
9 minute read
Francisco Vital Alves de Souza, Coruripe Açúcar e Álcool
o momento é este!
O etanol no Brasil já passou por várias fases, algumas delas muito promissoras, outras bem desanimadoras, portanto precisamos relembrá-las pontuando alguns fatos relevantes que marcaram a nossa história, não só para servirem como base de ajuste de rota, como também para não repetirmos os mesmos erros e, principalmente, para aprimorarmos os acertos e avançarmos no melhor caminho.
O etanol começou nos anos 1970 como uma alternativa nacional promissora, com o objetivo maior de reduzir a dependência do Brasil na importação de petróleo. Naquela época, houve uma nova crise de oferta no petróleo, os preços dispararam; importávamos quase 80% do petróleo que consumíamos, e isso era um peso grande em nossa balança comercial, além de um alto risco estratégico para o nosso País. O Programa Nacional do Álcool começou muito bem estruturado, o IAA planejava a produção com base na previsão do consumo, e esse modelo perdurou por décadas, sendo bem exitoso nas suas diretrizes, até a extinção desse importante órgão no início dos anos 1990. Logo após, veio a abertura do mercado, e passamos a viver momentos bons de preço e outros momentos bem abaixo do nosso custo; vivíamos oscilando entre o céu e o inferno por muitas safras e até dentro de uma mesma safra. Isso tudo em função das muitas variáveis que o nosso setor tem e, inclusive, vêm surgindo novas ao longo do tempo. Apenas para ilustrar, o nosso segmento teve que lidar, além de das variações das safras por motivos climáticos, com as mais diversas crises econômicas e
Nesse novo caminho, surgiu uma nova proposta de abordagem do setor para o mundo na comercialização do etanol, o projeto de nome 'Etanol do Futuro', pensado pelo nosso querido Plinio Nastari, a Agência África e toda a equipe da Datagro "
Francisco Vital Alves de Souza
Diretor Comercial da Usina Coruripe Açúcar e Álcool
volatilidade do mercado de açúcar internacional inerente ao nosso setor, e também precisou aprender com as oscilações do preço do petróleo, com os altos e baixos do câmbio, com as diversas políticas de importação e exportação do álcool, ou seja, tudo que poderia interferir em nossa comercialização para mitigarmos os riscos dessa volatilidade nos preços.
O negócio realmente ficou mais complexo, mas o setor se fortaleceu, investiu em tecnologia de produção, baixou os custos, correu atrás de abrir novos mercados fora do Brasil e buscou alternativas de financiamentos para viabilizar estocagem e posterior venda de álcool na entressafra, entre outros tantos movimentos.
Todas essas ações objetivavam equilibrar a oferta ao longo da safra para buscarmos preços remuneradores. Porém, mesmo assim, as coisas aconteciam invariavelmente fora das previsões orçamentárias, até em função de algumas superssafras e uma falsa liberdade de mercado. Digo isso porque, apesar de o setor sucroenergético poder vender uma maior quantidade de produto em diferentes meses, por outro lado, temos um mercado limitado por resoluções governamentais.
Em 2003, veio a primeira grande revolução para o nosso setor para os destinos do álcool, pois, com o lançamento do carro flex-fuel, que teve aceitação imediata do consumidor pela liberdade de escolha no combustível a ser usado, gerou a atratividade necessária para a produção desse novo modelo, impulsionando de vez

a indústria automobilística para a produção em larga escala desse tipo de veículo no Brasil, em função da confiança do consumidor e, consequentemente, mudando o patamar de consumo do álcool hidratado em nosso País. As coisas para o álcool começaram a mudar para melhor, a nossa frota foi virando, ao longo do tempo, totalmente para carros flex-fuel e, poucos anos depois, em concomitância com essa nova realidade de produção dos carros flex, veio uma nova crise do petróleo em 2008, os preços explodiram, e o álcool, mudando já de nome para etanol, pegou ainda mais força quanto à sua tendência de futuro e ganhou status de um dos produtos mais promissores naquele momento. Em cima disso, os incentivos do governo da época para produzirmos mais etanol vieram, o setor ganhou mais força, se expandiu rapidamente, a
PETRÓLEO
200
150
100
50
0
-501900 1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2008 2006 2010 2012 2014 2016 2018 2020
NY 11 cts/lb x BRL
40 35 30 25 20 15 10 5 0
1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004 2008 2006 2010 2012
Cents/lb BRL 2014 2016 2018 2020
R$ 7 R$ 6 R$ 5 R$ 4 R$ 3 R$ 2 R$ 1 R$ 0
CONSUMO ETANOL HIDRATADO ANP
25.000.000 20.000.000 15.000.000 10.000.000 5.000.000
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2014 2018 2019 2020 produção cresceu de uma forma geométrica, e as coisas pareciam melhorar com mais estrutura. Entretanto, poucos anos depois, o governo virou o interesse para a descoberta do petróleo do pré-sal, veio uma nova crise do petróleo, os preços na importação da gasolina ficaram praticamente congelados por muito anos, e voltamos a sofrer novamente.
Estou contando um pouco dessa nossa história toda do etanol para, de alguma maneira, nos ajudar a repensarmos o nosso modelo de comercialização, a forma de trabalhar todos os mercados, qual o enfoque que daremos para o etanol, mesmo porque, até então, usamos praticamente o atributo preço para o consumidor decidir se coloca etanol ou gasolina e, como todos sabem, esse é o atributo mais frágil.
