A mundialização da produção do álcool - OpAA18

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Opiniões &´ ALCOOL out-dez 08

a mundialização da produção do álcool

out-dez 2008

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Índice

Fórum Internacional sobre o Futuro do Álcool, 2008 06, Roberto Rodrigues

Coordenador do Centro de Agronegócios da FGV

12, Marcos Sawaya Jank

40, José Carlos Vaz

Diretor de Agronegócios do Banco do Brasil

42, Luiz Gustavo J. Figueiredo

Presidente da Unica

Presidente da Câmara Consultiva na BM&F-Bovespa

16, José Geraldo Eugênio de França

48, Rogério Almeida Manso C. Reis

24, Luiz Carlos Corrêa Carvalho, Caio

54, Luiz Gylvan Meira Filho

28, Joel Velasco

58, Alfredo Carlos Orphão Lobo

34, Eduardo de Figueiredo Caldas

60, Charles Siqueira Labrunie

38, Nilson Zaramella Boeta

64, Jairo Menesis Balbo

Diretor Executivo da Embrapa Vice-Presidente da Abag

Representante-Chefe da Unica nos Estados Unidos

Consultor de Agronegócios da Apex Diretor Superintendente do CTC

Vice-Presidente da Brenco

Professor do IEA da USP

Diretor de Qualidade do Inmetro

Gerente de Dutos, Terminais e Oleodutos da Transpetro Diretor Industrial da Usina São Francisco

68, Júlio César Pinho

Petrobras Biocombustíveis

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Editorial Carta aberta ao Excelentíssimo Presidente Lula Excelentíssimo Senhor Presidente Lula, Inicialmente, pensamos que estávamos tão somente organizando um evento que tinha por objetivo estudar importantes questões do setor sucroalcooleiro. Por si só já seria uma grande ocorrência, pois se tratava do evento oficial de abertura da maior feira do mundo sobre álcool, a Fenasucro. Desde o ano passado, havia sido decidido que deixaríamos de realizar eventos sociais ou políticos, e que o Fórum Internacional sobre o Futuro do Álcool teria, tão somente, como pauta assuntos estratégicos, de preocupação nacional, para os quais seria necessário buscar rumo e consenso e cujas decisões poderiam mudar de forma sensível, os destinos do setor. Para cada pauta escolhida, envolveríamos os maiores especialistas do assunto no país e, quando o caso, no mundo. Este ano, definimos como pauta a “Mundialização da Produção do Álcool”, estudando 3 aspectos deste tema: a consolidação de um Mercado Futuro, a definição dos seus padrões e o fomento da produção do álcool em outros países do mundo. As duas primeiras questões ocorrerão de forma natural, pela freqüência e continuidade da colocação dos pedidos de compras de álcool. Mas, a expansão do mercado de produtores, não. Nenhuma nação do mundo irá trocar a segurança de uma multiplicidade de fornecedores, por mais instável, caro e finito que seja o petróleo, por um outro produto que seja fornecido por um único país: o Brasil. Assim, se desejamos realmente trabalhar para que o álcool venha a se tornar uma commodity, teremos, obrigatoriamente, que implantar a cultura canavieira em outros países do mundo. São candidatos naturais todos os países de clima tropical, com grandes extensões territoriais. Nesta situação, a África coloca-se como uma excelente opção. No que se refere à logística, tem uma condição excepcional: a África fica no centro do mundo. Todas as rotas de navios-tanques circundam suas costas. A costa Oeste pode servir os EUA; o Centro, através de alcooldutos, a Europa; e a costa Leste, a China e toda a Ásia. O continente tem muitos problemas de administração como, por exemplo, guerras tribais, mas em se havendo interesses governamentais internacionais dirigindo os interesses empresariais, a discórdia poderá ter fim com muita rapidez e certa facilidade. Mas, jamais conseguiremos instalar na África apenas os canaviais. Todas as ONGs e a sociedade do mundo civilizado inviabilizariam sua implantação. Para uma operação desta envergadura, seria fundamental fazê-lo sob uma condição adequada de sustentabilidade, atendendo plenamente o tripé econômico, ambiental e social. Assim, o projeto de instalação de canaviais nos países africanos deverá

ter em seu pacote um amplo sistema de produção organizada de alimentos. Assim, se fecha o circuito. Este é o grande gol. O que seria o tendão de Aquiles dos biocombustíveis, torna-se toda a sua força. Ao invés de administrar a crítica mundial de que os biocombustíveis estão roubando o espaço dos alimentos, a sua produção estará sustentando e ampliando a produção mundial de alimentos, notadamente no lugar de maior carência do planeta. O bom de toda esta história é que o Brasil tem tecnologia no estado-da-arte na área agrícola e industrial (na extensão mais ampla da palavra: condições de fabricar fábricas), e tem autoridade científica para liderar este mega projeto mundial, no setor canavieiro, alimentício e industrial. O CTC, IAC, CanaVialis, Embrapa, os parques industriais de Sertãozinho e Piracicaba, dentre outros, detêm toda a tecnologia necessária para conduzir esta operação. O sistema reservaria à indústria brasileira específica um desenvolvimento muitíssimo maior do que o visto em qualquer época, em nossa nação. Temos totais condições de liderar este processo. Ninguém, Excelentíssimo Senhor Presidente, em nenhum momento de nossa história, levantou, tão alto, tão longe e por tanto tempo, a bandeira do álcool, entre todas as nações do mundo, como o senhor. E, por tudo que sabemos, o senhor fez isso de maneira natural e voluntária, independentemente de planos negociados com o setor ou entidades. Fez o que fez, transparece-nos, por acreditar que os biocombustíveis são soluções para muitos males econômicos, ambientais e sociais, no Brasil e no mundo. Se o senhor parasse agora, já teria feito pelo setor a mais efetiva e eficaz ação em prol deste sistema. Os recursos virão de investimentos diretos e de programas específicos como crédito de carbono, por exemplo. Existem muitos países interessados na parte econômica desta história. Grandes investidores do mundo já estão tocando, de forma experimental, Usinas aqui no Brasil. No que se refere à parte ambiental, muitos países estão altamente envolvidos num efetivo tratamento desse assunto. Quanto ao aspecto social, pergunta-se: quem será contra a produção de alimentos? Ainda mais na África? Esse não é um sonho de um poeta. É apenas um sonho grande demais. Para o qual, precisa-se de um homem com as características do senhor, para levá-lo ao mundo. William Domingues de Souza, Coordenador do Fórum Internacional sobre o Futuro do Álcool Editor Chefe da Revista Opiniões


Visão Estratégica Roberto Rodrigues

Coordenador do Centro de Agronegócios da FGV

Estamos diante de uma oportunidade raríssima: liderar um projeto mundial Este momento é fundamental para a tomada de visão em direção a decisões para o agronegócio sucroalcooleiro brasileiro e global. Tenho viajado bastante pelo mundo, defendendo a necessidade da criação do mercado de etanol, com a certeza de que ele será criado, porque, de acordo com a Agência Mundial de Energia, a demanda por combustíveis líquidos crescerá 55%, nos próximos 30 anos, e, seguramente, o petróleo não terá condição de atendê-la com preços compatíveis. Há uma expectativa, realmente formidável para os biocombustíveis, dentre os quais, o etanol tem um papel relevante. Mas, o mercado ainda não existe. No período que estive no governo, antes e depois, fiz viagens freqüentes a diversos países, tentando abrir o mercado. Chegamos a constituir com o governo japonês um acordo de estudo sobre o assunto, que deu origem ao acordo da Petrobras com a Mitsui. Trabalhamos também, muito fortemente, as oportunidades que existem entre Brasil e Estados Unidos, mas mercado mesmo, nada. Depois de várias visitas ao Japão, ouvi de um ministro japonês uma frase definitiva, em relação a esse assunto. Ele falou: “não vamos nunca substituir a nossa dependência de gasolina da OPEP por álcool do Brasil. Enquanto não houver segurança de abastecimento, de álcool, mais países produzindo e a possibili-

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dade de operação em Bolsa em todo o mundo, não temos confiança em criar a dependência do etanol brasileiro.” A partir daí, passei a trabalhar, insistentemente, nessa temática. Hoje, na Fundação Getulio Vargas, acabamos de vencer uma concorrência internacional, organizada pela OEA e pelo BID, para divulgarmos o etanol nos países do Caribe. Já estamos fazendo projetos para três países e existem outros dez interessados. Hoje, estou absolutamente convencido de que o mercado só será criado, de maneira consistente, quando mais países estiverem produzindo, para que haja uma commodity referida no mundo todo, com todos os mecanismos de certificação, qualidade, padronização, etc. Outros temas fundamentais para que o mercado seja criado, como a mistura compulsória, como uma estratégia global que até hoje não existe, que tem que nascer de uma estratégia nacional, que também não existe, e tudo isso, passa pela eliminação dos mitos que cercam hoje a questão do etanol. Mais países produzindo abrirão, para o Brasil, um cenário muito maior do que a exportação de etanol. Abre a condição para se exportar usinas inteiras, com tecnologia, conhecimento, know-how, motor flex, logística, pesquisa e experimentação e tudo que aprendemos nos 30 anos de etanol no Brasil.


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Podemos vender com grande competência para todo o mundo tropical, de forma a mudar a geopolítica mundial. Esse é o tema mais importante na questão da agroenergia. Qualquer país pode produzir comida, inclusive, em estufa. Já agroenergia e biocombustível, não. Só se houver muito sol, o que acontece entre os dois trópicos, na América Latina, em toda a África e na Ásia mais pobre - que serão os produtores da commodity mais importante do século XXI: a energia, seja biocombustível, bioeletricidade, pellets de bagaço; e o que for para aquecer os países desenvolvidos, ao norte do Trópico de Câncer. Eu tenho paixão por este tema. Lembro-me que participei de uma reunião de advogados ambientalistas, em Nova York, para falar sobre o etanol. Fui informado que eles eram contra o etanol. Fui preocupado, porque falo inglês igual ao Tarzan. Preparei-me muito bem e fiz uma palestra muito técnica, mas estava preocupado e resolvi abrir o jogo. Falei que havia sido informado que eles eram advogados ambientalistas, contrários ao etanol, porque achavam que íamos derrubar a Amazônia, provocar a falta de comida, e essas coisas que dizem sempre. Então, contei uma historinha para empatar o jogo e melhorar a situação: “O Papa e o advogado estavam em um automóvel viajando pela estrada, sofreram um acidente e morreram. Os dois foram para o céu e, chegando lá, o advogado, mais esperto, passou na frente. São Pedro estava esperando e disse: ‘Doutor, bem-vindo, aquele palácio com piscina aquecida, quadra de tênis, anjinho para catar bolinha, uma cozinheira baiana que é um espetáculo, música, uma maravilha, tudo reservado para o senhor. Nós o aguardávamos. Seja bem-vindo ao céu’. O advogado foi para o palácio e o Papa veio em seguida. São Pedro então falou: ‘Papa, aquela casinha lá é para você’, e o Papa perguntou: ‘O advogado ganha um palácio daqueles, eu sou o Papa e você vai me dar uma casinha?’. São Pedro respondeu: ‘De Papa o céu está cheio, mas advogado é o primeiro que chega’”. Eles não acharam tanta graça, mas eu empatei o jogo. Fiz uma palestra para desmistificar o etanol e o que se fala sobre a Amazônia. Tive ajuda do Caio e do Marcos Jank. Esgotei o temário todo e fui aplaudido de pé. O Presidente da Associação dos Advogados foi até a mesa e disse que eu os havia convencido. Achei que ninguém teria perguntas a fazer, mas eis que uma mocinha se levantou-se e disse ter uma amiga no Brasil que lhe falara que, de madrugada, o carro a álcool não pegava. Expliquei tecnicamente que isso acontecia há 30 anos. Ela retrucou dizendo que o álcool corroia o motor. Novamente, disse que isso era coisa do passado e que alguns componentes foram trocados. Na terceira vez que ela falou da tal amiga, a platéia deu uma risadinha e senti firmeza para brincar e disse: “Antes que você continue, posso dar dois conselhos? Primeiro, mude de amiga no Brasil, pois deve fazer uns 30 anos que ela não lê o

jornal. Segundo, tenho 65 anos de idade e faz, pelo menos, 50 que todo domingo, sem falta, eu tomo um copinho de etanol, com açúcar, limão e gelo, o que chamamos de caipirinha, no Brasil. O que você vê aqui? Um modelo velho, superado, antigo para chuchu, com a lataria toda estragada, mas o motor está em ordem, bom e sem aditivo, por enquanto. Quero lhe fazer uma proposta: durante 6 meses, tome, todo domingo, um copo de gasolina, e, se não fundir o seu motor, eu encerro esse assunto”. A conversa acabou. Dentro de 4 anos, o bagaço de cana, no Brasil, produzirá eletricidade equivalente a uma Itaipu. Isso dá uma dimensão da importância desse produto no futuro em curtíssimo prazo, na matriz energética brasileira, que é um modelo para o mundo inteiro. Na matriz energética do estado de São Paulo, 17% já vem da cana-de-açúcar, o que é um dado fundamental, tendo em vista o futuro que vem vindo. Vamos dobrar a produção de etanol por hectare e usar, com as novas tecnologias, bagaço e folhas de cana para a mesma finalidade. Para acompanhar o progresso desejável para geração de pleno emprego, precisamos produzir uma Itaipu a cada 4 anos, o que é um desafio realmente portentoso e que não sei se estamos estrategicamente preparados para isso. Com relação aos Contratos de Etanol da BM&F, gostaria de ressaltar dois temas. O primeiro é a questão da garantia, da segurança que se tem, trabalhando com o mercado futuro, no processo de entrega física do produto - o que não é muito comum na BM&F, por causa da aderência entre o preço de mercado e o preço dos contratos. Outro ponto que considero fundamental é que a Petrobras está com uma linha claramente definida de qualificação e padronização para transformar esse produto em uma commodity mundialmente comercializada. Precisamos trabalhar cada vez, com mais vigor, para que a referência seja a BM&F, por isso me encanta saber que os contratos são em metros cúbicos ou litros e não em galões, que é uma medida completamente “desgalonada" para o negócio do etanol. Quanto ao trabalho de padronização e certificação desenvolvido pelo Inmetro, quero observar o cuidado com o qual estes temas têm sido conduzidos. São assuntos diferentes e importantes. Na Padronização, temos que definir, em termos globais, que o etanol não é tão complicado quanto o biodiesel que conhecemos. A certificação é mais complexa, porque tem que ser tratada em parceria com o setor privado, e é assim que o Inmetro está fazendo, atendendo ao interesse global, mas com ênfase no nosso interesse, e não ao interesse global, com ênfase no interesse do comprador. Não podemos ter uma certificação que considere, sobretudo, a questão da sustentabilidade e que impeça de plantar cana no Brasil. Acredito que estamos trilhando um bom caminho. Com relação ao aquecimento global, algumas pessoas acreditam que é uma questão

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inequívoca. E é mesmo. Basta olhar a televisão todos os dias para observarmos isso. Parece-me que também existem dois pontos relevantes sobre esse assunto. O primeiro é que o biocombustível, particularmente o etanol, representará uma parte da solução. Ninguém tem a pretensão de fazer dos biocombustíveis uma solução, uma panacéia do aquecimento global. Obviamente não, mas, sem dúvida, ser uma parte da solução já é um grande estímulo. Gostaria que todos os setores envolvidos dessem uma atenção especial ao tema do MDL. O que o álcool representa, em termos de redução de emissões, vis-à-vis as emissões a mais, por causa de transporte, dentre outros? Qual é o saldo que o álcool representa e quanto disso pode ser rebatido para cana-de-açúcar, de tal forma que o fornecedor de cana também participe desse processo? Esse é um tema que precisamos conversar juntos - os fornecedores, os usineiros e as academias, para encontrar a solução dessa equação. É preciso colocar um pouco de dinheiro nisso, fazer as contas, para trabalhar na direção do processo que pode ser um fator de liberação para cadeia produtiva, como um todo, e que está avançando muito positivamente. Quando se fala em profissionalização do setor, há de se destacar os trabalhos articulados, como o da Brenco, em que se percebe a clara estratégia de dimensão mundial que possui, colocando como direção das suas operações o tripé custo-confiabilidade-sustentabilidade, que é, de fato, o tripé da sobrevivência econômica. Estive em um congresso interessante, em São Petersburgo, e assisti à uma palestra de dois cientistas da Universidade de Gotemburgo, na Suécia, em que expunham que, na economia globalizada, as pessoas que detêm o conhecimento têm, no conhecimento que possuem, sua fonte de sobrevivência. Quanto mais eles conhecem mais que os outros, mais se tornam indispensáveis e, portanto, vivem melhor, vendem o seu conhecimento melhor. Nesse modelo de economia globalizada, as empresas correm o risco de ter estrelas que sabem tudo sobre pouco, e não contam tudo sob pena de perderem seu privilégio do conhecimento. Então, diziam eles que, em um futuro de curtíssimo prazo, um dos funcionários mais importantes do empresariado mundial será o psicólogo, que vai conseguir arrancar, de cada um, o máximo que eles sabem para que a empresa ganhe o máximo possível. Quando meu pai ficou bem velhinho, começou a falar barbaridades e a gente falava que ele estava perdendo o controle, então ele disse: “Não, meu filho, agora estou em uma idade que falo só o que eu quero, quem quiser escute, quem não quiser, não escute”. Eu ainda não cheguei lá, mas, hoje em dia, falo com transparência. Toda vez que via uma notícia no jornal sobre política econômica e que tinha um comentário positivo sobre bancos, não queria nem ler a notícia. Eu era contra por definição.

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Sempre que a Petrobras falava alguma coisa sobre álcool, eu ficava contra. Eu não gostava da Petrobras, achava que tinha atrapalhado o Proálcool, por isso tinha muita raiva. Não estamos advogando o fim do petróleo. O que vai haver é um petróleo muito caro e a questão ambiental que ele provoca, ou seja, alternativas serão muito bem-vindas. Sempre achei que no dia em que as empresas de petróleo convencerem-se de que seu império não durará muito tempo e quanto mais rápido associarem-se aos biocombustíveis, mais rápido faremos a parceria do império, coordenado no Brasil pela Petrobras. E é o que está acontecendo hoje. A Petrobras interessa-se pelo assunto, é uma parceira. E essas foram diretrizes que tracei quando estava no Governo, como Ministro da Agricultura. A Petrobras incorporou essas diretrizes em uma parceria que acho muito importante. O Plano Açúcar, há 30 anos, tinha um projeto chamado “Produção de Cana e Alimentos”, que era gigantesco, um grande projeto nacional, que produzia abobrinha e feijão no meio da cana. Tem um memorial ótimo sobre esse assunto na UFSCar, no campus de São Carlos, que eu sugiro que vocês consultem. Não sei se vale a pena premiar a ineficiência de 70% do açúcar, ao invés de 98%, e plantar outra cultura no meio. É preciso olhar isso do ponto de vista da agronomia e fazer as contas. Temos o CTC, a Embrapa e o Instituto Agronômico em Ribeirão Preto - uma Estação Experimental formidável, com gente que estuda a tecnologia de cana há décadas. Então façamos essa parceria, conversando com quem já trabalha nesse assunto. Tenho um pouco de medo de que a Petrobras queira plantar cana e biodiesel, e ficar com aquela conversa da formiguinha com o elefante. Estou começando a gostar da Petrobras, mas é um otimismo moderado. Acredito que não é papel da Petrobras plantar biodiesel, mas vamos conversar, vamos fazer negócios juntos.



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Minha preocupação recorrente é a de que, por exemplo, a Petrobras tenha uma diretriz, o Inmetro tenha outra, a Brenco e a BM&F também; mas não conversem entre si. Esse Fórum mostra, mais uma vez, a importância da definição de uma estratégia nacional de biocombustível, que nos permita liderar uma estratégia global para a criação de mercados de etanol com produção econômica. Quanto etanol o Brasil quer produzir? Ninguém sabe; existem diferentes números. Temos que estabelecer uma meta. A Petrobras tem a visão clara de quanto pretende exportar por ano. A Brenco tem a visão de 10% da produção no Brasil. Mas e os outros? Como isso está sendo trabalhado e articulado? Quanto para o mercado interno? Quanto para o mercado externo? Ouvi do Dr. Carlos Genésio da Fonseca uma proposta genial, de que a indústria automobilística passe a exportar apenas carros flex, para se criar uma demanda, ainda que escondida. São temas dessa natureza que precisamos estabelecer, definir um sistema de produção, já que cada instituição tem um modelo de produção agrícola diferente, que é a base do processo. Estamos vivendo um momento de crise no setor, mas todas as usinas são novas. Existe algum erro nesse processo que precisamos resolver. Temos que discutir claramente a questão de quem paga sobre a estocagem, a quem interessa essa estratégia, porque o produtor não pode jogar álcool fora para fazer caixa em um tempo indevido. Vejo a Petrobras estudando tecnologias na área de etanol celulósico, o que é excelente, mas eu criei na Embrapa um Centro de Agroenergia para fazer isso. Também existe na Esalq um Centro de Biocombustíveis para tratar desse assunto. A Petrobras está conversando com a Embrapa e com a Esalq? Esses centros precisam andar juntos. Presido o Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e estamos trabalhando na fase final da criação da primeira SPE, uma Sociedade de Proposta Específica para Agroenergia. Precisamos que todos os interessados estejam conosco para investir o mesmo dinheiro no

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mesmo projeto, senão ficamos em um país pobre, dividindo recursos. A área de Recursos Humanos é importantíssima, não existem agrônomos nem engenheiros químicos disponíveis para usinas de álcool, o que é um problema. Montei na FGV o primeiro mestrado stricto sensu em Agroenergia do mundo, um negócio inédito, de uma parceria entre a FGV (responsável pela gestão), a Esalq (responsável pela tecnologia) e a Embrapa (responsável pela área de ciências). Três instituições desse peso, juntas, em um mestrado que é, hoje, considerado o melhor mestrado da FGV. Acredito que precisamos colocar mais gente para formar um chapéu pensador desse processo no Brasil, que pensem em todas as variáveis e olhem adequadamente o conjunto de uma estratégia nacional. A comunicação é um outro problema. A Unica está fazendo um projeto espetacular de comunicação, informando o mercado, e que tem que se expandir para o mundo. Fui a uma palestra para investidores estrangeiros em biocombustível, em Foz do Iguaçu, convencê-los de que não iremos derrubar a Amazônia e não vai faltar comida. Aliás, essa é uma conversa que eu tenho que colocar na testa, porque todo dia tem alguém me perguntando sobre esse assunto. A questão da tributação ainda não está resolvida. Falaram-me que, pelo menos um terço dos carros flex, no Brasil, nunca colocou um litro de álcool no tanque, porque, em certos estados, o imposto é tão alto que não viabiliza a competição com a gasolina. Esses são temas que implicam em uma importante estratégia e eu tenho proposto, insistentemente, que se crie uma Secretaria Executiva de Biocombustíveis, em que Petrobras, ANP, Embrapa, Enemet, Inmetro, ANA e os 11 Ministérios cuidem de etanol no Brasil, e que conversem para que se tenha uma estratégia nacional. Sugeri no Fórum do ano passado, e torno a sugerir, que se trabalhe para a formação de uma Secretaria de Agroenergia, que seria, certamente, mais importante do que um Ministério da Pesca. Precisamos ter uma estratégia. Estamos diante de uma oportunidade raríssima do país liderar um projeto mundial que mude a matriz energética e a geopolítica mundial, trazendo riquezas para os países pobres. Isso é fantástico, não é um romance, é mudar a realidade, mas se não temos a nossa própria estratégia, como vamos liderar uma estratégia global? Tudo é relativo na vida, o importante é que o motor funcione bem. Lembro-me que quando tinha 12 anos, fiquei nervosíssimo, porque meu pai tinha feito 40 anos. Eu achei que ia ficar órfão, que meu pai estava velho demais e ia morrer. Agora tenho um filho de 40 anos, que é um moleque ainda. Precisamos pensar que ainda há muito por caminhar. Temos hoje, nas mãos, uma jóia de excelência, o biocombustível, e não podemos perder a oportunidade de montar o cavalo que vem passando aí na curva, enquanto a gente está jogando truco.



