoradas. Por outro lado, o monitoramento pode ir além da empresa, fornecendo instrumentos e argumentos para que o governo possa orientar suas diretrizes e leis relacionadas à conservação da biodiversidade. Vemos absurdos acontecerem, como é o caso da não manutenção do sub-bosque sobre as florestas plantadas, porque, em época de corte, se estiver presente, não se obtém licença em tempo hábil. O monitoramento já nos mostrou que esse sub-bosque é de grande importância para aumentar a permeabilidade dessas áreas para a fauna. Nesse caso, a resolução só prejudica a conservação da biodiversidade. Sensibilidade e vontade ainda faltam para que haja uma discussão aberta e parceira sobre o assunto. Muitas vezes, o monitoramento propõe mudanças simples nas operações florestais, favorecendo a conservação da biodiversidade. Para que tais mudanças sejam concretizadas e eficazes, basta que as áreas de planejamento e meio ambiente trabalhem mais próximas, prática que tem caminhado a passos lentos. Historicamente, o setor de meio ambiente das empresas não fazia parte da tomada de decisão para o planejamento, e é esse paradigma que necessita mudar. Ter as informações sobre conservação da biodiversidade fazendo parte do input da matriz de tomada de decisão para o planejamento operacional tem que ser uma política da empresa e estar nas agendas dos tomadores de decisão.

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Temos visto milhões serem gastos na tentativa de restauração ambiental, sem que haja sucesso na efetividade dessas florestas. É aí que o monitoramento entra como ferramenta. "

Mônica Cabello de Brito

Diretora da Casa da Floresta Assessoria Ambiental

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um futuro

necessário

A sustentabilidade da produção florestal nos moldes atuais, de um ponto de vista estritamente físico e biológico, dependerá fundamentalmente da nossa capacidade em combinar essa produção – exitosa no Brasil, em muitos aspectos – com a restauração parcial dos ecossistemas que foram substituídos pelas florestas de produção. Explica-se. As atuais plantações de árvores ocupam o espaço físico, químico e biológico de sistemas naturais que evoluíram ao longo de milhões de anos para produzir vida diversa e interdependente em território brasileiro. Esses sistemas são o que chamamos Mata Atlântica, Cerrado, Campos, Caatinga e Amazônia, em largos traços. Sem pretender desenvolver aqui uma Hipótese Gaia para as florestas brasileiras, basta considerar que as florestas de produção não são viáveis na natureza sem a constante intervenção humana, tanto na sistemática redução da biodiversidade como na injeção de nutrientes e componentes do solo, para repor o que foi retirado ou degradado ao longo do crescimento e exploração comercial dos espécimes “produtivos”. Assim, o que uma floresta de produção fornece é basicamente o resultado do trabalho humano presente desde o momento em que a mata original é retirada, o solo é empobrecido do ponto de vista da sua biodiversidade e uma plantação de clones é implantada e cuidada ao longo de toda a vida útil do empreendimento. Essa substituição não seria problemática se a base do processo produtivo biológico não exigisse a diversidade como garantia de continuidade. A fotossíntese é o processo biofísico de captura da energia solar na estrutura de macromoléculas orgânicas. É a diversificação, combinação e síntese das macromoléculas orgânicas que tornam possíveis as diferentes formas de vida. Esse processo, embora bastante sofisticado e preciso na escala molecular, tem baixa eficiência na escala macroscópica. Menos de 1% da energia solar que incide sobre os indivíduos arbóreos ao longo da sua vida transforma-se em biomassa. O que torna as florestas nativas viáveis não é sua eficiência em capturar a energia solar através da fotossíntese.

O que torna viável uma floresta nativa é a sua diversidade, na qual as diferenças entre as espécies e indivíduos são complementadas pelas formas de cooperação, competição, simbiose e parasitismo. É essa complementação que torna uma mata nativa não só possível, mas adaptável, resiliente, evolutiva e sustentável. A Constante Solar é uma medida da energia solar incidente sobre uma área hipoteticamente localizada acima da atmosfera terrestre. Para uma incidência azimutal, essa constante é de 1,37 KW por metro quadrado na forma de luz solar. Ao atravessar a atmosfera, grande parte dessa radiação solar é absorvida nos fenômenos atmosféricos, como os ventos e o movimento das nuvens. Pouco mais de 10% dessa radiação chegam à superfície onde estão localizadas as plantações. Como um indivíduo ocupa uma área tipicamente de 10 metros quadrados, numa plantação, temos que cada árvore recebe 1,37 x ½ x 8.760 KWh ao longo de um ano. Para um ciclo de 7 anos, a energia total incidente é da ordem de 42 MWh por indivíduo! O modelo atual de implantação de florestas de produção tem como primeiro momento a eliminação da diversidade biológica presente na mata nativa, inviabilizando qualquer forma posterior de complementação entre os indivíduos ou partes da plantação. Esse primeiro momento sela, portanto, a efemeridade desse trabalho humano. A superação desse modelo exige que a diversidade biológica esteja presente ao lado das plantações de clones, para que sejam preservados o controle das pragas, as interações positivas com o fluxo local de água e nutrientes, bem como com o microclima. Experimentos localizados nessa direção têm sido feitos em pequena escala, principalmente nas plantações para a produção de celulose de mercado. Os resultados encorajadores permitirão radicalizar os experimentos, revertendo a situação em que a mata nativa é limitada a bolsões dentro das plantações, para uma paisagem em que as plantações serão bolsões dentro de um contínuo de mata nativa ao longo de cursos d’água e encostas demasiadamente íngremes. Isso é parte de um futuro necessário. Cabe a nós trabalhar para que ele se torne possível.

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A sustentabilidade da produção florestal nos moldes atuais dependerá fundamentalmente da nossa capacidade em combinar essa produção com a restauração parcial dos ecossistemas que foram substituídos pelas florestas de produção. "

Roberto Isao Kishinami Diretor-geral da NRG Consultoria em Energia e Meio Ambiente

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uma amazônia Em 1967, o americano Daniel Ludwig iniciou a implantação de grande projeto na região do Vale do Jari, na divisa do Pará com o Amapá. Como parte desse projeto, Ludwig implantou uma fábrica de celulose que deveria ser abastecida por cerca de 200 mil hectares de plantações florestais. Usou duas espécies no plantio, a Gmelina arborea, de origem asiática, e Pinus caribaea. Oposto aos bem-sucedidos plantios de pinus, as plantações de Gmelina fracassaram principalmente por sua excessiva demanda por solos férteis e suscetibilidade ao ataque de fungos da região. Na época do fracasso de Ludwig com a Gmelina, o eucalipto já era plantado com sucesso no Sul do País há muitos anos, e o setor de florestas plantadas de fibra curta crescia, principalmente com o desenvolvimento de equipamentos que produziam papel somente com essas fibras. Assim, a mudança para plantações de eucalipto foi determinante para que o projeto de Ludwig sobrevivesse até os dias de hoje. As taxas de produtividade alcançadas com o eucalipto na região foram comparáveis às das melhores plantações do Sul do País. Tal sucesso ocorreu, principalmente, graças à aplicação de modernas técnicas de manejo e melhoramento genético desenvolvidas no setor após anos de pesquisa. A iniciativa de Ludwig mostrou a possibilidade de se plantar com sucesso florestas em grande escala na Amazônia, e, apesar de suas florestas terem sido implantadas em áreas desmatadas para tanto, o modelo pode ser extrapolado para condições em que o desmatamento não fora com o propósito da substituição por qualquer cultura. Os plantios em mosaico utilizados por Ludwig, onde as florestas plantadas permeiam maciços de florestas nativas em terrenos de topografia acidentada, e faixas intercaladas em terrenos planos permitem o tráfego da fauna e servem de refúgio durante operações nas florestas plantadas. Estudos realizados na região pela universidade East Anglia do Reino Unido demonstram que, em florestas de eucalipto de várias idades, a fauna, diversa em termos específicos e de grupos, usa as plantações de eucalipto como refúgio, para alimentação e/ou para passagem de um bloco para outro de floresta nativa. O Brasil destaca-se no cenário internacional como um dos maiores produtores mundiais de madeira