Mais recentemente e, mais fortemente, nessa última década, veio uma nova ordem global com base na sustentabilidade, onde o consumidor mundial e todas as grandes nações priorizam os produtos sustentáveis, difundem a proteção ao meio ambiente e estimulam a redução de emissão dos gases de efeito estufa. Isso ratifica o etanol como a alternativa mais sustentável como combustível, tornando esse produto uma possibilidade real e abrindo espaço para torná-lo uma commodity definitivamente.
Nesse novo caminho, surgiu uma nova proposta de abordagem do setor para o mundo na comercialização do etanol, o projeto de nome “Etanol do Futuro”, pensado pelo nosso querido Plínio Nastari – uma das maiores referências em nosso segmento no mundo – juntamente com a Agência África e toda a equipe da Datagro, onde, contando com o apoio de todo o nosso setor, apresentarão para o mundo uma campanha usando os novos e importantes canais de comunicação, com enfoque nesse novo momento, os atributos de sustentabilidade que o etanol tem, adicionalmente à geração de emprego e renda em todas regiões de produção.
Enfim, acredito no etanol como uma matriz energética mais equilibrada, viável, longeva e sustentável que o mundo pode usar, mas precisamos unir todo o setor para vendermos essa ideia real, trabalhando o marketing como um investimento definitivo do nosso negócio, incentivando a evolução da tecnologia flex com prioridade para o etanol e apresentando para o mundo os benefícios dessa fonte de energia mais limpa e renovável para abrirmos mais mercados.
O mundo precisa do nosso produto, mas também precisamos de uma nova ”embalagem“, de um setor mais unido e organizado, pois o momento é este. ;
Com essa perspectiva, estamos estimando nova redução na oferta total de etanol de cana-de-açúcar, de 27,7 mi/m³ para 25,2 mi/ m³; por outro lado, a produção de etanol de milho crescerá mais 30% em relação a essa safra, alcançando 3,3 M.
Resumindo, a região Centro-Sul deverá produzir, na safra que se aproxima, 28.4 M/m³ de etanol, uma redução de 6,5% em relação ao que produzimos e ofertamos em 2020/2021.
Com a população sendo vacinada ao longo do ano, espera-se a recuperação de vendas de combustíveis do ciclo Otto, com vendas crescentes, voltando ao volume pré-pandêmico.
Com a tributação de 20% sobre o etanol importado, os preços projetados no mercado futuro americano e a manutenção do câmbio atual, qualquer arbitragem estará fechada, razão por que não acreditamos na entrada de volumes expressivos de etanol importado.
Com essa previsão, é necessário que a produção de etanol anidro seja priorizada pelas usinas brasileiras, para garantir o suprimento do mercado carburante, cuja mistura de 27% na gasolina precisa ser mantida.
Com a limitação de produção da safra do Norte e Nordeste, diante de um mercado crescente de combustíveis, estamos prevendo a necessidade de transferência de volume superior a 2 milhões de m³ da região Centro-Sul.
E qual será a precificação do etanol?
Os indicadores que temos para o ciclo que iniciará em abril de 2021 são bastante favoráveis para o setor sucroenergético, vejamos: • Pelo lado agrícola, teremos redução de oferta total de cana e ATR; • Na indústria, forte mix na produção de açúcar, com elevado volume de exportação já comprometido; • Comércio exterior com arbitragem fechada para importações de etanol, especialmente ao Norte e Nordeste; • Necessidade de expressivo volume de transferência do Centro-Sul para o Norte e Nordeste do País; • Demanda de combustíveis em recuperação, especialmente após a população ter sido vacinada; • Maior demanda de automóveis novos; • Projeção do barril de petróleo acima de US$ 55, e com câmbio oscilando entre R$ 5,00 a R$ 5,30.
Na safra que se encerra, tivemos um preço médio no estado de São Paulo, medido pela Cepea/Esalq, de R$ 1,90 lt no hidratado e R$ 2,15 lt no anidro, mesmo com o cenário de retração de demanda e com preços do petróleo ruim no auge da pandemia.
Podemos concluir que o preço de etanol dessa safra será superior e bastante remunerador aos produtores e fornecedores de cana.
Alguns produtores me perguntam o que poderia frustrar essas expectativas. Nosso maior risco, por quaisquer circunstâncias, seria o barateamento da gasolina nos postos. Num exercício de imaginação, passo abaixo algumas das ações isoladas ou combinadas que podem vir a prejudicar a precificação do etanol: • O agravamento da pandemia, seja pela ineficiência da vacina ou pela nova “cepa” de contágios, provocando lockdown com nova retração de demanda do ciclo Otto; • Como consequência, queda brusca do preço do petróleo ou desacordos de produção entre os principais produtores; • Forte valorização do real, permitindo arbitragem de etanol importado; • Mudança tributária que reduza o preço da gasolina no Brasil; • Interferência do Governo nos preços da Petrobras, sem equalizar em relação ao PPI (preço paridade internacional).
Finalizando, lembramos de mais duas medidas que devem ocorrer durante o andamento da próxima safra: 1. A privatização de algumas refinarias pela Petrobras e a resolução da ANP, que permitirá a venda direta de etanol pelas usinas produtoras. 2. A privatização da refinaria deve dar maior previsibilidade aos preços dos derivados fósseis, pois consideramos que a empresa estará sempre alinhando seu preço em relação ao mercado internacional (PPI). Portanto uma medida positiva que sempre defendemos. 3. Com relação à venda direta (distribuidora vinculada), projetamos adesão pontual de algumas usinas e, desde que o regime tributário seja o mesmo das atuais distribuidoras, o impacto final no preço ao consumidor será pequeno.
Mas certamente vamos ter que esperar e conferir, mantemos, entretanto, uma visão bastante otimista para o setor. n
