Politicas de Segurança Pública e Repercussões sobre a Infância - Relatório de Pesquisa

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130 Meu filho é o terceiro ano que vai repetir a mesma série... (Entrevistado 03). São mais agressivas [crianças filhas de usuários de drogas]. Elas acham que podem tudo, porque no tráfico eles acham que podem tudo né? Que eles podem matar, que eles podem roubar, que eles podem agredir. Então ele têm essa diferença. Mas eu tenho duas mãe ai. Assim como eu tenho crianças assim, eu tenho crianças que os pais são usuários, e que eles não gostam, entendeu? Eles não gostam. Eles são até, assim, contidos emocionalmente, por causa desse comportamento. Na escola nós falamos assim, por exemplo, eu tenho dois alunos especificamente, que ele estava ficando... ele era agressivo, hoje bem menos, agressivo e tudo dele ele ameaçava os colegas. E ai a gente foi buscar o porquê. E até então eu não sabia que ele era filho de usuários de drogas. E tudo dele era: ‘ô! venha que eu mando o meu pai ô [gesto]’ Que é matar. E ai foi a família, perceba com é... ele dizia assim: ‘ mas meu pai pode, meu pai vai, meu pai disse que qualquer coisa que ele resolve’. Então a gente teve que chamar o pai para poder conversar. Primeiro com ele também, dizendo: ‘venha cá, você sabe qual é a vida de seu pai? Você sabe o que seu pai faz?’. E ele diz: ‘sei’. E ele narra tudo. Ele diz que a avó dele manda o pai fumar dentro de casa, para a polícia não pegar ele do lado de fora. Então ele vê o pai fumando, maconha crack, entendeu? Dentro de casa. Ele via, porque agora o pai tá contido. Então ele falava tudo o que ele via. (…) Hoje com oito anos. Então a gente teve que fazer um trabalho de base, fazer um acompanhamento psicológico, então. (EPE).

Do ponto de vista dos impactos cognitivos, a autora enfatiza que os resultados das pesquisas apontam atitudes inapropriadas, maior predisposição a considerar a violência como meio de resolução de conflitos, menor pontuação em testes cognitivos e menor sucesso acadêmico. Um importante aspecto a ser considerado diz respeito ao fato de que, dado o contexto de vida e vulnerabilidade, somado ao contexto de baixa qualidade das escolas públicas, que são as mais frequentadas pelas crianças do Calabar, torna-se difícil analisar tais impactos cognitivos apenas sob a ótica destas crianças e suas (in)capacidades geradas pela violência. Considera-se efetivamente que o contexto de violência pode diminuir as possibilidades de uso da energia para o aprendizado, mas é preciso destacar a complexidade presente neste tipo de análise. Sabendo que o combate à violência se dá por meio de ações articuladas e multisetoriais, para contrastar com estes dados, é preciso destacar os esforços que a comunidade do Calabar tem empenhado em torno da oferta de serviços sociais que possam apoiar meninos e meninas. Assim a biblioteca comunitária tem modificado a relação de muitas crianças com a leitura e, por conseguinte, com sua formação cognitiva e suas etapas de desenvolvimento. Trata-se de uma ação que se opõe ao contexto de violência e vulnerabilidade e que vem produzindo bons resultados entre algumas crianças da comunidade.


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