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viável

oriunda de florestas cultivadas. Plantamos em larga escala eucalipto, pinus, acácia, teca e o paricá, entre outras. No entanto a privilegiada posição mundial que conquistamos está muito aquém do nosso potencial. Nossas florestas plantadas ocupam, aproximadamente, 0,8% do território nacional, e estudos de uso do solo, principalmente nos estados de menor distribuição demográfica, como é o caso do estado do Pará, demonstram um enorme potencial de crescimento de nossa base florestal, sem a necessidade de substituição de cadeias produtivas da base de produção de alimentos ou de florestas naturais. Estudo das imagens de satélite da região Amazônica pelo Inpe e Embrapa estimou que, até 2008, cerca de 72 milhões de hectares de áreas de florestas naturais haviam sido removidos; destes, 83% ou cerca de 59 milhões de hectares foram transformados em pastagens. Estima-se também que cerca de 50% dos pastos na Amazônia são degradados e que o manejo de gado se concentra no modelo extensivo de gado. No mais, as empresas do setor de florestas plantadas têm se dedicado como poucas ao envolvimento com as comunidades em geral, quer seja diretamente, ou indiretamente, por meio da sociedade civil organizada. Prova disso tem sido a velocidade com que o setor conseguiu certificar suas florestas, uma vez que os princípios e critérios na área socioambiental são extremamente exigentes para a obtenção da certificação pelo FSC, por exemplo. A sociedade civil organizada, em seus vários setores, por sua vez, olha para os plantios de forma que as discussões sobre o futuro ganham em transparência e legitimidade. Com tudo isso, é muito claro para quem olha com vistas à recuperação de tamanha quantidade de áreas degradadas ou ainda sobre a pressão por parte dos consumidores sobre a floresta nativa remanescente que plantar florestas na Amazônia é algo a se considerar, tanto por parte de grupos investidores, como por parte do governo e da sociedade civil organizada. Atuar na Amazônia é uma grande responsabilidade, maior que a usual para o empreendedor florestal, mas acredito que, frente à capacidade que o setor demonstra no Brasil, temos por dever plantar florestas economicamente viáveis, socialmente justas e ecologicamente corretas na Amazônia.

Atuar na Amazônia é uma grande responsabilidade, maior que a usual para o empreendedor florestal, mas acredito que (...) temos por dever plantar florestas economicamente viáveis, socialmente justas e ecologicamente corretas na Amazônia. " Armando Luís Pironel Diretor da Green Head Industrial e Serviços

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estamos no caminho

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não temos dúvidas de que o uso de espécies exóticas (como a seringueira em SP) para a implantação da RL pode ser o melhor caminho para unir as duas silviculturas e garantir os bens e serviços que se esperam da Reserva Legal " Maria José Brito Zakia Consultora de Meio Ambiente da Práxis Socioambiental

Gostaria de começar este artigo relembrando o histórico da relação floresta-propriedade rural, que pode ser de três períodos: Período 1: A floresta estava a serviço da propriedade – a floresta protegia água e solo ou produzia madeira para a propriedade. Não se pensava na propriedade colaborando para a conservação da biodiversidade. E o desmatamento era incentivado, mas havia obrigação de se respeitar limites. Mas as propriedades já desmatadas (legalmente) estavam rigorosamente dentro da lei. Esse período vai de 1965 (na verdade, desde 1934) até 1986, quando o desmatamento deixa de ser incentivado. Período 2: A floresta, na propriedade rural, passa a ser vista como elemento ambiental e de conservação da biodiversidade. Começam a aparecer novas interpretações do Código Florestal, principalmente após a promulgação da Constituição Federal, em 1988. Mas ainda só se tratava da floresta que ainda existia, ou seja, para as propriedades já desmatadas não havia nenhuma obrigação de recompor a Reserva Legal, termo que surge em 1986. Esse momento dura de 1986 até 2000. Período 3: A Reserva Legal passa a ser ambiental. Surge a obrigação de recompô-la. Agora, é a propriedade que deve estar a serviço da floresta, mas a floresta pode e deve continuar a serviço da propriedade.

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Estamos, neste exato momento, na transição para o que poderíamos chamar de período 4 – a da busca de instrumentos que viabilizem a volta da floresta à propriedade rural. E, não por outro motivo, vem tomando força a silvicultura de nativas. A produção de madeira pode ser considerada o objetivo primordial da silvicultura, mas a silvicultura moderna, além de produzir madeira, assume outras funções, como a produção de bens ou serviços. O que significa que ela deve ser utilizada para a recuperação/recomposição da Reserva Legal. Para tanto, novos modelos silviculturais devem ser estudados, testados, e devemos buscar a mesma excelência que temos na silvicultura de pinus, de eucalipto e de seringueira para os plantios heterogêneos. A maior experiência com plantio de espécies nativas tem sido nos trabalhos de recomposição/recuperação de Áreas de Preservação Permanente, e o quadro em destaque faz uma comparação entre os tratos culturais previstos e executados quando do plantios florestais comerciais; no caso, pegou-se o exemplo do eucalipto, com aqueles previstos e executados para a restauração florestal. Observa-se claramente, pelo quadro em destaque, que temos duas silviculturas – uma extremamente eficiente e outra necessitando avançar. No PCSN, elaboramos uma lista (ainda inicial) de 172 espécies nativas com potencial para uso na Reserva Legal. Dessas, 56 são fornecedoras tanto de produtos madeireiros quanto de não madeireiros, 97 são fornecedoras exclusivas de produtos madeireiros e 19, exclusivas de produtos não madeireiros. Das espécies fornecedoras exclusivas de produtos madeireiros, 49 já têm registro de algum tipo de experimentação ou de informações silviculturais, e 92 espécies têm potencial para uso em sistemas agroflorestais, com funções múltiplas. A silvicultura de nativas tem grande potencial no Brasil, com grande demanda de produtos madeireiros e não madeireiros, ainda não obtidos a partir de plantios. E há a carência de informações do ponto de vista ecológico e silvicultural dessas espécies e sobre a melhor forma de consorciá-las, quais os tratos culturais e quais os sistemas de colheita, mas estamos a caminho e não temos dúvidas em afirmar que o uso de espécies exóticas (como a seringueira no estado de São Paulo) para a implantação da RL pode ser o melhor caminho para unir as duas silviculturas e garantir os bens e serviços que se esperam da Reserva Legal.



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democracia e sustentabilidade no mercado de capitais A redução das taxas de juros praticadas no País está acelerando um movimento muito interessante no mercado de capitais brasileiro. O fim dos ganhos fáceis e de baixo risco com a compra de títulos públicos, combinado com a percepção da crescente complexidade da atuação das empresas, obriga gestores de investimentos a desenvolverem produtos inovadores, que considerem não só os tradicionais riscos empresariais, mas também as condições de sustentabilidade dos negócios. Se, por um lado, esse movimento tende a promover uma democratização dos produtos financeiros entre os aplicadores – até mesmo entre os órfãos da poupança da classe média, atentos à importância de buscarem novas modalidades de investimentos, caso queiram manter a boa rentabilidade de suas carteiras –, também deve ampliar o acesso das empresas a tais oportunidades de financiamento. Aí também é necessária a democratização. Afinal, hoje o custo de se fazer uma oferta de ações na bolsa de valores no Brasil – da ordem de R$ 500 mil – é inacessível para a maioria das empresas do País. Não só é preciso diminuir esse custo (e a burocracia envolvida nesse processo) como é fundamental o desenvolvimento de novas alternativas de participação nas empresas, como fundos de venture capital. Do lado das empresas, o principal desafio é fazer a lição de casa de aperfeiçoar seus processos e, em muitos casos, aceitar o envolvimento de novos sócios diretamente nos processos de gestão. E esses gestores deverão estar justamente preocupados com a sustentabilidade dos negócios. Por sustentabilidade, entenda-se não uma palavra da moda, mas sim uma atuação que efetivamente leve em conta os impactos ambientais, sociais e econômicos da empresa. O desafio é ir muito além da reciclagem do lixo do escritório ou da economia de papel por meio do uso de internet: a sustentabilidade tem de ser entendida como parte fundamental do próprio negócio. Afinal, a manutenção do tripé sustentável é que vai garantir o futuro da maioria dos negócios.