Visão Estratégica Marcos Sawaya Jank

Presidente da Unica - União da Indústria de Cana-de-Açúcar

A consolidação do etanol como commodity é o desafio para os próximos 10 anos

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Estamos em uma época de grandes transformações para o setor sucroalcooleiro. É impressionante a quantidade de visitantes que vêm conhecer e saber mais sobre o que está acontecendo nessa área, nessa transformação maravilhosa desta antiga planta chamada cana-de-açúcar, depois de mais de 500 anos no Brasil. Na Unica, já não tratamos mais do setor sucroalcooleiro, agora é o setor sucroenergético, porque falamos não só do combustível, mas também da eletricidade vinda da cana, de futuros bioplásticos e biorrefinarias. Ao invés de falarmos sobre o futuro do álcool, na verdade, é o futuro do etanol, que é realmente a forma como queremos encarar o álcool daqui para frente. Um produto ambientalmente correto, socialmente justo, competitivo e mundializado. Nosso principal objetivo é discutir a globalização, a mundialização e a consolidação do etanol como uma commodity comercializada no mundo inteiro. Gostaria de expor a visão da Unica sobre os seguintes assuntos: mercado, certificação e padrões, a questão da comunicação, da tecnologia e da sustentabilidade. Começando pelo mercado. Estamos passando de uma era de produção, para uma era de mercado. E não existe mercado sem haver, antes, produção e consumo. Isto fica claro, quando olhamos o imenso potencial americano, e gosto de falar que a indústria brasileira do etanol teve três grandes movimentos. O primeiro momento foi nos anos 70, quando o Brasil saiu à frente dos outros países e consolidou seu programa do etanol. Quando ninguém falava em energias alternativas e renováveis, a posição brasileira era de preocupação com o estabelecimento de uma menor dependência do petróleo. Naquela época, 80% do petróleo que usávamos era importado. Fizemos um programa arrojado. Em um período em que o barril de petróleo custava US$ 20, fazíamos etanol a US$ 60 o barril equivalente. Hoje, o barril de petróleo custa US$ 130 e estamos nos mesmos US$ 60, mesmo com o dólar valorizado. Na verdade, temos um movimento de imenso ganho de eficiência, graças a um programa que no início era subsidiado e, com o tempo, tornou-se comprovadamente eficiente. O segundo grande momento foi a frota flex. Hoje, 90% dos carros novos são flexíveis. A decisão da indústria automobilística brasileira de caminhar e consolidar o veículo flex, em tão poucos anos, fez com que o mercado de álcool hidratado renascesse e reaparecesse com muita força. O terceiro grande momento inaugurou-se no ano passado com a decisão americana de construir o maior programa que a humanidade já viu de substituição de combustíveis fósseis por renováveis, o RFS - Renewable Fuel Standard, saindo de uma produção de 25 bi-

lhões de litros de etanol, passando, esse ano para 34 bilhões de litros e planejando chegar a 140 bilhões de litros, em 2022. O Brasil, depois de 30 anos, está produzindo, em 2008, 26 bilhões de litros. Imagine o tamanho desse programa norte-americano. Esperamos que os americanos não vejam o etanol somente como uma solução nacional, mas como uma solução global. Resolveremos dois grandes problemas globais, o da escassez de petróleo e o do aquecimento. Esses problemas não se resolvem nacionalmente, só com milho, trigo, ou beterraba, mas a partir de uma visão global, onde serão buscadas as melhores tecnologias e matérias-primas, dando ao etanol a mesma oportunidade que foi dada ao petróleo, ao longo de 200 anos da existência de um mercado. Vemos o programa americano de maneira positiva, na medida em que eles não farão um programa de segurança energética - esse é o mote deles, sem subsídios, mas entendemos que a tarifa terá que ser eliminada em algum momento. O subsídio é importante, porque eles não vão sair da dependência do petróleo para uma dependência de um outro produto importado, portanto, querem fazer etanol de milho até 2014, depois irão fazer etanol de celulose. O etanol de milho é muito menos eficiente que o de cana. A celulose, ninguém sabe ainda o que será, a despeito da quantidade de dinheiro que está sendo colocado nesse projeto, e isso é mais do que lógico dentro da idéia da segurança energética, mas não é suficiente. Podemos complementar a oferta que eles terão que gerar com um etanol mais eficiente ambientalmente e mais barato, porque eles têm uma demanda definida, mas não têm uma oferta competitiva suficiente até aqui. Isso ajudaria a derrubar o preço da gasolina nos Estados Unidos. Essa é uma notícia extraordinária. Foi o primeiro país que deu esse grande passo e é o nosso primeiro aliado. Talvez, o único e verdadeiro aliado que o Brasil tem hoje na construção de um volume expressivo de produção e consumo de álcool. Depois dos Estados Unidos, vem a União Européia, administrando uma situação extremamente emocional. Hoje, existem mais de 50 programas de certificação de biocombustíveis em andamento no mundo, sendo feitos por governos nacionais, ONGs, Round Tables, entre outros. A Unica está participando de 10 debates, hoje, na Suécia, na Holanda, no Reino Unido, na Alemanha, em Bruxelas e no Round Table on Sustainable Biofuels in better sugarcane initiative. Já não escolhemos mais a mesa, vamos a todas e tentamos equilibrá-las. O que está se exigindo dos biocombustíveis em um ou dois anos de vida – pois apesar dos 30 anos de Brasil, este é o tempo que ele


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tem no mundo - nunca se exigiu do petróleo em 200 anos. É a necessidade da comprovação de uma sustentabilidade econômica e ambiental inacreditável, conduzida por uma discussão quase insana. Tentamos mostrar que a cana não cresceria na Floresta Amazônica, porque não temos interesse que isso ocorra, pois há espaço de sobra nos pastos e nas áreas agrícolas brasileiras para fazer o etanol. Quando se convenceram disso, passaram a dizer que a cana empurraria os outros produtos para a Floresta Amazônica, e aí temos que mostrar que não é assim, que existe um imenso espaço para a pecuária de corte brasileira ser mais eficiente, e que a cana, quando chega ao Centro-Oeste, não é um elemento de monocultura, mas sim de diversificação do uso da terra. O Centro-Oeste, até pouco tempo atrás, era basicamente pastagem e soja e, hoje, tem mais de dez produtos se desenvolvendo como milho, algodão, suínos, aves, café, leite e a cana-de-açúcar, como elemento de diversificação e de melhoria de renda do produtor. O Brasil tem um imenso potencial. Entretanto, temos que provar isso fora do país o tempo todo. Mostrar que o Brasil faz alimentos e energia e não alimentos ou energia, como é o caso do milho americano. Temos também que mostrar que outros países podem produzir. Existe um potencial imenso na América Central, na Colômbia, no Peru e na África. Não irá se construir um mercado global de biocombustíveis, se não houver programas de produção e consumo sólidos, em vários países do mundo. Hoje, o que existe de forte em produção no mundo é somente no Brasil e nos Estados Unidos. A consolidação do etanol como uma commodity global passa, em uma primeira fase, pelo esforço do desenvolvimento de programas nacionais, de produção e consumo e, em uma segunda fase, pela abertura desses mercados. Vemos que, por exemplo, se o etanol brasileiro pudesse entrar no mercado norte-americano, ajudaria a derrubar o preço da gasolina e a melhorar o balanço energético e ambiental americano. Temos que trabalhar intensamente nesse ponto. É isso que o Joel Velasco faz hoje nos Estados Unidos. Passa o dia andando pelo Congresso, pelo Executivo americano e pelos estados mais simpáticos à compra de etanol brasileiro, como Califórnia e Flórida. Recebemos o Governador da Flórida, que disse, claramente, que prefere comprar etanol brasileiro a ter que trazer etanol do Meio-Oeste. A Califórnia está desenvolvendo um padrão do chamado Low Carbon Fuel Standard, que vai ser decisivo para definir o que o estado vai fazer em termos de redução de emissões. É esse o diálogo com as pessoas que formulam políticas, com os grupos que definem a derrubada da tarifa, seja por razões ambientais ou porque o milho está caro demais. Estamos nos aproximando desses grupos, fazendo a comunicação e, também, consideramos a possibilidade de fazer um contencioso, se acharmos que isso é parte da solução. Já

fizemos um contencioso de açúcar que custou caro e levou 6 anos para trazer algum resultado, mas existe essa possibilidade, ainda que não seja a melhor opção. Nossa principal opção é o diálogo e a aliança. Entendemos que Brasil e Estados Unidos têm que cooperar, assim como o Brasil tem que cooperar com a África, com a Ásia e com a União Européia. A União Européia vai definir a sua diretiva nos próximos 3 meses, decidindo se terá ou não biocombustíveis. Estamos trabalhando a aprovação dos 10% de mistura de combustíveis renováveis em fósseis. Isso abrirá espaço para o biodiesel e para o etanol. Se a Europa definir os 10% como obrigatórios, começará um longo debate dos países europeus sobre as questões dos critérios de sustentabilidade, o uso da terra, alimentos versus energia, questões sociais no corte de cana, dentre outros. A certificação é um processo inevitável. Não somos contra a certificação, mas queremos que as mesas de discussão sejam balanceadas. Não dá para passar quatro horas em uma mesa, discutindo o que o produtor brasileiro vai fazer em Goiás com a sua terra, se é soja, cana, ou pasto, porque eles querem definir re-

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gras, inclusive, para isso. E quando falamos em discutir sobre as questões econômicas, que geram o problema dos alimentos versus energia, não podemos falar, porque é questão de soberania nacional. É um absurdo, um contra-senso. Na certificação, precisa haver um balanceamento entre o econômico, o social e o ambiental, considerando as diversas matérias-primas agrícolas. É inaceitável uma certificação européia para álcool de cana brasileiro. O que é possível é uma certificação global, para todo tipo de etanol, vindo de qualquer matéria-prima e comparando, principalmente, biocombustíveis com fósseis. O mercado tem que crescer aliado a programas públicos, como é o programa norte-americano de mistura e de volumes obrigatórios. É assim que eles chegarão a 140 bilhões de litros. Para chegarmos a esse nível, temos que passar por um esforço de comunicação e tecnologia. Estamos, agora, trabalhando na Unica, a questão do Memorando Brasil–EUA. Ano passado, os presidentes Lula e Bush encontraram-se duas vezes, em um mês, para falar de um programa conjunto de biocombustíveis. Esse programa tem três áreas: a da cooperação em terceiros mercados - que está avançando com os estudos feitos pela Apex e pela FGV; a do padrão físico-químico do álcool; e a da pesquisa. É fundamental aproximar esse imenso esforço de pesquisa de álcool de 2ª geração, que está acontecendo nos EUA a melhor matéria-prima que se conhece: a cana-de-açúcar. Estamos pleiteando as possibilidades desses recursos, que existem nos EUA, serem aplicados em pesquisa no Brasil, diretamente sobre a cana e que os produtos resultantes desse esforço tenham maior acesso e possibilidade de venda nesses dois países, que tenham certificação automática e que consigamos construir a 2ª geração, de maneira eficiente. O Brasil já tem, no caldo da cana, uma 2ª geração de etanol, em termos de eficiência ambiental e energética. O mundo não quer fazer etanol de matéria-prima agrícola clássica, e a melhor coisa a fazer é juntar esforços para fazer etanol de 2ª geração. Mas, não só isso. Temos muita coisa acontecendo na área de gaseificação, na produção de hidrocarbonetos a partir de sacarose de cana e todos esses novos usos de etanol que estão por vir através dessa imensa quantidade de pesquisas. É fascinante a revolução tecnológica que vai acontecer nos próximos 10 anos. O Brasil tem escala, matéria-prima e condições agronômicas ideais

para o desenvolvimento do etanol de 2ª geração, o que é fundamental, mas que não pode ocorrer sozinho. Tem que caminhar junto com o processo de abertura de mercado e de consolidação do etanol como commodity. Atualmente, fazem parte da Unica 117 usinas, sendo que cerca de 100 delas contribuíram para o Relatório de Sustentabilidade de 2008. Em 2007, as associadas da Unica estiveram à frente de mais de 600 projetos socioambientais, com investimentos de R$ 160 milhões e que beneficiaram 400 mil pessoas na área da saúde, meio ambiente, educação, cultura, esporte, qualidade de vida e capacitação. Foram treinadas 32 mil pessoas no ano passado, em 150 projetos; 83 mil pessoas atendidas na área da saúde, e 200 mil na área de cultura. Existe um imenso plantio de árvores pelo setor e o ganho ambiental do flex. Esses 6 anos de carros flex equivalem, em termos de redução ambiental, ao plantio de mais de 100 milhões de árvores, o que equivale a 35 milhões de toneladas de carbono evitado. Existe um imenso ganho na qualidade do ar, na redução de emissões e nos programas de retreinamento. Algo fundamental nesse processo é lidar com a mecanização, porque, se por um lado, reduz as emissões e permite-nos aproveitar toda a biomassa para fazer bioeletricidade, etanol e etc, por outro, gera desemprego. Uma das preocupações centrais tem que ser a requalificação de parte desses trabalhadores para operar as máquinas. Teremos, nesse relatório, todos os esforços que o setor desenvolve nas áreas de responsabilidade socioambiental, do meio ambiente, trabalhista, de regulação, dentre outras. Lançamos uma cartilha que traz, de forma didática, como e o porquê do etanol combustível melhorar a vida das pessoas e do planeta, em termos de saúde, emprego e energia. Pleiteamos, junto a ANP, a troca do nome álcool comum, por etanol, em todas as bombas de combustível do país, porque o mundo inteiro fala etanol, e este é o nome químico do álcool etílico. Também não queremos confundir o álcool do motorista com o álcool do carro. A Lei Seca diz que álcool e volante não combinam, mas isto vale apenas para o motorista. No automóvel esperamos que se utilize 100% de etanol. Para concluir, a consolidação do etanol como commodity global é o grande desafio dos próximos 10 anos. Tivemos uma fase de açúcar, que durou 500 anos. Estamos em uma fase da criação do mercado interno de etanol, nos últimos 30 anos, temos há 5 anos a frota flex, que relançou o nosso consumo, e temos também a bioeletricidade, embora acontecendo mais lentamente do que gostaríamos. Acredito que, 2010 a 2020, será a década do surgimento do mercado mundial de etanol como parte da alternativa para escassez de petróleo e para o aquecimento global. Pensando em nosso hino nacional, sugiro que: “lutemos juntos para que, o gigante pela própria natureza não fique deitado eternamente em berço esplêndido, mas vá conquistar,


com braço forte, o futuro agroenergético que espelha essa grandeza”.


Produção Agrícola José Geraldo Eugênio de França Diretor Executivo da Embrapa

Acreditamos que a produção de bioenergia na África será viabilizada

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Alan Graham MacDiarmid, Prêmio Nobel de Química em 2002, em uma palestra que apresentou no Brasil, ressaltou que, dentre os grandes problemas que a humanidade enfrentará, nos próximos anos, está, em um primeiro bloco, a água, a energia, a pobreza, o alimento e o meio ambiente, temas que podem ser associados, de forma direta ou indireta, a soluções e recursos da agricultura; e em um outro bloco, igualmente importante, as questões de doenças, da educação, do gigantismo da população mundial e da administração efetiva da democracia e dos conflitos armados. Se hoje, com uma população mundial ao redor de 6,5 bilhões, estes problemas já são de difícil administração, imaginemos então o cenário que teremos em 2050, quando seremos 10 bilhões de habitantes.

Se olharmos para o mapa do mundo, procurando detectar as grandes extensões de terra, na faixa propícia para o desenvolvimento da agricultura de base canavieira, o continente africano, sem dúvida, destaca-se. Temos na Embrapa, como agenda permanente e contínua, ênfase para as questões da água - inclusive a utilizada na produção agrícola, a produção de alimentos, o meio ambiente e, como pauta recente, a energia. Os principais questionamentos dirigidos à agricultura atual classificam, como força avassaladora da destruição ambiental, a produção do etanol, do biodiesel e as grandes culturas de alimentos. Óbvio que a geração do interesse de um negócio é o lucro, mas há espaço para que ele seja realizado sem abdicar da sustentabilidade ambiental e da redução dos desequilíbrios sociais. Acreditamos que isso seja possível e esteja sendo assim realizado. Temos que pensar em competitivi-dade, afinal, o Brasil é um país que pretende ser rico. Temos também que buscar volume e escala de produção, envolvendo, nessa operação, milhões de brasileiros, a partir de nossa excelente capacidade de produzir e, às vezes, isso pode esbarrar nas demais questões da sustentabilidade.

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Mas, certamente, há condições de administrar todas essas vertentes de maneira racional. Saúde e qualidade de vida estarão, sempre, nitidamente ligadas à questão da produção agrícola. No que se refere, especificamente, à cana-de-açúcar, o Brasil já dispõe de excelentes instituições trabalhando nesse assunto, como a Ridesa - Rede Interuniversitária de Desenvolvimento do Setor Sucroalcooleiro, e sua rede de 10 universidades federais, o Centro de Tecnologia Canavieira - CTC, e o Instituto Agronômico - IAC; e a esses se junta o esforço da Embrapa. Mas, devemos considerar que, ainda assim, somos poucos para os 8,5 milhões de quilômetros quadrados de nosso país. Hoje, a Embrapa tem cerca de 8.600 servidores, nada mais que um servidor para cada 100.000 km². Ou seja, somos muito pequenos para o tamanho de nossa agricultura. Os desafios para a expansão da cana-de-açúcar são muito grandes e trabalha-se com complexas questões sobre cultivares, ordenamento territorial, condições edafoclimáticas, zoneamento agroecológico, atração de novas empresas, definição de políticas públicas, processos industriais e sistemas de produção. É uma equação complexa que não se resolve com 100 pesquisadores. Provavelmente, precisamos alocar 1.000 pesquisadores, somente no setor sucroalcooleiro, e mais outro tanto trabalhando na pesquisa com oleaginosas, se quisermos realmente ter, daqui a 15 ou 20 anos, um biodiesel tão competitivo quanto é o etanol. A Embrapa é formada por uma rede nacional com 38 centros de pesquisa, 17 escritórios de transferência de tecnologia e unidades na América Latina, nos Estados Unidos, na Europa e na África. Estamos instalando novas unidades no Mato Grosso, Tocantins e Maranhão.


