REVISTA JULHO 2019

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ISSN 2183-4768

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SUMÁRIO

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ENTREVISTA À Mesa Com António Simas

CRÓNICA João Castro "Mares e Oceanos"

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REPORTAGEM Ponto de situação "Mais vale uma SATA a voar... do que duas na mão" REPORTAGEM

com um problema de imagem"

Fórum Serviço Regional de Saúde

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CRÓNICA

REPORTAGEM XVIII Concurso Micaelense Raça Holstein Frísia Jorge Rita quer "casar" a Agricultura com o Turismo

Creusa Raposo

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"A Casa Nobre de Arrifes"

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Jorge Corrêa "A Energia Nuclear: Uma solução verde

"Uma História sem Fim"

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CRÓNICA

REPORTAGEM As Pressões do Turismo na nossa Região Um caminho longo ainda por trilhar

CRÓNICA Universidade dos Açores "Compósitos para embalagens com propriedades

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antimicrobianas"

à mesa com

António Simas

ENTREVISTA António Parreira, deputado do Grupo Parlamentar do PS/Açores

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Fórum Serviço Regional de saúde

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XVIII Concurso Micaelense

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EDITORIAL

Os contrastes Quatro décadas de Autonomia Regional que progressivamente nos têm vindo a proporcionar melhorias substanciais no nosso dia-a-dia. São inúmeros os estudos, palestras, comissões e debates sobre a nossa Autonomia. Por um lado temos o conteúdo que se exalta pela substância das propostas. Por outro lado temos a forma levada a cabo pela classe política, com contributos de vários quadrantes da sociedade. Mas existe uma terceira via que teima em se desconcertar da essência da Autonomia, dando uma publicidade nada abonatória para que os nossos propósitos tenham razão de ser. A Autonomia conquista-se não apenas no papel mas, e sobretudo, com exemplos de conduta, postura, valores, princípios e ética. Coisa que nos últimos temos escassa pelas nossas bandas. Das nossas figuras políticas de proa nestas quatro décadas destacaram-se grandes contrastes. Sem desmerecer outros, a história da Autonomia destas quatro décadas irá ficar marcada por cinco nomes, Mota Amaral, Carlos César, Vasco Cordeiro, Duarte Freitas e Alexandre Gaudêncio. Da nova geração de líderes partidários, Duarte Freitas foi o mais crucificado, mas o tempo tem-lhe dado razão. Severamente criticado dentro do partido, por ter tido a coragem de o renovar, não lhe deram o tempo necessário para dar expressão ao seu projeto. Mota Amaral tem sido o padrasto da Autonomia e o coveiro do PSD/Açores. Não soube sair. Não se importou com a transição dentro do partido e apenas geriu o seu ego político, envolvendo o partido em peripécias desnecessárias. Arrogar-se de ser mentor das ultraperiferias é não ter noção da nossa condição geoestratégica e diminuir-nos à esmola. Deve ter faltado à aula de matemática que lhe permitia perceber a rotação dos 180 graus, colocando-nos na vanguarda da Europa transatlântica. Vasco Cordeiro irá deixar o pior legado nos transportes aéreos e marítimos, não só como Presidente do Governo Regional mas, também, como Secretário da Economia. O recém-chegado Alexandre Gaudêncio é a

efémera esperança. Por último, Carlos César. Para descrever Carlos César não é difícil, bastaria dizer que é um exemplo a seguir. Tem sido o político mais inteligente, coerente e sério nos últimos tempos em Portugal. Dos políticos portugueses, pós-democracia, que destacaria, Carlos César seria um deles a par de Ramalho Eanes. Carlos César, enquanto Presidente do Governo Regional, fez obra, tirou os Açores do marasmo de Mota Amaral e impulsionou a coesão regional. Homem de fortes convicções, líder e lutador, exaltou a honorabilidade como bandeira da sua atuação. Soube fazer política e demonstrou que as políticas são para o coletivo. Percebeu o momento da saída, mas fê-lo com mestria, sem deixar o partido órfão. Retirou-se para dar espaço ao sucessor e ao partido. Fê-lo com sabedoria, como poucos o sabem fazer. Regressou à atividade política com a inteligência que o carateriza e conseguiu reerguer um PS que estava amordaçado da Era Socrática. Liderou o partido, a bancada parlamentar e as negociações com a esquerda para a constituição de um governo alternativo. Reconheço que não foi tarefa fácil lidar com uma esquerda refém de si própria e fogaz na vitimização. Poucos lhe reconhecem este mérito, mas ficará para a história a sustentação de um governo improvável e com o tempo contado. Ao contrário do que muitos esperavam, com exaltadas críticas, Carlos César conseguiu o impossível: chegar ao fim de uma legislatura de quatro anos. Agora, e em contra ciclo da opinião generalizada, Carlos César surpreendeu tudo e todos. Fez-se silêncio em Portugal. Mas o mais importante para meia dúzia de iluminados foi criar uma cabala em torno da família, prenunciando o interesse e o oportunismo. Infelizmente a nossa democracia é isso, todos têm direito em enviesar o pensamento e a lucidez. Apesar de pensar que não termina aqui o seu percurso político, enquanto cidadão e jornalista agradeço a Carlos César a dedicação, a honestidade e por tudo o que fez a bem de Portugal.

RUI SIMAS diretor

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Ficha Técnica: ISSN 2183-4768 Proprietário Associação Agenda de Novidades NIF 510570356 Sede de Redação Rua São Francisco Xavier, 24, 9500-243 Ponta Delgada Sede do Editor Rua São Francisco Xavier, 24, 9500-243 Ponta Delgada Diretor/Editor Rui Manuel Ávila de Simas CP3325A Subdiretor André Aguiar CP7456A Redação André Aguiar CP7456A , Rui Santos Departamento de Marketing e Comunicação Cila Simas, Leonor Manaças Revisão André Aguiar Captação e Edição de Imagem Benjamin Decker Paginação Carolina Botelho Nº Registo ERC 126 641 Tiragem 3000 ex Periodicidade Mensal Impressão Nova Gráfica, Lda Morada Rua da Encarnação, 21, Fajã de Baixo, 9500-513 Ponta Delgada Depósito Legal 388942/15 Colaboradores Jorge Corrêa, João Castro, Universidade dos Açores Relações Públicas Cila Simas Contactos comunicacaonorevista@gmail.com Estatuto Editorial: A NO é uma revista de âmbito regional (não ficando excluídos os países de língua portuguesa e comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo). A NO disponibiliza informação independente e pluralista relacionada com a política, cultura e sociedade num contexto regional, Nacional e Internacional. A NO é uma revista autónoma, sem qualquer dependência de natureza política, ideológica e económica, orientada por critérios de rigor, isenção, transparência e honestidade. A NO é produzida por uma equipa que se compromete a respeitar os direitos e deveres previstos na Constituição da República Portuguesa; na Lei de Imprensa e no Código Deontológico dos Jornalistas. A NO visa combater a iliteracia, incentivar o gosto pela leitura e pela escrita, mas acima de tudo, promover a cidadania e o conhecimento. A NO rege-se pelo cumprimento rigoroso das normas éticas e deontológicas do jornalismo e pelos princípios de independência e pluralismo.


ENTREVISTA

à mesa com

António Simas

médico especialista em medicina geral e familiar

Cila Simas

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O que é que surgiu primeiro, o gosto pela Medicina ou pela Fotografia? Como surgiu essa paixão por duas áreas tão diferentes? Cedo me apercebi que a área das ciências era a área que mais entusiasmo me despertava, apesar de também ser bom aluno na área de letras; daí até surgir o gosto pela medicina foi um pequeno salto. Tudo o que dizia respeito ao funcionamento do corpo humano despertava a minha curiosidade. Teria 13 anos, já perto dos 14 anos. Pesou também o facto de a minha mãe ter travado amizade com alguns médicos que exerciam atividade no Centro de Saúde de São Roque do Pico, na altura era o denominado serviço à periferia, o que permitiu que levasse para casa, a meu pedido, revistas médicas que eles

Olhar Entre Proas - António Simas 6

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tinham e que lia com satisfação. Um outro fator que me empurrou para esta profissão foi a Guerra Colonial, pois pensei que, como médico, não teria uma participação tão direta no confronto, salvando vidas em vez de as dizimar. Meu pai, agente da lei (era polícia), não escondeu a sua tristeza por esta minha decisão, pois ele gostava que tivesse enveredado por uma carreira de advocacia, tendo chegado a assistir inúmeras vezes, com ele, a audiências que, confesso, achava piada, mas a medicina já criara os seus alicerces. A fotografia surge um pouco mais tarde, por influência de minha mãe. Ela, antecipando o esforço financeiro que teriam de suportar se mantivesse a minha decisão (só o meu pai era a fonte dos rendimentos e havia mais

um irmão a quem assegurar o futuro também), começou a fazer uso de uma máquina Kodak, que uma amiga residente nos Estados Unidos da América lhe oferecera, tirando fotografias para os Bilhetes de Identidade, pois em São Roque não havia ninguém que o fizesse, tendo depois começado a fazer outros trabalhos também fotográficos. Comecei a acompanhar o seu trabalho e o gosto pela fotografia foi-se enraizando, perdurando até hoje. Fale-nos um pouco sobre o homem por detrás da lente. Qual foi o seu percurso de vida, o que o motivou a prosseguir Medicina e Fotografia e até onde é que, neste mundo, as suas motivações já o levaram. Sou um homem do Pico igual a tantos


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outros que nasceram à sombra da Montanha. Nasci para colmatar uma grande perda emocional que os meus pais tiveram quando lhes faleceu o primeiro filho, com 2 anos e meio de idade, vítima, como tantas outras crianças, daquela que era o terror das doenças na altura: a meningite. Nasci numa tarde quente do mês de julho de 1959, tendo feito “transpirar” minha mãe, não pelo calor que se fazia sentir, mas pela volumetria com que nasci! Era um “rapazão”, como dizia uma tia minha que assistira ao parto, feito em casa por uma parteira. No Pico vivi nas Lajes e, depois, no Cais do Pico. Aos 6 anos fui viver para o Seixal, por a profissão do meu pai assim o ter exigido (foi o meu primeiro

cruzeiro a bordo do navio Funchal). Talvez esta tenha sido a semente para o gosto em fotografar navios de cruzeiro. Vivemos por lá cerca de três anos. Lá iniciei a escola primária, onde entrei com 7 anos, para vir acabar o agora ensino básico no Cais do Pico. Aqui foi a minha base domiciliária até me casar e onde tive uma infância com algumas carências, dividida entre estudos, brincadeira e a auxiliar o meu pai nas tarefas agrícolas, mas não deixou de ser uma infância feliz! Prossegui a escolaridade, até ao 5.º ano, no Externato de São Roque do Pico, que surgiu pela boa vontade de algumas professoras primárias que, por terem filhos na minha situação, pretendiam evitar a nossa ida para o Liceu da Horta. Essa ida para a ilha vizinha deu-se aos 16 anos, para frequentar os então 6.º e 7.º anos, pois já não poderiam ser lecionados no externato.