Um exemplo para ilustrar: recentemente, fui consultado por uma empresa que havia sido multada pelo Ibama por ter desmatado uma pequena área no interior de Minas Gerais. Sua principal dúvida era como explicar a multa para seus acionistas. O fato é que a multa é o de menos. Ao desmatar aquela área em particular, a empresa provavelmente inviabilizou a manutenção da nascente existente no local, o que poderá inviabilizar a manutenção de suas operações na região. Portanto, mais do que se preocuparem com os gastos momentâneos com uma multa, os acionistas terão de se atentar para o risco de que o próprio negócio seja comprometido. É esse tipo de questão de sustentabilidade que os gestores precisam levar em conta. Isso porque o novo cenário de investimentos também traz um componente adicional, que é a questão do prazo. A tendência – e já era em tempo – é que deixemos de ser um país que atrai capital especulativo: precisamos de investidores de longo prazo, interessados em efetivamente se tornar sócios dos nossos empreendimentos. Gente que queira crescer junto com o Brasil, não só aproveitar nossos juros altos. São sócios que não estão preocupados com a oscilação da bolsa de valores no curto prazo, mas com a capacidade de criação de valor de uma companhia e real condição de crescimento e manutenção do seu negócio daqui a 20 ou 30 anos. Ou seja, o novo investidor está preocupado em encontrar boas opções de rentabilidade duradouras – portanto, de negócios sustentáveis –, e as empresas precisam se organizar para receber esse investidor. A compreensão dessa realidade por companhias e gestores fará toda a diferença no futuro. Temos de cumprir nosso papel de desenvolver essas oportunidades e estimular as empresas brasileiras. Certamente, ao conseguirem condições para financiar o seu desenvolvimento sustentável, essas empresas terão condição de remunerar bem não apenas seus sócios, como também contribuir intensamente para o crescimento sustentável do nosso país.

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LaurodoAntonio Fujihara Marco

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Consultor Diretor da emnsulting Key Associados


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florestas, mudanças climáticas e serviços ambientais No mês de maio último, fui convidado a participar de um workshop sobre florestas nativas promovido pelo CBRN, órgão da Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo responsável pela elaboração de políticas públicas relacionadas ao uso dos recursos naturais estaduais. O objetivo do evento era discutir propostas para subsidiar um plano de implantação de florestas nativas com viabilidade econômica e ecológica. Logo no início do evento, foi apresentado um mapa em que, a partir do cruzamento de diferentes características edafoclimáticas, resultava em um zoneamento do território estadual apontando áreas com diferentes aptidões. De maneira simplificada, podia se observar uma grande mancha na porção central do estado, com uma aptidão agrícola produtiva intensificada, e, nos extremos do mapa, áreas com menor vocação agrícola e potenciais candidatas para conversão florestal a partir de áreas de pastagens de baixa produtividade. Mais do que a distribuição entre as diferentes alternativas, fui surpreendido com a apresentação de um segundo mapa que fazia os mesmos cruzamentos, porém considerando uma elevação de 2°C na temperatura – cenário bastante plausível dentro do que a ciência das mudanças climáticas vem nos apresentando. O resultado era que as áreas com alta aptidão agrícola minguavam, se reduzindo a uma fração de sua extensão original. Na reforma do Código Florestal, o grande embate aconteceu em torno da questão da redução das áreas produtivas disponíveis, caso a legislação atual fosse aplicada, seus impactos econômicos e rebatimento na questão de segurança alimentar. Ora, se lembrarmos que, hoje, o Brasil está entre os 4 maiores emissores de gases de efeito estufa e que cerca de 2/3 de nossas emissões decorrem do desmatamento e mudanças no uso do solo, temos mais um elemento a ser considerado na discussão. Nenhum dos cenários de redução de áreas agricultáveis é pior do que aquele associado às mudanças do clima. Com todos os percalços inerentes ao processo, tudo indica que estamos gradativamente caminhando para uma mudança de paradigma para a chamada

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economia de baixo carbono ou economia verde. O setor florestal brasileiro, incluindo florestas nativas e plantadas, pode ter uma contribuição importante para essa mudança. Por meio do desmatamento evitado, temos uma das menores curvas de custo marginal de abatimento para carbono e, para florestas plantadas, temos um diferencial competitivo único. Assim, podemos dizer que vivemos um momento de crise de identidade, em que oscilamos entre visões na qual a conservação florestal ora é vista como passivo ambiental, ora como ativo ambiental. Um passo para consolidarmos nossas florestas como ativos ambientais está no mecanismo de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA). Ainda embrionários, na esfera federal, por meio de projeto de lei (em discussão), e nas esferas estaduais e municipais, com legislações próprias, surgem pequenos projetos-pilotos em que ativos ambientais (florestas) são remunerados pelos serviços ecossistêmicos prestados. Tais serviços podem incluir conservação de recursos hídricos, conservação de solo, captura biológica de carbono e biodiversidade. A servidão florestal onde a Reserva Legal pode ser compensada extrapropriedade, permitindo um melhor planejamento do ordenamento territorial, complementa o cardápio de opções de remuneração por ativos florestais. Se adicionarmos a possibilidade de exploração econômica de áreas de Reserva Legal, incluindo o uso de espécies exóticas, temos um esboço de viabilidade econômica para áreas tidas como passivos ambientais sem função produtiva. A teoria financeira afere o valor de um ativo por meio do fluxo de caixa esperado. Fluxos de caixa florestal, caracterizados por altos investimentos iniciais e receitas na exploração de médio/longo prazo, podem ser beneficiados com receitas intermediárias e adicionais por meio de PSA. Estamos ainda muito distantes da construção de um novo modelo econômico de exploração florestal mais sustentável e sua operacionalização. Mas o caminho dos PSAs, com a implantação dos princípios do usuário pagador e do poluidor pagador, aponta para novos rumos.

vivemos um momento de crise de identidade, em que oscilamos entre visões na qual a conservação florestal ora é vista como passivo ambiental, ora como ativo ambiental " Philippe Lisbona Diretor da Verdesa

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pegada hídrica

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se considerarmos o conteúdo de água embutido na ampla gama de matérias-primas utilizadas no processo industrial, chegaremos facilmente à conclusão de que boa parte do sucesso do setor florestal brasileiro se explica pela disponibilidade de água doce do nosso país " Cindy Silva Moreira