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O eixo formado pelos estados do Maranhão, Piauí, Tocantins, Goiás, Oeste da Bahia e Mato Grosso será, em 20 anos, o grande pólo da produção agrícola, pecuária e da agroenergia do país. E para termos as áreas de cerrado dessa região competitivas, precisamos de densidade científica. Temos que ter gente qualificada e instituições de pesquisa atuantes, senão, vamos falhar. Fundamos, recentemente, a Embrapa Agro-energia, um centro dedicado aos assuntos específicos de energia, para concentrar os esforços de pesquisa, desenvolvimento e inovação, PD&I, assim como transferência de tecnologia. Lá, concentramos os programas de etanol, biodiesel, biogás e florestas energéticas. Seus quatro laboratórios temáticos de PD&I dedicam-se a estudos nas áreas de: 1. biologia energética; 2. processamento de matérias-primas energéticas; 3. aproveitamento de co-produtos e resíduos, e 4. gestão do conhecimento em agroenergia, focando no desenvolvimento de tecnologia agronômica (com ênfase nos sistemas de produção sustentáveis), na tecnologia industrial (com foco nos programas de eficiência de conversão) e em estudos sociológicos, econômicos, de mercado, gestão e políticas públicas. Os grandes focos da Embrapa Agroenergia são as rotas tecnológicas, as cultivares modificadas – pois não podemos abdicar de trabalhar a modificação genética no caso da cana-de-açúcar, as competências técnico-científicas, o fortalecimento das redes de competência de PD&I, a redução de custos de produção e a duplicação da produção de etanol. Hoje, somos importantes e competitivos no etanol de primeira geração. Mas, alicerçados nos programas de melhoramento genético tradicional e nos novos sistemas de produção agrícola e industrial, temos condições de crescer, ainda nesta fase, algo entre 20% e 30% da produção atual. Trabalhamos intensamente no desenvolvimento do etanol de segunda geração, através de melhoramento e de biologia avançada, e acreditamos que, com esta nova tecnologia possamos, talvez, duplicar a produção total de etanol. No que se refere à expansão da área agroindustrial, a Embrapa tem trabalhado no zoneamento agroclimático, no desenvolvimento de cultivares, nos sistemas de produção e no balanço de energia. Com relação ao zoneamento agroclimático, o Brasil está investindo R$ 78 bilhões no Pronaf e em outros segmentos, organizado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, como um braço da Embrapa. No desenvolvimento de cultivares, a Embrapa tem um forte trabalho associado a Ridesa, ao CTC e a outros centros. Quanto ao balanço de energia, temos duas situações que gostaria de destacar. Um forte trabalho sobre a economia da água na irriga-

ção da produção agrícola e sobre a fixação biológica do nitrogênio - FBN. O Brasil é líder nesse campo, com um excepcional sistema de produção, que envolve 22 milhões de hectares de soja sem a utilização do nitrogênio mineral. Queremos expandir o sistema também para as gramíneas, e reduzir em 20% o nitrogênio aplicado na cana, no arroz, no milho e no sorgo. Parcerias estratégicas: Devemos tratar com destaque a organização do nosso Banco Ativo de Germoplasma de cana-de-açúcar BAG - Cana-de-açúcar. O germoplasma é de todos e não é de ninguém. Temos, hoje, uma riqueza de conhecimento muito grande aplicada nessa área, que precisa ter ordenamento, associando informações e esforços dos vários bancos, para um bem comum. As parcerias estratégicas devem, também, investir nos arranjos e sistemas produtivos sustentáveis para eficiência agrícola e industrial, no melhoramento genético e desenvolvimento de Organismos Geneticamente Modificados - OGMs, na Fixação Biológica do Nitrogênio, na eficiência de inoculação, nas rotas tecnológicas e gargalos/inovação para processos de produção de etanol celulósico (EtOH-LC) e na biologia energética. Zoneamento Agroecológico: As questões ambientais envolvem, costumeiramente, grandes embates internacionais, notadamente sobre alguns biomas, como a Amazônia e o Pantanal. O Brasil precisa ter uma posição mais dura em relação ao zoneamento agroecológico - que tem ou precisa ter, e não pode se deixar intimidar sobre o que podem pensar de nós. Tenho uma posição bastante clara em relação à questão do álcool americano. Muita gente critica os Estados Unidos pelo fato de produzirem álcool a partir do

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milho. Mas, o milho é deles e cabe a eles decidirem o que devem ou não fazer com o seu produto. Se quiserem fazer pipoca, farinha ou etanol, isso diz respeito apenas aos Estados Unidos. Quem deve administrar seus potenciais, seus problemas e seus assuntos internos são eles. Seguindo o mesmo princípio, cabe apenas a nós decidirmos o que fazer com a nossa mandioca, com a nossa cana, com a nossa soja e com as nossas terras; e não o que alguém imagina que devamos fazer. Fundamentalmente, administrando suas questões internas de solo, planta e clima é que o Brasil conseguiu sair da produção de 78 milhões de toneladas de grãos, em 1997/98, para colher, atualmente, 143 milhões de toneladas. A Embrapa contribuiu com isso - principalmente no Cerrado, e hoje se candidata a continuar esse processo em parceria com instituições de pesquisa, ensino e extensão, agora, dentro do sistema cana. A internacionalização do conhecimento e da pesquisa: Há 10 anos, a Embrapa instalou o primeiro Laboratório Virtual da Embrapa no Exterior - Labex, nos Estados Unidos, visando estabelecer oportunidades de cooperação internacional em pesquisas agropecuá-rias, acompanhando os avanços, tendências e atividades científicas de interesse do agronegócio. Abrimos também um escritório na França, para tratar do relacionamento com a Europa. Hoje, já ampliamos nossas bases para a Holanda e para o Reino Unido. Em 2006, instalamo-nos na África, visando diretamente a transferência de tecnologia. Com relação à América Latina, recentemente instalamos uma equipe na Venezuela. Aprendemos e realmente construímos bases. Pensamos que ago-

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ra está na hora de compartilhar, de dividir e de fortalecer parcerias. É assim que estamos entrando nesta questão do álcool. No caso do etanol combustível, a produção, de fato, está nos Estados Unidos, com o milho, e no Brasil, com a cana-de-açúcar. Nós temos produção na Índia, na China, e em vários lugares do mundo, mas a grande produção de álcool como combustível ocorre apenas nos dois primeiros países. A pretensão do Brasil é ampliar, significativamente, a produção de álcool, disponibilizando ao mundo um volume que lhe ofereça plena segurança. Para fazer isso de uma forma racional, chegou a hora de envolver novos países. Se olharmos para o mapa do mundo, procurando detectar as grandes extensões de terra, na faixa propícia para o desenvolvimento da agricultura de base canavieira, o continente africano, sem dúvida, destaca-se. São 52 países que dispõem de um imenso ambiente tropical, em grande parte do continente, propício para a produção de etanol. A Embrapa vai participar diretamente desse projeto. Certamente vão criticar essa posição. Os países, principalmente na África, estão precisando plantar alimentos. Como alguém pode desejar produzir biocombustível em suas terras? Vejo aí um grande equívoco das políticas de ajuda e distribuição de alimentos para a África, quando deveriam tê-la ajudado a estabelecer e consolidar o desenvolvimento, ao invés de mandar milho, arroz e trigo para lá. O alimento, se come e se acaba. O desenvolvimento perpetua-se e multiplica-se. Este é o mapa de visão futura sobre a contribuição do Brasil, não apenas para a produção de etanol, mas também de alimentos.



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A África já produz cana-de-açúcar. Em 1997, plantava, em todo continente, pouco mais de 1,2 milhão de hectares. Em 2007, várias regiões, principalmente na África Oriental, apresentaram significativo crescimento, passando para 1,6 milhão de hectares. Esses números são ainda pequenos para o potencial do continente, mas significam uma aptidão e, certamente, uma tendência. Podemos e temos condições de ajudá-la a produzir muito mais cana-de-açúcar, a instalar usinas, a viabilizar a estrutura de negócios associados ao complexo, envolvendo diversos países do continente africano. Será que existem condições propícias à produção de cana-de-açúcar e etanol na África? Há, porque lá existem regiões caracterizadas como por seu potencial para desenvolvimento de uma agricultura sustentável, de altíssima produtividade, identificadas no mapa em verde-escuro; as de alta potencialidade, identificadas com verde-claro e, as de médio potencial, com amarelo. Temos ali milhões e milhões de hectares para produzir alimento e biocombustíveis. No caso da região leste da África, há condições de fazer uma agricultura sustentável desde o Egito, passando pelo Sudão, Quênia, Tanzânia, Uganda e Malawi, chegando à África do Sul. Temos áreas com excelentes condições de tornarem-se produtoras de cana-de-açúcar: do Rio Nilo ao Rio Zambeze, ao Rio Orange, ao Rio Congo, ao Rio Níger e as áreas centrais da África. É dessa África que, facilmente, pode sair etanol para a Europa, para os Estados Unidos e para toda a Ásia. A África está no centro do mundo. Por todas essas razões, a produção expressiva do álcool combustível não pode ficar centrada em apenas dois países - Estados Unidos e Brasil. O etanol é irreversível na matriz energética do Brasil e dos Estados Unidos, independente de quem seja escolhido como seu próximo

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Presidente - agora ou daqui a quatro, oito ou doze anos, porque eles não irão acabar com uma infra-estrutura com a dimensão da que foi montada. Os agricultores americanos jamais deixarão que os Estados Unidos parem a produção de álcool. O uso, como combustível automobilístico, tampouco pode ficar concentrado apenas nesses dois países. Temos que tentar incentivar muito mais países a se envolver com o consumo e a produção de álcool. A conquista de novos países é fundamental para a consolidação desse negócio. No caso da África, vários países podem ser produtores, e envolver-se em uma operação como esta. É bom lembrar que, dos 52 países africanos, nem todos têm o petróleo da Angola, da Nigéria, ou do Sudão. Existem países que compram quase todos os grãos que consomem. A produção de etanol pode atender às demandas econômicas, ambientais e sociais desses países, conta com um mercado em expansão e pode ser a base de exportação para a Europa e a Ásia, preferencialmente. Não podemos dizer aos nossos amigos africanos que estamos tratando disso porque somos “muito bonzinhos”. Nós somos amigos, sim; o Brasil é um país fraterno. Mas, pensamos que nossa economia possa se associar a dos países africanos, no fornecimento de tecnologia e bens de capital, e façamos um bom e grande negócio para ambos os lados. A economia brasileira deve abrir os olhos para ser sócia deste empreendimento global, antes que seja tarde. O papel da Embrapa é disseminar tecnologias tropicais de produção de alimentos, fibras, oleaginosas e da cana-de-açúcar. Porque nós acreditamos, fundamentalmente, que a produção de bioenergia na África vai se viabilizar. Mais do que isto: a produção da energia viabilizará o desenvolvimento e a produção, em larga escala, dos tão necessários alimentos.



Mercado Mundial Luiz Carlos Corrêa Carvalho, Caio

Vice-Presidente da Abag - Associação Brasileira de Agribusiness

Existem muitas oportunidades, mas devemos nos preparar para aproveitá-las Quero apresentar neste trabalho o etanol, sob o foco do mercado e, com o alicerce de seu passado, avaliar a estrutura de sua produção, o curso que sinaliza o mercado, considerando o crescimento e o seu tempo, as dificuldades, as potencialidades e as oportunidades, para assim montar a perspectiva do cenário a que estará sujeito num futuro a médio e longo prazos. Vivemos a realidade de preço de petróleo muito elevado. Mesmo que por algum fator econômico ou conjuntural ele venha a cair no curto e médio prazos, a tendência efetiva é que, ao longo dos anos, os preços consolidem-se em novos patamares, cada vez mais elevados. As reservas de petróleo vêm caindo cerca de 8% ao ano, o que é um dado relevante, trazendo uma pressão muito forte, com relação à oferta e à demanda, principalmente, pelo consumo dos países em desenvolvimento e todas as inseguranças dominantes nos países produtores de petróleo ao redor do mundo.

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Podemos caracterizar o desafio energético global em 3 principais pontos: Primeiro, a questão da demanda crescente, em função, principalmente, do crescimento econômico dos países emergentes, além do crescimento populacional e da renda per capita. Segundo, a segurança da oferta. Cada vez mais, as estatais de petróleo estão dominando todas as reservas. Portanto, o petróleo barato já não existe. Um percentual muito alto de fontes não convencionais serão necessárias para atender à demanda. Terceiro, a questão ambiental, já que, por um período de tempo, os hidrocarbonetos continuarão mantendo o domínio sobre a matriz energética, gerando os impactos das emissões de carbono dela resultantes. O desafio é mudar essa situação. Temos como premissa a necessidade de ser sustentável. Já não se admite que não sejamos sustentáveis na produção e no uso. Quando analisamos, em escala global, qual é a realidade das posições políticas do uso de energias, verificamos que a utilização das energias limpas e renováveis representa apenas 15% da matriz energética, ou seja, nós estamos 85% fora do chamado politicamente correto. Além do pequeno percentual, destaca-se, ainda, que cerca de 70% da oferta das energias limpas e renováveis está concentrada nos Estados Unidos e no Brasil. Uma série de políticas públicas fundamentais, ainda está por ser implantada na maioria dos países do mundo e, mesmo no Brasil, há espaço para políticas ainda mais eficientes. Quando se analisa o mercado dos EUA e as novidades que tivemos a partir de dezembro de 2007, quando foi definida a lei americana que estabeleceu qual será a demanda e as políticas para estimular a utilização do etanol, verificamos que há uma limitação de volume estabelecida ao etanol convencional de 15 bilhões de galões, ou seja, cerca de 60 bilhões de litros. Temos um potencial de consumo previsto para uma tecnologia ainda em desenvolvimento para o chamado etanol de segunda geração, o etanol celulósico, para o qual se prevê, a partir de 2020, um crescimento realmente acelerado. A visão prospectiva, até 2030, de como a questão dos combustíveis renováveis evoluirá nos Estados Unidos - o grande mercado consumidor, segundo a Agência Internacional de Energia dos EUA, já em 2010, é que deverão ser importados 4 bilhões de litros de etanol, crescendo para 15 bilhões em 2020, mesmo contando com uma boa produção interna a partir da celulose. Isso implicará em modificações das condutas públicas atualmente em vigor. Devemos estar preparados para esta mudança. No que se refere à mudança do setor de transportes, ou mais precisamente em relação


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à evolução dos automóveis até 2015, deverão ser disponibilizados os veículos híbridos, os chamados turbo diesel com injeção direta de diesel e o carro flexível, com uma proporção muito forte de vendas. Isto projeta uma imensa expansão de consumo do etanol, apenas tomando por base a frota americana. Matthew Simmons, um respeitado banqueiro ligado à área da energia, autor de um livro que sugere que o ciclo de vida do petróleo na Arábia Saudita é muito menor do que se pensava, afirmou que: considerando a frota mundial de 900 milhões de veículos consumindo petróleo, que as novas tecnologias levarão certo tempo para chegar ao mercado, e que o etanol ainda é uma parte pequena da solução para o problema energético global, o barril de petróleo chegará em breve, na espetacular, porém apavoradora faixa dos US$ 600 por barril. O mix de energia, efetivamente, vai mudar e devemos conviver durante um longo tempo de transição, com uma cesta de produtos. Existe uma posição defendida pela British Petroleum, no The Economist, em Agosto de 2008, de que: “A sede global por energia cresce dia-a-dia. Em 2030, 60% da energia primária total será atendida por petróleo e gás natural. Com o crescimento da demanda mundial de energia a um nível acima de 50%, petróleo e gás natural não conseguirão atender à demanda. Portanto, forçosamente, ocorrerá uma inter-relação entre petróleo, gás, carvão, nuclear com solar, eólica e biocombustíveis.” A convivência entre todas essas fontes será tão viável e rápida quanto mais se consiga reduzir os custos de produção dos biocombustíveis nas diferentes regiões do mundo, superado os desafios de qualidade, de disponibilidade e de caracterização da sua sustentabilidade, do estabelecimento de um suporte regulatório condizente e de uma tecnologia que permita, efetivamente, não só reduzir custos, mas expandir a demanda. Também com relação à demanda, sua aplicação não deve apenas se restringir ao uso no setor de transportes, mas também para a aplicação no setor térmico, como acontece com várias regulações que estão sendo feitas no Japão e na Europa, que estipulam um percentual de energia renovável nas térmicas. Regiões, desenvolvimento e estratégias: Esta é a lógica de desenvolvimento que temos no mundo. Quando se compara Europa e Estados Unidos, vemos que, basicamente, o forte de ambas as regiões é a existência de muito capital, porém, recursos naturais e trabalho distribuem-se de uma forma um pouco diferente entre eles. Ao olharmos para a Ásia, pelo contrário, temos muito trabalho, um aumento de capital e alguma coisa de recursos naturais. No Brasil, como na Rússia, temos um outro cenário, que justifica essa visão de BRICs, em que os investidores estão procurando, cada vez mais, onde existem muitos recursos naturais. No caso de biocombustíveis, obviamente, isso é muito importante. Em uma evolução na qual

a população urbana, daqui a um ou dois anos, ultrapassará a população rural e os países menos desenvolvidos buscam índices de uso de energia dos países desenvolvidos, começamos a imaginar as mudanças que veremos daqui para frente e o peso dos países emergentes. Vivemos hoje duas situações interessantes. Por um lado, o dilema da agricultura, que vem perdendo renda real de 2% ao ano, nos últimos 50 anos. Quando vemos uma recuperação de preço e todo esse estardalhaço, na realidade é uma forma de suavizar o tremendo peso da pobreza existente no meio rural. Por outro lado, o novo paradigma ditado, no caso da China, é caracterizado por um crescimento da demanda por alimentos e por energia. No caso específico dos Estados Unidos, registramos uma escalada de preços nos postos de gasolina, com uma disparidade bastante clara na variação dos preços da energia, metais e alimentos. Temos no mundo importantes diferenças do efeito das políticas públicas. Prevê-se, para 2010, o seguinte quadro: a Europa, como um todo, com honrosas exceções, usará em torno de 5,75% de combustíveis renováveis; a Austrália, não prevê quase nada; o Japão está começando a demonstrar algum interesse, mas, de fato, é muito discurso e preocupação até com a questão das térmicas e como utilizar etanol misturado com outros combustíveis em térmicas; o México, a grande novidade, com uma lei já aprovada e sua regulamentação que ficará pronta até dezembro deste ano, terá 10% de etanol misturado à gasolina, dentre outros. Um relatório bem atualizado da OCDE, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, de julho deste ano, tem como preocupação a forma como este foco es-

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tava sendo feito. O foco da análise dos gases de efeito estufa, da importância para o etanol da cana-de-açúcar hoje, comparado à potencialidade do lignocelulósico, no qual também a gente se encaixará, com a cana-de-açúcar. Tudo isso traz uma vantagem excepcional para o etanol e para o mundo tropical, que tem a chance de ter cana-de-açúcar. Os Estados Unidos estão com uma produção de etanol acima do Brasil. Mas, quando examinamos como é, efetivamente, o uso do etanol ou dos biocombustíveis no sistema rodoviário, vemos que o Brasil ultrapassa os 20% sobre o total de combustíveis. Os Estados Unidos estão próximos de 3%, a União Européia não chega a 2% e o mundo, como um todo, é menor que 2%. Portanto, o Brasil, de fato, está muito à frente no desenvolvimento, do ponto de vista prático, de uso de biocombustíveis, em substituição aos combustíveis fósseis. Sabemos que os biocombustíveis são muito dependentes de políticas públicas e de suporte. A OCDE, em seu relatório, caracteriza que é fundamental ter concessões de impostos para viabilizá-los ou, então, subsídios, suporte para infra-estrutura, uso mandatório em misturas e também problemas de restrição de comércio, que é o grande entrave que vivemos hoje, para poder expandir rapidamente o uso. Mas, essas questões que estão colocadas como de políticas públicas têm um aspecto interessante, pois não há uma política que sirva para todo mundo, com um tamanho padrão para todos. Cada país tem, de fato, a sua peculiaridade. Para os biocombustíveis, o essencial, do ponto de vista técnico, é maximizar a redução dos combustíveis fósseis e, também

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reduzir, ao máximo, as emissões de gases de efeito estufa; olhar e avaliar o impacto do uso das terras; examinar a questão dos impostos de importação, porque hoje eles estão distorcendo todos os esforços feitos; abrir mercados que atendam aos pressupostos ambientais e de dependência dos fósseis. Thomas Friedman, um conhecido jornalista que escreveu um livro chamado “O mundo é plano”, diz que “minimizar a alienação e comemorar a interdependência, em vez da auto-suficiência, e a inclusão, em vez da exclusão”. Porque o que mais se vê, é uma luta insana de se querer, constantemente, estar sendo auto-suficiente nesse mundo globalizado. A grande questão que tínhamos era o Petróleo versus a Biomassa. Ou seja, se a biomassa era competitiva com o petróleo. A discussão está no nível de hidrocarboneto versus carboidrato, tirando a proteína de lado, que é para alimentação. Fizemos uma análise dos custos e concluímos, com dados técnicos, que os custos de produção sobem constantemente. Hoje, o hidrocarboneto tem um custo de produção que gira em torno de US$ 180 a tonelada, enquanto que a biomassa gira em torno de US$ 150. Estou me referindo ao custo e não ao preço. Portanto, essa barreira está quebrada. É claro que, para os países menos competitivos em biomassa, ela ainda não está. Vivemos no Brasil um mar de oportunidades que banha, tanto o lado dos hidrocarbonetos, como os carboidratos. Nesse caso, vemos todos os investimentos para cada uma das longas cadeias produtivas, como enormes e espetaculares fronteiras. O mundo é absolutamente diferente. Temos trânsitos dos mais complexos e formas de transporte das mais complicadas. Mas, de fato, estamos vivendo um novo ciclo muito importante do ponto de vista dos combustíveis. Do ponto de vista do Brasil, até 2020 teremos um potencial de oferta de álcool para o mercado externo que, embora importante, é muito menor do que a oferta para o mercado interno – este sim, é o grande mercado que temos. Por outro lado, uma visão da bioeletricidade que, literalmente, quintuplicará a sua presença na matriz energética brasileira, chegando a 15% do total que temos. Portanto, para encerrar, colocamos a questão da visão das alternâncias de ciclos que estamos vivendo. Passamos agora a viver um novo ciclo positivo, o crescimento vem acontecendo de uma forma extraordinária, do ponto de vista da oferta. O etanol, para virar uma commodity efetiva, precisa ter detalhamentos importantes e acordos na área de certificação. Para isso, Governo e setor privado têm que trabalhar a quatro mãos e têm que quebrar alguns dos paradigmas da agricultura, pouco a pouco. Toda essa campanha que está sendo desenvolvida pela Unica, não só no Brasil, mas também fora do país, é fundamental, além da visão da tecnologia para viabilizar a escala que precisamos.


A Va l e o f e r e c e m i n é r i o p a r a s u a v i d a .

E usa tecnologia ambiental para ajudar a conservar 9 7 % d a F l o re s t a N a c i o n a l d e C a r a j á s . A mineração moderna praticada pela Vale usa tecnologia de ponta em seus processos produtivos e na sua gestão ambiental. • A Vale recupera os 3% da área que utiliza em Carajás para mineração e infra-estrutura. • E possui o maior viveiro de mudas de espécies nativas tropicais da América Latina. • Na Reserva Natural Vale, em Linhares - ES, são protegidas seis espécies de felinos da Mata Atlântica, inclusive a onça-pintada. A Vale acredita que pode fazer mais. É um enorme desafio mas, sim, é possível.

www.vale.com


Mercado Americano Joel Velasco

Representante-Chefe da Unica nos Estados Unidos Queremos abrir e ser líder do mercado americano

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Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a toda equipe da Unica, inclusive ao Conselho, por ter me trazido a esse setor. Há um ano, o Marcos Jank estava me convencendo a largar um emprego em Washington, para lá permanecer, mas para defender o setor canavieiro. O meu primeiro dia de trabalho foi fazer um depoimento perante uma Comissão do Congresso Americano. Passei o final de semana lendo tudo que achei no Google e ligando para todos que conhecia no Brasil para me contar um pouquinho sobre o setor, a fim de tentar parecer inteligente. Não sei quanto aprendi no último ano, mas, certamente, acho que tenho mais conhecimento, e estou muito feliz com esse setor. Temos muito a fazer.