Completei o 7.º ano em 1977 e, em 1978, frequentei o chamado Ano Propedêutico que surgiu como uma antecâmara para a entrada na universidade, cujo ensino era feito pela TV. Durante o início deste Ano Propedêutico arranjei o meu primeiro emprego, pois o futuro ainda estava nebuloso, e a entrada na universidade dependia da avaliação final do tal Ano Propedêutico. Trabalhei, durante alguns meses, num Restaurante/Bar no Cais do Pico, propriedade de um primo meu, “O Cadete”, que ainda hoje existe – passe a publicidade. Foi difícil esse tempo porque o horário de trabalho não me permitia seguir as aulas via TV. E as gravações sonoras, pois não havia gravadores de vídeo, que a minha mãe fazia com recurso a um gravador usado vindo dos “States”, não me entusiasmava. O cansaço com que chegava a casa também não colaborava. Por alguns professores do então Liceu


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"os Açores têm muito mais que paisagem. Têm a sua gente, a sua cultura, que são uma inspiração única para quem gosta de fotografia"

Nacional da Horta se terem apercebido das nossas dificuldades na aprendizagem através da TV, resolveram juntar-se e lecionar como de um ano letivo normal se tratasse. Isto fez com que tivesse de regressar ao Faial para frequentar essas aulas de apoio às transmissões televisivas. Os três anos que estive no Faial foram dos mais felizes que tive. Pudera! Fora das saias da mãe e do cinto do pai! Em julho concluí, com aproveitamento, o Ano Propedêutico e candidateime à Universidade de Coimbra para frequentar o Curso de Medicina. Escolhi Coimbra por ser uma cidade mais pacata e por já lá estarem alguns conhecidos meus. Frequentei o Curso de Medicina entre 1978 e 1984. Casei durante o curso. Estava no final do 3.º ano, a transitar para o 4.º, e a minha então mulher ia transitar para o 6.º. Durante o curso nasceram os meus três filhos, um casal de gémeos – Ângela e Gonçalo e, depois, a Filipa. Estes sim foram os anos mais difíceis da minha vida, pois fazer os três anos do Curso de Medicina e criar três filhos não foi fácil, mas foi feito quase sempre de sorriso nos lábios. Passámos algumas dificuldades económicas, que foram atenuadas pelas duas bolsas de estudo que recebia, uma do Governo Regional e outra dos Serviços Sociais da PSP que, com o pouco que os nossos pais davam, dava para viver sem cometer nenhum excesso. Valeu também o facto de a mãe 8 NOJUL19

dos meus filhos ter começado a trabalhar um ano depois. Após terminar o curso, a 5 de novembro de 1984 (dia do primeiro aniversário da minha filha Filipa), fiz o meu 1.º ano de estágio nos Hospitais da Universidade de Coimbra, de janeiro a dezembro de 1985. Em fevereiro de 1987 pedi transferência para o Hospital de Ponta Delgada, onde exerci funções até julho de 1987, altura em que entrei para o serviço militar obrigatório, que cumpri durante 18 meses. Foi mais um período difícil no meu percurso de vida, pois a privação do meu ordenado, como médico, em nada contribuiu para o conforto e bem-estar familiar. Após terminar o serviço militar concorri, como médico de Clínica Geral, aos então Serviços Médico-Sociais de Ponta Delgada, onde comecei a exercer funções, em janeiro de 1989, e onde me mantenho até hoje, naquele que agora é o Centro de Saúde de Ponta Delgada, integrado na Unidade de Saúde da Ilha de São Miguel. A medicina sempre me entusiasmou e sinto-me completamente realizado profissionalmente como Médico de Família, embora a nossa atividade, muitas vezes, nos possa trazer algumas deceções. Mas o saldo final é muito positivo e, neste momento, sinto-me feliz enquanto médico, mas também o sou enquanto pai, avô (tenho três netos), companheiro e homem. A fotografia sempre me acompanhou durante todo o meu percurso de vida, motivada pelos mais diversos motivos. Natural de São Roque do Pico, que relação mantém com a “Ilha Montanha”?

Apesar de ter abandonado a Ilha Maior aos 18 anos, para lá só regressar em férias, nas veias corre-me lava quente da Montanha, os ossos são feitos de basalto negro, o meu olhar é o de cima da Montanha e o sentir é o sentir de quem ama a ilha onde nasceu e onde as raízes teimam em crescer apesar da distância. Continuo a ser o homem do Pico que sempre fui. O cordão umbilical continua presente. No Centro de Saúde de Santo António deparamo-nos com uma decoração lindíssima. Está repleto de quadros com as suas fotografias. Que comentários ouve dos seus colegas e dos próprios utentes? Obrigado pelo elogio. A ideia de decorar as áreas comuns e o meu gabinete com fotografias minhas, surgiu com a intenção de serem janelas abertas para o mundo, um mundo que nos oferece muita beleza e não apenas os problemas que levam as pessoas a recorrer a um serviço de saúde. Servem para mostrar que há muito mais mundo para além do das doenças e amenizar um pouco o ambiente geralmente pesado e ameaçador de uma Unidade de Saúde. A reação dos utentes surpreendeu-me. Não ouvi uma única crítica negativa, antes pelo contrário, e isso deixa-me feliz. Desde utentes a “quererem levar as fotos para casa”, até aos mais variados incentivos e elogios tem havido de tudo. Por parte dos colegas houve, também uma crítica bastante positiva. Lembra-se de qual foi a sua primeira máquina fotográfica? E a primeira fotografia que tirou? Sim lembro-me. Foi a Kodak com que a minha mãe começou a tirar fotos. Ofereceu-ma depois de comprar uma que não me lembro a marca. Levei-a para a faculdade e acompanhou-me nos primeiros anos dos meus filhos. Depois de vir para São Miguel comprei uma


Sentir o Mar do Norte - António Simas Canon Isus compacta, que mantive durante anos e anos, até os meus filhos se licenciarem. Qual diria ser a significância dos Açores na sua fotografia? De que modo este nosso arquipélago influencia a sua arte? Não chamaria arte às fotos que tiro, pois não me sinto um artista, mas sim apenas alguém que gosta de olhar à sua volta e registar em fotografia aquilo que desperta os seus sentidos. Costumo dizer que tudo o que fotografo está apenas à distância de um simples olhar. Nós vivemos numas ilhas únicas no mundo, onde a sumptuosidade das suas belezas naturais nos rodeia permanentemente, independentemente para onde se vá ou olhe. Por brincadeira digo que os Açores são as Caraíbas da Europa, mas o que realmente sinto cá dentro é que são bem melhores, em tudo! Ninguém consegue olhar para a beleza destas nove ilhas sem dizer: “vou fotografar isto ou aquilo”, ou “caramba! Porque não trouxe a máquina fotográfica comigo?”. Mas os Açores têm muito mais que paisagem. Têm a sua gente, a sua cultura, que são uma inspiração única para quem gosta de fotografia.

Sabemos que várias publicações, cá e lá fora, já imprimiram e divulgaram fotografias suas. Fale-nos um pouco sobre essa experiência. Sim, de facto já vi fotos minhas publicadas cá dentro e lá fora. Essas publicações devem-se, quase exclusivamente, à minha paixão por fotografar os navios de cruzeiro que escalam o Porto de Ponta Delgada. Essa paixão levou-me a enviar algumas fotos para inúmeros sites e blogues relacionados com esse tema, os quais começaram a partilhar as minhas fotos. O responsável de um desses blogues, um holandês, pediu a minha colaboração na cedência de fotos minhas para ilustrar um livro sobre navios de cruzeiro. O livro chama-se The best of ShipParade, 2012, Volume 1, e o seu autor é Bart de Boer, responsável pelo blogue “ShipParade”. Oito das fotos publicadas são minhas. Também colaboro com a revista “Cruise Industry News”, com sede em Nova Iorque, e que é uma das mais completas revistas sobre cruzeiros, do mundo. Nesta revista já foram capa, penso que por duas vezes, fotos minhas. Também já publicaram um calendário onde alguns dos meses foram ilustrados com fotos minhas. Faço tudo isto apenas pelo gosto de

fotografar e assim poder partilhar as fotos que tiro. Costumo dizer que as minhas fotografias só ganham algum sentido se as partilhar. Também já tive algumas fotos minhas na revista “Visão”, revista “Açores” e no jornal “Açoriano Oriental”. Sabemos, também, que o seu trabalho já foi reconhecido com alguns prémios. Todos, decerto, marcaram-lhe. Mas quais destacaria aqui? Sim é verdade. Ganhei o 1.º prémio num dos temas do concurso de fotografia organizado pela eurodeputada Maria do Céu Patrão Neves, sobre os Açores, intitulado “Açores Europa 2013”, o que originou uma exposição que esteve patente ao público no Parlamento Europeu. Fiz três exposições individuais. A primeira foi no Doris Bar, nas Portas do Mar, a convite do seu proprietário, José Soares. A segunda foi na sede da Ordem dos Médicos em Ponta Delgada, após o desafio por parte da minha querida amiga e colega Irene Pereira. A terceira, e última, foi no Polivalente da Freguesia de Santo António, a convite do presidente da Junta de Freguesia, Nelson Silva, no âmbito das comemorações dos 20 anos daquele edifício e dos meus também 20 anos ao serviço da população NOJUL19

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Sem Rosto - António Simas das freguesias de Santo António e Santa Bárbara. Participei em várias exposições conjuntas em resultado de concursos fotográficos a que concorri, uma delas na Ordem dos Médicos em Setúbal e as restantes aqui em São Miguel (Ponta Delgada, Povoação, Capelas e Lagoa) . Sente que esta validação artística é importante hoje em dia, ou é suficiente gostar do que se faz? Continuo a dizer que não me sinto artista, apenas uma pessoa sensível à diversidade física, humana e animal que me rodeia, e que gosto de guardar esses olhares em fotografia. Quanto à sua pergunta a resposta é não. Não é importante essa validação. Faço fotografia porque gosto, mas só gostar não é suficiente, é preciso sentir entusiasmo ao fazê-lo. Não tiro fotos apenas por tirar. Quando tiro uma foto

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geralmente atribuo-lhe um título de imediato, que pode ter a ver com o objeto da foto, uma emoção ou outra coisa que eu sinta ao fazer o clique. O facto de concorrer a concursos ou fazer uma exposição não significa que procuro essa validação de que fala, mas sim pelo gosto que tenho em partilhar as minhas fotos com aqueles que me rodeiam. Claro que o meu ego “incha” perante uma crítica positiva, mas as minhas fotografias são para minha satisfação. Das várias vertentes da fotografia qual é aquela em que se sente mais à vontade? Diria ser a paisagem? Acertou! Gosto imenso de fotografar paisagens, mas os navios de cruzeiro são também uma paixão. Adoro fotografar a lua e o pôr-do-sol, já o nascer, apesar de gostar, é mais difícil porque o despertador avaria sempre nessa altura.

Não gosto de fotografar com o recurso ao tripé. Alguma vez ponderou experimentar algo mais com a fotografia? Ou é esse um trabalho que tem feito ao longo dos anos – o de continuar a experimentar e a descobrir novos métodos de retratar o nosso pequeno canto do mundo? Não faço projetos a nível da fotografia. Tenho ideias. Se houver oportunidade de as concretizar tudo bem, mas se não conseguir não me sinto um falhado. Faço fotografia por gosto, para me divertir e não para criar stress. O único vazio que sinto no meu gosto pela fotografia é não ter fotografado o meu Pico como ele merece e com a paixão que lhe tenho. A vida às vezes tem destas coisas, mas estou convencido que um dia o farei.


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Um prejuízo de 20,8 milhões de euros no primeiro trimestre deste ano. Um avião parado no Aeroporto Francisco Sá Carneiro porque, assim, custa “metade” do que custaria se estivesse a operar. Salários pagos em modo faseado. Voos cancelados porque não há “boa vontade” dos pilotos. “Fracos resultados financeiros” que afetam o rating da Região.


REPORTAGEM

A

SATA tem sido uma das empresas mais escrutinadas nos últimos tempos, alguns diriam desde que António Cansado deixou de liderar os destinos do Grupo SATA, em 2007. Senão vejamos. Só no espaço de três meses, em sede da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, um debate de urgência marcou o plenário de maio, no qual se fez uma “análise à situação operacional, económica e financeira do Grupo SATA”, apresentado pelo CDS/Açores. Depois, em junho, deu-se a audição de Ana Cunha, secretária regional dos Transportes e Obras Públicas, na Comissão de Economia, a pedido do PSD/Açores, sobre os cancelamentos dos voos que a SATA opera de e para o Faial e Pico. Depois no plenário de julho, e de novo por iniciativa do CDS/Açores, o Governo Regional foi interpelado acerca dos “transportes e acessibilidades” no arquipélago. Conhecidos os prejuízos do Grupo no primeiro trimestre do ano sabemos que a Azores Airlines, antiga SATA Internacional, teve um prejuízo de 16,9 milhões de euros entre janeiro e março de 2019. A isto acresceram os cerca de quatro milhões de euros de prejuízo da SATA Air Açores, que opera os voos inter-ilhas. Comparando com os resultados obtidos pelo Grupo em 2018, no mesmo trimestre, em que a Azores Airlines teve um prejuízo de 14,5

milhões e a SATA Air Açores de 708 mil euros, a tendência parece ser a de os resultados continuarem a agravar-se. Recorde-se que o Grupo SATA fechou as contas de 2018 com um prejuízo de 53,3 milhões de euros, mais 12,3 milhões do que em 2017. No mais recente plenário, o de julho, os democratas-cristãos açorianos sustentaram que o que está em causa é “o superior interesse dos Açores, no que respeita à nossa economia e às nossas finanças regionais”, bem como “a mobilidade dos açorianos, que se veem confrontados com a supressão e a degradação das respostas às suas necessidades de transporte”. Afirmações de Artur Lima, presidente do CDS/ Açores, que dois meses antes já havia defendido que “os resultados financeiros dos últimos exercícios do Grupo SATA apontam um caminho que não podemos continuar a percorrer”. Paulo Estêvão, deputado do PPM/ Açores, disse ainda este mês, no âmbito da interpelação ao Governo sobre “Transportes e Acessibilidades”, apresentada pelo CDS/Açores, que a solução em relação aos constrangimentos sentidos no setor dos transportes e acessibilidades na Região terá de passar, primeiro, por “assumir que o problema existe”, depois por criar “uma cultura de responsabilidade política” nos Açores e, por fim, promover “um melhor planeamento” das estratégias a implementar.