Gerente de Projetos da DeltaCO2 Sustentabilidade Ambiental

A água doce é um dos principais recursos naturais do nosso planeta e um dos mais básicos e importantes para o setor florestal. Sua presença se faz necessária desde a produção de mudas, e seu crescimento no campo, até a obtenção do produto final. Se considerarmos o conteúdo de água embutido na ampla gama de matérias-primas utilizadas no processo industrial, chegaremos facilmente à conclusão de que boa parte do sucesso do setor florestal brasileiro se explica pela disponibilidade de água doce do nosso país. Um dos indicadores ambientais que mais vem sendo discutido mundialmente envolve o conceito da pegada hídrica. Ele reflete o grau de impacto sobre a quantidade de água doce consumida e utilizada para a produção de bens e serviços. O conceito pode ser utilizado no âmbito de um país, para uma bacia hidrográfica ou para um indivíduo, conforme o objetivo da aplicação. O cálculo do volume de água doce consumido no setor florestal é feito ao longo de toda a cadeia produtiva, envolvendo tanto a pegada hídrica direta, que é a água usada na produção propriamente dita, como a indireta – água embutida na matéria-prima utilizada no processo. Em função da fonte de consumo e a destinação da água, a pegada é classificada em azul, verde e cinza, cada uma medindo diferentes tipos de apropriação da água. A azul mede o volume de água doce retirada de fontes superficiais e subterrâneas, utilizado na etapa de produção florestal e no processamento da madeira. A verde está relacionada ao volume de água das chuvas requerido para o crescimento das árvores. A cinza refere-se ao volume de água necessário para diluir uma determinada carga de poluentes que foi descartada na água doce captada, de forma a reestabelecer sua qualidade conforme os padrões vigentes. No âmbito da produção florestal, é importante destacar que a pegada de água verde de um produto agrícola difere bastante do mesmo indicador na silvicultura. As atividades agrícolas muitas vezes requerem maior intervenção humana e um manejo mais intensivo para serem produtivas. Já as florestas são uma parte integrante do ciclo natural da água, o que, comparativamente aos cultivos agrícolas, torna o seu consumo de água verde menor.

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Não obstante, embora a prática florestal sustentável no Brasil seja uma realidade, a pegada de água verde no campo costuma ser significativa devido aos elevados índices de evapotranspiração das florestas plantadas de rápido crescimento. As pegadas de água azul e cinza no campo costumam ser relativamente menores que a de água verde, uma vez que a irrigação e aplicação de fertilizantes não são práticas intensivas. Na etapa de produção industrial, não se costuma contabilizar a pegada de água verde direta, mas sim a indireta, proveniente do campo. Com relação à pegada direta de água azul, muito embora as empresas brasileiras já tenham avançado muito na questão da eficiência do uso da água nos processos industriais, com o fechamento de ciclos e reutilização da água, ainda é possível reduzir perdas nos processos, de modo a trazer a pegada de água azul a níveis muito próximos de zero. É importante destacar, no entanto, que a maior parte do consumo de água da etapa industrial origina-se na cadeia de abastecimento. No setor de celulose e papel, por exemplo, esse índice pode chegar a mais de 90%. Uma vez identificadas e quantificadas as pegadas hídricas verde, azul e cinza, é possível dar início às ações de redução dos volumes de água consumidos e dos impactos associados à atividade produtiva. A azul pode ser reduzida, por exemplo, minimizando-se as perdas por evaporação nos processos de produção e no fechamento de ciclos de água nas indústrias. A cinza pode ser reduzida com o tratamento eficiente da água de processo antes do seu descarte em corpos hídricos. Na cadeia de suprimentos, os contratos podem incluir cláusulas específicas exigindo informações sobre a pegada hídrica das matérias-primas fornecidas, cujo impacto indireto no produto final é de extrema relevância. Finalmente, a pegada de água do setor florestal não deve ser considerada um indicador isolado, mas sim parte de um pacote de ações que, juntamente com outras ferramentas, como a pegada de carbono, a análise do ciclo de vida e as práticas de manejo sustentável, irão promover uma melhor compreensão das questões relativas aos serviços ambientais da floresta e, consequentemente, contribuirão para a sustentabilidade do setor.


Cuide do meio ambiente. nĂŁo deixe chegar o dia em que nĂŁo poderemos mais comemorar essa data.

ArcelorMittal BioFlorestas

de Junho

Homenagem da ArcelorMittal BioFlorestas ao Dia Mundial do Meio Ambiente.


mercado, bancos & fundos

títulos de crédito

para financiar a formação de florestas

À exceção da Cédula de Produto Rural - CPR, título de crédito emitido em favor de qualquer credor, todos os demais títulos de crédito disponíveis para formalização de financiamentos têm que ser emitidos em favor de instituições financeiras (“bancos”). Os títulos de crédito são utilizados pelos bancos de acordo com a atividade do financiado: 1. Cédulas de Crédito Rural para produtores rurais e suas cooperativas; 2. Cédulas de Crédito Industrial para a indústria; 3. Cédulas de Crédito Comercial para o comércio; 4. Cédulas de Crédito à Exportação para os exportadores; e, 5. a partir de 2004, a Cédula de Crédito Bancário para financiar qualquer tipo de atividade. A CPR foi desenvolvida com objetivo de criar um instrumento de crédito que viabilizasse o financiamento das atividades rurais com recursos privados e que, ao mesmo tempo, permitisse: 1. ao produtor rural vender antecipadamente a sua produção e, com os recursos oriundos da venda, complementar as suas necessidades financeiras para a formação de suas lavouras; 2. comprar insumos para pagamento em produto na colheita (barter). Em 2000, foi admitida a liquidação financeira da CPR, denominada CPR Financeira, resguardada, porém, a sua vinculação ao preço do produto ou índice do preço do produto, para que fosse mantida a chamada “equivalência-produto”, que é a moeda do produtor. A CPR veio, assim, permitir o financiamento do setor agropecuário com recursos privados através das tradings e empresas de insumos, responsáveis por atender 1/3 das necessidades do setor. Essas empresas atuam como se bancos fossem, analisando a operação de crédito, assumindo os riscos de produção e de preços. Esse título também está viabilizando a participação de fundos de investimentos, de fundos de previdência pública e privada, através da aquisição direta do título ou por intermédio da estruturação de operações com os demais títulos do agronegócio: Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio - CDCA, Letra de Crédito do Agronegócio - LCA, Certificado de Recebíveis do Agronegócio – CRA.

A entrada desses novos atores no financiamento do agronegócio mostra-nos que as instituições financeiras não mais detêm o monopólio da concessão de financiamentos ao setor produtivo, seja porque não dispõem de recursos suficientes para tal ou porque não se interessam por alguns tipos de financiamentos. O paradigma de que somente instituições financeiras podem conceder financiamento foi quebrado com a evolução dos negócios financeiros. A formação de florestas para fins comerciais exige a elaboração de projeto econômico-financeiro e agronômico, que, além de outras informações, leva em consideração o resultado da análise do solo, a necessidade de correção e utilização e fertilizantes, preparo das mudas, plantio, replantio, cuidados com ervas daninhas, desbrota, etc. A formação de florestas para fins comerciais exige a elaboração de projeto, inclusive agronômico, com cronograma para liberação dos recursos, e, do lado do financiado, o prazo para pagamento do empréstimo, amortizações periódicas e as demais condições a serem cumpridas pelo financiado. A CPR tem sido utilizada de maneira inadequada no financiamento para formação de florestas, uma vez que não admite a indexação de taxas de juros e nem a liberação parcelada do crédito, motivos pelos quais sou de opinião de que essa atividade seja atendida através de um Título de Crédito específico, com as seguintes características: 1. obrigue pagamento em dinheiro; 2. admita a liberação parcelada do crédito; 3. permita a fixação de prazo de carência; 4. admita amortizações periódicas; 5. seja transferível por endosso; 6. aceite a pactuação de juros sobre a dívida e sua capitalização; 7. aceite a pactuação de obrigações a serem cumpridas pelo financiado e pelo credor; 8. permita a vinculação de garantias reais ou fidejussórias, como o penhor, a alienação fiduciária e a hipoteca cedular; e, 9. que possa ser emitida em favor de qualquer credor. Um título com essas características poderá revolucionar o financiamento para formação de florestas com recursos privados, viabilizar a realização de operações estruturadas que permitam aos fundos de investimentos e investidores estrangeiros participarem do financiamento de florestas.