Precisamos ser líderes. Líderar não quer dizer dominar. Significa ser o símbolo e levar o mercado sucroalcooleiro à frente. O Brasil tem a oportunidade e as condições necessárias para ser o líder no mundo e nos Estados Unidos. Vou expor três questões. Em primeiro lugar, avaliarei o mercado americano, a questão da oferta-demanda e a dinâmica da tarifa americana atualmente. Em segundo, analisarei as eleições nos EUA, seu o impacto em nosso mercado. E, por último, a estratégia da Unica, do ponto de vista de Washington, na questão de engajamento e de articulação das nossas posições e do que consideramos interessante para o setor. Mercado de etanol nos Estados Unidos: A demanda oficial dos Estados Unidos, no inglês Renewable Fuel Standard - RFS, é a obrigação que o mercado americano de gasolina tem em consumir biocombustível, grande parte em etanol. Os EUA têm, em 2008, uma demanda obrigatória por volta de 34 bilhões de litros de combustível E-10 (gasolina com mistura de 10% de etanol). Mas, na realidade, como os Estados Unidos consomem hoje 145 bilhões de galões, assim 14,5 bilhões de galões ou 55 bilhões de litros, é a demanda natural de etanol que existe hoje. Isso é importante porque, mesmo que exista a demanda oficial, o mandado oficial do Governo Federal de consumir, no curto prazo. Assim a demanda natural do mercado será maior do que a demanda obrigatória dos Estados Unidos. Isso porque a gasolina, hoje,

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custa bem mais caro do que o etanol de cana e de milho. Temos, hoje, uma situação em que a demanda americana de etanol é bem maior do que a oferta existente no mercado, pelo menos, no curto prazo. No gráfico Mercado da Mistura E-10 nos EUA, podemos avaliar o percentual das vendas do ano passado e o percentual atual das vendas do E-10. A Flórida, por exemplo, que no ano passado consumia 2% da mistura gasolina-etanol, de um ano para o outro, por causa do aumento do preço da gasolina, passou para 55% da gasolina misturada com, pelo menos, 10% de etanol. Esse é o reconhecimento do mercado de que o etanol é mais barato do que a gasolina e de que existe um incentivo econômico nesta ação. O gráfico Demanda e Oferta de Etanol no Mercado Americano é o que eu considero mais importante, do ponto de vista dos interesses do Brasil. Essa é a forma como entendo o mercado americano. As colunas são o mandado federal, a linha em laranja é o máximo possível de 10% de mistura de etanol na gasolina americana - baseado na demanda de gasolina americana e a linha em verde representa nossas exportações para os Estados Unidos - diretamente ou via Caribe, projetada na expansão natural existente no Brasil. Existe uma demanda fixa da mistura gasolina-etanol


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e a capacidade americana instalada, hoje, é por volta de 37 bilhões de litros, com previsão de expansão entre 6 e 9 bilhões de litros para os próximos dois anos. Porém, com o preço atual do milho americano e a dificuldade de financiamento de novas plantas nos Estados Unidos, é bem provável que a oferta não vá chegar à demanda do mercado doméstico e isso acaba sendo uma boa notícia para o Brasil. Mas, vai depender da nossa agilidade de captar essa oportunidade e responder ao que achamos que o mercado vai fazer. Isso porque existem vários países, como a Tailândia, que estão olhando para o mercado de biocombustíveis e dizendo: “eu também consigo produzir esse produto”. Ao contrário do que parece, isso é bom para o Brasil. Mas, o importante é que entendamos que tem um mercado lá - e não estamos falando de E-85, nem em mudar a mistura de etanol na gasolina americana, estamos simplesmente dizendo que isso é possível dentro da lei hoje em vigor nos Estados Unidos. Obviamente, existe a questão da tarifa, que todos conhecemos. Utilizo muito o gráfico Preço Final do Etanol no Mercado Americano no Congresso Americano para explicar porque que o Brasil briga tanto pela questão das tarifas. Em junho, o etanol de milho subiu no mercado americano, por causa das enchentes, a US$ 2.75 o galão, para entrega em Nova Iorque, no atacado. O etanol brasileiro chegava a US$ 2.00 o galão, pagava US$ 0.05 de uma tarifa primária, US$ 0.54 de uma tarifa secundária, atingindo US$ 2.60 o galão em Nova Iorque. Havia muita gente vendendo etanol naquele ano, para contratos de julho. Em agosto, o preço do etanol americano abaixou. Ainda assim, o etanol brasileiro chega ao porto dos Estados Unidos abaixo do preço do americano, mas com a adição das tarifas de US$ 0,05 mais US$ 0,54, o produto brasileiro acaba ficando bem mais caro para o americano. Utilizamos esse gráfico no Congresso Americano por duas razões. Uma, por questões da previsibilidade necessária, porque para o produtor brasileiro continuar a produzir excedentes de etanol para exportação acaba sendo uma decisão difícil, pois, de um mês para o outro, ele passa de vendedor para permanecer em espera de uma próxima onda de subida de preços nos Estados Unidos. A segunda razão é que, em um cenário como esse, não é possível esperar que o consumidor americano seja beneficiado pelo preço mais baixo do etanol. Em um momento em que todo mundo, nos Estados Unidos, está preocupado com o pre-

ço da gasolina na bomba, a única coisa óbvia é que - como o próprio Presidente do Banco Central americano reconhece, o único mecanismo que pode fazer abaixar o preço da gasolina em um curto prazo é o etanol sem tarifas. Por isso, devemos nos alicerçar nessas duas razões. Obviamente que a importação não é boa para o produtor americano, mas quem paga esta conta é o próprio consumidor dos Estados Unidos. Isso, para um político, é uma mensagem bem clara. Eleições Americanas: Vamos mudar de assunto e tentar encaixar essas duas questões nas eleições americanas. Nos Estados Unidos, os colégios eleitorais são divididos por estados. Para ganhar a eleição, é necessário conquistar 270 eleitores no colégio eleitoral. As eleições sinalizam que o candidato Barack Obama pode ganhar uns 260 votos no colégio eleitoral, o candidato John McCain uns 176. Ficam sobrando mais uns 120 votos de colégio eleitoral, dos indecisos. São os famosos swing states, os fiéis da balança. Há uma enorme indecisão sobre quem será o próximo presidente dos Estados Unidos. Se os democratas e o Obama não conseguirem ganhar a eleição dessa vez, depois de terem ganho e não levado a eleição de 2000, de 8 anos de desastre econômico e desastres políticos em série, está na hora de procurar outra profissão. A eleição vai ser decidida, obvia-

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mente, por questões de economia e de energia, que hoje são os dois assuntos mais importantes para o povo americano. Mas, para o setor sucroalcooleiro brasileiro, eu diria que a eleição presidencial não vai mudar muito, porque o presidente americano tem pouca força sobre as questões que nos preocupam, como comércio exterior, tarifas e mercado. Essas questões são decididas pelo congresso, já que a constituição americana obriga o congresso e não o presidente a definir tarifas. A câmara e o senado, hoje, são dominados pelos democratas, e segundo a previsão dos pesquisadores e cientistas políticos americanos, eles vão aumentar o número de cadeiras na câmara. Quinze vagas deverão passar dos republicanos para os democratas. Isso é muito importante por causa das comissões, pois a divisão é feita pela representação dos partidos. No senado pode-se ter uma situação semelhante, com os democratas ganhando 5 novas cadeiras. Se isso acontecer, os democratas ficarão com 56 cadeiras, e terão muita força política, pois precisarão de apenas 4 votos de republicanos para dominar a pauta inteirinha do congresso. Como se diz nos Estados Unidos, se o senado tem 61 pessoas, de um lado do partido, é quase uma ditadura, porque do jeito que o congresso americano funciona, com 60 votos no senado, aprova-se o que quiser. Fecha-se o debate e a oposição não consegue bloquear. Digo isso porque o senado é onde a nossa briga de tarifa é mais difícil, é onde os ruralistas e os protecionistas americanos têm muito mais

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força. A tarifa hoje não baixa, não porque a gente não consegue 51 votos, mas porque a gente não consegue 60 votos para abrir a pauta. A mídia fala apenas se Obama ou McCain vai vencer, mas para mim, é muito mais importante saber quem vai vencer as eleições na câmara e no senado. A estratégia da Unica: Quanto à estratégia da Unica, temos que pensar em duas coisas: engajamento com o congresso, governos estaduais, federais e a sociedade civil e uma nossa articulação específica. Que seja isso chamado de lobby, comunicação, seja o que for – acontecendo nos Estados Unidos e aqui no Brasil. Em setembro, recebemos aqui, no Brasil, senadores e deputados dos Estados Unidos e representantes do "Ibama" americano. Essa é a forma como temos trabalhado na Unica. Eu diria que o próximo governo americano vai ter que lidar com, pelo menos, três questões de grande importância para o nosso setor: A questão das mudanças climáticas - pois o presidente eleito terá que fazer uma severa decisão na questão de mudanças climáticas, de como os Estados Unidos se engajarão nessa questão Pós-Kyoto. A segunda questão é sobre o aumento na exploração de petróleo e os investimentos em fontes renováveis. Os discursos de ambos os candidatos prometem isto. Obama promete US$ 150 bilhões, nos próximos 4 anos, para o setor de exploração de energias renováveis investir na redução da dependência do petróleo estrangeiro, bem co-


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mo em energia renovável - etanol celulósico, biodiesel, dentre outras opções. O terceiro ponto é que temos uma agenda que, ao nosso ver, vai ser defensiva, que é tentar evitar que aquele mandado federal seja revisto de uma forma que nos atrapalhe. Existe uma indústria alimentícia que está muito brava com o grande consumo de milho para etanol e, dentre outras coisas, quer ver uma redução total desse negócio e uma real redução das tarifas. São nossos aliados em algumas questões. Mas, ao mesmo tempo, queremos que o mercado americano continue comprometido com o biocombustível. Então, em parte o etanol de milho pode ser nosso rival, mas também é amigo de batalha. Em termos de tarifas, as questões, obviamente, não estão em pauta, como eu disse sobre a indústria alimentícia, mas chamo a atenção para a questão do drawback. É possível que vá existir uma reforma, no próximo ano, sobre o processo de drawback americano, que pode levar à volta do drawback para o etanol. Temos, hoje, pelo menos dois projetos de leis em andamento no congresso que lidam com tarifas. Um na câmara, com poucas chances de ser votado e muito menos de ser aprovado em curto prazo, que acabaria com a tarifa completamente. Mas, tem um projeto no senado, que eu acho que é possível ser votado este ano - que pretende reduzir a tarifa ao nível do incentivo fiscal americano, com uma redução de US$ 0,54 para US$ 0,45, por galão. Tenho trabalhado muito nessa área, especialmente porque é no senado, e temos a possibilidade mesmo de ter uma maioria absoluta nesta isntituição a favor disso, no curto prazo. Seria, obviamente, muito bom para o setor sucroalcooleiro brasileiro. Não vai solucionar todos os problemas de acesso de mercado, mas será significativamente importante. Estamos fazendo nos Estados Unidos um sério trabalho na área de comunicação, em grande parte em parceria com a Apex. Nós sabemos muito bem o que queremos. Queremos abrir e

ser líder deste mercado, mas a mensagem que a gente leva em cada lugar tem que ser um pouco diferente. A estratégia é definida baseada na demanda do mercado, e a demanda, hoje, no mercado americano, é a redução do preço da gasolina, que subiu muito e já passou de US$ 4 o galão. Fizemos uma campanha que saiu nos jornais, que colocamos na porta de cada apartamento de hotel-base dos hóspedes da convenção do partido democrata, que é muito similar a que fizemos em 4 de julho, com a Apex, na Califórnia e na Flórida. A campanha diz, literalmente, que se o americano quer realmente ter independência energética, tem que diversificar as fontes de energia através, especialmente, do etanol de cana, que hoje é taxado pelo Governo. Temos também um site na internet especialmente voltado para o público americano - www.SugarCaneEthanolFacts.com, que tem todos os fatos, argumentos e a cobertura da mídia, com tudo sobre a questão da tarifa. Pela primeira vez, acho que o setor está engajado, e não estamos falando nessas campanhas publicitárias, que tem que ser o etanol de cana do Brasil, mas é fato que os Estados Unidos consomem petróleo da Arábia Saudita, da Venezuela e de vários outros países – que entra no país sem tarifa, mas o etanol renovável de países amigos, não entra desta forma. E, se permitissem, isso poderia, efetivamente, abaixar o preço. Concluindo, estamos em uma briga de gigantes. Pelos meus cálculos, o que está sendo gasto em relações públicas e institucionais nos Estados Unidos, nessa briga sobre tarifas, etanol e biocombustíveis, deve ser da ordem de US$ 100 milhões, só este ano. Grande parte desse dinheiro vem da indústria alimentícia, da indústria do etanol de milho, mas estamos sendo pontuais e procurando focar melhor nossa mensagem. Sempre me perguntam o que o Obama e o McCain pensam sobre o Brasil. O que eles irão fazer na questão da tarifa? Penso que devemos esquecer o que eles farão ou vão querer fazer. Em primeiro lugar, porque a necessidade de outras questões são prioritárias e, em segundo, porque temos que procurar o nosso interesse. Não devemos esperar o que eles irão propor para gente, mas irmos lá propor, demonstrar que o etanol de cana pode participar desse setor como complemento. Precisamos ter ambição, não podemos ficar sonhando em ter 5%, como é hoje, do mercado de E-10 americano ou até 5% de E-10 mundial. Precisamos ser líderes. Líderar não quer dizer dominar. Significa ser o símbolo e levar o mercado sucroalcooleiro à frente. O Brasil tem a oportunidade e as condições necessárias para ser o líder no mundo e nos Estados Unidos. O nosso hino diz que somos “gigante pela própria natureza” e, mais tarde, “que o teu futuro espelha essa grandeza”. Que assim seja. O Brasil é realmente gigante e estamos em uma briga de gigantes, o futuro vai ser gigante para a gente, mas vai necessitar que façamos nossa parte, precisaremos ter um grande nível de ambição, de vontade e de trabalho.



Promoção Internacional Eduardo de Figueiredo Caldas

Consultor de Agronegócios da Apex

Nossa história é a melhor forma de propaganda

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Com foco na ampliação e consolidação da pauta exportadora brasileira, a Apex administra, aproximadamente, 70 projetos com entidades setoriais, representando segmentos diversificados da economia, estruturados em informações avançadas de estudos de mercado, para suprir e dirigir ações efetivas de promoção à exportação. Com relação ao futuro do setor energético internacional, temos tido grande atenção ao que acontece no Brasil e nos mercados de outros países, para que possamos definir, com maior precisão, nossas ações com foco no crescimento da demanda e nos desafios da oferta na segurança energética, nas restrições ambientais, que são e serão, cada vez mais, fatores cruciais para a venda de nossos produtos e serviços e, no caso, do etanol, da sua cadeia de equipamentos e serviços como um todo. Esses são nossos grandes drivers para a promoção comercial.

Nossa meta é tornar o etanol uma commodity e fazer com que ele seja produzido em muitos outros países. É fundamental para nossa sobrevivência, como indústria, que o etanol seja fonte central de políticas externas em diversos países tropicais. A segurança energética será o fator de maior força para atrair os países na adoção de políticas para promoção do etanol e das energias associadas à sua cadeia produtiva. Nesse contexto, a Apex segue três linhas principais, como focos de atuação: 1. Ampliar o conhecimento de mercados consumidores potenciais. Um trabalho que vem sendo feito, juntamente com a Unica, há quase um ano. Nesse projeto, estão sendo investidos R$ 16 milhões - cinqüenta por cento pela Unica e seus associados e cinqüenta por cento pela Apex - e tem por objetivo promover, exclusivamente, a imagem do etanol de cana-de-açúcar. Nossa meta é tornar o etanol uma commodity e fazer com que ele seja produzido em muitos outros países. É fundamental para nossa sobrevivência, como indústria, que o etanol seja fonte central de políticas externas em diversos países tropicais. 2. Apoiar o governo brasileiro no acordo bilateral Brasil-Estados Unidos de biocombustíveis, para a criação de mercado. Um fator extremamente sinérgico com outras ações da Apex. Através de acordos de apoio a países,

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principalmente da América Central, assimilamos ações que se tornarão fundamentais para a expansão da entrega de serviços pelo mundo. 3. Promover produtos, máquinas, equipamentos e serviços associados à cadeia produtiva. O etanol não é apenas um produto, e sim uma cadeia de muito valor, muito mais extensa que o combustível líquido em si. Nessa parceria com a Unica, temos ações localizadas, principalmente, nos Estados Unidos e na Europa. Como parte deste acordo, abrimos dois escritórios (um em Bruxelas e outro nos Estados Unidos) e temos planos para instalar um terceiro, talvez na China. Uma atuação, um pouco mais avançada, na Ásia, está sendo estudada, já que a realidade nessa área é muito mais diversa do que as duas outras. Dentre estas ações, cabe destacar que a Unica está lançando um selo para o etanol, que será a marca deste projeto. Os novos mercados para os biocombustíveis envolverão, certamente, a América do Sul e Central, a Ásia e a África. E ao pensar, não apenas no consumo, mas também na produção localizada, abrimos o mercado para todo o sistema de serviços e equipamentos que compõem o setor sucroalcooleiro. O mercado-alvo para a promoção de máquinas e serviços do etanol são, notadamente, os países de clima tropical, que têm condições para o desenvolvimento da cultura da cana-de-açúcar, envolvendo América Latina, África, Ásia e Oceania, com destaque para os dois primeiros em função das grandes extensões de terra disponibilizada. Temos visto pelo mundo diversos níveis de entendimento sobre a realidade do etanol e a sua cadeia. Isso é um fator de fundamental importância nas questões da aceitabilidade e da segurança para a entrega dos serviços e produtos que desejamos dispor. Há um grande desconhecimento do mundo a respeito do etanol e do que ele pode representar para o sistema energético mundial. É necessário que os empresários brasileiros façam sua lição de casa para demonstrar a capacidade brasileira de exportar produtos específicos. Precisamos de coragem para internacionalizar e vislumbrar as oportunidades de negócios em diversos países. Para isso, são necessários mais estudos estruturais, não só do ponto de vista agronômico, como também nas áreas de logística e economia específicas dos países. As melhores oportunidades para o etanol não se limitam ao flex-fuel do automóvel. O sistema etanol é muito mais que isso. Alguns países precisam do etanol como aditivo, outros como combustível carburante, outros ain-


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da da bioeletricidade que o sistema pode gerar. A América Central é um bom exemplo desse cenário. A identificação dessas necessidades específicas será, com certeza, o grande propulsor das políticas e das diretrizes da Apex para ajudar a iniciativa privada a atingir novos países consumidores e produtores. A Apex apóia, incondicionalmente, a criação de um mercado internacional para o etanol, pois esse é um fator de ampliação no setor. Por isso, estamos sempre dispostos a auxiliar e apoiar negociações com os países interessados em estabelecer bases de produção de etanol de cana-de-açúcar. Um outro fator a considerar, que a princípio pode parecer sem importância, é a demonstração de que o Brasil já dominou as questões de governança dentro da cadeia. Temos mais de 30 anos de experiência na produção e utilização de biocombustíveis e avançamos muito no conhecimento agrícola, na tecnologia industrial, na logística e nas questões ambientais. Temos que transmitir, na promoção do etanol, a segurança necessária para conquistar novos parceiros e mercados. Nossa agenda, agora, deve alcançar um patamar mais institucional nas discussões com os países. Temos uma história a contar. Em 1931, fizemos os testes com o primeiro veículo movido a etanol. Em 1975, começamos a utilizar o etanol como aditivo à gasolina. Em 1979, o etanol foi utilizado, pela primeira vez, como combustível puro e, neste mesmo ano, foi comercializado o primeiro veículo movido, exclusivamente, a etanol. Em 1980, o biodiesel foi patenteado e introduzido no Brasil. Em 2003, foi comercializado o primeiro veículo flexível álcool/gasolina. Já no início de 2007, 77% dos veículos leves vendidos no Brasil já eram com motores flexíveis. O setor sucroalcooleiro foi o grande protagonista dessa história. Passamos por muitas dificuldades, erramos e acertamos, mas agora estamos em um patamar muito superior a outros países. Essa é, na realidade, nossa melhor forma de propaganda. Realizamos um trabalho com os Estados Unidos para a verificação de solos de maior aptidão na República Dominicana, visando, especificamente, a disposição para a produção de girassol - que faz parte de uma cadeia de opções que tentamos oferecer a esses países. Evidentemente, falamos muito mais intensamente do etanol de cana-de-açúcar e quase sempre se chega à conclusão de que a cana é mais economicamente viável que todas as outras opções para a matriz energética do país. O Brasil tem, sem dúvida, uma grande oportunidade de se tornar o líder nesse mercado. Estive, recentemente, em um congresso na Índia sobre biocombustíveis e percebi que as discussões pareciam estar tecnologicamente atrasadas em, pelo menos, 5 anos. Falava-se, dentre outros assuntos, sobre a produção de biomanso e, se havia ou não, problemas nas máquinas. Nesse evento, ocorreu uma grata

apresentação de um representante da Tailândia. Lá, a produção de etanol é feita com cana e mandioca e eles têm uma visão muito agressiva do setor. Estão na nona colocação de produção mundial e, talvez, consigam chegar à quinta posição. Eles têm 4 mil postos que distribuem E-10 no país e 200 que distribuem o biodiesel-3, B3. A meta é de que, em 2012, todos os postos de abastecimento do país tenham distribuição de biocombustíveis. No próximo ano, serão implantadas bombas de E85. Quando questionado sobre o porquê de não colocarem bombas E-100, ele relatou que a Tailândia está importando carros de diversas partes do mundo, como Estados Unidos, Europa e Brasil; e seguindo a lógica de que o carro brasileiro é flex, estão colocando o E-85, com vistas a importar cada vez mais carros do Brasil. Essa informação é importante porque demonstra que, aos poucos, os países vão se adequando às suas necessidades e aprendendo os benefícios da utilização do flex. O Brasil é um modelo para o mundo. Podemos ampliar ainda mais essa conquista e consolidar nossa condição de exportadores de máquinas, equipamentos, serviços, veículos e tecnologia.