O deputado do PPM/Açores afirmou, a esse propósito, ser fundamental “assumir que o problema existe, que há uma empresa que está em derrapagem financeira, que está em falência técnica”, defendendo que “há uma empresa que apresenta, todos os anos, resultados piores e há uma empresa que está a falhar, em determinadas zonas do arquipélago, em relação à mobilidade dos açorianos. Era reconhecer isto. Custa alguma coisa? Custa, porque os senhores têm uma atitude absolutamente arrogante em relação a esta matéria e não reconhecem que o problema existe”. Paulo Estêvão referia-se, em concreto, às declarações do socialista André Rodrigues, que havia defendido que a SATA, “ano após ano, tem atingido os melhores resultados de sempre”. No entender do deputado do PS/Açores, “os resultados são evidentes, estão à vista de todos. Nunca tivemos tantos voos, tantas ligações de e para a Região, nunca tivemos tantos voos inter-ilhas”, explicando que, “de facto, em 2018, no último ano, tivemos 22.745 voos na Região Autónoma dos Açores, o que representou um crescimento de 43% face a 2012”. “Estes resultados são factos, são dados concretos, são resultados positivos que levaram a uma alteração de paradigma. Passamos a ter aviões cheios, nomeadamente na época alta, com alterações e implicações, também, na vida dos açorianos. Passamos a ter

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de reservar com antecedência as nossas deslocações na época alta”, disse. Ainda no entender de André Rodrigues, “os constrangimentos a que agora assistimos existem por causa destes resultados positivos, existem porque temos mais pessoas a viajar, porque temos mais turismo em todas as nossas ilhas, e não porque reduzimos a operação da SATA, aliás a operação da SATA tem crescido ano após ano”. Esses resultados “são fruto do trabalho do Governo dos Açores, do Partido Socialista, que realizou a maior reforma de sempre do modelo de acessibilidade, de e para a Região, onde se concretizaram condições de promoção de igualdade de direitos a todos os açorianos”, defendeu. Para André Rodrigues, “este novo modelo teve reflexos inequívocos nas dormidas e nos proveitos totais do turismo em todas as ilhas, com reflexo no emprego e no desenvolvimento económico de cada uma dessas ilhas”. Mas Paulo Estêvão discordou, criticando a bancada socialista no Parlamento regional, referindo que “é preciso uma cultura de responsabilidade política”. Depois questionando se “algum gestor, ao longo desses anos, com milhões e milhões de prejuízos todos os anos, foi responsabilizado”, segundo o deputado “todos os gestores, no âmbito 14 NOJUL19

da SATA, têm resultados e avaliações positivas excelentes. Ninguém assume responsabilidades”. “Querem uma solução”, perguntou o deputado do PPM/Açores, respondendo ao mesmo tempo que “é preciso ter um melhor planeamento”, uma vez que “nós temos estudos que nos custaram meio milhão de euros, exatamente para planear uma estratégia em relação ao futuro. Depois a sua implementação é absolutamente ruinosa”. No entender do deputado popular monárquico, “é necessário, nesta matéria, ter espírito de determinação, ter a capacidade de ouvir os outros nesta matéria, e ter a capacidade de assumir as vossas responsabilidades. Os senhores nem sequer assumem que o problema existe”. Logo no dia a seguir a esta interpelação, e em reação aos prejuízos de 20,8 milhões da SATA, no primeiro trimestre deste ano, o vice-presidente do Grupo Parlamentar do PS/Açores, José San-Bento, veio a público dizer que “a SATA está num processo de profunda reestruturação. Estamos a falar de reformas operacionais, reestruturações comerciais, financeiras, renegociação da dívida, renovação da frota, um projeto de inserção da empresa no mundo concorrencial da aviação civil, através da alienação de 49% do seu capital”.

Acrescentando ter a certeza de que “a administração da SATA tem plena consciência das responsabilidades que tem pela frente”, o socialista reafirmou a necessidade de que “é preciso dar tempo. As alterações estruturais são muito importantes para assegurar esse objetivo de recuperação e, nesse sentido, nós esperamos que os resultados finais em 2019 possam estar em linha com os objetivos que a própria administração da SATA definiu”. Em causa está um objetivo estabelecido pela administração da companhia aérea açoriana para o ano de 2019 – uma redução substancial de cerca de 50% dos prejuízos operacionais em relação ao ano anterior, algo que o PS/Açores “está a acompanhar”. Já António Vasco Viveiros, deputado do PSD/Açores, também em reação a esses resultados, recordou que “há pouco mais de um mês o senhor Presidente do Governo jurava que a SATA estava no bom caminho e que havia melhorias no primeiro trimestre de 2019. A realidade desmentiu agora essas fantasias de Vasco Cordeiro”. No entender do social-democrata, “estes prejuízos são perturbadores e mostram que as contas da SATA estão absolutamente desgovernadas. O objetivo de reduzir os prejuízos para metade em 2019 está seriamente comprometido,


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bem como a sobrevivência da companhia aérea”. “Vasco Cordeiro e o Partido Socialista são os únicos responsáveis por este descalabro da SATA, pois ignoraram durante anos os avisos e propostas dos trabalhadores, partidos da oposição e sociedade civil”, frisou. António Lima, coordenador do BE/ Açores, apontou que “a situação de caos que se vive hoje na SATA é o resultado do falhanço do Governo Regional em construir uma estratégia para os transportes e, tendo essa estratégia, dotar o setor dos meios necessários para a cumprir”. “A inconsistência dos governos do PS sobre esta matéria exemplifica-se com o Plano Integrado de Transportes que, como nós e muita mais gente disse, não era um plano, não era integrado e apenas falava vagamente de transportes”, sendo “prova disso” que, pouco tempo depois, “o plano estava a ser alterado”, disse o bloquista açoriano. “O caos que se vive nos transportes radica na falta de estratégia e não no acidente, no imprevisto ou no piloto que teve gripe”, afirmou o coordenador do BE/Açores, acrescentando que esse

caos “radica na incompetência da tutela e do Governo, como um todo, para atender, de forma decente, a um setor tão importante como este para uma Região arquipelágica”. João Paulo Corvelo, deputado do PCP/ Açores, afirmou também que “se há setor onde mais se faz sentir a política centralista do poder regional esse é, sem dúvida, todo o setor dos transportes, designadamente os transportes aéreos e marítimos”. O comunista açoriano acredita que, “no tocante ao transporte aéreo, toda a política encontra-se subordinada à centralização dos fluxos de passageiros e de turistas, preferencialmente para um único destino, e só a partir daí para os restantes destinos da Região”. “A aposta do Governo em subsidiar os grupos económicos donos de empresas low cost, utilizando a SATA Air Açores para efetuar os reencaminhamentos gratuitos dos seus passageiros, vem, desde sempre, colocando sérios e graves problemas”, criticou, acrescentando que “se é certo que, desde logo, essas empresas, mercê dos encaminhamentos gratuitos, fazem uma concorrência desleal, nomeadamente à SATA,

condenável sob todos os aspetos, a verdade é que as consequências dessa política não se ficam por aqui”, explicou. No entender de João Paulo Corvelo, “a política de desinvestimento, de não pagamento das verbas devidas, e de atirar a SATA para um buraco financeiro, que permita ao Governo vir sustentar junto da opinião pública que a SATA é ingovernável enquanto empresa pública e, como tal, apenas a sua privatização pode tornar viável a empresa, é para nós, PCP, não só uma política criminosa como conduzirá a breve trecho à ruína da SATA, ao desmantelamento de uma empresa estruturante essencial à Região e ao consequente agravamento dos problemas de acessibilidades e mobilidade na Região”. Serão estes sinais claros de que a nossa companhia aérea está numa “rota de colisão” com um estado de falência irreparável? Será que a solução passa pela SATA deixar de ser “nossa” e passar para as mãos de privados? Muitos discordam neste ponto. A privatização da SATA Air Açores colocaria em causa o direito à mobilidade dos açorianos, sendo este o maior argumento contra tal medida.

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REPORTAGEM

SERVIÇO REGIONAL DE SAÚDE

“UMA HISTÓRIA SEM FIM”

o Fórum “Serviço Regional de Saúde: uma conquista e um direito dos açorianos”, FOI uma iniciativa INÉDITA da Secção Regional dos Açores da Ordem dos Enfermeiros, NA QUAL SE FEZ UM BALANÇO DE 39 ANOS DE CONQUISTAS E DESAFIOS, BEM COMO DE DOIS ESTILOS DE GOVERNAÇÃO, CADA QUAL COM AS SUAS PRIORIDADES E LINHAS DE AÇÃO.

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sessão de abertura do Fórum contou com cinco oradores, de diferentes áreas, mas que têm em comum o facto de todas elas contribuírem, de uma maneira ou de outra, para o desenvolvimento do setor da saúde na Região Autónoma dos Açores (RAA). Luís Furtado, presidente do Conselho Diretivo da Secção Regional dos Açores da Ordem dos Enfermeiros, foi quem deu início aos trabalhos, afirmando que “não poderia o momento ser o melhor para promovermos esta iniciativa”, dado que estamos “praticamente a um ano das eleições legislativas regionais, permitindo distanciamento suficiente para uma discussão profunda”. O mesmo caracterizou o Serviço Regional de Saúde (SRS) como “um dos grandes promotores de coesão nesta Região Autónoma”, identificando “os desafios e a responsabilidade naquilo que é o assegurar de respostas capazes às necessidades e saúde de todos os cidadãos açorianos que tão

Rui santos

assimetricamente se distribuem em nove realidades insulares, que têm tanto de comum como de distinto”. António Bento Barcelos, presidente da União Regional das Misericórdias dos Açores, classificou o SRS como “uma das mais importantes conquistas da nossa democracia e autonomia constitucional”, indo ao encontro de Luís Frutado sobre o momento em que se realiza o Fórum, uma vez que “todos os partidos políticos estão a trabalhar na preparação do seu programa eleitoral e a área da saúde é, de facto, fundamental”. Albertina Oliveira, vereadora da Câmara Municipal da Lagoa, em representação da presidente da autarquia, falou sobre a insularidade, referindo que “viver em Regiões Autónomas pode ser um entrave ao nível da saúde, no que respeita à formação e ao acesso a eventos de natureza técnico-científica fora do arquipélago, que acarretam custos acrescidos”, e congratulou-se pelo novo hospital da Lagoa, “um investimento com um impacto para desenvolvimento do concelho e que virá contribuir,

fortemente, para a criação de postos de trabalho afetos a várias áreas hospitalares e administrativas”. Já João Luís Gaspar, reitor da Universidade dos Açores, sublinhou o contributo da instituição académica para o SRS, referindo que “a Escola de Enfermagem de Angra do Heroísmo e a Escola de Enfermagem de Ponta Delgada têm dado ao SRS muitos dos nossos quadros de enfermagem”, reforçando, também, a ideia de que, “no grande documento orientador da investigação científica para os Açores, possa ser considerada a saúde como um dos pilares, uma das áreas prioritárias da investigação científica na Região”. O último orador da sessão de abertura foi Rui Luís, na altura secretário Regional da Saúde, em representação do Presidente do Governo dos Açores, que destacou o facto de o SRS ter sido “capaz de afirmar e personificar a marca da nossa Autonomia e da política de coesão, determinado em atenuar diferenças e reduzir assimetrias próprias de uma Região insular como a nossa”.