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esse título poderá revolucionar o financiamento para formação de florestas com recursos privados, viabilizar a realização de operações estruturadas que permitam aos fundos e investidores estrangeiros participarem do financiamento de florestas "

Roberto Ricardo Barbosa Machado, Bob Especialista em Títulos de Crédito - Gerente de Operações com Títulos e Registro da Bolsa Brasileira de Mercadorias

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Opiniões

a solução

para a sustentabilidade é contábil

Em 2005, estive na Costa Rica e ouvi do então ministro de Meio Ambiente e Energia, Carlos Manuel Rodriguez, uma das frases mais emblemáticas de toda a minha carreira. Me disse ele: “a solução dos problemas ambientais do mundo e a mudança da trajetória da humanidade no rumo da sustentabilidade é contábil”. Em 1987, a Costa Rica estava à beira de um colapso socioeconomico e ambiental. Mais de 80% do país já havia sido desmatado, e grande parte das terras estava degradada. A agricultura já não produzia como antes, a vazão dos rios diminuíra e comprometera a geração de energia, e as alternativas “clássicas” para se combater o problema estavam se exaurindo. A sociedade costarricense, numa atitude corajosa e inédita, trabalhou firme e reverteu, em pouco mais de uma década, a derrocada iminente. Nos anos 90, fundos internacionais foram captados, e compromissos firmados com empresas e proprietários de terras, todos com um mesmo fim, recuperar as florestas do país e fazer delas uma fonte de recursos para as gerações futuras. Em 2000, a cobertura florestal triplicara, e o PIB do país dobrara, com uma diversificação profunda, em especial pelo turismo relacionado às florestas naturais, à energia hidráulica e à agricultura irrigada. A grande virada da Costa Rica deu-se quando os custos e os benefícios gerados pelos serviços ambientais foram contabilizados nas contas públicas. Cerca de 80% da água utilizada pelos 7 bilhões de seres humanos para suas necessidades de alimentação, vestuário, geração de energia, dentre outras atividades fundamentais à vida moderna, é “produzida” em três regiões do globo: América do Sul, África subsaariana e sul da Ásia. Disse-me uma vez Pavan Sukdev, indiano e um dos maiores especialistas nas relações entre negócios e meio ambiente: “se os líderes de uma dúzia de países resolver cobrar pela água necessária para se produzir a soja e o milho que alimenta o gado de leite e os suínos na Europa e no Japão, os mercados internacionais sofreriam uma verdadeira revolução”. Para se produzir um quilo de soja, precisa-se ter disponível cerca de 4.000 litros de água. Milho, um pouco menos, cerca de 3.500 litros por quilo. E essa água não está contabilizada no preço de centavos de dólares que se paga por esse quilo de soja ou milho.

Uma floresta é o que mais se assemelha a uma “fábrica de água”. Não existe floresta sem água, nem o inverso. O desmatamento da Mata Atlântica e a potencial falta de água em várias cidades, bem como a perda de solos por erosão, com consequente diminuição da produtividade agrícola, são evidências dos riscos que corremos com o desmatamento e a perda de florestas em nosso país. O Brasil possui um dos maiores potenciais florestais do mundo. Temos a Amazônia, temos os eucaliptais mais produtivos e algumas das regiões mais aptas ao plantio de florestas. Mas, na prática, temos menos florestas manejadas do que a Finlândia, um país 25 vezes menor. Estamos perdendo investimentos para países vizinhos menos burocratizados, como o Uruguai. Temos quase nada em termos de programas de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), os quais podem remunerar as florestas pelo serviço de proteção da água. Mesmo com todo esse potencial florestal, que protege cerca de 15% da água doce do planeta, ainda não conseguimos criar os incentivos para plantarmos mais florestas e manejarmos, de forma sustentável, a Amazônia e outros biomas. O novo Código Florestal certamente servirá para reduzir ainda mais esse potencial. O atual governo federal não criou, pela primeira vez em 20 anos, nenhum hectare de novas áreas florestais protegidas. São essas áreas, as Unidades de Conservação Públicas, que garantem as bases geradoras do serviço de proteção de água para o consumo humano. Para citar um exemplo, cerca de 4 milhões de habitantes do Rio de Janeiro (Niterói, Itaboraí, etc) bebem água “produzida” no Parque Estadual dos Três Picos, na região serrana. Parque este que, ainda hoje, sofre com agressões de todo tipo, como caçadores e coletores de palmito, além da falta de regularização fundiária. Falar de sustentabilidade florestal é falar de proteção e contabilização da água que as florestas protegem. É falar de proteger matas nativas. É falar de desburocratizar e tornar mais transparentes os investimentos florestais. Talvez precisemos de mais contadores ao lado de ambientalistas e engenheiros florestais e de menos políticos decidindo o que fazer com as nossas florestas e nossa água. E ainda nem falei nada de carbono fixado nas árvores e sua função no combate às mudanças climáticas...

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Temos a Amazônia, os eucaliptais mais produtivos e algumas das regiões mais aptas ao plantio de florestas. Mas, na prática, temos menos florestas manejadas do que a Finlândia, um país 25 vezes menor. "

André Loubet Guimarães Diretor Executivo da Conservação Internacional do Brasil

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mercado, bancos & fundos

Opiniões

um esforço nacional Quem admira a exuberância da Floresta da Tijuca fica surpreso ao saber que aquela mata teve como origem um árduo trabalho de reflorestamento. Tudo ali estava degradado pelos cafezais em declínio, e a água começava a escassear na cidade. Foi preciso que o Imperador D. Pedro II ordenasse um extenso plantio de mudas. A tarefa foi confiada ao Major Archer, que, com alguns escravos, plantou cerca de 80 mil mudas. Entraram para a história. Hoje, a voz suprema da autoridade é outra. Estabelecida por diversas leis e decretos, a recuperação de biomas brasileiros é uma demanda ecológica, social, ambiental e econômica que exige um esforço nacional, distribuído por todas as regiões do País. Os benefícios da recomposição da cobertura vegetal em áreas degradadas com espécies nativas são conhecidos e incluem a proteção da biodiversidade, a manutenção dos recursos hídricos e a redução da erosão. Além deles, podemos citar o armazenamento de carbono e a regularização ambiental das propriedades. Ainda é pouco considerado um benefício adicional o crescimento de um novo setor da economia brasileira, o de plantio e condução da regeneração de espécies nativas e de sua cadeia produtiva, o que inclui a coleta de sementes e a produção de mudas em viveiros. Espera-se um significativo aumento da demanda por atividades de recuperação dos biomas brasileiros, com geração de emprego e renda no meio rural. O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES, oferece diversas formas de apoio a investimentos ambientais, desde as tradicionais para energias renováveis, saneamento ambiental e prevenção de poluição, até as linhas de financiamento a projetos que envolvam plantio, enriquecimento e condução de regeneração com espécies nativas para fins de recuperação ambiental. A Linha BNDES Florestal pode ser utilizada em projetos acima de R$ 1 milhão. O Programa de Agricultura de Baixo Carbono, para projetos de integração de lavoura, pecuária e silvicultura, financia o proprietário rural em até R$ 1 milhão por ano/safra. O Fundo Nacional sobre Mudança do Clima oferece aos estados e municípios do Nordeste taxas de juros de 3,5% ao ano e, para empresas e cooperativas, entre 3% e 6% ao ano, dependendo do risco de crédito. E o Fundo Amazônia, com recursos não reembolsáveis, pode ser utilizado para projetos no bioma Amazônia. Nas atividades de reflorestamento com espécies nativas, existe a Iniciativa BNDES Mata Atlântica, ação com recursos não reembolsáveis a entidades sem fins lucrativos. Na primeira fase, foram aprovados 14 projetos, o que deverá resultar em desembolsos superiores a R$ 40 milhões. Estuda-se, agora, o lançamento de