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Produção de Cana Nilson Zaramella Boeta

Diretor Superintendente do CTC

Trabalhando na fronteira do conhecimento

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O CTC - Centro de Tecnologia Canavieira, é financiado, basicamente, pela iniciativa privada. Funcionamos com contribuições de 177 membros, sendo 159 usinas de cana-de-açúcar e 18 associações de fornecedores de cana, que representam cerca de 12 mil fornecedores desse setor, agregando 60% de todo o grumo de cana processada no Brasil. O CTC fazia parte da Cooperativa Copersucar e, em 2004, tornou-se independente, para que a tecnologia desenvolvida pudesse ser utilizada por todos os interessados em participar do processo de expansão da cana-de-açúcar. Logo na fundação, como Centro de Tecnologia Canavieira, saímos de 30 para 79 usinas associadas, somando-se a elas as associações de fornecedores. Hoje, temos 137 usinas associadas e cremos que daqui a um ano teremos por volta de 200 unidades. Somos estruturados como uma organização da sociedade civil de interesse público, ou seja, uma empresa sem fins lucrativos, com esforço e foco na retribuição ao associado do resultado das pesquisas no setor agrícola e industrial da cadeia da cana-de-açúcar. Nossa missão é criar e disseminar tecnologias e inovações aplicadas à cadeia de valor da cana. O CTC conta hoje com uma equipe de 343 funcionários espalhados pelo Brasil, dos quais 130 pessoas com mestrado e doutorado em várias áreas do conhecimento da atividade agrícola e industrial, envolvendo economistas, financistas, químicos, e uma variedade de profissionais, que participam do esforço de manter o Brasil na liderança tecnológica do setor sucroalcooleiro. Atuamos em 12 regionais espalhadas pelo Brasil, com representação em SP, PR, MT, MS, GO, MG, ES, AL, PE e TO. Para dar suporte a essa atuação, sem fazer um considerável aumento de mão-de-obra, lançamos mão de atualizados recursos tecnológicos, como a videoconferência. Hoje, temos as regionais e mais 30 associados conectados ao centro em Piracicaba, através de equipamentos de videoconferência. Isso possibilita que o empresário possa se conectar, através da internet, ao CTC e ter acesso aos 300 especialistas que atuam no setor. Tempos atrás, precisaríamos deslocar um profissional para a interação com a equipe da usina. Hoje, podemos fazer isso através de uma simples conexão de internet, sem custos adicionais e, em 90% dos casos, conseguimos encaminhar a solução, através de um diálogo a distância. Outro desafio que enfrentamos foi o treinamento. A imensa expansão do setor sucroalcooleiro exigia que estivéssemos presentes em diversos locais, treinando as equipes de nossos associados. Isso ficou cada vez mais difícil e partimos para o modelo de treinamento à distância, envolvendo as principais univer-

sidades do país com sucesso nesse empreendimento e, em parceria com a Ibmec-SP, desenvolvemos os princípios e conceitos para se fazer treinamentos à distância. Convertemos nosso treinamento presencial para um modelo web. Investimos nos 12 primeiros cursos e colocamos o projeto em prática a partir de maio deste ano. De maio a agosto, tivemos 1.200 alunos tanto nos processos de , como em palestras e seminários, que são, normalmente, gravados. Isso dá ao sistema grande flexibilidade, pois, às vezes, o aluno que vinha a Piracicaba para assistir à uma palestra, tinha que reproduzir um modelo no seu local de origem. Dos 100 cursos presenciais existentes, 20 já estão disponíveis via web. Os demais estarão disponibilizados nos próximos anos. Hoje, temos 93 associados utilizando-se desse sistema, possibilitando a formação de mão-de-obra de alto nível. O CTC atua em toda a cadeia, desde o começo de caracterização dos ambientes de produção, da escolha das variedades de cana, até os produtos finais: açúcar, etanol ou bioeletricidade. Somos o único centro do mundo, em cana-de-açúcar, que atua, tanto na parte agrícola, como na parte industrial e isso nos dá uma vantagem competitiva muito interessante. O CTC tem um segmento da equipe que faz, puramente, Pesquisa e Desenvolvimento, ou seja, as tecnologias que estarão disponíveis daqui a 2, 3, 5 anos; e um outro segmento, que chamamos de Mercado, que aplica aos associados a tecnologia já disponibilizada. Temos uma série de áreas de atuação, com cerca de 50 projetos de pesquisa simultâneos, em andamento. À medida que um projeto termina, ele transforma-se em produto e é disponibilizado para todas as 159 usinas associadas e para os 12 mil agricultores que possam se beneficiar do desenvolvimento conquistado. O impacto do ganho que desencadeamos, em termos de produtividade, vai direto para o bolso do associado. Ninguém financia o CTC a fundo perdido; é um retorno imediato, ano a ano. Alguns dos desafios para que o setor continue competitivo estão em transferirmos para a fronteira agrícola o mesmo conhecimento aplicado hoje, por exemplo, no estado de São Paulo. Existe um forte empenho para procedermos ao mapeamento do ambiente edafoclimático de todas as regiões de interesse da cana. Em SP, GO e MG os mapeamentos já foram concluídos. Nesta safra, estamos atuando no PR, MS, MT e ES. No ano que vem, cobriremos o Nordeste, principalmente, as regiões tradicionais de AL e PE. Teremos, então, um mapeamento específico e detalhado desses ambientes, dirigindo, assim, os investimentos, de forma mais racional. Hoje, já temos 12 pólos de melhoramento varietal, que serão ex-


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pandidos para 18, nos próximos 3 anos. Teremos, assim, 100% dos ambientes edafoclimáticos mapeados e 90% dos pólos do Brasil caracterizados para cana. Com tais dados em mãos, a produtividade aumenta em, pelo menos, 5 toneladas por hectare. É parte da nossa missão fazer pesquisas com foco em sustentabilidade. Os temas de conservação de solo e água são prioridade. Buscamos encontrar fórmulas que minimizem os custos e o impacto ambiental da deterioração que o homem causa na natureza. Atuamos, fortemente, na busca de controles biológicos de pragas e doenças e, normalmente, quando encontramos a solução, reduzimos o custo do manejo da área em, aproximadamente, 90%. Quando não há possibilidade de se fazer o controle biológico, buscamos no mercado os produtos químicos que tenham os menores custo e impacto ambiental, para recomendá-los. Além do processo tradicional de desenvolvimento de variedades, o CTC também investe, pesadamente, em biotecnologia. Temos em Piracicaba a maior casa de vegetação para produzir cana-de-açúcar transgênica do mundo. São 5 mil m², onde as transformamos e avaliamos sua adaptação às exigências que queremos, em termos de produtividade e resistência. Temos, pelo menos, 500 experimentações feitas todo mês neste local. O CTC busca variedades de cana que possam ter seus genes supra-expressados ou silenciados por efeitos diversos. Buscamos canas com resistência a herbicidas, frio, seca, estresse hídrico e com mais acúmulo de sacarose. É importante aplicar, cada vez mais, a agricultura de precisão. No final desse ano disponibilizaremos, a todos os nossos associados, imagens de satélites dos empreendimentos em que atuamos, e faremos uma avaliação da produtividade, por talhão. Vamos identificar as áreas em que há déficit de produtividade, atuando gradualmente com a equipe de solo, buscando a origem e a solução dos problemas, na busca da produtividade em seu nível mais alto. Com relação aos com modelos de simulação, dispomos de opções que simulam as safras agrícolas na área de corte, carregamento e transporte, até por 5 anos. Quando do estudo sobre a instalação de um novo empreendimento, podemos traçar no computador toda a dinâmica que ocorrerá naquela implementação, por 5 safras. Por conseguinte, o empresário pode avaliar a necessidade de investimento em termos de equipamentos como transbordos, colhedoras e plantadoras, de maneira a gerenciar mais apropriadamente o seu capital, no atendimento e alocação de treinamento de mão-de-obra. Esse sistema funciona, eficientemente, para todas as etapas e conseguimos, ao final da operação, reduzir custos, evitando gastos e desperdícios. A Unica firmou, através de parceria com o Governo do Estado de São Paulo, um Protocolo Ambiental em que há um programa de redução de queimada e, por conseguinte, uma demanda por, cada vez mais, colher a cana

crua, trazer para usina e, a partir disso, fazer a limpeza a seco e separar a palha da cana. O CTC já está nessa 3ª geração de processamento e limpeza de cana a seco. Esse sistema é essencial para o sucesso na geração seguinte de aproveitamento total da biomassa da cana. Existe muito interesse em se entrar na segunda geração do etanol. Para que o projeto seja bem-sucedido, deverá envolver várias etapas. Em primeiro lugar, precisaremos ter as variedades apropriadas para serem plantadas mecanicamente. Essa cana precisará crescer de maneira ereta, ser viável para uma colheita mecanizada e ter um equilíbrio apropriado entre biomassa e sacarose; e precisaremos ter certeza de que os canaviais serão sistematizados de maneira a permitir que os equipamentos fluam através das áreas agrícolas, de maneira eficiente e com baixo custo. A partir daí, todos os processos que mencionamos - corte, carregamento e transporte, recepção, limpeza a seco, separação da palha e um melhor uso possível do bagaço e da palha para gerar, tanto eletricidade, como etanol de segunda geração. Estamos trabalhando para chegar a essa tecnologia. É importante dizer que existem países que possuem mais capital, mais mão-de-obra ou mais recursos ambientais. O Brasil, sem dúvida, é o país que, em se descobrindo a tecnologia apropriada, é o lugar certo para que ela seja primeiro implantada; porque temos, hoje, nos nossos empreendimentos, o bagaço disponível. E a palha está se tornando, cada vez mais, parte desse processo. É necessário buscar os parceiros certos para esse empreendimento, o que não vai acontecer de graça, pois temos vários desafios. Uma questão fundamental é o tratamento apropriado da biomassa. Segundo, as enzimas que trabalharão nesse processo de conversão têm que ser viáveis em termos de eficiência e de custo. Por esse motivo, estamos desenvolvendo parcerias com diversos e centros de pesquisas ao redor do mundo. Durante a visita, no ano passado, do Presidente Lula à Dinamarca, tivemos a oportunidade de formar um acordo de parceria com a Novozymes, a maior fabricante de enzimas do mundo e que trabalhou muito intensamente com o governo americano para viabilizar enzimas que transformam os resíduos do milho em etanol de segunda geração. Montamos uma parceria com essa empresa para tornar igualmente viável enzimas que sejam eficientes para cana-de-açúcar, bagaço e palha. É um processo de médio e longo prazo, algo entre 3 e 5 anos, para se atingir sucesso, tanto na parte agrícola, como na industrial. Essa é, hoje, a nossa fronteira.

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Fomento José Carlos Vaz

Diretor de Agronegócios do Banco do Brasil O capital é a maior commodity que existe

Alguns dos grandes insumos, em qualquer atividade econômica, são o capital, o financiamento e as fontes de recursos. Esse é o papel do Banco do Brasil na mundialização da produção do álcool. Vamos trabalhar essa questão sob a ótica financeira. A contribuição que o setor financeiro pode dar é o fortalecimento da indústria nacional, na produção da cana-de-açúcar, na industrialização, na exportação e na geração de tecnologias para mundializarmos a produção do álcool. Abordaremos, nesta ocasião, temas sobre fontes de recursos, habilitação, crédito e oportunidades que enxergamos no setor. O capital é a maior commodity que existe. Podemos observar as migrações de recursos entre os diversos mercados de capitais. Temos que pensar adiante, no momento em que teremos que trabalhar o maior número de fontes possíveis de recursos para apoiar as atividades. O crédito rural é a primeira onda de financiamento no setor e é claramente suficiente para atender às necessidades do segmento como um todo. Em 2006, apenas para o custeio da cana, o crédito rural destinou 13% de suas necessidades. Ele precisa ser visto, cada vez mais, como um complemento às necessidades do setor. O crédito bancário foi a segunda onda de apoio ao segmento, incluindo todos os seus modelos: o crédito rural industrial, o crédito comercial com recursos internos ou externos e as operações de repasse. Esse não é um modelo esgotado, ele continuará a ser feito, mas há a necessidade de se buscar alternativas que complementem esse apoio. A terceira onda foi o apoio do governo, presente com suas diversas formas – os subsí-

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dios, no passado e, agora, com diversos incentivos fiscais e as operações de mercado - que foram o grande mote dos últimos anos, com a profissionalização da gestão das empresas, apresentando-se para o mercado e buscando recursos. Agora estamos em um momento de enxugamento da liquidez, em que os recursos fluem para os mercados de operações mais tradicionais. Obviamente, isso não irá perdurar por muito tempo, pois haverá retorno de uma maior atração de capitais no país. Talvez, tenhamos que perseguir uma quarta onda, que seria o desenvolvimento de um mercado a termo, com antecipação dos resultados comerciais. Existe um conjunto de soluções bancárias que pode ser acoplado de diversas formas ao aumento da captação de recursos em cima de operações comerciais. Mas, é preciso, fundamentalmente, desenvolver o mercado a termo, não só na cadeia do etanol, mas em todas as cadeias do agronegócio brasileiro. Qualquer que seja a estrutura de financiamento que utilizamos, é necessário focar na questão da habilitação do crédito. Não me refiro ao crédito bancário, e sim crédito no sentido de confiança. O fornecedor de recursos que pode ser um investidor, um acionista, um sócio minoritário, um agente financeiro, uma seguradora ou outras diversas formas - precisa ter convicção de que é possível conceder aquele crédito ao tomador de recursos. Os requisitos básicos desses créditos são os mesmos de qualquer operação de crédito tradicional. Mas, o que tem se destacado, nos últimos anos, é a questão do relacionamento do tomador de crédito com a sociedade, com o meio ambiente, com os empregados, com os fornecedores, com os sócios, com os investidores e com os consumidores. Esse é um dos pontos-chave para se ter acesso a recursos, custos e prazos os mais adequados possíveis. Isso se consegue tendo transparência, visibilidade e buscando certificações. É importante trabalhar muito a questão da gestão. Hoje, os fornecedores de recursos têm, muitas vezes, uma parte contrária, onde também tomam recursos e fazem intermediações, e cuja parte exige atenção do tomador de recursos com questões de meio ambiente, sociais e observância da ética empresarial. Talvez, esse seja o aspecto essencial a ser considerado no uso dos mecanismos mais modernos que existem para se ter acesso a recursos. Outro ponto que gostaria de enfatizar sobre as oportunidades é o mercado a termo. Ainda existe um espaço muito grande para se trabalhar nas relações comerciais, envolvendo desde a compra da matéria-prima, até a venda de etanol e agroenergia, em termos de antecipação de uso e estabelecimento de padrões, preços e critérios de arbitragem. Isso envolve


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a necessidade de se ter uma mudança nos canais de comercialização dos ativos comerciais e a necessidade da pulverização de diversos agentes. É preciso que esses agentes participem do mercado, desde pequenos até grandes consumidores ou fornecedores, de forma a se ter uma base que dê liquidez à realização desses negócios e que se possam implementar produtos bancários complementados com as relações comerciais. Para isso, é essencial desenvolver formas e registrar esses compromissos, de maneira transparente e acessível a todos os interessados, desenvolver mecanismos de garantia, como seguro-garantia, fundos garantidores e fundos de liquidez, desenvolvimento de um sistema de liquidação neutro, que possa trabalhar, inclusive, com a forma de arbitragem para resolver eventuais conflitos e, assim, agilizar a execução dos contratos. O investidor precisa ter muita confiança quanto à segurança jurídica dos contratos, para se dispor a colocar recursos no prazo e no preço que o tomador de recursos tem interesse. Com o desenvolvimento do mercado a termo, teremos uma base mais forte para o crescimento dos mercados futuros, uma das grandes oportunidades do país, não só na indústria do etanol, na questão do petróleo e do pré-sal, como também no próprio mercado futuro do etanol, do café e da soja, mercados estes, que o Brasil pode ser a praça referenciadora de preços, onde ocorre a movimen-

tação desses recursos e a formação dos negócios. Portanto, uma das grandes oportunidades que temos é a melhor estruturação do mercado a termo e as relações comerciais ao longo da cadeia como um todo. O BB, dentro do crédito rural e agroindustrial, está chegando a quase R$ 2,5 bilhões em carteira, e tem apresentado, ao longo dos últimos anos, um crescimento entre 15% e 20% ao ano. Conservamos a ótica de manter presença no setor, com todas as suas linhas de créditos comerciais e internacionais. Também buscamos disponibilizar toda a quantidade e as somas possíveis de consultoria, estruturas específicas de financiamento, assessoria e serviços. As novidades do BB neste ano são, em primeiro lugar, a disponibilização de um fundo de Private Equity específico para o agronegócio, que promova a abertura de capital de empresas nacionais, lastreadas no agronegócio brasileiro e, em segundo, por parte da Aliança do Brasil, a seguradora de nosso conglomerado, que está disponibilizando um seguro agrícola de cana para os estados de SP, PR e MG. O tema do Fórum é o futuro do álcool, mas considero que ele trata, essencialmente, sobre o futuro do Brasil, pois não podemos pensar no futuro do Brasil sem considerar a questão do etanol, um legítimo produto nacional, que usa, além de recursos naturais, muito trabalho de brasileiros e tecnologia nacional na genética e na produção industrial.

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Mercado de Futuros Luiz Gustavo Junqueira Figueiredo

Presidente da Câmara Consultiva do Açúcar e Etanol na BM&F-Bovespa A segurança do mercado de futuros

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A BM&F considera muito importante expor os detalhes do Contrato de Etanol da bolsa brasileira de mercadorias e futuros, e de como ele insere-se na realidade da internacionalização do etanol e do aumento de sua importância na matriz energética brasileira e global. Farei uma breve explanação sobre como funcionam as Câmaras Consultivas específicas na BM&F, para cada tipo de mercadoria, como café, boi gordo, soja, milho e, no caso de nosso interesse, açúcar e álcool. Essa Câmara é composta por integrantes do mercado, envolvendo produtores, consumidores, tradings, corretoras da Bolsa, que em reuniões periódicas, sugerem ações de direção para que a Bolsa possa tornar maior a liquidez dos contratos negociados. Temos, assim, uma Câmara para o Açúcar e Etanol, a qual eu presido. Eu não sou um executivo da BM&F. Sou um produtor de açúcar e álcool e trabalho como executivo responsável pela comercialização na Usina Alta Mogiana. Gostaria de iniciar esta exposição destacando as premissas necessárias para que os contratos de etanol consolidem-se. O primeiro passo é alcançar um maior volume de produção, gerando, com isto, automaticamente, uma maiores necessidade e demanda por proteção de preços. O Brasil está apresentando um significativo e contínuo aumento na produção de etanol, dedicando um percentual cada vez maior à exportação. Esse volume deverá dobrar nos próximos 6 ou 7 anos, suprido e assegurado, em sua maior quantidade, pelas novas unidades em instalação, algumas até com foco exclusivo no mercado externo. E, quanto maior for o volume exportado, maior será a participação de compradores e produtores no mercado futuro, porque o mercado externo exige, normalmente, uma necessidade maior da proteção de preço. O contrato do etanol na BM&F é uma peça de grande utilidade para o produtor. Como mostra o quadro Evolução de Preços à Vista e Primeiro Vencimento, que registra o preço do etanol no mercado físico e o preço do contrato da BM&F, seus valores andam praticamente juntos. Ao longo de um histórico de 6 anos, tem-se uma aderência praticamente perfeita de preço entre a Bolsa

e o mercado físico. Isso significa que se alguém quiser fazer uma proteção do preço do seu estoque ou da sua produção, na época futura da entrega, a usina vai ter uma maior segurança de que a mercadoria valerá, no físico, o preço da Bolsa. Isso é importante porque vemos várias usinas comercializando álcool de maneira errada, fazendo a precificação com base em outros mercados. Existem usinas precificando o álcool contra o açúcar, mas essa correlação, que já foi grande, hoje é muito pequena. Como exemplo, há algum tempo, o açúcar, no mercado internacional, caiu 15%, em 2 ou 3 sessões, enquanto o etanol, no caso o álcool anidro, que é o objeto de contrato da Bolsa, subiu de 2% a 3%. Percebe-se, claramente, que a correlação não é perfeita com o açúcar e vemos muitas unidades precificando também as suas exportações contra o petróleo ou contra a gasolina, o que, a nosso ver, é pior ainda. O gráfico Preços do Etanol e da Gasolina registra os valores dos últimos dois anos, em dólar por galão, no mercado spot, comprovando que o comportamento de preços ao longo do tempo é diferente. Evidentemente que isso envolve um risco muito grande para um dos lados comprometidos nesse contrato. Ou o comprador terá uma desvantagem muito grande, comprando por um preço muito mais



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alto do que deveria, ou o inverso, o produtor, entregando uma mercadoria com um valor abaixo da cotação na época da entrega. Na nossa opinião, essa comercialização, ligando o preço do etanol ao de derivados de petróleo, por enquanto, não funciona. Pode até ser que, no futuro, a correlação aumente, mas hoje não acontece e acreditamos que não ocorrerá. O Contrato de etanol é muito simples. Toma-se por base o álcool anidro. Primeiro porque, para ele virar hidratado, basta adicionar água, enquanto o contrário não teria esta facilidade. O segundo motivo é que, assim como existe o carro flex, existe a demanda flex, ou seja, se o preço do álcool hidratado sobe demais, diminui a demanda e o mercado acaba ajustando-se. No caso do álcool anidro, é um pouco mais complicado. Se não houver álcool anidro para adicionar à gasolina, o sistema fica paralisado, a não ser, evidentemente, que a mistura seja reduzida. Para garantia de abastecimento, faz muito mais sentido ter um contrato de álcool anidro do que de álcool hidratado. Não há nenhum problema em se fazer um contrato de álcool hidratado e precificar na bolsa. Basta fazer um contrato usando o modelo de álcool anidro e dar um desconto equivalente à quantidade de água contida no álcool hidratado. Ou seja, é plenamente praticável comercializar toda a produção de álcool usando esse contrato, apesar dele ser destinado ao álcool anidro. O contrato considera como quantidade o lote de 30 m³ ou 30 mil litros, com preço em dólar americano por m³, livre de impostos, e prevê que o vendedor entregue a mercadoria no Porto de Santos, se isso for o desejo do com-

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prador. O contrato é híbrido, ou seja, ele serve tanto para o mercado doméstico, como para o mercado internacional; e quem decide o local de entrega é quem compra. Cabe ao produtor ou trading simplesmente entregar a mercadoria. O recebedor – comprador desses contratos, definirá onde quer alocar esse álcool. Se ele quiser que o álcool seja exportado, ele comunicará à Bolsa e, no caso, a usina ou quem tiver na posição de venda entregará essa mercadoria sobre rodas em um terminal em Santos, indicado pelo comprador. Se o comprador for uma distribuidora ou uma indústria química, por exemplo, que deseja manter o álcool no mercado doméstico, basta anunciar a intenção. A Bolsa calculará os impostos - ICMS, PIS, Cofins e o que mais seja aplicável. A única diferença é que, ao invés da usina entregar em Santos, ele será retirado na usina, considerando um desconto do custo do frete equivalente ao transporte. O valor desse frete é calculado todo mês pela Bolsa, refletindo os preços do mercado na época. O gráfico Contrato Futuro de Etanol da BM&F-Bovespa mostra o comportamento dos preços dos contratos nos últimos meses. O que se percebe, claramente, é a volatilidade que existe no mercado de etanol, que, acredito, dificilmente diminuirá, apesar do nosso desejo, principalmente, olhando o interesse do consumidor final. Temos uma mercadoria que depende de clima, dos efeitos de câmbio, dos efeitos logísticos, do componente de preços de açúcar, petróleo, milho, são n variáveis interagindo todos os dias, que fazem com que a volatilidade seja uma constante desse mercado. Ora, se a volatilidade é uma característica estabelecida no mercado de álcool, o que os participantes precisam fazer? Precisam reduzir essa volatilidade usando o instrumento de mercado futuro. Essa é a única maneira de se diminuir a volatilidade intrínseca a esta mercadoria. No caso do comprador, ele tem que comprar da maneira que lhe convir e, no caso do produtor, vender na época que lhe for atraente. Só assim as volatilidades serão diminuídas. O gráfico Número de Contratos Negociados e em Aberto registra a evolução do volume dos contratos negociados na Bolsa. Percebe-se um crescimento até o mês de junho. Entretanto, os volumes são bons enquanto há um número grande de exportação. De julho em diante, há uma redução natural de negócios, pois as exportações que as usinas planejavam, já tinham sido realizadas. A maior parte do volume do contrato de etanol está sendo regido pelos compradores externos, notadamente, as tradings. Temos uma confiança muito grande no aumento da liquidez desse tipo de contrato. Um dos motivos é que a produção, a demanda e as exportações têm aumentado. O outro motivo é de ordem estrutural, pois acreditamos que a aquisição da Esso, por um grande produtor brasileiro, a Cosan, fará com que ela utilize esse instrumento de mercado futuro, já que faz