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No debate “Serviço Regional de Saúde: um constructo de Autonomia”, entre Mota Amaral e Carlos César, foi exposta a situação do SRS durante as suas governações e defendida a ideia de que o mesmo é um processo sem fim. Mota Amaral começou por referir, remontando à altura em que tomou posse como Presidente do Governo Regional, que, “na realidade, aquilo com que nos deparamos no princípio foi com uma decadência, nesse domínio, nas nossas ilhas”, referindo-se aos serviços de saúde da RAA. O antigo Presidente do Governo

Regional demonstrou, também, a preocupação que havia com a saúde. “Na altura em que arranca a Democracia em Portugal, com o 25 de Abril, e aqui nos Açores com a nossa Autonomia democrática, é óbvio que se assume, como responsabilidade elementar, a saúde”. “Em 1976 o que é que temos? Temos poucos enfermeiros, poucos médicos, temos os hospitais das Misericórdias, mas muito mal equipados e prestando serviços rudimentares e, por isso, a população mal servida em termos de saúde”, constatou. Com muito trabalho em mãos no que tocava a este setor, o antigo Presidente do Governo Regional explicou, ainda, como pretendeu melhorar o sistema de saúde na região. A “ideia é simples: boa saúde para todos os açorianos e, para isso, tratamos de pôr de pé o SRS, fazer infraestruturas e de organizar os serviços”.

Como exemplo destas infraestruturas, Mota Amaral mencionou a construção do Hospital da Horta, erguido durante o seu mandato, “numa altura em que a saúde e a educação representavam dois terços da despesa regional”. Perante a evolução tecnológica e o surgimento de novos métodos e técnicas de tratamento, mais rápidas e mais eficazes, Mota Amaral classificou as questões da saúde como uma “Neverending Story”, (uma “história sem fim”), constatando isso mesmo através de um exemplo regional atual, as obras no Hospital da Horta, referindo que “estamos sempre a melhorar, o progresso tecnológico é constante”. “O Governo dos Açores tinha que ter a área da saúde na sua responsabilidade, se tivéssemos deixado este assunto à conta do Governo central estávamos bem arrumados, é ver o serviço do Governo central no estado em que se encontra”, sublinhou.

"o SRS não é sustentável, para ser sustentável teria que se sustentar a si próprio. Não! O SRS é uma despesa do Estado e o Estado tem que assumir a despesa do SRS"

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O antigo Presidente do Governo Regional referiu, ainda, que o maior desafio com que o SRS se depara “é a dispersão da população” e que “é preciso haver o mínimo de condições nas ilhas todas e, depois, claro que há certas especialidades que não podem haver em todas as ilhas”. Relativamente à parte financeira do sistema de saúde, Mota Amaral acentuou que “o problema financeiro não passa por ter despesas a mais, é ter receitas a menos”, acrescentando que “pôr um hospital de pé é fácil, pô-lo a funcionar aí é que é mais difícil”. Concluindo, Mota Amaral defendeu que “o SRS não é sustentável, para ser sustentável teria que se sustentar a si próprio. Não! O SRS é uma despesa do Estado e o Estado tem que assumir a despesa do SRS”, uma afirmação recebida com aplausos pela maioria dos presentes. Carlos César, por sua vez, concordou com Mota Amaral na ideia de que o SRS foi uma conquista da Autonomia açoriana, afirmando que “o SRS e o direito à saúde ainda é uma conquista

e, portanto, esse caminho e essa progressão estão longe de estar concluídos”, acrescentando que, em contrapartida, “está bem mais longe da indigência em matéria de direitos e de assistência em que vivíamos quando a Autonomia foi instalada”. “Os governos do doutor Mota Amaral implementaram uma rede infraestrutural que correspondeu à época, ao que era possível e em consonância com os recursos que a Região tinha”, explicou. Contudo, “há outras dimensões de realização que mostram como, independentemente da diversidade partidária, os governos vão prosseguindo e aproveitando vantagens e corrigindo erros antecedentes”, referindo-se, de seguida, à atuação do seu Governo sobre o SRS, dizendo que “fizemos um percurso extraordinariamente significativo”. De novo em consonância com Mota Amaral, Carlos César constatou,

também, que “ao longo do tempo vão-se multiplicando as razões e as necessidades para o investimento crescente no SRS”, e que, por outro lado, “vão sendo alcançados patamares que nem sempre são progressivos, portanto, pode-se voltar atrás em alguns indicadores e, sobretudo, face ao conjunto incessante de exigências que o sistema de saúde coloca”. O antigo Presidente do Governo

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Regional mencionou, ainda, a construção de raiz de “muitos centros de saúde na Região”, durante a sua governação. Para além do investimento em infraestruturas, Carlos César enalteceu, também, o investimento em recursos humanos, recordando que, “nos últimos três ou quatro anos, foram admitidos mais 200 enfermeiros. Nos últimos 16 anos foram admitidos 70 enfermeiros por ano”. O mesmo afirmou que “há uma pressão muito forte, sempre no plano político, na área da saúde mais do que em qualquer outra área”. Depois expondo alguns indicadores estatísticos, a nível da saúde, durante os seus 16 anos de mandato, em relação à situação antecedente, constatou-se “mais 51% de médicos, mais 89% de enfermeiros, mais 79% de técnicos de

"antes taxas moderadoras com cuidados de saúde do que sem taxas e sem cuidados"

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diagnóstico e terapêutica, mais 89% de consultas de especialidade, mais 52% de cirurgias e mais 61% de deslocados entre ilhas”. Carlos César concluiu, através destes mesmos indicadores, que tal pressão política “não tem uma correspondência com a realidade”. “A verdade é que ao longo dos anos, e com a expansão da rede de saúde e da proximidade dos cuidados de saúde, as pessoas, mais cedo, compreenderam a sua doença, mais cedo foram tratadas e foram objeto de uma atenção precoce da prestação de cuidados de saúde. Este é que é o grande ganho, porque os que morreram não poderão contar desta estatística”, acrescentou. Relativamente à sustentabilidade do SRS, o antigo Presidente do Governo Regional disse que o que deve ser assegurado “é o acesso aos cuidados de saúde dos cidadãos, é assegurar a sustentabilidade da qualidade do sistema de saúde e do SRS em particular”. Mais uma vez de acordo com Mota

Amaral, Carlos César afirmou que o SRS “é uma despesa do Estado e, portanto, é com ela que o Estado deve viver. Aqui quando digo o Estado digo em geral e, especificamente, o Governo Regional e o Orçamento regional”, destacando não ser nada extraordinário “o facto de gastarmos somas avultadas no nosso SRS” e que “só haverá algo de extraordinário quando conseguirmos detetar que há despesa desnecessária ou improdutiva”. Referindo-se, depois, às taxas moderadoras implementadas durante o seu Governo, Carlos César disse que “de um ponto de vista geral, eu acho que se as taxas forem moderadoras, cumprem, efetivamente, uma função. Agora eu creio que a situação ideal é não haverem taxas moderadoras”, salvaguardando que “antes taxas moderadoras com cuidados de saúde do que sem taxas e sem cuidados”. Concluindo o seu discurso, o antigo Presidente do Governo Regional fez uma apreciação geral do SRS, sublinhando que “nós hoje, nos Açores, temos um SRS capaz com expressão significativa na prestação de cuidados em todas as nossas ilhas”.


O Serviço Regional de Saúde (SRS) dos Açores foi criado no ano de 1980, via Decreto Regional, e funciona sob a tutela da Secretaria Regional da Saúde do Governo dos Açores. São órgãos do SRS as Unidades de Saúde de Ilha (USI), o Conselho Regional de Saúde, o Instituto de Gestão Financeira da Saúde e a Inspeção Regional de Saúde. O SRS engloba nove USI, uma em cada ilha, as quais agregam 14 centros de saúde, três hospitais e um centro de oncologia. Cada USI congrega todos os estabelecimentos públicos de saúde existentes na respetiva ilha. Existem dois tipos de USI: a primeira agrupa tanto hospitais como centros de saúde, integrando a prestação de cuidados de saúde primários e diferenciados e assemelhando-se portanto às unidades locais de saúde do Serviço Nacional de Saúde. O segundo tipo congrega apenas centros de saúde, prestando apenas cuidados de saúde primários e assemelhando-se aos agrupamentos de centros de saúde do SNS.

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“Nós temos a certeza que a administração do grupo SATA tem perfeita consciência da grande responsabilidade que tem, e, aquilo que nós esperamos, é que consigam fazer aquilo que se comprometeram fazer.” José San-Bento, PS/Açores

“Há pouco mais de um mês, o senhor Presidente do Governo jurava que a SATA estava no bom caminho e que havia melhorias no primeiro trimestre de 2019. A realidade desmentiu agora essas fantasias de Vasco Cordeiro.” António Vasco Viveiros, PSD/Açores

“Esta governação socialista falhou nas políticas públicas de transportes e legitimou modelos de gestão e de operação que conduziram ao descalabro financeiro do setor e empurraram o Grupo SATA para a situação de falência técnica.” Artur Lima, CDS/Açores

“O caos que se vive no sector dos transportes nos Açores radica na falta de estratégia e não no acidente, no imprevisto ou no piloto que teve gripe.” António Lima, BE/Açores

” ”

“Há uma empresa que apresenta, todos os anos, resultados piores e há uma empresa que está a falhar, em determinadas zonas do arquipélago, em relação à mobilidade dos açorianos. Era reconhecer isto. Custa alguma coisa? Custa, porque os senhores têm uma atitude absolutamente arrogante em relação a esta matéria e não reconhecem que o problema existe.” Paulo Estêvão, PPM/Açores NOJUL19

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CRÓNICA

Casa do Marquês da Praia e Monforte. Foto de Cláudio Pacheco, 2018

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CREUSA RAP O SO

M E S T R E E M PAT R I M Ó N I O E MUSEOLOGIA

A Casa Nobre de Arrifes

m termos gerais as casas nobres são construções de cariz particular ou doméstico exibindo o poder económico dos seus proprietários e representando da melhor forma as tendências estilísticas dominantes através do emprego de materiais de melhor qualidade. A residência aristocrática deve ser entendida na dupla aceção de casa-residência e casa-instituição nobiliárquica, pois traduzia o poder económico e prestígio social de determinada família. Aliás a mesma família podia possuir diversas residências: casas e “quintas” em locais diferentes. A localidade de Arrifes recebeu grande influência do núcleo urbano mais próximo. Os senhores de linhagem nobre, mas também alguns ricos comerciantes, edificaram aqui as suas quintas de dimensões consideráveis, onde acompanhados pela criadagem, passavam períodos mais ou menos longos designadamente no Verão. Algumas evoluíram para residências permanentes, como foi o caso da propriedade de João Dias de Carvalho, primeiro Procuradorgeral da vila de Ponta Delgada, que veio morar definitivamente para o lugar de Piedade em 1508, mas todas possuíam

tipologias diferentes e complexas, com várias divisões, umas destinadas ao convívio familiar e outras como zonas de serviço. Alguns exemplos que se destacam são a propriedade da família Raposo do Amaral, do Marquês da Praia, do Morgado Manuel da Câmara Coutinho, do Barão das Laranjeiras e de Afonso Anes. Esta última merece uma atenção mais detalhada pela presença de duas salas quinhentistas em barrete de clérigo de excepção na Região. A casa apresenta características de casa linear e de pátio, com destaque para as duas fachadas e os seus anexos, que ao longo do tempo viram as suas funções iniciais alteradas. É de salientar os dois períodos distintos de construção da casa. O primeiro possivelmente nos finais do século XVI e inícios do século XVII. A segunda fase é provável que se tenha iniciado ainda antes do século XIX, por influência da tendência que despontou nos anos de setecentos, em conservar as quintas rurais e transformá-las em casas de campo. Frequentemente estas habitações disponham de variados complexos como cavalariça, cisterna, lagar, pomar, jardim, capela, mirante, brasões de armas como elemento decorativo, entre outros1.