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uma nova fase de suporte visando ao aumento de escala do conjunto de projetos. Da experiência de apoio a tais projetos, já é possível distinguir aspectos relevantes para um esforço nacional de recuperação de áreas com vegetação nativa. • Seleção de áreas prioritárias: Seguindo a ideia da evolução anual da capacidade de recomposição, é importante priorizar algumas áreas, seguindo a formação de corredores ecológicos. • Integração de iniciativas de recomposição: Na medida do possível, os projetos de empresas e ONGs devem ser integrados, mesmo que indiretamente, com as iniciativas e programas dos governos estaduais e municipais. • Coleta de sementes e produção de mudas: Os investimentos em viveiros e rede de sementes podem ser derivados de um aumento da demanda de mudas, mas também podem ser feitos diretamente com recursos de um projeto específico. Certamente, a disponibilidade de mudas em quantidade, qualidade e diversidade de espécies pode se tornar um gargalo se tais investimentos não acompanharem o esperado crescimento da demanda. • Aumento da escala das ações de recomposição: Para atingir níveis relevantes de restauração de biomas, é essencial que surjam integradores de projetos que possam gerir projetos menores em localidades diversas. Esse é um avanço que precisa ocorrer no setor de recomposição de nativas. • Necessidade de recursos públicos e privados: Atingir metas ousadas de recomposição vai exigir aportes adicionais aos recursos públicos. A participação do setor privado, apesar de alguns casos emblemáticos, ainda é tímida nas atividades de reflorestamento, mesmo quando elas são obrigatórias. Seja voluntário ou fruto de compensações, o apoio das empresas será crucial para promover a evolução da recomposição. • Diretrizes e coordenação dos órgãos ambientais estaduais: Mesmo se não puderem exercer papel de agentes diretos de restauração florestal, os órgãos estaduais são os grandes responsáveis pela demanda de recomposição por meio dos licenciamentos e autorizações. Quanto à captação de recursos, uma alternativa é a estruturação de fundos com foco bem definido no apoio a projetos de recomposição com recursos públicos, os quais poderão ser alavancados por doações e obrigações complementares oriundas de empresas nacionais, instituições multilaterais e países. A continuidade de iniciativas de recomposição estimulará um número maior de agentes reflorestadores, com impactos na capacidade de gestão e implementação. Quem sabe poderão honrar o exemplo do Major Archer e dos escravos de dois séculos atrás.

Quanto à captação de recursos, uma alternativa é a estruturação de fundos com foco no apoio a projetos de recomposição com recursos públicos, os quais poderão ser alavancados por doações e obrigações complementares oriundas de empresas nacionais, instituições multilaterais e países. " Márcio Macedo Costa Chefe do Departamento de Meio Ambiente do BNDES


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Apesar da intensa degradação e fragmentação, a Mata Atlântica é ainda um grande repositório de biodiversidade e responsável pela produção de água para milhões de brasileiros. Diante desse cenário, a restauração florestal em larga escala é a estratégia mais urgente e viável para ampliar a conectividade entre os remanescentes florestais e assegurar a conservação da biodiversidade e a manutenção dos serviços ambientais fornecidos por essa floresta. Para fazer frente a esse enorme desafio, nasceu o “Pacto pela Restauração da Mata Atlântica”, um movimento coletivo de organizações públicas, privadas e não governamentais comprometido com integração de esforços e mobilização da sociedade para restaurar, até 2050, 15 milhões de hectares de áreas degradadas. Lançado oficialmente em 2009, em apenas três anos, o Pacto se tornou uma referência nacional e internacional em termos de arranjos multi-institucional e multissetorial, voltado para trazer soluções pragmáticas com impactos sociais, ambientais e econômicos para mais de 110 milhões que dependem dos bens e serviços das florestas. Como consequência, o Pacto é hoje um dos programas mais inovadores de restauração florestal do mundo, com a capacidade e a ambição para solucionar as principais barreiras que têm impedido a restauração na escala desejada. Até maio de 2012, o Pacto já engajou 217 organizações-membros, distribuídas entre organizações ambientalistas nacionais e internacionais, instituições governamentais, empresas e centros de pesquisa; criou um website em português e inglês com um banco de dados online para cadastrar os projetos e iniciativas de restauração; cadastrou mais de 320 iniciativas, sendo 114 projetos de restauração em andamento, mais de 32 políticas formuladas, 54 patrocinadores, 21 viveiros, 88 voluntários, 12 pesquisas científicas, além de áreas para restauração e prestadores de serviços; publicou o estado-da-arte da restauração florestal na Mata Atlântica através do Referencial dos Conceitos e Ações de Restauração Florestal; mapeou mais de 17 milhões de hectares de áreas potenciais para restauração na Mata Atlântica, com áreas elegíveis para mercados de carbono e prioritárias para produção hídrica e conectividade;

e publicou três artigos científicos em revistas internacionais. Além desses produtos, o Pacto tem sido um instrumento fundamental para promover a capacitação, troca de experiências e disseminação de informações entre seus membros, apoiando a realização apesar dao vegetalde" cursos e oficinas. Tem colaborado também na execução e na padronização do monitoramento das áreas restauradas, contribuindo, assim, para melhorar a qualidade e a replicação das iniciativas exitosas de restauração e assegurar o bom uso dos recursos públicos e privados investidos em restauração florestal. Apesar dos 114 projetos já cadastrados totalizarem apenas 62.000 hectares de áreas em restauração, após uma análise preliminar dos dados, constatou-se que o Pacto será um grande agente de mudanças e melhoria social. Em termos de geração de postos de trabalho, os projetos cadastrados conAntoga tam com o envolvimento de 1728 pessoas, através de postos de trabalho diretos, indiretos e voluntários. Estima-se que, Profesraná ao cumprir a meta do Pacto, serão criados 6,5 milhões de postos de trabalho diretos e indiretos durante as próximas quatro décadas. Na busca por integrar, articular e disseminar suas experiências para outros biomas e países, o Pacto tem interagido e colaborado com vários fóruns e redes nacionais e internacionais, destacando-se a Rede Brasileira de Restauração Ecológica (REBRE), Society for Ecologial Restoration (SER), Global Partnership Forest Landscape Restoration (GPFLR), Red Latino Americana de Naturaleza (REDLAN) e a International Union for Conservation of Nature (IUCN). Apesar das grandes conquistas, os membros do Pacto reconhecem que ainda existem enormes desafios a serem superados para atingir a meta de restauração. Um deles é transformar a restauração florestal num grande negócio para a sociedade, seja através da geração de renda para quem investir em restauração, ou para aqueles que dependem dos serviços ambientais para a sua sobrevivência e bem-estar. Para isso, o Pacto tem investido no desenvolvimento de pesquisas para reduzir custos da restauração e aumentar a produção e o valor dos bens e serviços das florestas nativas para toda a sociedade.