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parte da cultura do comprador. A partir do momento que uma grande distribuidora começa a usar este instrumento, ela causa um natural desconforto nas demais, que acabam se vendo obrigadas a seguir, pelo menos em parte, esse mercado. No mercado interno, percebe-se essa tendência para os próximos anos. Outra tendência de aumento de volume está na indústria química, onde temos grandes projetos sendo instalados no Brasil, usando etanol como matéria-prima. Nas indústrias químicas, o hedge é muito relevante, diferentemente da atividade de distribuição de combustível que, como o próprio nome diz, apenas distribui, repassa. No caso de uma indústria, o hedge é muito mais importante, e esses projetos em curso, que vão maturar a partir de 2010, provavelmente utilizarão o contrato de etanol da BM&F, como parte da sua precipitação. Uma grande vantagem do contrato é que ele dá a proteção de preços perfeita para o produtor. Se este quiser inventar e fazer hedge em outras mercadorias, o risco dele será maior, podendo, evidentemente, ganhar ou perder muito. No que se refere à justificativa dos compradores externos, queixando-se de que não poderiam ficar na dependência só do Brasil como fornecedor único, existe a possibilidade de se minimizar o risco da não entrega da mercadoria através da utilização do contrato de etanol da BM&F. O pior cenário seria a usina não entregar a mercadoria na época do vencimento. Mas, se o comprador estiver usando o contrato para se proteger, ele receberá o álcool na Bolsa, considerando inclusive, as especificações

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padronizadas para o atender. Esse mecanismo é também muito importante na escala governamental, porque, nos últimos anos, temos vivido uma espécie de gangorra com o Governo, em relação à mistura de anidro na gasolina, ora com sobra, ora com falta, tendo que lançar mão do teor da mistura - entre 20% e 26%, para se regular o mercado. Nenhum produtor gosta de ter perda ou destruição de demanda. O que pode ser feito para reduzir este risco que alguns participantes do mercado acreditam que possa ocorrer nesta entressafra? Em nossa opinião, o modelo ideal é que os contratos de álcool anidro sejam feitos e referenciados na Bolsa, justamente para garantir ao comprador que, na pior das hipóteses, ele receba a mercadoria na própria Bolsa. Quem vai entregar é problema de quem tiver vendido. Então, se a distribuidora comprou a R$ 800,00 o m³ e o mercado for para R$ 2.000,00, não é seu problema. Ela irá receber na Bolsa R$ 800,00. Quem vai ter que se virar para entregar, mesmo se o mercado estiver indo para a estratosfera, é o produtor que vendeu. Por isso, o contrato de etanol é um fantástico instrumento, regulador de mercado. É uma grande surpresa para a Bolsa que o setor ainda não esteja utilizando este instrumento na magnitude que poderia. O setor deveria olhar com mais atenção esse assunto, porque a destruição de demanda fica muito cara, tanto a curto, quanto a médio e longo prazos. A redução da mistura atrai desconfiança do mercado, tanto doméstico, como externo e, além do que, diminui as perspectivas de preços dos outros produtos que fabricamos, como o açúcar. Utilizando o contrato, há condições de se melhorar a rentabilidade do produtor, pois, hoje, o modelo tradicional de venda, de contratação de etanol no mercado doméstico, segue um índice de preços publicado pela Esalq. Apesar de ser um modelo muito prático e fácil de ser assimilado entre comprador e vendedor, nada mais é do que uma média de preços, ou seja, se eu faço um contrato com alguém, baseado nesse indicador, a única coisa que estou garantindo para minha empresa é que estou vendendo, rigorosamente, na média do mercado. Na nossa empresa, isso não é suficiente. Sou cobrado para proporcionar aos acionistas um preço acima da média do mercado e não tenho como conseguir um resultado desses, fazendo um contrato com um indicador que segue uma média. A única maneira de tentar conseguir preços melhores é, realmente, usando o instrumento de derivativos; e o contrato de etanol da BM&F dá essa possibilidade ao produtor. A BM&F está aberta para as empresas que queiram aprender mais sobre o assunto e sobre como abrir posições nesse contrato. A maneira ideal de se aprender um pouco mais sobre essa questão é buscar alguma corretora credenciada pela BM&F, que pratica a comercialização do etanol.



Produção Rogério Almeida Manso da Costa Reis Vice-Presidente da Brenco

O projeto para se alcançar 10% da produção brasileira de etanol Embora também atenda ao mercado brasileiro, o projeto da Brenco é voltado, predominantemente, para o mercado internacional. Avaliaremos, assim, a internacionalização do etanol, sob a óptica do empreendedor, apresentando uma visão geral da questão, para depois entrarmos no projeto específico. O primeiro contexto diz respeito ao movimento do etanol, por sua condição de alternativa mais limpa e às questões que são, freqüentemente, associadas ao fator do petróleo. Comecemos por aí. Eu não advogo o fim do petróleo. Prefiro expressar mais a questão dos problemas relativos à concentração de reserva em poucos players e, notadamente, em países com características de instabilidade. Esse eu considero um problema bem maior do que o esgotamento da reserva em si. Outra questão, é que o petróleo barato está acabando, com o declínio das reservas de custo mais baixo de exploração. As reservas estão localizadas, cada vez mais, em regiões inóspitas e profundas, como os desafios que existem na frente do pré-sal. Esse problema está acontecendo em todos os países do mundo. A conseqüência desse ambiente tem sido o aumento da mistura de etanol na gasolina. Os Estados Unidos têm um fator visível, o Canadá está entrando com mandado. Na Europa, a perspectiva é de 10% e, na Ásia, vários países estão tomando iniciativas dentro de programas de redução de gases de efeito estufa. O que podemos observar é que existem movimentos em diversos países, na direção da mistura do etanol. Olhando projeções a longo prazo, os países estão, de uma maneira geral, aumentando a sua produção e consumo. O importante é olhar com perspectiva. Temos o Brasil tornando-se exportador e Estados Unidos, China, União Européia, Japão e Índia tendendo a se consolidarem como importadores; ou seja, a exportação do Brasil está cami-

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nhando nesta direção. O Brasil, obviamente, tem uma lideran-ça que é fruto dos 30 anos de experiência com o etanol. Temos as condições favoráveis para produção de cana, as vantagens sobre outros países que produzem o etanol a partir de outras culturas, uma matriz energética que é um exemplo para o mundo, um crescimento contínuo do mercado interno - que estimula o investimento, e um mercado demandante pela energia elétrica a partir do bagaço de cana, o que complementa ou estabiliza a receita das usinas. O Brasil trabalha com uma cultura que é mais eficiente que a dos competidores. Temos uma relação energética da cana superior ao milho, ao trigo e à beterraba; um rendimento por hectare maior que qualquer outro produto concorrente; um custo de produção competitivo em relação a todas as demais culturas; e um ganho de produtividade crescente e contínuo. Além de tudo isso, o Brasil tem uma área agricultável que permite a expansão de culturas para biocombustíveis. Hoje, o Brasil, quando comparado ao resto do mundo, tem uma vantagem flagrante. Temos uma segura perspectiva de aumento de produção, saindo de pouco menos de 20 milhões de m³ em 2006, para algo próximo a 60 milhões de m³ em 2020. Estamos vivendo um consolidado aumento da demanda com o mercado do combustível flex-fuel e é importante mostrar, já que falamos de internacionalização, que estamos saindo de uma exportação marginal, na faixa entre 2 e 3 milhões de m³ por ano, para uma exportação que pode chegar a 15 ou, quem sabe, 20 milhões de m³ por ano. Aqui, vale a pena uma parada para reflexão. O Brasil pode se posicionar, de fato, como um player mundial, entretanto existe uma lição de casa a ser feita. Somos um modelo de nacionalização. Como um programa que tinha tudo para ser regional, dado o foco do grande mercado e área de produção em São Paulo e costa do nordeste, conseguiu se transformar em um mercado nacional? Qualquer bomba de posto do país tem álcool hidratado e a mistura de álcool anidro-gasolina. Do ponto de vista da internacionalização, queremos vender um modelo para outros países serem produtores e exportadores, mas, antes, vamos fazer a nossa avaliação. Estamos fazendo o nosso dever de casa? Quais são os problemas que temos aqui, em relação à internacionalização? Dualidade de produção: Primeiro, o mercado ainda está fortemente influenciado pelo açúcar, e existem incertezas em relação à oferta de etanol para o mercado internacional. Normalmente, antes do início da safra, tem-se a discussão de qual será a projeção de preços


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do açúcar para o ano, gerando a dúvida, até o último momento, se a safra será açucareira ou alcooleira. É uma característica do mercado, e é um ponto positivo ter a possibilidade de escolha entre a produção de açúcar e do etanol. Quando falamos em internacionalização do mercado de etanol, precisamos lidar com a questão dos mecanismos que possam dar conforto, previsibilidade e trazer planejamento para dentro desse sistema. Infra-estrutura: Temos, hoje, uma infra-estrutura logística precária da usina ao destino, inclusive fora do país. Temos problema no carregamento da usina até a base, no transporte da base até o porto, no próprio porto e no transporte do porto até o ponto de destino; sem falar das dificuldades nos portos de destino, pois o mundo não foi concebido para trabalhar regularmente com esse produto. Qualquer projeto com interesse no mercado internacional tem que administrar, essencialmente, como toda commodity, três características: custo, confiabilidade e sustentabilidade.

Barreiras Tarifárias: Temos um problema enorme de barreiras tarifárias e de técnicas em todos os mercados. Conheço poucos mercados que sejam tão complexos, pelo menos na área de energia. Não é o problema apenas das barreiras tarifárias, mas a combinação das barreiras tarifárias e técnicas. Por exemplo: apesar da Brenco não ser a companhia que está produzindo hoje, estamos fazendo um trabalho que chamamos de pré-marketing - a comercialização de produtos de terceiros para assegurar o desenvolvimento de canais logísticos de distribuição que funcionem adequadamente. Fomos convidados por uma das grandes companhias compradoras na Europa para um contrato de longo prazo. Preparando a nossa cotação, percebemos que havia uma cláusula de sustentabilidade, em que a companhia comprometer-se-ia em atender aos requisitos de sustentabilidade do país recebedor do produto. Como os requisitos não estavam detalhados no pedido de cotação, liguei para o trader, pedindo que me enviasse os tais requisitos. Ele respondeu que eles ainda não existiam, mas que quando existissem, teríamos que atendê-los. Notem a dificuldade para se criar uma barreira técnica, a ponto de, praticamente, termos que adivinhar qual vai ser o requisito que virá pela frente. Contratação: Com relação à contratação uma parte importante do processo de venda e de abertura do mercado, observamos que ela é concentrada em contratos de prazos de um ano ou menos. Existem muitas negociações spot e, mesmo no mercado internacional que busca uma referência do mercado spot, o que encontramos são mercados de baixa liquidez. Tenho acompanhado, dia-a-dia, as negociações feitas, por exemplo, na Europa, e chegamos a diferenças de 5% a 10% em relação aquilo que o mercado está, de fato, negociando, e o

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que é representado pelos índices, por conta da baixa liquidez. Às vezes, ficamos até uma semana prorrogando negociações extremamente influenciadas por fatores de mercado não tão objetivos. Dentro desse contexto, nasceu uma companhia, com a pretensão de ser um fator importante nesse processo de transformar em algo concreto a possibilidade do mercado brasileiro ser um grande supridor do mercado mundial. A primeira idéia para que isso aconteça é que, para se entrar nesse mercado, é necessário uma escala mundial. É preciso ter visibilidade e estar no radar, se quisermos ter um papel importante ou de transformação. A escala mundial dentro do setor foi definida como um projeto de 1 bilhão de galões. Essa escala deve nos ajudar a sermos efetivos nos três elementos que citamos: conseguir um custo competitivo, ter influência, principalmente na cadeia logística, para lidar com a questão da confiabilidade e construir um sistema com sustentabilidade. Assim nasceu, há cerca de dois anos, o conceito da Brenco. A companhia foi incorporada, oficialmente, há um ano, para a construção de pólos de produção com a moagem de 44 milhões de toneladas e a produção de 1 bilhão de galões de etanol por ano, gerando, concomitantemente, 600 megawatts, com um investimento

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da ordem de US$ 3 milhões e buscando um market share, que na sua maturidade, tivesse uma representatividade dentro da produção brasileira de 10%, em 2015. Desenvolvemos um sistema logístico, através de uma transportadora recém-criada, a Centro-Sul Transportadora Dutoviária, onde pretendemos investir em uma infra-estrutura logística para escoamento, não só da nossa produção, mas também disponibilizada a terceiros que estejam dentro da área de influência desse duto. Além disso, temos o desenvolvimento de atividades de comercialização de etanol, auxiliando a abertura de mercados e incentivo à demanda. Para que esse projeto vá em frente, vejo a necessidade de ações em alguns níveis. Em nível de governo, muito importante a ser ampliado, por conta de todas as barreiras que já citamos anteriormente. Em nível institucional, com empresas organizadas, de uma forma coletiva, buscando levar um papel de indústria para o mundo inteiro. E o trabalho de caixeiro viajante, que é pegar um avião para o exterior, bater na porta das empresas, em algumas, ser recebido, em outras não, contar histórias, negociar preços e detalhes de contrato e ficar nessa negociação até conseguir viabilizar a operação. A proposta da Brenco é ser um elemento importante e de parceria nesse setor. Definimos 8 estratégias para o modelo que acreditamos ser um projeto de escala mundial, muitas delas já em implementação pela indústria. Acreditamos que a companhia é diferenciada pela integração dessas 8 estratégias e, como é um projeto que nasce em Greenfield, ele foi buscar, dentro do próprio setor, as melhores estratégias que fizessem sentido dentro desse modelo. Desenvolvimento de projetos Greenfield: Primeiro, é necessário estruturar os projetos Greenfield, ou seja, buscar em um mercado específico, como o mercado de energia, dentro dos parâmetros custo-confiabilidade-sustentabilidade, para construir um modelo, na escala, com a integração e o foco que precisamos. Formação de pólos de usinas: Só trabalhamos em lugares onde possamos integrar pólos de usinas. Por isso, estamos desenvolvendo 3 pólos, de maneira que se crie uma massa crítica no desenvolvimento, não só na área agroindustrial, mas também que possamos ter uma proposta para a logística, que mude o sistema que funcionou até hoje, com uma forma de crescimento gradativo, sem poder fazer investimentos, por não ter no local a massa crítica do volume necessário disponível.



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O foco na energia renovável: Essa questão é um entendimento que o agente produtor de açúcar e álcool já tem, e que já faz o trabalho muito bem dentro da indústria. Vamos criar um agente diferenciado, que busque fazer o outro papel e que possa dar, através desse foco na energia renovável, um serviço diferenciado para um novo mercado. A produção em grande escala e com baixo custo: Estes são dois assuntos extremamente associados. A forma como buscamos abordar isso é fazendo projetos modulados. Todas as 10 usinas que estamos construindo terão o mesmo módulo, de maneira a levar para a indústria uma proposta de parceria, de se criar eficiência também nesse nível, à medida que se replique o mesmo projeto n vezes. A integração da cadeia logística: Todas as vantagens competitivas do Brasil - da cana, produtividade, solos, etc, não podem ficar só aqui, têm que chegar à porta do consumidor, porque é lá que a competição dá-se. Gosto de citar o professor José Carlos Moreira Teixeira, que diz o seguinte sobre os combustíveis: “É um produto que ninguém vê. Falar em diferenciação é muito difícil. O produto entra no seu tanque e você não vê. E ainda tem uma coisa pior: você não acorda de manhã pensando que vai parar hoje para abastecer seu carro porque está com vontade. Você pode acordar querendo comprar um toca-discos, um Ipod ou um celular. Mas, você pára com má vontade no posto e ainda não vê o produto que está sendo colocado. Esse produto será julgado justamente por esse custo; e aí a necessidade de se ter uma cadeia integrada para garantir custo e confiabilidade”. Prática de Governança e Sustentabilidade: Quando se trata de um projeto de Bilhão, você precisa dar ao investidor o conforto de que o dinheiro está sendo aplicado de acordo com o combinado, seguindo todas as regras de boas práticas do mercado. Um projeto assim não se faz sem risco e é preciso ser milimétrico, buscando eficiência em cada coisa, inclusive, na captação de recursos. A governança, como a sustentabilidade, são fatores essenciais. O projeto da Brenco está sendo implantado no Pólo Alto Taquari-Mineiros, onde estamos com cinco usinas em desenvolvimento. Duas partem na safra do ano que vem, duas na de 2010 e uma na de 2011. Outras três começaram a ser desenvolvidas em novembro, no Pólo Paranaíba-Itajá, onde pretendemos colocar a primeira usina em operação em 2010 e, depois, as outras, na seqüência. Na safra 2009/10 moeremos 3,6 milhões de toneladas de cana, 12 milhões na seguinte, 24 milhões em 2011/12, chegando na safra 2015/16 com 44 milhões de toneladas de cana moída. Em 2009/10 cogeraremos 56 MW de energia, 191 e 376 nos anos seguintes, atingindo, em 2015/16, um excedente da ordem de 689 MW. Na safra 2009/2010, produziremos 313 mil m³ de etanol, 1.061 na safra seguinte, 2.087 em 2011/12, alcançando na safra 2015/16 o patamar de 3.826 mil m³, ou seja, 1 bilhão de galões

de etanol. O gráfico Produção em Grande Escala utiliza uma amostra representativa do setor, apresentando a distribuição da produção entre etanol e açúcar. Como podemos ver, a média típica do setor é de plantas menores, algumas com a produção dedicada ao álcool, mas de até 150 mil m³ de produção por ano. O que estamos fazendo são plantas de grande escala, para cada módulo de moagem de 3,7 milhões de toneladas de cana e uma produção de 340 mil m³ por ano. Multiplicando esses valores por 10 unidades, entendemos como vamos buscar aqueles 10% de participação dentro do setor. Nesse horizonte, tornamo-nos, no caminho, um dos maiores exportadores do mundo, dado o foco na exportação. O projeto dá grande importância ao quesito logística, adequada do ponto de vista de custo, confiabilidade e sustentabilidade, para um projeto de competitividade em escala mundial. Estamos concentrados em dois Pólos, com volume para justificar a solução dutoviária. O duto de 1.120 km está dentro do cronograma para operação em julho de 2011, no trecho entre São José do Rio Preto e Paulínia. Está planejado para transportar 6 milhões de m³, mas, deixaria um pouco do produto em Paulínia e seguiria para Santos, exportando 4 milhões de m³. Esse projeto já está em desenvolvimento há cerca de um ano. No início de 2008, iniciamos o processo de licenciamento no Ibama e na ANP. Na área de engenharia, estamos relativamente avançados para todo o trecho Alto Taquari-Paulínia e estamos iniciando a parte da engenharia no trecho Paulínia-Santos, definindo, principalmente, questões como o contorno da cidade de São Paulo e a chegada ao terminal em Santos. Em suma, o Brasil está em primeiro lugar, com grande sucesso na nacionalização. O etanol é uma referência para outros países e tem um potencial produtivo diferenciado. Para alcançarmos a internacionalização, temos que construir uma plataforma de exportação eficiente, competitiva e, principalmente, que assegure a produção. Precisamos ter investimentos que estejam associados à garantia dessa exportação como um lastro para contratos de longo prazo. Paralelo a tudo isso, temos que reforçar as ações institucionais globais, os programas de incentivo à mistura e ao consumo de etanol, e também à retirada das barreiras tarifárias e técnicas.


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Meio Ambiente

Opiniões

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Luiz Gylvan Meira Filho

Professor do Instituto de Estudos Avançados da USP

A mudança do clima já foi detectada e de forma inequívoca

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Tenho trabalhado na área de mudanças climáticas e gases de efeito estufa e quero enfocar esses aspectos e impactos sobre o setor sucroalcooleiro. O fato é que o clima está mudando devido à ação do homem. A forma, como se sabe, é extremamente simples. Segundo a física, certos gases, como o CO2, o Metano, o N2O e os compostos de flúor absorvem a radiação infravermelha. Quem trabalha no campo, especialmente em lugares frios, sabe que uma noite de inverno com céu limpo é muito fria, porque a superfície perde energia por radiação infravermelha. Se tiver alguma coisa que segure, não esfria tanto. O efeito estufa é só isso. Esse efeito é pequeno e essa é a razão pela qual ele ainda não havia sido detectado. A mudança do clima não pode ser notada. O que observamos é o clima, que mistura a mudança do clima com a variabilidade natural, efeito de vulcão, de El Niño. Todas essas coisas estão sobrepostas e têm uma certa magnitude. Foi preciso esperar que o clima mudasse mais do que a variabilidade natural para que o IPCC, no ano passado, declarasse que a mudança de clima já foi detectada e de forma inequívoca. A humanidade vê-se diante da necessidade da seguinte decisão: podemos dizer que não vamos fazer nada e aceitar os danos que ocorrerão uns 30, 40 anos depois das emissões. Isso é uma possibilidade; é a opção pela inação. A outra é dizer que vamos nos adaptar. Em alguns casos, isso será possível. O setor agrícola pode desenvolver algumas variedades melhor adaptadas a um clima um pouco diferente. Em alguns casos, não será possível. A savanização das bordas da Amazônia, por exemplo, não tem solução. É dano mesmo. E a outra opção é evitar que o clima mude, o que significa diminuir as emissões. Gosto muito da analogia hidráulica para falar sobre esse assunto: um tanque com uma torneira aberta e um ralo embaixo. Se eu não quiser que a água suba mais, devo fechar a torneira para entrar a mesma quantidade que sai. A analogia é que o nível da água no tanque corresponde à quantidade de gás carbônico na atmosfera. Essa é a conservação de massa, pela analogia hidráulica. O tamanho do ralo é conhecido. Saem da atmosfera, fundamentalmente para os oceanos, 2,2 bilhões de toneladas de carbono de CO2 por ano, que se transformam em carbonato de calcário e sai do sistema. Considerando que as emissões globais, em 1990, eram de 8,6 bilhões de toneladas de carbono por ano, o único jeito de fazer com que o CO2 na atmosfera estabilize e pare de subir é cortar cerca de 60% das emissões mundiais. Isso inclui certos países crescendo a taxas de 10% ao ano e esse problema é um dos grandes desafios políticos do mundo, neste século.