1. Brasão dos Barões de Nª Sr.ª da Saúde

2. Chaise-longue em madeira e cetim

Raposo, C. M. S. (2016) – Arrifes: Urbanismo e Património Construído, Master Thesis, Repositório da Universidade dos Açores, Ponta Delgada, Universidade dos Açores.

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ROBERTO AMORI M

HEL ENA CR I STI NA VASCO NCEL O S

CRÓNICA

Compósitos para embalagens com propriedades antimicrobianas

TEL M O E LE UT ÉR I O

M AR I A JOÃO P ER EI RA

GABRI ELA MEI RELL ES

Produzidos com fibras de Hedychium gardnerianum (conteira), a planta invasora que conquistou os Açores

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O que fazer com uma espécie invasora tão abundante como a conteira?

A conteira é uma planta nativa dos Himalaias que chegou aos Açores em meados do século XIX. Inicialmente era usada para ornamentar os jardins com as suas exuberantes flores amarelas. Em 1856 já fazia parte do conjunto de espécies existentes no Jardim de Sant’Ana, em S. Miguel. Contudo, rapidamente se percebeu que esta espécie não teve problemas em se adaptar ao clima dos Açores e encontrou nestas ilhas, habitats semelhantes aos da sua região de origem. A ausência de inimigos naturais, o seu comportamento no ecossistema, e algumas especificidades da espécie explicam também o seu comportamento invasor. Esses motivos e a falta de conhecimento sobre esta planta na época, levaram a que a mesma rapidamente escapasse dos jardins e invadisse os terrenos anexos, encontrando-se, hoje em dia, espalhada por todas as ilhas dos Açores, exceto no Corvo. Atualmente, a conteira é vista pelas populações locais como uma espécie sem valor nenhum, um recurso inútil, e pela comunidade científica como uma ameaça à biodiversidade e às plantas endémicas do arquipélago. Mas será de facto um recurso inútil? Sabemos que impedir ou retardar a expansão desta invasora é uma missão quase impossível, bem como muito dispendiosa. O uso de produtos químicos não é adequado pois acabam por matar outras espécies,

mas cortar a planta e deixar os resíduos nas bermas dos caminhos também não é solução. O seu grande potencial está no uso das suas fibras. Biodegradáveis e de origem renovável, as fibras da conteira permitem fabricar embalagens de materiais compósitos com potencial para substituir os plásticos descartáveis. Numa altura em que o planeta já dá sinais evidentes de degradação, com enormes quantidades de poluição e de acumulação de resíduos, o uso desta matéria-prima 100% natural apresenta uma grande cumplicidade com os princípios da sustentabilidade ecológica, e os conceitos emergentes da economia circular e da economia verde.


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Compósitos de fibras vegetais: uma tecnologia atual, mas também muito antiga

Ao longo dos séculos, as fibras vegetais têm sido usadas em todo o mundo por muitos povos, não só no fabrico de roupas, mas também em blocos de construção (tijolos) e por vezes no fabrico de artefactos para artes de pesca, como cordas e redes, etc. Existem diversos tipos de fibras vegetais, sendo o algodão, linho, sisal e cânhamo as variedades mais conhecidas e de maior produção mundial. No passado, as populações utilizavam-nas consoante a sua disponibilidade local. O primeiro material compósito da história foi feito no Egito há 3000 anos e era constituído por uma mistura de argila e palha, usada para fabricar os tijolos utilizados na construção das pirâmides dos faraós. Ao examinar a constituição desses tijolos, podemos perceber que se trata, tipicamente, de materiais bifásicos, nos quais uma matriz é reforçada com uma fase de fibras. Desta combinação surgiu um produto que agrega as melhores propriedades das duas fases constituintes. A este novo material dá-se o nome de material compósito. Muitos compósitos têm sido criados para garantir a combinação de determinadas propriedades como rigidez, elevada resistência mecânica e baixo peso. Em aplicações avançadas, as propriedades térmicas, químicas e de barreira são também de grande interesse, tornando estes materiais aptos para aplicações multifuncionais, como é o caso das embalagens inteligentes ou com propriedades ativas. Os antigos egípcios ensinaram-nos muito sobre o potencial das fibras naturais e esse legado foi-se perpetuando ao longo do

tempo. Mais recentemente, Henry Ford, o fabricante de automóveis, construiu em 1941 um protótipo inovador a partir de painéis de plástico reforçados com fibras vegetais (de cânhamo). Na época, a indústria automóvel nos EUA estava em expansão e Ford ao decidir usar plantas para construir carros foi considerado um dos pioneiros da economia verde. Atualmente verifica-se um renovado interesse na utilização de materiais compósitos naturais, colocando-os de novo no centro das atenções. Embora alguns céticos ainda vejam a utilização de fibras vegetais em compósitos como um regresso ao passado, na Universidade dos Açores (UAç) acreditamos que este é o futuro e as fibras de conteira, em particular, serão uma importante matéria-prima para esta nova geração de materiais. Esta alternativa irá revelarse bastante eficaz, especialmente em aplicações que tradicionalmente eram desempenhadas por materiais plásticos, como o caso das embalagens, mas também de muitos outros utensílios de uso descartável.

O projeto ECOPLACKAGING: é uma aposta em compósitos com fibras de conteira Fabricar embalagens com propriedades antimicrobianas é o objetivo principal do ECOPLACKAGING, um consórcio de instituições de investigação europeias liderado por Espanha, que conta com um financiamento, que ronda os 600 mil euros, para desenvolver até 2021 novos compósitos de ácido poliláctico (PLA) e fibras de conteira funcionalizadas com vidros antimicrobianos. Além do grupo da UAç, que tem o apoio financeiro do Fundo Regional da Ciência e Tecnologia (FRCT), integram este consórcio investigadores espanhóis do Instituto de Nanomateriais e Nanotecnologias das Astúrias (CINN) e as empresas checas SYNPO e SPA2000, ambas do ramo dos materiais poliméricos. O kick off do projeto ocorreu no passado dia 3 de maio, em EL Entrego, nas Astúrias. Este é um dos 27 projetos europeus que em 2018 conseguiu obter fundos do M-ERA.NET, uma rede financiada pela União Europeia que foi estabelecida para apoiar e aumentar a coordenação de programas de financiamento de investigação e inovação em ciência e engenharia dos materiais. O ECOPLACKAGING é, sem dúvida, um projeto de grande interesse para a Europa, e para os Açores em particular, por promover a sustentabilidade do meio ambiente ao produzir embalagens tão eficientes quanto as de plástico, mas ao mesmo tempo tão diferenciadas que até protegem a saúde dos consumidores, permitindo que estes ingiram alimentos seguros e livres de bactérias durante mais tempo. Por outro lado, estas embalagens também evitam a adição de conservantes aos alimentos, tornando-os mais saudáveis.

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CRÓNICA

J OÃ O F. CA ST RO

PROFESSOR MESTRADO E M G E S T Ã O P O RT U Á R I A

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Mares e Oceanos

s oceanos cobrem três quartos da superfície da Terra, estimando-se que mais de 3 biliões de pessoas dependam da biodiversidade marinha e costeira para sua subsistência. Cercam os continentes e são massas de água, que ocupam 361,9 milhões de quilómetros quadrados, representando 97% de toda a água existente na Terra. A profundidade média dos oceanos ronda os 4.000 metros, tendo como ponto mais profundo a fossa das Marianas, no Oceano Pacífico, com 10,994 metros de profundidade. O valor dos recursos e indústrias marinhas ronda os 3 triliões de dólares, representando 5%, do produto interno bruto mundial. Absorvem cerca de 30% do dióxido de carbono produzido pelos seres humanos, amortecendo os impactos do aquecimento global. São a principal fonte de proteína para mais de 2,6 biliões de pessoas, representando, só na atividade da pesca, mais de 200 milhões de postos de trabalho. António Guterres, secretário geral da ONU, tem referido a importância dos oceanos e dos mares para a humanidade. Pela sua biodiversidade e enquanto “defesa vital contra a emergência climática global”. Sofrem uma ameaça sem precedentes, “onde, nos últimos 150 anos, cerca de metade de todos os corais vivos foram perdidos” e “nas últimas quatro décadas, a poluição por

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plásticos aumentou dez vezes”. A sua sobre-exploração pela indústria, pesca, transporte, mineração e turismo, está a atingir níveis insustentáveis para os ecossistemas marinhos. No mundo encontramos cinco oceanos, sendo eles o Índico, Pacífico, Atlântico, Glacial Ártico e Glacial Antártico. A principal diferença entre os mares e os oceanos está na sua extensão territorial. Os primeiros são menores, menos profundos e limitados ou cercados por continentes e estão ligados aos oceanos. Existem mares abertos, continentais e fechados. O Sistema de Informação Biogeográfica Oceânica contabilizou, até 2010, mais de 124 mil espécies. A União Internacional para a Conservação da Natureza identifica os crustáceos, tubarões, raias e corais, como as mais referenciadas, dentro das 27 mil espécies mais vulneráveis e em risco de extinção no planeta. As Nações Unidas estimam que um terço das reservas de peixe, exploradas comercialmente, se encontram em situação de sobrepesca. O equilíbrio dos oceanos está ameaçado. São responsáveis pela absorção de grandes quantidades de dióxido de carbono (CO2), impedindo que a atmosfera fique ainda mais quente. Esta absorção de CO2 tem conduzido a um processo de acidificação, que se tem acentuado, alterando habitats, com consequentes riscos para diferentes

formas de vida e contribuindo para uma menor biodiversidade. Por outro lado, os oceanos recebem cerca de 13 milhões de toneladas de plástico por ano, estimando-se que, em 2050, o plástico nos oceanos pese mais do que todos os peixes juntos. O plástico é indistinguível do alimento, para muitas espécies, entrando na sua cadeia alimentar, com efeitos nefastos provocados pelo seu consumo. É neste contexto que o mês de junho assume especial ênfase, quando no seu dia 8 se regista o Dia Mundial dos Oceanos, cuja comemoração se iniciou em 1992, na conferência sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizada pela ONU, no Rio de Janeiro. Dezenas de países celebram o Dia Mundial dos Oceanos, com a finalidade de, a cada ano, fazer um tributo aos oceanos e à sua importância para a humanidade, enquanto fonte de alimento, energia e comunicação. Portugal tem mais de 2.100 quilómetros de costa, entre o continente e as Regiões Autónomas. A Zona Económica Exclusiva (ZEE) cobre mais de 1,6 milhões de quilómetros quadrados do oceano atlântico, prevendo-se que, com a plataforma continental estendida, o oceano sob jurisdição portuguesa, passe para próximo dos 4 milhões de quilómetros quadrados. É neste contexto que nos devemos educar para os Oceanos, todos os dias!


CRÓNICA

JORGE CO R R ÊA

MESTRE EM ENGENHARIA DO AMBIENTE

A energia nuclear

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uma solução verde com um problema de imagem

ntes de começar, sim, considero-me um ambientalista, não um ideológico, mas sim em bases de racionalismo, lógica e pragmatismo, para existir sustentabilidade. E afirmo, após anos de descrença e suspeita, que a energia nuclear é a solução para a crise energética e para mitigar, em grandes quantidades, as emissões de dióxido de carbono atmosférico, que advêm de combustíveis fósseis usados para a produção de energia elétrica. Comecemos pela grande vantagem da energia nuclear: não há emissões de dióxido de carbono, enquanto produz-se uma quantidade enorme de energia usando pouca matéria-prima. A produção de energia nuclear é obtida através da fissão de átomos, regra geral de urânio. Segunda grande vantagem é a produção de energia não depender de fatores ambientais, tais como o clima, já que certas energias renováveis, como a solar, eólica e outras, dependem de fatores que não controlamos, enquanto com a

nuclear produz-se a quantidade desejada, a qualquer altura, independentemente das condições meteorológicas. Então porque não é utilizada como fonte de energia em Portugal? Este tipo de energia está associado a conotações bélicas (leia-se bombas nucleares), a certos incidentes tais como os de Fukushima e Chernobyl, que se deveram a uma má operação e a não haver reforço suficiente (existiam outras centrais de energia nuclear que possuíam mais reforço e proteção do que a de Fukushima, que aguentaram um tremor de terra e tsunami, por exemplo). A energia nuclear é considerada a mais segura, segundo especialistas na área, assim como tem menor impacto ambiental, dado a natureza das regulações necessárias (e com razão). Atualmente só existe um reator nuclear em Portugal, para fins não comerciais, que é utilizado para investigação. Atualmente, em Portugal continental, produz-se mais energia do que se consome. A opção nuclear só será economicamente viável se houver um desfasamento de centrais termoelétricas

(que usam combustíveis fósseis, que emitem dióxido de carbono para a atmosfera). Será opção nos Açores? Possivelmente, dado ser possível reduzir as dimensões das centrais para o consumo atual e futuro, mas será preciso mais investigação para verificar as condicionantes locais. Provavelmente as ilhas com maior população iriam beneficiar de um conjunto de produção energética, quer de renováveis (eólicas), quer de biomassa e nuclear. Veremos se, com o nosso crescente consumo energético, irá ver efeitos pela perceção pública e política, que a nuclear é, e provavelmente será, a energia mais limpa e eficiente do futuro.