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apesar da intensa degradação e fragmentação, a Mata Atlântica é ainda um grande repositório de biodiversidade e responsável pela produção de água para milhões de brasileiros "

Miguel Antonio de Goes Calmon Assessor de Estratégia para Conservação para a América Latina da NTC - The Nature Conservancy

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visão local - amazônia

Opiniões

amazônia, as raízes do atraso

As florestas plantadas são modelos de sustentabilidade por suprir continuamente matéria-prima das fábricas de celulose e madeira para diversas finalidades industriais. Porém essa sustentabilidade poderá ser ainda maior se consorciada com outras atividades produtivas. São vários os fatores a serem considerados para caracterizar, na prática, a sustentabilidade de um empreendimento de silvicultura, sendo a maneira mais didática a baseada em exemplos de manejos já ocorridos. Não é tarefa fácil conciliar o tripé que rege teoricamente a sustentabilidade, ou seja, os fatores econômico, social e ambiental, sendo que acrescentaríamos um quarto componente, o “tecnológico”, pois, sem ele, não existirá sustentabilidade, principalmente na Amazônia brasileira. Um exemplo negativo ocorrido na Amazônia foi o ciclo da borracha (1870-1910), totalmente baseado em práticas extrativistas. Não somos contra o extrativismo, porém é preciso que se tenha tecnologia, pois, com o aumento da expansão demográfica e não havendo plantios mais adensados das essências florestais e experimentos científicos das espécies manejadas, para melhor conhecer o comportamento delas, logo o processo terá problemas econômicos, sociais e ambientais. O mercado da borracha amazônica, ainda hoje, é o exemplo mais evidente. Nós o perdemos para os ingleses, que haviam contrabandeado sementes da seringueira para suas possessões asiáticas, com resultados catastróficos para a economia da Amazônia. Como comparação, enquanto a incidência da seringueira nas florestas nativas de áreas de várzea da Amazônia era (e é hoje) de uma média de 10 árvores por hectare, os ingleses plantaram 900, demonstrando, portanto, a difícil condição de se ter um empreendimento economicamente sustentável em condições de competição. A Amazônia era o berço da seringueira e poderia ter hoje grandes seringais com sustentabilidade econômica, depois de vencidas as doenças fúngicas pela experimentação continuada. Mas isso não aconteceu, pois lhe faltou o principal fator para consolidar a atividade, ou seja, a tecnologia, que, no mínimo, poderia ter sido no

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O uso da to uma garantia de sobrevivência futura. "

método de adensamento, como bem disse recentemente Ignacy Sachs: “É possível adensar a floresta com as espécies que me interessam”. Recentemente, lançamos um livro sobre a Amazônia, intitulado “Amazônia, as raízes do atraso”, no qual procuramos abordar as oportunidades que a região apresenta, devido às suas características naturais, propícias para a silvicultura e, de um modo geral, para a produção de biomassa, considerando a sua abundância em água, incidência de luz, inexistência de chuvas de granizo e outras condições adversas para a produção. Porém nos falta a condição tecnológica, com a qual, sem dúvida, a silvicultura, em plantios intensivos consorciados, terá mais sustentabilidade, o mesmo acontecendo com os manejos sustentáveis das florestas nativas. Para se obter sustentabilidade em qualquer atividade, é necessário ter tecnologia. Os seringueiros poderiam ter sido capacitados a observarem as árvores que eram mais sadias e resistentes ao ataque dos fungos, para que, mais tarde, os técnicos pudessem aproveitar esse conhecimento prático e obter clones resistentes e produtivos. Isso nunca aconteceu, e, até os dias atuais, a maior parte das regiões amazônicas continuam com o mesmo método extrativista, não só da seringueira como também dos castanhais e das sementes oleaginosas, como o cumaru, puxuri e outras espécies; a sustentabilidade da economia é insuficiente porque não tem volume dos produtos. Certas regiões estão em constantes conflitos, porque as populações dos castanhais e seringais aumentaram, havendo competição pelos produtos. Como consequência, a questão ambiental corre sérios riscos, porque os produtos são todos colhidos, não se mantendo sementes suficientes na floresta que possam germinar e produzir, fazendo a reposição das espécies. A situação se agrava, pois o caboclo amazônida não tem a cultura de plantar, costume herdado do nosso colonizador ibérico. As florestas nativas da Amazônia correm sérios riscos se não forem manejadas adequadamente, com manejos sustentáveis, acompanhados de certificação. Não há condições de ela suportar a demanda desordenada dos desmatamentos. O sonho de grandeza, vivido durante a corrida da

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O mercado da borracha amazônica, ainda hoje, é o exemplo mais evidente. Nós o perdemos para os ingleses, que haviam contrabandeado sementes da seringueira para suas possessões asiáticas, com resultados catastróficos para a economia da Amazônia. "

Cristóvão Lins

Engenheiro agrônomo, escritor, especialista em Amazônia

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visão local - amazônia borracha, só serviu para aumentar a dependência de toda a economia da região, em torno de um único produto extrativista, desarticulando outras atividades que poderiam proporcionar um desenvolvimento sustentável. Durante aquele período, a borracha tinha sido tudo para a Amazônia, mas, nos primeiros anos do novo século, a concorrência dos seringais da Ásia já dava claros sinais do desastre iminente. Naquela ocasião, o cientista Jacques Huber visitou as plantações de seringais na Ásia. Impressionado com o que viu, não usou meias palavras e anunciou que a hegemonia da borracha da Amazônia no mercado mundial estava com os dias contados. Continuando ainda mais um pouco com o exemplo do extrativismo puro, ou mesmo com a intocabilidade da floresta como alguns ambientalistas apregoam como o modelo certo, além do risco que as essências estão correndo por não serem replantadas por adensamento (seringueiras e castanheiras), ou por falta de manejo e conhecimento de seus ciclos (espécies comerciais produtoras de madeira) e ainda devido ao aumento populacional das comunidades extrativistas, que não têm o hábito de plantar, e mesmo criar, e servem-se, apenas para a sua alimentação, dos recursos faunísticos (plantadores da floresta). As florestas nativas precisam ser olhadas pelo governo brasileiro como um grande negócio para diminuir a pobreza da Amazônia, considerando que, para cada emprego direto proporcionado por uma área em regime de manejo sustentável, haverá seis indiretos. A título de informação, segundo Antonio Carlos Hummel, 20 milhões dos 239 milhões de hectares de florestas públicas da Amazônia apresentam condições que justificariam adotar o modelo de exploração sustentável. Vamos tratar, a seguir, de métodos mais consistentes sobre a sustentabilidade, baseado no exemplo que tivemos a oportunidade de conduzir, quando ainda éramos funcionários da Empresa Jari, na qual tivemos a oportunidade de trabalhar pelo período de trinta anos. O exemplo prático foi executado com uma floresta plantada com o Pinus caibaea, Vr. Ondurenses, mas que poderá também ser com eucalipto, paricá (Shizolobium amazonicum) ou outra espécie, sendo a cultura florestal a principal, do ponto de vista econômico, que poderá ser ajudada, na sua sustentabilidade, por outras atividades consociadas. O manejo consorciando silvicultura de pinus com pecuária na empresa Jari, quando ainda pertencia a Daniel Keith Ludwig, na época um dos homens mais ricos do planeta, o qual tinha interesse pessoal no programa, que era visitado por ele anualmente, desde o seu início, no ano de 1976, era assim: denominado silvopastoril, foi executado em uma área de 10 mil hectares, com 3 mil bovinos, abrangendo as fases de cria, recria e engorda, utilizando a tecnologia de inseminação artificial com sêmen de raças europeias para corte, em vacas nelore, com ótimos resultados zootécnicos, tendo sido inseminadas, em média, 1.200 matrizes por ano. O plantio do pinus foi efetuado no espaçamento de 4 metros entre as linhas e 2,2 metros entre plantas, existindo também espaçamentos de 4x3 metros. O plantio das gramíneas foi feito após o plantio do pinus, com um espaço de tempo de trinta dias. A densidade do plantio do capim, no caso o colonião, foi de duas linhas ao centro, em cova aberta e distante uma da outra um metro. Somente após um ano, os animais teriam acesso ao capim. Nos primeiros meses, o manejo dos animais requeria cuidados para que não houvesse pisoteamento do pinus.