Queira ou não, o setor sucroalcooleiro está no meio do redemoinho e pode ser uma parte da solução do problema. Não há a menor possibilidade dos biocombustíveis sozinhos resolverem a questão. Por outro lado, não há a menor possibilidade de se encontrar uma solução sem os biocombustíveis. Existe a energia nuclear, que tem os seus problemas e limitações de escala. Existe também a possibilidade de se enterrar o CO2. A Petrobras está trabalhando no assunto. Trata-se da captura e do armazenamento de gás carbônico em postos de petróleo. Há diversas outras coisas que precisam ser feitas. Uma delas é o uso de biocombustível em grande escala no mundo inteiro. E por todas as razões que já foram mencionadas, o setor sucroalcooleiro e o Brasil podem ajudar a liderar esse processo. Não é uma tarefa fácil. A questão de, por exemplo, exportar essa tecnologia ou auxiliar os nossos vizinhos africanos, exigirá um trabalho de desenvolvimento, em uma escala sem precedentes. A palavra desenvolvimento, dentro das Nações Unidas, surgiu com a criação da própria ONU e é associada à questão das ex-colônias européias que, corretamente, disseram: “não é só uma questão de ficarmos independentes, nós queremos o desenvolvimento”.



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Essa palavra significa muita coisa nos aspectos social, político e econômico; e, durante muitos anos, as atividades de desenvolvimento coordenadas pelas Nações Unidas, por meio do PNUD - o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, tiveram bastante sucesso em organizar estruturas de governo e infra-estrutura básica nos países. Mas, é um movimento que perdeu o fôlego. Houve uma esperança, em 1992, na Conferência do Rio sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento, em que essa preocupação com os temas ambientais globais, de alguma forma, com muita inteligência e criatividade, pudesse ajudar a promover uma nova onda de desenvolvimento em vários países. O tempo passou e as coisas não se mostraram tão simples quanto se imaginou na conferência do Rio de Janeiro. Mas, o que vem acontecendo hoje, no interior de São Paulo, mostra que, talvez, eles tivessem razão e, realmente, uma preocupação com o tema global, como a mudança de clima, pode servir de mola propulsora para um novo ciclo de desenvolvimento. Pediram-me para comentar sobre alguns outros aspectos do que deveria ser feito em outros países, para que pudesse se aproveitar a experiência daqui, incluindo a parte de alimentos. A única sugestão útil que consegui formular é a de que, rapidamente, por meio do governo, esse assunto seja levado ou se peça ajuda ao sistema das Nações Unidas, que tem um conjunto de agências especializadas e corpos técnicos habilitados para tratar, não só de agricultura, mas de desenvolvimento social, aspectos econômicos, dentre outros assuntos. Equacionar os aspectos econômicos dessa expansão da produção de etanol para outros países talvez seja a parte mais importante. Aprendi com o professor da FGV, Luiz Carlos Bresser Pereira, que “o mercado sozinho não vai resolver esse problema de mudança de clima”. O livre mercado é a melhor forma de fazer com que as coisas ajustem-se dentro da economia. Mas, nesse caso, a introdução de biocombustíveis renováveis não ocorrerá somente com o mercado completamente livre. O segredo é que os governos, em suas amplas esferas - como no caso do Protocolo de Kyoto, orientem as coisas para o lado certo. No caso da mudança de clima, teoricamente, como diz o senhor Nicholas Stern, no Relatório Stern do Reino Unido, a maneira mais fácil, simples e correta de fazer isso, seria por meio de tributos - em inglês, um carbon tax. Ou seja, coloca-se um imposto sobre o carbono liberado, que altera a estrutura do preço e faz com que quilowatt/hora gerado do carvão mal queimado passe a custar mais caro do que o quilolowatt/hora gerado por um combustível renovável. É difícil imaginar um imposto sobre carbono, na esfera internacional. Só existem duas formas de tratar o problema: uma, por meio de tributos - que podem ser impostos ou subsídios e são, na realidade, impostos negativos; a outra, que chama atenção de todo mundo, são os créditos de carbono.

O crédito de carbono é o resultado da aplicação copiada de um sistema, que em inglês chama-se Cap and Trade e que foi introduzido, com sucesso, nos Estados Unidos, para diminuir as emissões de dióxido de enxofre. A teo-ria diz que se pode emitir quanto quiser, mas é preciso ter posse de um certificado expedido pelo regulador. Caso a empresa seja apanhada emitindo sem o certificado, receberá uma multa que custará muito mais caro do que ter evitado a emissão. Ao longo dos anos, são expedidas um número decrescente de permissões de emissão, que podem ser comercializadas. Fica por conta do empreendedor decidir qual é o mais barato: reduzir as emissões ou comprar certificados do vizinho que, por uma razão qualquer, pode ter um custo marginal de redução de emissões menor do que o seu e prefere lhe vender. Essa é a teoria que está por detrás do MDL - Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, do Protocolo de Kyoto, que é uma variante desse sistema. O MDL é muito pequeno para acomodar as reduções desejadas pelo mundo. Para se ter uma idéia, o Protocolo de Kyoto fala em reduções de 5% dos países industrializados, ou seja, 4% das emissões globais, quando precisaríamos de uma redução de 60%, até 2050. Apesar da inexperiência ou da falta de capacidade de adivinhar o futuro de todos os envolvidos, o MDL tem sido útil, mas a experiência tem trazido à superfície alguns pecados, talvez até de origem. Um deles é o fato de que a redução das emissões é medida em relação a uma linha de base hipotética e as discussões sobre qual seria esta linha, na prática, têm criado um cartório de subjetividade internacional que, em particular, tem evitado, até hoje, que haja projetos de MDL pela produção de etanol, no Brasil. Conseguem-se alguns créditos com a geração de energia elétrica, mas outro problema corrente é que, na prática, os reguladores têm procurado incluir, nas exigências para a concessão dos créditos, considerações que são de outra natureza e têm a ver com sustentabilidade social, efeitos ambientais locais, dentre outros. O sistema está ficando complicado demais. Tempos atrás, em uma conversa, eu prometi ao Ministro Roberto Rodrigues que daria uma olhada no problema, para verificar, se é que é possível, como escapar completamente de toda essa complexidade e fazer contas simples, separando as considerações sociais, locais, etc, do problema do carbono e, de alguma forma, atribuir ao uso do etanol para a geração de energia o real efeito que ele tem sobre a mudança de clima. Conversando também com o Dr. Isaías Macedo, da Unicamp, que faz todas essas contas sobre o balanço de carbono, a conclusão é que se levarmos em conta a contribuição para as usinas que têm caldeira de alta pressão, geram energia elétrica, a jogam na rede e, com isso, deslocam a geração térmica de eletricidade no Brasil. Na realidade, isso equivale a uma emissão negativa. É um desafio muito grande e este grupo precisará ajudar a exercer liderança nessa área, senão ninguém mais o fará.



Padronização e Certificação Alfredo Carlos Orphão Lobo

Diretor de Qualidade do Inmetro

O Programa de Certificação do Etanol

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O Inmetro - Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, é uma autarquia federal, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, e tem por objetivo criar uma infra-estrutura, um ambiente de confiança nas medições e na conformidade de produtos e serviços em relação a normas e regulamentos. A contribuição do Inmetro ao desafio da internacionalização do etanol está na criação do Programa de Certificação de Etanol, em 2006. O Inmetro vem desenvolvendo algumas linhas de ação na questão do etanol. Em primeiro lugar, os padrões metrológicos de referência. Essa é uma das razões de ser do Inmetro – que atua no campo da confiança das medições, definindo o padrão de referência para o mercado, de como seria um etanol com o maior grau de pureza possível. Além disso, estamos em articulação com o NIST, o congênere do Inmetro nos Estados Unidos, com a ANSI, entidade normalizadora americana, com a DIN, entidade normalizadora alemã e com a ISO, unidade normalizadora internacional, desenvolvendo um trabalho que possa criar uma norma técnica que defina os padrões e a especificação do etanol. Na fase inicial do Programa de Certificação, estamos tomando por base o regulamento da ANP - Agência Nacional do Petróleo. Mas, como temos em vista a idéia da internacionalização, estamos perseguindo o estabelecimento de uma norma de especificação do etanol internacional. Existem, pelo menos, 50 iniciativas no mundo de criação de programas de certificação e, obviamente, o Brasil também precisa do seu próprio programa. Já desenvolvemos alguns padrões de referência do etanol, que foram intercomparados com os padrões desenvolvidos pelo NIST. O nível de confiança na medição alcançado pelo nosso padrão foi similar ao desenvolvido pelos americanos. Gostaria de destacar os quatro objetivos do Programa de Certificação. O primeiro é atestar a conformidade, um fator importante para o acesso a mercados. A idéia é atestar que o etanol brasileiro atende a requisitos de sustentabilidade sociais, ambientais e econômicos, que, de preferência, sejam de consenso internacional. Exatamente por isso, um dos componentes do Pro-

grama de Certificação é o impacto ambiental do processo produtivo. O segundo objetivo é evidenciar que a utilização do etanol produzido com cana-de-açúcar reduz a emissão dos gases de efeito estufa, contribuindo para a mitigação das mudanças climáticas. Em terceiro lugar, está a valorização da imagem do etanol brasileiro no mercado nacional e internacional. E, por fim, nosso quarto objetivo é pautar as discussões internacionais. Entendemos que é importante que o Brasil não fique à margem dessas discussões e, na condição de possível grande exportador, é fundamental que pautemos essas discussões, ao invés de sermos pautados. A iniciativa de criar um Programa de Certificação é absolutamente fundamental para que o Brasil possa discutir, no mínimo, de igual para igual, com outros players internacionais. O Programa de Certificação vai avaliar a qualidade intrínseca do etanol, tomando por base os requisitos estabelecidos pela ANP para as propriedades físico-químicas daquele produto. Além disso, irá analisar o impacto socioambiental do processo produtivo e atestar o fator de redução de gases de efeito estufa. Estamos estudando metodologias internacionais, que avaliam a emissão de gases de efeito estufa - GEE. A idéia é disponibilizar estas metodologias, treinar e formar uma massa crítica de profissionais no Brasil. Estamos também fazendo parcerias com universidades, no sen-


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tido de desenvolvermos um banco de dados para atestar o fator de redução dos GEEs. Queremos evidenciar que o etanol é muito mais vantajoso que os combustíveis fósseis. As estratégias que estão norteando o desenvolvimento desse programa estão no estabelecimento de requisitos socioambientais, no que diz respeito ao seu rigor, buscando um equilíbrio entre a necessidade de atrair produtores nacionais para o programa e, ao mesmo tempo, buscar reconhecimento internacional. Esse é o nosso grande desafio. Desde 2007, temos negociado com o setor produtivo e com a Unica, de forma a estabelecer um nível adequado de rigor nos requisitos socioambientais. Esses requisitos não podem ser estabelecidos de forma muito rigorosa, provocando a perda de atratividade na certificação, na maior parte dos produtores nacionais. Ao mesmo tempo, não podemos estabelecer requisitos frouxos, porque de nada adiantará criar um Programa de Certificação no Brasil, que não alcance reconhecimento internacional. Já realizamos dois painéis em Xerém, sede do Inmetro, envolvendo mais de 250 partes interessadas, com o desafio de estabelecer o nível de rigor desses requisitos socioambientais. A idéia é trabalhar com requisitos evolutivos, que sejam considerados uma boa prática internacional de certificação; ou seja, estabelecer, em um determinado nível, sinalizando a idéia de se buscar uma evolução gradativa, em função da resposta do setor. Outra estratégia é realizar algumas experiências piloto, ainda este ano, de preferência uma no estado de São Paulo, outra no Centro-

-Oeste e outra no Nordeste, para testar a rigidez desses requisitos e fazer as adequações devidas. Ainda neste ano, os organismos creditados pelo Inmetro farão as certificações, em caráter piloto, de forma a viabilizar ajustes. Basicamente, o Programa de Certificação tem três documentos. Um define como deverá ser conduzido o processo de certificação, em relação à questão das propriedades físico-químicas e socioambientais do processo produtivo. É um documento básico, que tem dois anexos. Um define os princípios, critérios e indicadores, nos quais basearemos a medição e a avaliação do cumprimento daqueles princípios. O outro anexo define os requisitos físico-químicos para a análise do etanol combustível. Selecionamos, nessas discussões, quatro princípios fundamentais: • Racionalidade no uso de recursos naturais em busca da sustentabilidade; • Proteção, recuperação e conservação da biodiversidade; • Respeito às águas, ao solo e ao ar, e • Respeito às questões trabalhistas, previdenciárias e de saúde e segurança do trabalhador. Esses princípios são divididos em critérios que, por sua vez, são subdivididos em indicadores, nos quais basearemos a avaliação e o cumprimento dos quatro princípios iniciais. Neste momento, estamos em consulta pública dos procedimentos de avaliação da conformidade, chamada de RAC para Etanol Combustível. Quem quiser conhecê-la, pode acessar o site do Inmetro, onde também poderá criticá-la e mandar contribuições para o programa. Estamos também elaborando um projeto para a avaliação da cadeia de custódia, já que o etanol sairá certificado da usina, mas precisará chegar, de forma confiável, ao porto de destino e passar por todos os trâmites e processo durante este final de ano. A nossa expectativa é que possamos ter o documento publicado, em caráter definitivo, já no inicio de 2009. O Brasil possui uma boa experiência em programas de certificação. Temos um Programa de Certificação de Florestas e a Certificação de Cadeia de Custódia do Setor Madeireiro, que avalia a qualidade intrínseca do produto e o impacto socioambiental do processo produtivo. Durante a gestão do Ministro Roberto Rodrigues, tivemos a oportunidade de desenvolver um Programa de Certificação de Cachaça, que também avalia as propriedades físico-químicas do produto, bem como a variação do impacto socioambiental. Hoje, são cerca de 29 marcas de cachaça certificadas, que aumentam significativamente suas expor-tações por conta do selo de conformidade. Temos também outro Programa de Produção Integrada de Frutas, que avalia, essencialmente, o processo produtivo e a rastreabilidade da produção. A grande experiência do Brasil em programas como esse está sendo considerada e contribuindo, decisivamente, para a criação do Programa de Certificação de Etanol.

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Logística Charles Siqueira Labrunie

Gerente de Dutos, Terminais e Oleodutos da Transpetro Precisamos quebrar paradigmas

Vivemos um momento de transição e a quebra de alguns antigos paradigmas faz-se necessária. A indústria sucroalcooleira está em evidência e precisa adaptar-se a novas formas de trabalho. Preocupa-me, por exemplo, quando a BM&F estabelece, em seus contratos, que o álcool a ser exportado tem que ser entregue no terminal de Santos “sobre rodas”. Nós que trabalhamos com dutos, pensamos: “aí está um paradigma que precisa ser quebrado.” Assim, começo minha explanação, falando exatamente de como os dutos funcionam. A cadeia do etanol começa na usina, vai para a empresa distribuidora, depois para os dutos, para os terminais, para os navios e para o mundo. Existem centros coletores junto às usinas, que levam o produto aos terminais de embarque e aos navios. Muito se fala sobre pesquisa na produção, mas escuto muito pouco sobre pesquisas na área logística. É um ponto esquecido quando se fala na questão da exportação. Toda a cultura da cana-de-açúcar é voltada para o mercado interno. Precisamos

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lembrar que, ao colocar o produto nos Estados Unidos e na Europa, 10 a 30% do preço será destinado a pagar custos logísticos. Temos duas diretorias. Uma responsável por operar os dutos de líquidos e outra pelos dutos de gás. São quase 8.000 km de dutos líquidos e 4.000 km de gasodutos. Até o final deste ano, inauguraremos mais um duto na Amazônia, na região de produção de Urucu, que transportará gás de cozinha até Manaus. Hoje, temos treze terminais operando com etanol e dois polidutos que transportam etanol. Percebemos que o setor não conhece a questão do livre acesso aos dutos. Eles pertencem a Petrobras e são operados pela Transpetro, mas quem quiser pode transportar por eles, assim como em uma estrada. Por exemplo, o Terminal de Maceió é um grande exportador, principalmente de álcool químico, onde somos responsáveis por 15% das exportações brasileiras. O corredor da Replan, que já está em funcionamento em Paulínia, é um grande concentrador para o recebimento de álcool da região produtora no estado de São Paulo. Essa facilidade já está disponível e, se alguém quiser transportar álcool por ele, já pode fazê-lo. Estamos construindo um novo corredor para escoar o produto por São Sebastião, que será o segundo ponto de escoamento da produção da região de São Paulo. Já exportamos também por Maceió e Paranaguá. Alguns produtores do Paraná aproveitam o poliduto para transportar álcool junto com outros derivados e para distribuir a produção no Sul do Paraná e em Santa Catarina. A história da Transpetro no transporte do etanol: Em 1976, a Petrobras criou a primeira força tarefa para estudar as operações de mistura álcoolgasolina. Em 1978, foi iniciado o sistema de distribuição com a instalação de 35 bombas de etanol, nos estados de São Paulo e do Rio de Janeiro. Em 1982, a Petrobras aumentou o seu escopo e passou a atender aos mercados nacionais e internacionais de etanol. Nessa mesma época, a Petrobras concluiu os planos de transporte de etanol via costeira. Em 1997, foi encerrado o monopólio da Petrobras e criada a Transpetro.


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Em 2005, voltamos a trabalhar na logística do escoamento de álcool, que esteve um pouco parada, devido à baixa produção no país. Desde 1976, transportamos etanol em dutos, um trabalho único no mundo. Constantemente, recebemos visitas para conhecer como desenvolvemos este sistema de logística. Com relação ao volume de etanol transportado por polidutos, em 1997, chegamos a 3 milhões de m³, representando 21% do volume total transportado. Se compararmos com os volumes de hoje, menos de 500 mil m³, representando 2% do volume total, podemos observar o grande potencial disponibilizado ao transporte de álcool. Ainda em 2010, planejamos atingir 2 milhões de m³, representando 6% do volume total, entre 3 e 3,5 milhões, em 2011; e, acima de 4,5 milhões, em 2012, o que representará algo ao redor de 11% do volume total transportado. Em 1997, o etanol representava quase 70% dos produtos transportados por poliduto no Corredor Rio de Janeiro, chegou quase a zero em 2003, hoje representa 40%, e planejamos que até 2012 dediquemos 100% dessa facilidade ao transporte de etanol. O sistema Osrio e Osplan vai de Paulínia ao Rio de Janeiro, tem 16 polegadas de diâmetro, soma 525 km de comprimento e transporta anualmente cerca de 55 mil m³ de etanol. O Opasc, com 10 polegadas e o Osvat, com 22 polegadas, têm, respectivamente, 270 e 100 km, e transportam anualmente, cada um, 30 mil m³ de etanol. Os sistemas Obati mais o Opasa, levam produtos para Barueri, têm 14 polegadas, juntos, somam 250 km, e

transportam anualmente 10 mil m³. O Osplan tem um segundo segmento na linha para o Rio de Janeiro, com 160 km de comprimento e 24 polegadas de diâmetro; transporta, aproximadamente, 8 mil m³ de etanol. O sistema Olapa, com 12 polegadas de diâmetro, 100 km de comprimento, transporta anualmente cerca de 3 mil m³ de etanol. Esses são os principais dutos utilizados no sistema para o transporte de etanol. A experiência da Transpetro: Estamos trabalhando em uma vasta gama de assuntos relacionados ao etanol, como a garantia da contaminação “água zero” e a adequação do seqüenciamento de bateladas nos dutos - no qual o etanol anda junto com gasolina e diesel. Outra questão que tem exigido grande cuidado é o controle de corrosão – o transporte do etanol por dutos foi muito questionado, principalmente, pelos americanos, com a alegação de que ele causaria sérios danos ao sistema. Operamos há 30 anos e nunca tivemos problemas em nossos dutos. Mas, de qualquer forma, o Centro de Pesquisa da Petrobras detectou que, ao contrário do etanol de cana, o etanol de milho causa, realmente, problemas aos dutos. Na linha da busca da garantia da não contaminação, trabalhamos também no desenvolvimento de tetos e coberturas para os tanques existentes. Buscamos ainda soluções para o gás inerte para tanques, em razão do aumento da acidez no transporte em navios de maior porte. Trabalhamos também no desenvolvimento de operações de mistura, no manuseio e tratamento de interfaces, e nas necessidades especiais de combate a incêndio, compatibilidade dos materiais, dentre outras ações. Logística para a exportação do etanol: Temos uma grande competitividade na produção de etanol. Entretanto, é necessário que consolidemos um sistema de transporte confiável, eficiente e tecnologicamente atualizado, para que nos livre dos engarrafamentos em estradas e portos e reduza os custos reais para fazer o produto chegar ao mercado final. Isso vale para o Brasil e para todos os outros países que queiram começar a produzir o etanol. Estamos trabalhando também em grandes projetos na Hidrovia do Tietê, navios e em terminais no exterior. Com o objetivo de dar maior segurança de fornecimento ao consumidor, a Petrobras comprou duas refinarias, uma em Pasadena e outra, mais recentemente, no Japão - que é, na realidade, um terminal com uma refinaria anexa. Utilizaremos estes dois sistemas para nossa logística de criar estoques junto ao consumidor e garantir três quesitos. Em primeiro lugar, o consumidor quer ter certeza que trocará sua matriz energética por um produto que manterá a competitividade. Em segundo, o consumidor quer ter a garantia de que a sua produção é sustentável e que não esteja vinculada a problemas ambientais e trabalhistas. E por último, o consumidor quer ter a segurança de que o suprimento é confiável.


