O Perú Molhado

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Sandro, Sandro, por que me persegues? Por Vilmar Madruga

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caminho de Damasco, o apóstolo Paulo quando ainda um contumaz perseguidor de cristãos chamado Saulo, foi atingido por uma luz e perdeu a visão ouvindo dos céus uma voz: Saulo, Saulo, por que me persegues? Não sei por que cargas d’água esta passagem bíblica sempre me vem à mente toda vez que leio os artigos do meu bom e velho amigo Sandro Peixoto nas páginas do Perú. Em geral eles metem o pau nas igrejas evangélicas, apesar de nosso grande Sandro afirmar ter igual nojo de todas as outras religiões. Assim como ele detesta religião, tenho uma especial admiração pelos ateus. Prefiro um ateu convicto a um religioso equivocado. Existem templos na Índia, por exemplo, que adoram ratos. Os altares são cheios de camundongos para quem a famosa Insetizan soaria como uma espécie de Gestapo. Mas, teologicamente desconfio que Sandro não é ateu. Ou pelo menos não um ateu genuíno. Na cultura cinematográfica, por exemplo, cineastas como Buñuel de Viridiana ou do Discreto Charme da Burguesia e mais recentemente Martin Scorzese da Última Tentação de Cristo, abordam a questão Deus (que Sandro escreve com minúscula) com um tratamento que se poderia chamar de herege. O tema é colocado sob uma visão critica onde o cristianismo é pincelado como um ato de alienação das massas e o exercício da fé uma catarse para camuflar um lado doentio e reprimido, cheio de taras e desvios comportamentais da raça humana. Em comum uma tendência clara em esvaziar a figura do Deus encarnado através de Jesus, atribuindolhe conotações políticas, levantando suspeita sobre sua divindade, sexualidade e até mesmo casandoo com Maria Madalena como sugere o Código Da Vinci, de Dan Brown. Seriam Buñuel, Scorzese ou Pasolini ou mesmo intelectuais como Sandro ateus? Não acredito. O verdadeiro ateu não está nem aí para as questões de divindade não importando seu endereço de origem. O italiano Antonioni de Blow-Up sim me parece não ver nada além do aqui e agora. E, já que estamos falando em aqui e agora preciso discordar do Saulo, perdão Sandro, quando diz que quanto mais religiosa uma nação mais atrasada ela é. Pelo menos não é o que tem demonstrado ao largo da história países de universidades protestantes como Harvard, Oxford, Princeton, Yale e até o nosso Mackenzie. Durante muitos anos dei aulas de arte em favelas e prisões do Rio de Janeiro. Vi presos freqüentando cultos evangélicos para ganhar progressão de pena,

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mas também vi gente que realmente mudou de vida, largou o crime, abandonou o vicio ou o tráfego e realmente virou crente, para alegria de mulher e filhos e para o ódio e a condenação dos descrentes na mais ampla concepção do termo. Quem poderá dizer que Fernandinho Beira-Mar, a exemplo do ladrão crucificado ao lado de Jesus, não está genuinamente arrependido e disposto a viver debaixo deste favor imerecido? Não muito tempo atrás, a revista Veja publicou pesquisa onde revela que as igrejas católicas e evangélicas fazem em muitas comunidades pobres brasileiras o papel do estado, não só em situações trágicas como durante as enchentes, mas suprindo regularmente as camadas menos favorecidas levando alimentos para o corpo e até para a alma. Há muitos mais tons de cinzas nas questões que envolvem o exercício da fé, do que pode imaginar a vã filosofia. Homofobia é crime seja ela praticada por um político evangélico ou por um estudante da zona sul. É lícito sim, condenar as práticas mercantilistas ou doentias de pastores corruptos ou padres pedófilos. Mas não se pode jogar a criança fora junto com a água do banho. A manipulação da fé deve ser tão condenável quanto a manipulação da informação como aconteceu esta semana com a futura candidata a presidência Marina Silva. Um jornalista anunciou o enterro político de Marina dizendo que ela se alinhara ao Pastor Feliciano. Marina diz simplesmente que muito da animosidade em relação a ele vinha do fato do mesmo ser evangélico. Isto é apenas uma opinião. Não a alinha a nada. Muito menos ao paredão que em sua campanha política antecipada para minar a ala progressista de eleitores o tal jornalista tentou colocála. Esqueceu-se de que mesmo evangélica Marina é a favor da união civil de pessoas do mesmo sexo mas, contra o casamento religioso de gays por suas convicções cristãs. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Os setores cristãos com os quais tenho contato vibram com as cobranças que se fazem em relação aos crentes: - Felizmente, a sociedade ainda espera de nós equilíbrio em nossas posturas e coerência com aquilo que pregamos. Faz sentido. As igrejas sérias e comprometidas com o verdadeiro evangelho devem ser lugares para o compartilhar da fé, para o exercício do amor, da generosidade e da integridade. Igrejas deveriam ser revolucionárias, ser o palco da mudança, fazer parte da contra cultura contrariando valores distorcidos de uma sociedade à beira de um ataque de nervos. Mas, a Igreja sempre será feita por homens e se alguém encontrar uma igreja perfeita, por favor, não entre. Certamente irá estragá-la.

“O que mais me preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos sem ética. O que mais me preocupa é o silêncio dos bons” (Martin Luther King) Con­se­lho edi­to­rial Bri­git­te Bar­dot, Clau­dio Kuck, Ivald Gra­na­to, Jo­ mar Pe­rei­ra da Sil­va, Fi­no Quin­ta­ni­lha, Re­na­ta Des­ champs, Ota­vi­nho, Umberto e Clau­dio Mo­dia­no, Er­nes­to Za­bo­tinsky, Tra­ja­no Ri­bei­ro, Re­na­to Pa­co­te, Jor­ge Te­des­co, Clau­dio Co­hen, Lau­ritz Lach­man, Gui­lher­me Araú­jo, Pe­dro Pau­lo Bul­cão, Pau­lo Ma­ ria­ni, Al­ber­to Fan­ti­ni, Ma­rie Anick e Jac­ques Mer­ cier, Ara­guacy da Sil­va Mel­lo, Luis Ed­mun­do Cos­ta Lei­te, Mar­cos Pau­lo, Elie Sha­ye­vitz, Jo­nas Suas­su­na, Gló­ria Ma­ria, Ruy Castro, Heloisa Seixas, Márcio Fortes, Luiz Fernando Pedroso, Lula Vieira, Antônio Pedro Figueira de Melo, Eduardo Modiano, Ancel­ mo Góis, Etevaldo Dias, Joaquim Ferreira, Thomas Sastre, Adriana Salituro, Armando Ehrenfreund, Mário Pombo e Dr. Pormim.

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De 18 a 25 de maio de 2013 – O Perú Molhado


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