PROTECÇÃO DE MENORES – PROTECÇÃO DE CRIANÇAS COM DEFICIÊNCIA – LIVRO - 1998

Page 18

É nesse quadro inspirador que se devem buscar as fontes da acção do movimento de pais que a partir de 1974 conduziu à criação das CERCI (Cooperativas de Educação e Reabilitação de Crianças Inadaptadas). Reforçaram as condições sociais propícias a tomada de consciência da situação de injustiça social a que se encontravam submetidos, face à desigualdade de acesso à educação escolar por parte dos seu filhos, deficientes mentais. " Após o 25 de Abril, as pessoas sentiram-se libertas para agir. Não havia alternativas para as crianças deficientes no direito ao acesso à escolaridade"

(Jaime) 11.

Os móbiles económicos não são os únicos que levam os indivíduos a agir. Eles podem ser motivados pelo prestígio, pelas amizades ou por outros objectivos materiais e psicológicos. A participação pode pois dever-se a outros factores, tais como as sanções e as recompensas, capazes de mobilizar um grupo latente. Constituem motivações colectivas que coexistindo com razões meramente individuais, constituem um móbil poderoso da acção social. Do ponto de vista sociológico, a acção conjunta dos pais, dos técnicos e dos outros agentes sociais só pode ter sido possível num quadro de referência comum. A natureza dessa acção teve de assentar numa crença comum de entendimento possível, alicerçada num equilíbrio de valores interpessoais. Segundo Moessinger (s.d: 47), "o equilíbrio de valores interpessoais constitui um elemento fundamental da organização". Embora um grupo organizado seja sobretudo um conjunto de indivíduos ligados por relações de poder, isso não impede que possam estar ligados por outros tipos de relações, nomeadamente, como no presente caso, por relações de amizade, solidariedade, ou outro qualquer interesse comum. Podemos afirmar, com alguma segurança, que a relação de interesses convergentes entre os pais e os técnicos se fundamentou, e ainda se fundamenta, num pressuposto fundamental, cujo símbolo ou meta comum se centrou na necessidade de se substituírem ao Estado, na sua incapacidade para resolver os problemas da educação especial de crianças e jovens deficientes mentais. A estas razões manifestas, outras razões latentes se devem acrescentar, ou seja, os pais provavelmente, na sua maior parte, mais do que proporcionar educação especial aos seus filhos, procuravam suprir as dificuldades do dia-a-dia, resultantes da permanência em casa, a todo o tempo, de um filho deficiente, requerendo atenção constante, para o qual não tinham respostas satisfatórias. Situação essa que se traduz, regra geral, num ambiente familiar altamente degradado.

11

As transcrições dos testemunhos recolhidos nas diversas entrevistas serão apresentados em letra tipo "carregado" ao usualmente utilizado no texto. Os inquiridos serão identificados pelo nome próprio, sempre que para isso fomos autorizados.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.