Muitas vezes, não consideramos a questão da segurança energética, mas sabemos o quanto custou ao Brasil a falta de energia. Os outros países estão muito conscientes disso e pensarão muito, antes de mudar a sua matriz energética. Colocar um sistema de armazenamento junto no país consumidor, dá a ele uma tranqüilidade maior de que o produto estará ali quando for preciso. Estabelecemos algumas linhas mestras para a consolidação da nossa estratégia. No que se refere à estruturação de uma maior competitividade, estamos instalando terminais marítimos e navios de grande porte. Para a garantia de suprimento no serviço porta a porta, estamos buscando disponibilizar grandes volumes nos locais de consumo. Para a redução dos custos logísticos, planejamos uma maior utilização do sistema de dutos.

Temos três corredores de exportação. O de São Paulo – que se inicia em Senador Canedo, Araçatuba e Oeste do Estado, na divisa com o Mato Grosso, incluindo o sistema hidroviário, que descerá para São Sebastião, com capacidade instalada prevista de 12 milhões de m³. O do Rio de Janeiro, com capacidade instalada de 4 milhões de m³. O corredor Sul, que sairá por Paranaguá, com capacidade para 4 milhões de m³. Totalizando, em 2015, um volume de 20 milhões de m³. Um sistema muito interessante a ser implantado em macrorregiões produtoras de etanol, com grande concentração de usinas é o conceito da Coleta Dutoviária de Produção, que é a interligação das usinas por dutos, utilizando material plástico, formando uma malha, ligando a rede a um duto troncal. Esse sistema é muito utilizado na indústria de petróleo que tem campos de produção muito espaçados. O campo de Urucu, por exemplo, é, na realidade uma área de, aproximadamente, 50 km de raio, onde temos todos os pontos interligados a um duto troncal, que leva ao terminal. Trata-se de um projeto que poderá ser utilizado na região de Ribeirão Preto, devido à grande concentração de usinas, bem como nas novas regiões das fronteiras de expansão - nas quais estão sendo planejadas a instalação de complexos de usinas próximas, para baratear o custo da logística da usina até o alcoolduto.


Cogeração Jairo Menesis Balbo

Diretor Industrial da Usina São Francisco

A mundialização do etanol aumenta a oferta da bioeletricidade

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Anualmente, no Brasil, entram no mercado de trabalho 3,2 milhões de jovens. O ganho de produtividade e as inovações tecnológicas colocam nesta mesma fila da procura de emprego 460 mil brasileiros. Para atender a esse contingente seria necessário gerar 3,6 milhões de vagas a cada ano. O PIB, para atender a essa demanda, tem que ser igual ou maior do que 5%; e sabemos que com a nossa infra-estrutura, o risco de apagão total ou de apagão em nível de energia elétrica está em torno de 4% desse crescimento. Energia e geração de empregos: Para cada 1% do PIB, precisamos de 1,2% de energia. Na Europa, esse valor já é de 0,9%, devido ao estágio de equilíbrio que eles atingiram. Observamos que no Brasil o consumo por pessoa é 2.121 kWh/ano, na França 6.797 kWh/ano, na Austrália 9.666 kWh/ano, nos Estados Unidos 12.643 kWh/ano e, no Canadá, cerca de 7,5 vezes mais que o Brasil, com 15.815 kWh/ano. Temos, no Brasil, uma qualidade de vida inferior a desses países. Doze milhões de brasileiros vivem sem energia. A taxa média de desemprego no Brasil é de 12%, com picos, como é o caso da Grande São Paulo, de 17%. Para a geração dos 3.660.000 novos empregos necessários a cada ano, o PIB teria que crescer 5% ao ano. Para que isto pudesse ser realizado, teríamos que gerar, a cada ano, 6% a mais de energia. Ou seja, precisaríamos gerar 3 mil MW a mais de energia a cada ano 12 mil MW a cada 4 anos, o equivalente a construir uma Itaipu neste período, se quiséssemos garantir o pleno emprego. Desenvolvimento: Nos últimos 25 anos, crescemos em média 3% ao ano. Qualquer valor abaixo de 5% representa que muita gente não foi atendida com o emprego necessário. Isso é sinônimo de subdesenvolvimento. Na época do apagão, de 2001 a 2003, o PIB cresceu, em média, 1,1% ao ano, abaixo do crescimento da população, de 1,4%. É fundamental que se

invista em infra-estrutura - portos, estradas, aeroportos, energia, etc, para que consigamos voltar a crescer nos percentuais que temos necessidade. Um dos poucos negócios auto-suficientes em energia elétrica é o sucroalcooleiro, pois a usina, além de não precisar de energia, gera um significativo excedente na rede. O setor, que cresce 1% do PIB a cada ano, precisa de zero de energia. O desenvolvimento poderá ser limitado à energia elétrica disponível e um menor desenvolvimento piora a qualidade de vida da população, gerando queda de produção de bens e, conseqüentemente, desemprego. Sem energia não cresceremos e ficaremos mais pobres. Parque Gerador: A capacidade geradora instalada no Brasil é de 96,5 mil MW médios e a capacidade para suprir a carga de eletricidade é de 58,5 mil MW médios. Em 2030, precisaremos ter 130 mil MW instalados, e, segundo a Empresa de Pesquisa Energética – EPE, 88 mil MW virão das usinas hidroelétricas, 12 mil MW das termoelétricas - queimando gás natural, 5 mil MW das usinas termonucleares, 7 mil MW das PCHs, 1 mil MW do lixo, 5 mil MW dos ganhos de produtividade, e, destaco: 7 mil da biomassa da cana, através da colheita de 1,4 bilhão de toneladas de cana. O setor sucroalcooleiro tem, aproximadamente, 400 unidades, das quais 10% com excedentes e capacidade total atual de 2.810 MW de geração, com cerca de 600 MW excedentes. Investimentos necessários: Para que não tenhamos racionamento de energia elétrica, o Brasil requer o investimento em geração-transmissão-distribuição de US$ 15 bilhões anuais, a partir de 2004, e destinados a operações de US$ 40 bilhões nos próximos 10 anos. Como conhecemos as dificuldades dos recursos públicos, a iniciativa privada é a melhor saída. O racionamento é aceito pelo sistema em 5%. Em 2007, foi estimado 25% no Sudeste, e acabou havendo; só que passou despercebido, através de um menor crescimento e de todo o problema que aconteceu com o gás. E, para 2008, em 50%, que, com o regime de chuvas, foi amenizado, mas a situação já está começando a se complicar novamente. Outro grande problema são os projetos de hidroelétricas que estão dependendo de licença do Ibama, envolvendo a geração de cerca de 7.600 MW de energia. O custo do déficit energético no Brasil é de, aproximadamente, R$ 3.000 por 1 MW, ou seja, é muito mais barato investir em infra-estrutura do que pagar o custo pelo déficit. Em 2001, durante o racionamento, o custo foi de R$ 640 por MW - em valores não corrigidos. No racionamento via preço, quem pode pagar, leva. Quem não pode, diminui o consumo. Podemos concluir que a energia mais cara é a que não temos.



Opiniões

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O racionamento e a falta de energia têm como conseqüência a redução de competitividade de produtos brasileiros no exterior, a redução do ritmo de desenvolvimento econômico, o aumento do preço das mercadorias e de serviços e a piora do IDH - Índice de Desenvolvimento Humano. A Argentina é um exemplo do que não devemos fazer no Brasil. Ela estava crescendo de 8% a 9% ao ano. Com o racionamento, as grandes empresas foram limitadas a consumir o mesmo valor da energia consumida em 2005 e o baixo valor das tarifas desestimulou completamente os investimentos no setor de energia elétrica no país. Desde 2001, não há investimentos. Os últimos grandes projetos em energia, na Argentina, foram feitos em 1990 e, para se ter uma idéia, a conta de luz média da família argentina é de US$ 10 por kW, o que afugenta qualquer investidor. A energia do mundo: Temos duas questões em relação à energia no mundo: Como é possível aumentar a oferta de fontes e como fazer isto sem colocar em risco o planeta? Hoje, no mundo, 1,5 bilhão de pessoas estão sem acesso à energia e terão que entrar no mercado. Grande parte dessa demanda está na China, que usa a fonte mais poluente de energia, o carvão. Na África, em grandes regiões, apenas entre 10% e 35% da população tem acesso à energia, fazendo com que o consumo per capita equivalha a 1/15 do consumo dos Estados Unidos. Já na Europa, 50% dos suprimentos vêm de países estrangeiros, principalmente da Rússia. França e Alemanha são menos dependentes, mas utilizam muita energia nuclear. O crescimento estimado da demanda global por energia, entre 2005 e 2030, será de 55%. Desse aumento, 84% virá dos combustíveis fósseis. Para estabilizar a concentração de CO2 na atmosfera em 450 partes por milhão - nível considerado seguro pelos cientistas, seria necessário cortar 19 bilhões de toneladas do gás, o que é mais do que as emissões de todos os países industrializados somados em 2005. O carvão mineral terá um salto de 73% na demanda, passando a responder por 28% da energia mundial em 2030, contra 25%, em 2005. O aumento estimado nas emissões de gases de efeito estufa no mesmo período é de 57%. Estados Unidos, China, Rússia e Índia responderão por dois terços das emissões globais. Já em 2015, 50% de toda emissão de CO2 virá da China, dos Estados Unidos e da Índia. O uso da energia nuclear é muito mais forte do que imaginamos. O grau de dependência da França é de 78%, da Bélgica de 60%, do Japão de 34% e da Alemanha 33%, enquanto no Brasil, representa apenas 3% da nossa matriz. A energia no Brasil: Os produtos da cana-de-açúcar já passaram a energia hidráulica, com 16,0% contra 14,7%. Na energia elétrica, a representação do setor sucroalcooleiro está crescendo, com investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias e, dependendo do preço a ser pago pela geração de excedentes, as usinas entrarão de forma definitiva nesse mercado.

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As usinas já fazem cogeração de energia, há mais de cem anos, e o que fizemos na Usina São Francisco, em 1987, foi interligar nosso sistema ao sistema nacional, trabalhando juntamente com a CPFL. A cana é uma alternativa energética limpa, renovável e brasileira. É também uma das máquinas mais eficientes da natureza para estocar a energia do sol. A energia da cana é dividida em três partes: 1/3 da energia está no caldo, que fabrica açúcar e álcool; 1/3 da energia são folhas e pontas - que estudamos como utilizá-las melhor, mas ainda há muito o que fazer, e 1/3 da energia é bagaço. Uma tonelada de cana tem de 250 a 275 kg de bagaço, sendo que 1 kg de bagaço gera 2 kg de vapor e 1 kW precisa de 10 kg de vapor. Vantagens da cana: Uma das principais vantagens da geração de energia elétrica com resíduos de cana é permitir a correção da oferta sazonal de hidroeletricidade, uma vez que a safra do setor sucroalcooleiro coincide com o período de seca, no qual há escassez de geração de energia das hidrelétricas. Hoje, o sistema vende energia pela energia firme, e a safra de cana coincide com a seca, quando as represas diminuem seus volumes e, então, entramos com a nossa energia. Essa é a importância da energia cogerada da biomassa. Cada 1.000 MW de bioenergia permite elevar em 4% o nível dos reservatórios, onde a energia da biomassa substitui a energia hidráulica. Já existe amplo domínio da tecnologia para cogeração e interligação dos sistemas de fornecimento. É uma tecnologia brasileira e: oferece emprego em todo o interior do país e a manutenção dos atuais postos de trabalho, com o fornecimento de energia; o custo dessa energia não depende do risco cambial e do preço internacional do petróleo; promove o desenvolvimento das indústrias de base brasileiras; oferece a perspectiva de preços decrescentes, diretos e indiretos, para outros energéticos como o etanol, agregando valor à cana-de-açúcar; tem um efeito ambiental positivo, com a redução do nível de emissão de CO2; para seu suprimento, a unidade cogeradora passa a ter menores perdas elétricas. A geração de energia térmica é mais confiável que a linha elétrica, porque sofre menores intervenções das condições atmosféricas, dando equilíbrio ao Sistema Energético Brasileiro, que é 95% hidráulico. O investimento para cada kWh instalado a partir do bagaço de cana é de, aproximadamente, US$ 1.000,00, além de não necessitar investir em linhas de transmissão, pois a cana está, geograficamente, distribuída ao longo do consumo. Esse valor oscila muito, pois cada projeto tem suas peculiaridades. De toda forma, para comparar, o investimento na energia nuclear chega a US$ 8.000,00. Concluindo, com a internacionalização do etanol, podemos aumentar a oferta de fontes de energia elétrica da biomassa (bagaço), aumentando a participação da bioeletricidade na matriz energética e, o melhor, sem colocar o planeta em risco.



Biocombustíveis Júlio César Pinho

Petrobras Biocombustível O desenvolvimento dos biocombustíveis no Brasil

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O Brasil destaca-se globalmente pelo alto nível de sustentabilidade e de renovabilidade, principalmente da nossa matriz energética, que em grande parte vem do setor sucroalcooleiro. Ela tem, praticamente, 45% da sua composição de fontes renováveis - contra os 13% da média mundial, devido à fortíssima representação do setor hidrelétrico e sucroalcooleiro. O Brasil é, atualmente, o segundo maior produtor de etanol no mundo. Hoje, a produção de etanol divide-se da seguinte forma: América do Sul com 38%, América Central e do Norte com 37%, Ásia com 16% e Europa com 9%. Primeiramente, faremos um overview do setor sucroalcooleiro no Brasil e da energia no mundo para, depois, entrarmos na questão do que o Sistema Petrobras representa nesse setor, o que planeja fazer e quais são suas metas, onde se inclui a nova empresa Petrobras Biocombustível. Atualmente, temos três principais rotas de produção de etanol. A rota sacarina, uma tecnologia totalmente dominada no mundo, representada no Brasil pela cana-de-açúcar e mundo afora pela beterraba, arroz, trigo e várias outras matérias-primas. A rota amilácea é a utilizada pelos Estados Unidos para a produção de etanol através do milho. A produção de energia através de material vegetal pode gerar discussão e conflito com a produção de alimento. A China é um bom exemplo. Em 2001, ela desejava se tornar um player global na produção de biocombustíveis e tomou uma série de ações nesse sentido. Mas, em razão de conflitos, acabaram descontinuando o projeto e optando pela produção de de alimentos. A rota de lignocelulose, ou etanol de segunda geração, tem recebido imenso investimento e está em desenvolvimento em uma centena de centros de pesquisas no mundo. A Petrobras tem hoje uma planta-piloto em funcionamento no Cenpes, nosso Centro de Pesquisa, na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. A tecnologia de lignocelulose tem poten-

cial para revolucionar o setor e sua configuração, porque são utilizados materiais residuais da agricultura ou qualquer outra biomassa rica em celulose para produção de etanol. Com a tecnologia da lignocelulose, toda a palha de soja, de milho e de arroz, que existe na produção, por exemplo, da China, poderia ser usada para a obtenção de etanol. Essa tecnologia tem duas opções bastante diferentes, a ácida e a enzimática. A opção enzimática tem, primeiro, uma fase ácida, seguida de uma enzimática. O principal problema da ácida é a qualidade do produto e o rendimento. O principal problema da opção enzimática é o custo. Pela ácida, com uma tonelada de bagaço de cana, por exemplo, pode-se produzir cerca de 85 litros de etanol. Já pela opção enzimática, pode-se chegar a 220 litros de etanol com a mesma tonelada de bagaço. A previsão do Cenpes da Petrobras é que, em 2010, consigamos instalar uma planta de produção semi-industrial, utilizando essa tecnologia. Para cada matéria-prima e cada material celulósico utilizado, é necessária uma enzima específica para maximizar o rendimento desse processo. Pode ser, que no futuro, consigamos desenvolver uma superenzima que processe palha de soja, bagaço de cana e cavaco de madeira. Mas, ela ainda não existe. A Petrobras assinou uma parceria com a Novozymes, uma das maiores produtoras de enzimas do mundo, para desenvolver uma enzima específica para o bagaço de cana. A vantagem da cana sobre as outras opções é que ela está muito centralizada e não haveria um custo logístico muito grande para a implantação desse processo. Essas diretrizes fazem parte do Plano Nacional de Agroenergia 2006-2011 e tem algumas questões muito relevantes, como: o desenvolvimento da agroenergia no Brasil, a agroenergia e a produção de alimentos - de forma complementar e não competitiva, o desenvolvimento tecnológico, a autonomia energética comunitária, a geração de emprego e renda, a otimização do aproveitamento de áreas antropizadas e das vocações regionais, a liderança no comércio internacional de biocombustíveis e a aderência à política ambiental. Em relação ao desenvolvimento tecnológico e à autonomia energética comunitária, esse documento levanta uma questão importante: a de que deveríamos empenhar esforços no sentido de criar alternativas tecnológicas para uma produção descentralizada de álcool, de forma a promover a inserção econômica e social da pequena produção de etanol. Gostaria de enfatizar também a questão da aderência à política ambiental. A Petrobras acompanha e faz parte de alguns fóruns mundiais que estão discutindo a questão da susten-



Opiniões

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tabilidade da produção de biocombustíveis e, conseqüentemente, a sua certificação. Somos companheiros da Unica em um desses fóruns que teve origem na Suíça, o Round Table on Sustainable Biofuels, que chegou a um documento final, uma versão zero, que foi publicada e comunicada à imprensa. Represento a Petrobras nesse fórum e sou testemunha da ativa participação que a Unica teve na versão final do documento. Hoje, não há como fugir da questão ambiental, que está em pauta no mundo todo. É uma discussão importante e precisamos fazer um grande esforço para participar desses fóruns e levar a nossa opinião, visão e posicionamento, de forma muito consistente. Não temos espaço para uma posição passiva e secundária nessa discussão global, porque somos grandes produtores de etanol no mundo e seremos ainda mais de biodiesel. A estratégia da Petrobras no segmento de biocombustíveis é atuar, globalmente, na comercialização e logística de biocombustíveis, liderando a produção nacional de biodiesel e ampliando a participação no negócio de etanol de diversas maneiras. Entre 2008 e 2012, a Petrobras prevê o investimento de US$ 1,5 bilhão em projetos de biocombustíveis, envolvendo produção e transporte, sendo 46% desse valor para dutos e alcooldutos, 29% para biodiesel, 25% para as demais atividades, onde se inclui o H-Bio - um diesel que utiliza fontes renováveis na sua composição (óleos vegetais como o de mamona, girassol, soja, ou dendê), mas tem as características físico-químicas finais semelhante às do óleo diesel mineral. A Petrobras tem como metas corporativas para o segmento de negócios de etanol, sair de uma exportação, em 2008, de 500 mil m³, para 4,7 milhões de m³, em 2012, com um crescimento de 75% ao ano. Temos um conjunto de investimentos que está em análise na companhia para produção de etanol. A Petrobras assinou um acordo com a Mitsui e temos alguns projetos em análise mais avançada, e outros em fase de implementação. Os projetos de etanol são todos em parceria com a nova empresa, a Petrobras Biocombustível, e serão geridos e administrados pela Diretoria de Participações. Na Diretoria de Produção Industrial, serão geridos os projetos nos quais não há participação de sócios, ou seja, 100% da Petrobras. Por enquanto, temos apenas projetos de produção de biodiesel, que são 100% da Petrobras. Em relação ao biodiesel, nossa meta de disponibilização é de 329 mil m³, em 2008, para chegar a 1,1 milhão de m³ de biodiesel, em 2015. Falamos em disponibilização, porque a nossa preocupação é desenvolver projetos que sejam 100% da Petrobras e projetos em parcerias. Hoje, a Petrobras é a principal compradora de biodiesel. Quando falamos de disponibilização, significa tanto a produção própria da Petrobras, quanto a produção de biodiesel que será comprada pela companhia, através de leilão ou de contratos com empresas produtoras no Brasil.

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Agricultura familiar: A Petrobras apoiou uma cooperativa do Rio Grande do Sul na implantação de um projeto de agricultura familiar, para verificar a sua viabilidade. O projeto contempla nove microdestilarias, com capacidade de produção de 500 litros/ dia. Existe uma unidade retificadora central, colocada para garantir a especificação do produto. O projeto é muito diferente, porque a plantação de cana é feita de forma consorciada com a produção de alimentos. Quando a cana é cortada, pode-se plantar, no meio das ruas da soqueira, milho, girassol, abóbora, e uma série de produtos com ciclo vegetativo rápido, de 3 a 4 meses. Antes que a cana cresça e forme uma cobertura para aquela produção secundária, o agricultor procede à colheita da cultura consorciada. O bagaço é utilizado não só para a geração de energia, mas como fertilizante e como alimento animal, porque na microdestilaria, o coeficiente de extração do caldo é da ordem de 70% - muito menor que o da moenda da usina, com um aumento de 20% da produção de leite. Biodiesel: A Petrobras tem duas plantas-piloto de produção de biodiesel, localizadas em Guamaré, no Rio Grande do Norte, e três plantas industriais, localizadas em Quixadá, Candeias e Montes Claros. O importante nessas plantas-piloto, para o setor sucroalcooleiro, é que, hoje, praticamente toda a produção de biodiesel no Brasil é feita utilizando metanol. A Petrobras está desenvolvendo duas tecnologias: uma tradicional, cujo objetivo é ter uma tecnologia nacional, para que não tenhamos que comprar tecnologia estrangeira toda vez que instalarmos uma planta de biodiesel. Na segunda planta-piloto, o objetivo é fazer o processo de transesterificação, não a partir do óleo, e sim da semente. Isso é importante para a produção de biodiesel, porque, quando montamos um projeto de biodiesel, temos, basicamente, duas sessões, a de esmagamento e a de transesterificação. O maior investimento que se faz é na sessão de esmagamento, para pegar o grão ou a semente, esmagar e tirar o óleo. Na tecnologia que estamos desenvolvendo, não é preciso esmagar a semente para retirar o óleo, é preciso apenas quebrar a semente e provocar uma fissura no grão, para que o reagente possa entrar e fazer a transesterificação e, depois, com a centrifugação, tira-se o produto final. Estamos desenvolvendo tecnologias que utilizarão o etanol como catalisador para o processo. Nas plantas de Guamaré foram investidos R$ 20 milhões, produzem 20,4 milhões de litros por ano e envolvem 5.200 famílias. Nas plantas de Quixada, Candeias e Montes Claros foram investidos R$ 227 milhões, produzirão 171 milhões de litros por ano e envolverão cerca de 70 mil famílias. Já existem mais de 6 mil postos, da BR Distribuidora, vendendo biodiesel no Brasil.




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