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Opiniões A carga de animais por área dependia do tamanho do piquete. Era feito rodízio, avaliando a altura do capim pastado, embora o suporte fosse até o quarto ano de 1 U.A (400 kg bruto) por hectare. Após o quarto ano, começaram as dificuldades da pecuária na arregimentação dos animais, diminuição das pastagens devido ao sombreamento da floresta e queda de acículas do pinus. O manejo florestal restringia-se ao combate à saúva e a roçagens periódicas, em número comprovadamente bastante inferior, comparadas com áreas onde não havia o plantio de gramíneas, demonstrando, dessa maneira, uma ajuda substancial na sustentabilidade econômica da floresta. Para avaliar a metodologia de produção consorciada, comparamos duas áreas da mesma idade plantadas com a mesma espécie florestal, sendo uma com plantio somente de floresta e a outra consorciada com pecuária, cujos resultados após a colheita da madeira foram os seguintes: a área manejada com pecuária e floresta atingiu um volume de medida de 126 m³, sem casca, e a sobrevivência do plantio até o corte raso foi de 80% (920 árvores). A área com apenas silvicultura, com as mesmas características, teve um volume de madeira de 118 m³, sem casca, e a sobrevivência foi 74% (846 árvores). Portanto, já há 36 anos, em plena Amazônia, foi realizado um programa consorciado entre silvicultura, como a principal atividade econômica, e a pecuária bovina, demonstrando que uma atividade secundária poderá ajudar a manter a sustentabilidade florestal no seu tripé econômico, social e ambiental, sendo utilizada tecnologia de ponta nas duas atividades. Na pecuária, na qual éramos os coordenadores do programa, utilizávamos sêmen importado dos melhores touros provados do mundo das raças Charolês, Herefford, Quianina, Marcgiana, Santa Gertrudes, inseminando vacas da raça Nelore, obtendo um produto na geração F1 de altíssima qualidade, sendo o cruzamento de melhor performance com Charolês: na desmama, machos e fêmeas, com idades entre 8 a 10 meses, pesavam 263 Kg e 245 Kg, respectivamente; no abate, na faixa de 24 a 36 meses, os machos pesavam em média 444 Kg brutos. A conclusão a que se chegou na prática em consorciar pecuária com silvicultura na Jari foi positiva em certos aspectos, pois, além do comprovado aumento da matéria-prima da essência florestal, foi também observado menor número de limpezas anuais e combate a saúvas. Do ponto de vista do manejo do rebanho, por ser a área de responsabilidade da gerência florestal, o planejamento era direcionado com prioridade à silvicultura, porém não existem dúvidas de que as duas atividades podem ser operacionalizadas em conjunto em prol da sustentabilidade econômica, social e ambiental, devendo ser estimulada a sua prática nos manejos das florestas amazônicas ou, por que não dizer, nas florestas brasileiras. Cabe aqui também mencionar que a sustentabilidade obedece a limites, e um determinado empreendimento poderá ou não ainda ter o que avançar, ou já estar comprometido com a sua expansão, não tendo mais como evoluir com a mesma velocidade de quando ainda não havia atingido as suas condições máximas, mesmo já tendo utilizado tecnologia. No nosso exemplo, uma experiência vivida pelo período de 10 anos, embora tenhamos utilizado a área para pecuária com alta tecnologia abrangendo as modalidades de cria, recria e engorda, sugerimos que a utilização mais adequada para o consórcio floresta/pecuária seja a de recria e engorda.



ensaio especial

Opiniões

pagamento por

serviços ambientais

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... a justificativa é o benefício que resultará para o meio ambiente ou a natureza, que é dever de todos nós preservar. Em outras palavras, o agricultor não pode ser penalizado por um benefício que atingirá a sociedade como um todo "

Luiz Ernesto George Barrichelo Diretor Executivo do IPEF

A conceituação apresentada por Sven Wunder, economista, pesquisador do CIFOR (Center for International Forest Research), é uma das mais completas: Pagamento por Serviço Ambiental é uma transação voluntária, através da qual um serviço ecológico específico é adquirido por um (ou mais) adquirente de um (ou mais) provedor desse serviço e, somente se, o provedor assegurar sua provisão (condicionalidade). Por outro lado, a proposta do Projeto de Lei Federal 5.487/2009 é bastante abrangente na sua conceituação, como a retribuição, monetária ou não, às atividades humanas de restabelecimento, recuperação, manutenção e melhoria dos ecossistemas que geram serviços ambientais e que estejam amparadas por planos e programas específicos. A Política Nacional de Serviços Ambientais, que faz parte da mencionada lei federal, apresenta como princípios e diretrizes, desde tópicos extremamente genéricos, como “desenvolvimento sustentável” e “controle social e transparência” até outros ambíguos, como “reconhecimento da contribuição da agricultura familiar, dos povos indígenas e dos povos e comunidades tradicionais para a conservação ambiental”. Sem dúvida alguma, os melhores exemplos são ligados a propostas e programas delimitados por objetivos mensuráveis, tanto a partir da iniciativa pública como privada, e apoiada, quando for o caso, por legislação estadual e mesmo municipal, que têm tido aumento significativo nos últimos anos. O assunto ainda é controvertido, pois muitos alegam ser um contrassenso a remuneração ser destinada ao produtor rural que deve, por lei, ser obrigado a manter ou recuperar, por exemplo, Áreas de Preservação Permanente em torno de nascentes e à margem de córregos e rios. Em contrapartida, há um argumento e uma justificativa para tal medida. O argumento reside no fato de que o benefício concedido pelo poder público, ou pela sociedade civil, é uma compensação do possível prejuízo direto que o agricultor teria, isolando parte da área da propriedade considerada APP. A justificativa é o benefício que resultará para o meio ambiente ou a natureza, que é dever de todos nós preservarmos. Em outras palavras, o agricultor não pode ser penalizado por um benefício que atingirá a sociedade como um todo.

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A pendência se dilui quando a conceituação de Wunder é respeitada e identifica, com clareza e objetividade, quem é o “provedor” e quem é o “adquirente” ou o “receptor”. Dois exemplos clássicos são: primeiro, o dos produtores da água Perrier-Vitel, na França, que pagam aos fazendeiros a montante da sua captação pela proteção de suas nascentes. O outro exemplo vem nos Estados Unidos, onde a prefeitura de New York, há mais de 20 anos, remunera produtores rurais, distantes cerca de 200 quilômetros, pela adoção de práticas ambientalmente corretas nas suas atividades de preservação dos mananciais, através de reflorestamento das margens dos rios e não contaminação da água com resíduos da agricultura e pecuária. Sob dessa ótica, governos estaduais e municipais no Brasil têm editado leis com uma razoável aceitação pelos interessados. Como um exemplo, a Secretaria de Meio Ambiente de São Paulo lançou o programa “Adote uma Nascente” (Programa de Proteção e Recuperação de Nascentes), que permite um efetivo controle das partes envolvidas. Como iniciativas, em nível municipal, um destaque no estado de Minas Gerais: a cidade de Extrema possui um consórcio da Prefeitura local, Sabesp, ANA, IEF e TNC que mantém o programa Conservador de Água, que remunera produtores localizados na Serra da Mantiqueira que protegem as nascentes e promovem a recuperação das matas nativas. O envolvimento financeiro da Sabesp se justifica, pois a região possui bacias hidrogáficas que integram o Sistema Cantareira, que abastece a cidade de São Paulo. Seguindo esse exemplo, muitas outras cidades brasileiras têm procurado popularizar iniciativas semelhantes, de maneira a reverter o preocupante quadro de degradação ambiental. Em contrapartida, outras iniciativas têm surgido, muitas das quais se caracterizam mais como ações paternalistas, a exemplo das “bolsas” nas quais se procura remunerar, de forma indefinida ou difusa, a população carente da zona rural, com resultados de difícil avaliação e duvidosos na sua eficácia. Se for uma tentativa de motivar a população beneficiada para ações ecologicamente corretas, na nossa modesta opinião, não é por aí.




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