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REPORTAGEM

XVIII CONCURSO MICAELENSE RAÇA HOLSTEIN FRÍSIA

JORGE RITA QUER “CASAR” A AGRICULTURA COM O TURISMO

Rui santos

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Os apoios externos da União Europeia, a cooperação interna entre instituições, o preço do leite e o futuro da juventude no setor agrícola dos Açores foram os desafios apontados por JORGE RITA E Vasco Cordeiro na cerimónia de abertura da 18ª edição do concurso micaelense da raça Holstein Frísia, realizada no dia 21 de junho, no parque de exposições da ilha de São Miguel, em Santana.

orge Rita, presidente da Federação Agrícola dos Açores (FAA), apontou a falta de mão-de-obra e de formação da mesma no setor agrícola como dois dos grandes desafios com que a agricultura açoriana se depara, tendo referido que “esse é um trabalho que tem que ser feito na Região, tem que ser feito em parceria com as escolas, tem que ser feito com aqueles que normalmente também o querem fazer”. O presidente da FAA falava na sessão de abertura da 18.ª edição do Concurso Micaelense da Raça Holstein Frísia, realizada no Parque de Exposições da Associação Agrícola de São Miguel (ASSM), a qual também preside, em Rabo de Peixe, tendo acrescentado que “a Associação tem demonstrado ao longo dos anos que procura, precisamente, este tipo de formação que é essencial para um setor tão importante quanto este”, Jorge Rita explicou, ainda, que, para o setor, “a questão do leite é o grande Calcanhar de Aquiles” e propôs “fazer a valorização do nosso produto através do aumento do preço do leite”. Considerando o facto de os Açores terem “o melhor leite do mundo”, esse é, “neste

momento, o mais mal pago da Europa”, disse. “Compete a quem decide, em termos estratégicos, também tentar melhorar a situação com campanhas de marketing mais solidificadas, mais bem orientadas e com nova procura e com apoios que existem, chegar a novos mercados, essencialmente ter o objetivo e a ambição da internacionalização dos nossos produtos, para assim dar o salto”, salientou o presidente da FAA. Jorge Rita apontou, também, o desafio que é “tentarmos saber qual é a melhor forma de aumentarmos o POSEI para a Região Autónoma dos Açores (RAA)”, e o problema de logística com os transportes, dado a conjuntura geográfica da Região. “O transporte é um dos grandes handicaps que ainda temos, vivemos em nove ilhas – é bom que não nos esqueçamos disso e essa dificuldade que existe e o custo acrescido que temos nos nossos produtos, para serem competitivos a nível do transporte”, apontou. “O casamento da agricultura e turismo é um bom casamento mas também estamos casados com as nossas indústrias, mas

o Governo Regional não pode ser o juiz que decide o divórcio. Tem de ser o juiz que faz a conciliação entre as partes”, defendeu, acrescentando que “o caminho para o sucesso é estarmos condenados a viver todos os juntos, nós, a indústria, o Governo Regional. Esta é a forma para chegarmos sempre mais perto do sucesso que nós ambicionamos para a RAA”. Já Vasco Cordeiro, Presidente do Governo Regional dos Açores, começou o seu discurso congratulando o setor agrícola da Região, assim como o papel que a AASM tem desempenhado a nível interno e “para além das fronteiras da nossa Região”. O líder do Governo Regional apelou a uma “consciência clara e inequívoca sobre aquilo que está em causa neste momento”, sendo que, para tal, há que analisar “onde é que nós nos situamos”. No entender de Vasco Cordeiro, tem de ser objeto de reflexão “o trabalho que nós necessitamos de fazer, aquilo que, no fundo, é o nosso posicionamento face a alguns desafios externos e internos com que a Região e, em particular, o setor agrícola estão confrontados num futuro próximo”.

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Apresentando, na ocasião, quatro assuntos pertinentes para a agricultura da Região, Vasco Cordeiro referiu, primeiramente, ser de “importância fulcral” perceber aquilo que a “União Europeia (UE) quer para si”, o que acaba por influenciar “um conjunto de políticas e medidas que relevam para cada uma das parcelas que compõem o território da UE”, referindo-se, mais concretamente, “às perspetivas financeiras para o período de 2021 a 2027, no âmbito do setor agrícola, e naquilo que, especificamente, tem a ver com a nossa Região, como região ultraperiférica no quadro do POSEI”. Pensando no futuro, o líder do Executivo regional acredita que “se se confirmarem aqueles que são os crescimentos, à volta dos 4,8%, para o Pilar I da Política Agrícola Comum (PAC), nomeadamente os dirigidos ao nosso país”, e, por sua vez, “não mantendo-se as verbas do POSEI, há, efetivamente, aqui um desequilíbrio que deve ser trabalhado e que tem sido, aliás, já trabalhado” afirmou. Ainda em relação a este assunto, o Presidente do Governo Regional destacou o trabalho que tem sido feito

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pelo próprio Executivo em cooperação com outras entidades, tais como a FAA, quanto à “sensibilização para que não era aceitável o corte para qualquer verba no POSEI”, recordando que “o próprio comissário da Agricultura, Phil Hogan, aqui numa visita à nossa Região, assumiu claramente que não haveria esse corte”. Para ultrapassar este tipo de adversidades externas, o Presidente do Governo dos Açores solicitou a união interna, mencionando o “novo Parlamento Europeu, no qual os Açores têm um eurodeputado”, e, também, apelando à necessidade de “nós articularmos, cada vez mais, esforços e desenvolvermos parcerias para que a Região fale a uma só voz em relação àquilo que são as suas pretensões face à UE, suscitem elas a intervenção da própria Comissão do Parlamento Europeu ou do próprio Governo da República e dos Governos nacionais”. Em segundo lugar, Vasco Cordeiro explicou que “o Governo tem uma ideia e tem propostas em relação àquilo que pretende fazer, mas acha fundamental que essas propostas e essas ideias sejam testadas. Sejam, no fundo, colocadas

à crítica e ao debate por parte dos parceiros sociais, que é assim que tem sido”. “É dessa maior possível congregação de vontades, congregação de perspetivas, no fundo união à volta daquele que é o caminho que se pretende seguir, no caso concreto na nossa agricultura, mas também na nossa Região, que tem sido a grande força e que, na minha opinião, tem sido uma das justificações para que muitas das medidas que têm sido criadas por parte do Governo Regional têm suscitado uma adesão significativa por parte daqueles que são os nossos agricultores” acrescentou. Exemplificando essa “adesão” e “congregação de vontades”, o Presidente do Governo Regional falou sobre “um programa regional de componente agrícola no âmbito dos fundos comunitários que estão em vigor”, o PRORURAL+, referindo-se ao mesmo como uma experiência “particularmente positiva”. Segundo Vasco Cordeiro, o programa em causa contou com a participação de “cerca de 900 projetos de investimento privado”, os quais suscitaram “um investimento à volta dos 90 milhões de


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"O casamento da agricultura e turismo é um bom casamento mas também estamos casados com as nossas indústrias, mas o Governo Regional não pode ser o juiz que decide o divórcio. Tem de ser o juiz que faz a conciliação entre as partes"

euros”, o que demonstra “a adesão por parte daqueles que fazem desta a sua vida do dia-a-dia”. O líder do Executivo Regional salientou que o PRORURAL+ é “absolutamente fundamental”, que apelando à “cooperação, o diálogo, a assunção clara das naturais diferentes perspetivas que cada um tem quanto ao caminho que deve seguir”, destacando “essa capacidade que tem sido uma constante ao longo do tempo”. O terceiro aspeto enumerado por Vasco Cordeiro, em relação ao setor agrícola da Região, prende-se com os desafios internos desse mesmo setor. O governante afirmou estar “absolutamente de acordo” com Jorge Rita, presidente da FAA, no que diz respeito “à questão do rendimento dos nossos agricultores, do qual uma das componentes fundamentais é, efetivamente, a componente do preço do leite pago à produção”. De modo a tentar ultrapassar este obstáculo, o Presidente do Governo Regional mostrou a sua disponibilidade para que “todos se sentem à mesa”, de modo a “ver de que forma, em que entre

aquilo que é a capacidade de politicas públicas e aquilo que é a capacidade dos privados de mobilizar, de orientar a sua atividade para uma cada vez maior valorização dos produtos da nossa Região, nós consigamos não apenas que os produtores tenham um maior e melhor rendimento, mas que toda essa cadeia possa fortalecer o seu valor e o seu contributo para a economia da nossa Região”. Destes desafios internos, Vasco Cordeiro, para além da questão do leite, expôs, também, a questão da “velha tripla”: caminhos, água e luz, mencionando ser “uma matéria em que nós continuamos a apostar e continuamos a concretizar investimento e investimento público”, relembrando, ainda, investimentos realizados noutros domínios como “o matadouro da Graciosa que completa, no fundo, esta rede regional de abate moderno e modernizada”. Por último, o Presidente do Governo Regional referiu que há que “continuar a apostar no futuro do setor agrícola na nossa Região”, através da juventude, acrescentando que “é uma matéria que


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tem sido evidenciada, por exemplo, por via da adesão às candidaturas ao PRORURAL”, que, por sua vez, “têm tido uma expressão muito significativa no ponto de vista dos montantes de investimento de projetos de apoio à primeira instalação”. No caso da nossa Região “está à volta dos nove milhões de euros, montante de investimento que nestes quatro anos, deste quadro monetário de apoio, foram feitos em termos de projetos de primeira instalação”, destacou. Para o Presidente do Governo dos Açores, o investimento acima referido “não dá por concluído o desafio de apostar no futuro da agricultura da Região, através do rejuvenescimento do setor em causa”. Não considerando suficiente o apoio ao investimento em equipamentos e instalações, Vasco Cordeiro apontou o “investimento na capacidade, na qualificação dos jovens agricultores para fazerem cada vez melhor”. Com isto em mente, o governante mencionou “uma iniciativa do Governo Regional que já esteve a ser debatida e construída, que é o programa Jovem Agricultor”, iniciativa que visa, “em três ou quatro áreas fundamentais da formação da partilha de conhecimento, naquilo que é a criação de condições para o acesso a financiamento bancário, por exemplo, dar melhores condições

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para o desenvolvimento desta atividade”. “Temos que ser capazes de, efetivamente, deste trabalho de mobilização, de congregação do diálogo e parceria para desenvolver aquelas que são as apostas estratégicas que temos à nossa frente”, afirmou. Em relação ao que Jorge Rita, presidente da FAA, mencionou no seu discurso, relativamente ao “casamento entre a agricultura e o turismo”, Vasco Cordeiro esclareceu que “poderia dizer que entre marido e mulher ninguém mete a colher, mas não é bem esse o caso, a ideia está percebida, mas também a ideia tem que ser clara quanto áquilo que é o limite, a fronteira da atuação das entidades públicas em relação a determinadas áreas”. “Há áreas nas quais as entidades públicas não podem, nem devem, interferir. Isto deve ser deixado à qualidade, à competência, aquilo que, no fundo, é o engenho e a arte dos intervenientes nesse setor”, acrescentou. Concluindo, o Presidente do Governo Regional congratulou a realização da 18.ª edição do Concurso Micaelense da Raça Holstein Frísia, apelando a um momento de “enaltecimento da qualidade, do saber fazer açoriano, nesta área fundamental que é a nossa agricultura, para benefício deste setor e para benefício de toda a nossa Região”.

A “ORP Mccutchen Maia” da Exploração de Óscar e Roberto Ponte, da Lomba da Maia foi a Vaca Grande Campeã. Esta é a quarta vez que a Exploração dos irmãos Ponte vence um concurso bovino organizado pela AASM. A exploração da Lomba da Maia participou no XVIII Concurso Micaelense da Raça Holstein Frísia com nove animais, sendo que em todas as categorias conseguiu alcançar o pódio, nomeadamente com uma vitela que foi vice-campeã e que irá marcar presença na Feira Açores deste ano.


SAÚDE

DR. SÉRGIO CUNHA PSICÓLOGO CLÍNICO

Chiclete “E, como tudo que é coisa que promete, a gente vê, é como uma chiclete, que se prova, mastiga e deita fora, sem demora!” (Chiclete, Táxi). A saúde é um bem. O valor de uma afetividade sã é fundamental à vida, reproduzindo-se em todas as dimensões. Este valor afirmase quando damos pela sua falta, nas relações marcadas por poder e violência, na gestão inconstante daquilo que é básico na nossa vida, ou na incapacidade de enfrentar a atitude de quem nos afronta. Sendo um bem, concordaremos que a saúde mental não é uma “coisa”. O nosso comportamento, e o padrão de relacionamento que desenvolvemos, não é um conjunto de elementos transitórios que possamos optar por adquirir ou descartar. A forma como atuamos é apenas a superfície de uma história de vida que se repete no “aqui-eagora”, nos sentimentos e pensamentos despertados por aquilo que observamos. Cada um de nós tem o seu próprio “dicionário de vida”, povoado por definições, aforismos, ilustrações… uma gramática emocional em que nos fomos construindo. Constatar o papel dos nossos “significados pessoais” na manutenção do drama atual, pode ser desconfortável, mas é esse mesmo o ponto em que se afirma a nossa liberdade, a esperança na possibilidade de transformação da nossa história. Quando alguém procura ajuda para o seu sofrimento, encontrará propostas que negam o seu carácter pessoal: uns dirão que é preciso definir conteúdos mentais a manter e reforçar (ditos “positivos”) e outros a eliminar; poderão dizer que um

sentimento ou pensamento não merece lugar no pensamento, não tem relevância ou utilidade na vida quotidiana, apenas a prejudicando; dirão algumas propostas que é preciso deixar “os pensamentos negativos fluir” [para fora da mente]; outros ainda, dirão que se trata de “más energias” que devem ser evacuadas. Mas, como poderá alguém “rasgar” da sua vida algo que construiu, e de que se constrói? Será possível confiar num “dicionário de vida” com folhas rasgadas, significados rasurados, sentimentos omitidos, oprimidos? Estas propostas caracterizam-se por um sentimento de omnipotência, de tudo mudar como quem “mastiga e deita fora”. A afirmação da música ilustra um modo de controlar a realidade, sem se deixar afetar por ela, (sobre)vivendo de um modo insensível, anestesiado, desumanizado.

Esta afirmação deve servirnos de alerta. As decisões que tomamos podem – e devem! – comportar uma opção crítica. Todos temos o direito de questionar se nos sentimos respeitados na sensibilidade das nossas diversas dimensões, se nos propõem um espaço de respeito ou se nos oferecem a alienação. A alienação de sentimentos e emoções criará “desertos de significado”, empobrecendo a vida mental. Tal como uma criança que insiste em fazer-se escutar, os pensamentos descartados mostram a sua urgência. Despojada dos pensamentos que a representava, a razão da sua urgência “inflama”, irrompendo novamente à superfície da mente. Mas, desta vez, o caminho da representação está bloqueado. A representação foi banida, e o pensamento desvia-se da verdade, do amor, da sensibilidade. Aumenta a energia (sem lugar) e a violência. O resultado é o aparecimento de sintomas de maior gravidade. Um adulto cujo medo de voar não seja sido entendido (na sua sensibilidade particular) pode temporariamente omitir esse medo, acabando por desenvolver uma desconfiança generalizada. Do ponto de vista – frio e distante – do controlo do sintoma, nada parecerá estar mal. Mas de pouco lhe servirá a omissão do sintoma, face à desorganização emocional e social. Qual será, então, a alternativa? A ajuda a alguém que sofre, passará sempre pela criação de uma relação de verdade, escuta, compreensão sensível, contenção emocional, curiosidade e abertura à mudança.

Avenida D. João III, 26 r/c poente nascente Ponta Delgada Tlf. 296 654 234 / Tlm. 961 436 337 www.lalar.pt geral@lalar.pt Horário: dias úteis: 10h00 - 20h00 NOJUL19

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REPORTAGEM

AS PRESSÕES DO TURISMO NA NOSSA REGIÃO

UM CAMINHO LONGO AINDA POR TRILHAr André Aguiar

A

Mário Fortuna e Catarina Cymbron encerraram, no passado mês de junho, o ciclo de conversas informais sobre as pressões do turismo nos Açores, iniciativa esta da Associação Seniores de São Miguel, identificando a falta de infraestruturas, de equipamentos e de qualificação da mão-de-obra como os maiores constrangimentos sentidos no setor aqui na Região.

o presidente da Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada (CCIPDL), e professor catedrático da Universidade dos Açores, Mário Fortuna, coube falar sobre as evidências da pressão que o turismo está a exercer na nossa Região. Referindo-se, em concreto, a São Miguel, Mário Fortuna explicou que, só em Ponta Delgada, e até ao mês de maio, aumentaram os passageiros desembarcados e as dormidas em cerca de 8% e 27%, respetivamente, dados esses comparados com o mesmo período homólogo. Contudo, “os proveitos por quarto subiram apenas 5,5%, o que quer dizer que os proveitos por quarto existente não estão a crescer tão depressa neste período”. No entender do presidente da CCIPDL, isto acontece, provavelmente, “por uma razão muito simples” – porque estão aparecer mais quartos, mais hotéis e alojamentos, e o crescimento da oferta está a ser superior ao crescimento das dormidas. O turismo, diga-se, não pode ser analisado apenas atendendo às dormidas, por exemplo. Segundo Mário Fortuna há que considerar as “plantas satélite”, uma espécie de contabilidade do turismo que tem em conta os transportes, o alojamento, a restauração, as companhias de rent-a-car, as agências de viagens, entre outras variáveis. Nesse sentido, e segundo o presidente da CCIPDL, “o turismo vale, ou valia, 360 milhões de euros em 2018”, cerca de “10% de

todo o valor acrescentado da nossa setores considerados “pilares” da nossa economia”. Ainda segundo Mário economia, estão abaixo destas grandes Fortuna, só em atividades associadas ao áreas de atividade. turismo temos, nos Açores, cerca de 18 Depois focando-se no turismo, Mário mil postos de trabalho, “cerca de 15% de Fortuna fez uma comparação do que se toda a mão-de-obra”, o que significa que, está a passar nos Açores com o que se desde 2015 até ao momento, “criaram-se está a passar a nível nacional e, de facto, seis mil postos de trabalho”. “quer nos Açores, quer a nível nacional, Depois fazendo alusão a uns gráficos que o peso do turismo disparou. Agora havia preparado para a ocasião, Mário a percentagem do turismo na nossa Fortuna procurou mostrar economia é maior do que como, na Região, o setor "quer nos Açores, quer a percentagem do turismo que assume maior peso a nível nacional, portanto a nível nacional, o peso temos uma intensidade de é o da Administração Pública, com “cerca de do turismo disparou. turismo superior à média 25% do valor gerado nos demonstrou. Agora a percentagem nacional”, Açores”. Comentando “A pergunta que nos do turismo na nossa resta é se estamos a fazer esta evidência, o presidente da CCIPDL economia é maior do aquilo que devíamos disse que aparentamos estar a fazer para tirar que a percentagem ser “bem ricos, para o devido partido deste termos um setor público setor”, referiu Mário do turismo a nível tão pesado”, em tom Fortuna, “por um lado, nacional, portanto de brincadeira. Depois da procura que existe, temos uma intensidade e ainda bem que existe, explicando que “ricos não somos, somos pobres”, de turismo superior à e a minha expetativa Mário Fortuna referiu é que vai continuar a média nacional" que “o dinheiro que está existir enquanto houver à vista é o dinheiro que aviões no espaço livre”, vem das transferências do Orçamento e, por outro lado, “deste mercado, de Estado e das transferências da União deste movimento mundial” que se tem Europeia, portanto isto é um bocadinho registado, ao nível de novos mercados artificial”, ressalvou. emissores, especialmente no extremo Abaixo da Administração Pública temos Oriente, com uma classe média cada vez a dupla Turismo/Comércio, “os nossos mais significativa e predominante, com serviços privados”, e, em terceiro maior poder de compra e mais recursos lugar, “surpreendentemente”, o setor disponíveis para viajar. imobiliário. A agricultura e a indústria, É entender de Mário Fortuna que “o NOJUL19

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turismo deve ser, diria até, em termos para ter uma imagem efetivamente sociais, que tem que ser um pilar declarada”. Este é, segundo o presidente significativo da nossa economia, se da CCIPDL, “o primeiro ponto” da não queremos abordar a questão da problemática do turismo nos Açores. desertificação dos Açores”, o turismo “é O outro ponto prende-se com as sempre uma outra alternativa”. A ideia, infraestruturas. “A Câmara de Comércio, referiu, “é tirar partido deste potencial já na altura, e na altura até abordamos a para gerar empregos e gerar riqueza”. Ordem dos Arquitetos, o imediatamente Depois identificando um dos maiores vimos é que ia haver congestionamento constrangimentos em levar essa ideia nos pontos principais de visitação da teoria para a prática, o presidente da turística, Vista do Rei, Lagoa do Fogo, CCIPDL disse que “chegar aos Açores Furnas, e insistimos logo para que, por é um bocadinho penoso”, uma vez que favor, requalifiquem os miradouros”. “quem quiser vir dos Estados Unidos Depois fazendo alusão a uma série de para os Açores, sem dar muitas voltas, miradouros, trilhos e spots de natureza tem que ir primeiro a Lisboa, ou algures que já havia visitado, e que visita, ainda, na Europa, para voltar para aqui, portanto com alguma frequência, Mário Fortuna imaginem se um dia temos mais alguma concluiu, e apelou, para o facto de que ou mais algumas companhias a fazer a “podemos tirar mais partido da natureza, ligação dos Estado Unidos”. podemos usar mais a natureza, podemos Depois dizendo que, “quando usá-la com mais inteligência” e “eu acho descobrirem os Açores, vão relegar para que é isso que está a faltar, usá-la com segundo lugar o Havai, quase de certeza inteligência”. absoluta”, Mário Fortuna transitou para Já Catarina Cymbron, diretora da uma questão de maior importância – “e Agência de Viagens Melo, e delegada agora o que é vamos fazer com isto regional dos Açores da Associação tudo”. Portuguesa das Agências de Viagens Segundo o presidente da CCIPDL, e Turismo (APAVT), começou a sua “a Câmara do Comércio, desde a intervenção com um exercício de primeira hora, foi alertando para aquilo comparação entre os Açores e a Islândia. que era preciso fazer e recordamos Enquanto esse país no norte do Atlântico perfeitamente, ainda estávamos em tem cerca de 330 mil pessoas, mais 2014, que alertamos para a importância de metade das quais reside na capital de um plano de formação extensivo, Reiquiavique, os Açores têm perto de para qualificar as pessoas para as novas 247 mil residentes, dos quais mais de funções que iriam estar em procura em metade vive em São Miguel. Quando função do incremento do turismo que comparado o crescimento do turismo viria com a abertura do espaço aéreo, em entre estas duas regiões, “notamos que, março de 2015”. a partir de 2014, o crescimento das duas Ora “não aconteceu nada até hoje, foi igual”. Relembrando não aconteceu particamente nada”, uma altura em que lamentou Mário Fortuna, recordando contactou uma que “só este ano é que se anunciou que ia haver um " sim senhor, o turismo conjunto de programas de formação na área do está a subir nos Açores, turismo”. Reconhecendo só que nós não temos que, “entretanto, houve algumas levas de miúdos sítio para nos expandir. que se formaram nas Nós somos nove ilhas Escolas Profissionais”, e ao lado é o mar. Se isto “nem de longe nem de perto é aquilo que continuam a vir pessoas nós precisávamos para o não há sítio para ir, nosso mercado” e os que já estavam a trabalhar então temos que tentar “ninguém pensou neles”. organizar aquilo que É entender de Mário temos da melhor forma" Fortuna que “a realidade dos serviços, muitas vezes, não está ao nível daquilo que nós achávamos que era necessário, para prestar o serviço como deve ser, 38 NOJUL19

agente de viagens islandesa, colega sua, “para saber como é que aquilo estava, porque nós aqui sentíamos muita pressão mesmo, pessoas a quererem vir e não haver alojamento”, Catarina Cymbron disse que esta sua colega avisou-a para que nós, nos Açores, não crescêssemos “tão depressa, porque nós crescemos depressa e estamos com problemas para resolver”. Em concreto, e segundo a diretora da Agência de Viagens Melo, na Islândia “havia poucos hotéis, estava tudo cheio, poucos restaurantes, e depois os preços começaram a subir, nos restaurantes a qualidade baixou e os preços aumentaram, também havia falta de mão-de-obra”, e Catarina Cymbron disse, a essa agente de viagens da Islândia, que o mesmo “também se passa aqui, nós também temos esse problema”. A agente de viagens recordou essa troca de impressões para chegar à conclusão de que, “sim senhor, o turismo está a subir nos Açores, só que nós não temos sítio para nos expandir. Nós somos nove ilhas e ao lado é o mar. Se continuam a vir pessoas não há sítio para ir, então temos que tentar organizar aquilo que temos da melhor forma”. Depois referindo que uma das soluções encontradas pelo Governo islandês foi a de equipar, com as devidas


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infraestruturas, locais que, antes, só eram acessíveis após longas viagens de carro, mas que, com o crescimento do turismo, começaram a ser cada vez mais frequentados, Catarina Cymbrom também disse que algo praticado na Islândia, “e em falta aqui nos Açores”, são inquéritos ao grau de satisfação dos locais, dos residentes, em relação ao turismo. As perguntas variam, mas a diretora da Agência de Viagens Melo destacou algumas. “O turismo criou emprego atrativo na minha área?”, ou “os turistas fizeram com que passasse a apreciar mais a nossa natureza?”, ou ainda “os turistas limitam o acesso aos serviços?” – tudo questões que, no entender de Catarina Cymbron, evidenciam um despertar de consciências, especialmente por parte das entidades públicas, em relação ao impacto que o turismo pode ter no dia-adia dos cidadãos. No caso concreto de São Miguel, ilha onde, na opinião de Catarina Cymbron, se sente uma maior pressão do turismo, falta controlo, nomeadamente no que diz respeito à entrada e saída de visitantes nos spots de natureza.

Depois fazendo alusão à “coesão das ilhas”, a delegada regional dos Açores da APAVT referiu que uma das soluções para combater esta pressão sentida em São Miguel seria a de “escoar mais gente” para as restantes ilhas, algo que, no seu entender, “é o papel de um agente de viagens”. “O nosso trabalho diário é criar pacotes para as outras ilhas, seja só São Miguel e duas ilhas, três ilhas, as nove ilhas, caminhadas a pé, vinicultura, gastronomia, enfim, depende do interesse do cliente”, explicou, acrescentando que “nós criamos esses pacotes e criamos pacotes para o ano inteiro. Nós não provemos só o verão, nós queremos que eles venham no inverno também e uma das coisas que se deve fazer, agora, é promover o inverno e mostrar como é que o inverno é tão bom aqui”, especialmente divulgando e promovendo “os banhos quentes” que os turistas podem tomar nas Furnas. Uma outra questão que, no entender de Catarina Cymbron, está subaproveitada, é a questão dos trilhos, “um produto que já é conhecido, pelo menos na Europa, uma vez que a maior parte dos turistas

vem cá para fazer passeios a pé”, mas “é importante que se mude a legislação e que se organize uma Comissão de Trilhos que seja autónoma das secretarias”, apelou. “Isto porque, em termos de investimento é pouco, mas o retorno é muito grande e há muito que se pode fazer em termos de trilhos, para as pessoas até ficarem mais tempo aqui, para fazerem mais trilhos em várias ilhas, ou irem para uma ilha mais pequena, fazer um trilho na ilha inteira, ficando logo quase cinco dias lá. Portanto há uma imensidão de alternativas em termos dos trilhos de que se poderia falar”. Concluindo, a diretora da Agência de Viagens Melo referiu que “o turismo é uma indústria que engloba e mexe com todos os restantes setores da economia”, ao virem “mais turistas, gasta-se mais água, come-se mais, comem mais peixe, comem mais carne, comem mais legumes em por isso, é muito importante que todos os outros setores evoluam com o turismo. A cultura também”. No entender de Catarina Cymbron, “todas as outras atividades vão a reboque do turismo e o turismo mexe com tudo”.


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ENTREVISTA

Entrevista a André Aguiar

antónio parreira deputado do Grupo Parlamentar do PS/Açores na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores (ALRAA)

Como açoriano e responsável político, compete-me dar continuidade a este trabalho, de modo a contribuir para a resolução das temáticas e dos novos desafios com que ainda estamos confrontados

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Com mais de quatro décadas, não restam dúvidas de que a Autonomia modificou os Açores e a vida dos açorianos para melhor, tendo sido criada uma série de infraestruturas que contribuíram para o nosso crescimento e desenvolvimento, económico e social

Quando assumiu funções como deputado pelo PS/Açores na ALRAA? Iniciei as funções de deputado na ALRAA a 25 de novembro de 2004.

Não assumo qualquer outro cargo na estrutura do partido. Sou responsável pela área agrícola, conjuntamente com outra colega deputada.

Que profissão/funções desempenhava antes dessa altura? Continua a desempenhar essas funções em simultâneo com as de deputado? Sou bancário de profissão, função que deixei de exercer aquando da minha tomada de posse como deputado em regime de exclusividade.

Das intervenções que realizou na ALRAA, até ao momento, quais destacaria aqui e porquê? Foram várias as intervenções em que participei. Destacaria as relacionadas com o setor agrícola, por se tratar de uma área que gosto e conheço, para além de ter uma relação de proximidade com os agricultores, particularmente com os da minha ilha. De resto, a agricultura é o pilar fundamental da economia regional. No entanto, destacaria em primeiro lugar o trabalho realizado pelo Grupo de Trabalho – Acompanhamento do Fim do Regime de Quotas Leiteiras nos Açores, do qual fiz parte como relator. Foi um trabalho gratificante e importante, que nos permitiu ver e perceber no terreno o grande investimento realizado pelos nossos agricultores, o aumento e melhoria significativa da qualidade do leite produzido. Quero aqui referir que, hoje, nos Açores produzem-se produtos de excelente qualidade, de nível igual ou até mesmo superior aos que se produzem na restante Europa.

De que Comissões faz parte e como caracteriza o seu trabalho nas mesmas? Antes de mais, gostava de referir que nas VIII e IX legislaturas fiz parte da Comissão dos Assuntos Parlamentares, Ambiente e Trabalho e também da Comissão Eventual de Inquérito à Rutura no Abastecimento de Água na Ilha Terceira, bem como da Comissão Eventual para analisar a aplicação do Rendimento Social de Inserção na RAA. Na anterior legislatura e na atual fiz e faço parte da Comissão de Economia e fui relator do Grupo de Trabalho de Acompanhamento do Fim do Regime de Quotas Leiteiras nos Açores. Ao longo destes anos, participei nas reuniões de trabalho das comissões a que pertenci e pertenço, discuto e debato os temas em análise, particularmente os relacionados com o setor agrícola, contribuindo assim, ativamente para o desenvolvimento da nossa Região, bem como para a melhoria e bem-estar dos açorianos. Por fim, há que referir que o trabalho que é desenvolvido em comissão é importante e fundamental, desde logo, porque ouvimos os órgãos do Governo, as diversas entidades da sociedade civil e os cidadãos, o que nos permite perceber melhor a realidade e a especificidade dos assuntos e, assim, propor alterações que beneficiem e melhorem as propostas inicialmente apresentadas e que deem resposta às necessidades. Para além de deputado do PS/Açores, que outros cargos assume na estrutura do partido? Está responsável por alguma área setorial em específico, das quais são exemplo a Economia, Agricultura, Solidariedade Social, Educação?

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Das iniciativas apresentadas pelo GPPS/ Açores, em quais participou ativamente, dando contributos como deputado eleito pelo círculo eleitoral da ilha Terceira? Participei nas iniciativas relacionadas com o Setor Agrícola e com o Setor do Turismo. Que diálogo mantém com os terceirenses, enquanto representante dos mesmos na ALRAA? O contacto é mantido diariamente nos locais onde me desloco, aos domingos na Feira do Gado e em diversos eventos culturais e religiosos, bem como nas visitas às freguesias, realizadas pelos deputados do PS/Terceira, durante as quais contactamos com os representantes das instituições e coletividades, de modo a perceber as suas dificuldades e anseios e, assim, contribuir para o progresso e desenvolvimento das nossas freguesias e da nossa ilha.


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Quais diriam ser as temáticas que assumem maior relevância e pertinência, neste momento, na RAA? Que outros problemas deveriam estar a ser discutidos, ou que, estando a ser discutidos, não o estão a ser de maneira eficaz? As temáticas que assumem maior relevância e pertinência no momento atual são do conhecimento público. Refiro-me às questões relacionadas com o ambiente, nomeadamente as alterações climáticas. É uma problemática mundial e que diz respeito a todos nós, aos governos, às empresas e aos cidadãos. Temos pela frente um desafio enorme e só numa união de esforços será, realmente, possível ter um melhor ambiente, capaz de garantir o futuro das novas gerações. Para além deste enorme desafio, há outros de grande importância para o nosso desenvolvimento económico e social, como, mais precisamente, as negociações do próximo Quadro

Financeiro Plurianual para 2021/2027, bem como da nova PAC e do POSEI. Tal como o senhor Presidente do Governo tem feito em diversas ocasiões, há que defender acerrimamente a importância da Política Agrícola Comum, da manutenção e do reforço do POSEI e da Política de Coesão. No que se refere às questões do Mar e à importância que tem para a nossa Região, há que referir que a área dos Açores representa cerca de um milhão de quilómetros quadrados, revestindo-se, por isso, de grande importância também para o país, enquanto estado-membro. Com mais de quatro décadas, não restam dúvidas de que a autonomia modificou os Açores e a vida dos açorianos para melhor, tendo sido criada uma série de infraestruturas que contribuíram para o nosso crescimento e desenvolvimento, económico e social. Exemplo disso é a melhoria substancial que se verifica hoje na saúde, na educação, na solidariedade social, nas acessibilidades, entre tantos

outros serviços. Como açoriano e responsável político, compete-me dar continuidade a este trabalho, de modo a contribuir para a resolução das temáticas e dos novos desafios com que ainda estamos confrontados, para que haja melhor desenvolvimento económico, social e ambiental sustentável, a criação de mais emprego, uma melhor distribuição da riqueza, mais coesão e igualdade, melhores acessibilidades, etc. Ou seja, no fundo, para que tudo isto se traduza na melhoria e no bem-estar dos nossos concidadãos.

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FERNANDO M. SOUSA

www.iroa.pt facebook.com/iroaazores

TÉCNICO SUPERIOR DA IROA, S.A

O PAPEL DA IROA NO DESENVOLVIMENTO RURAL E NA FIXAÇÃO DAS POPULAÇÕES NO MEIO RURAL

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A de bast ág ec ua ime nt o

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As principais funções da IROA têm-se mantido praticamente inalteradas desde a sua criação até aos dias de hoje. São elas a reestruturação fundiária e o ordenamento agrário, através da criação de mais e melhores infraestruturas de apoio à agricultura açoriana. Neste âmbito, torna-se imprescindível e até obrigatório salientar a importância dos fundos comunitários, em particular o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER), que ao longo dos sucessivos quadros de apoio tem permitido realizar investimento em matéria de infraestruturas, alterando não só a paisagem das nossas ilhas, mas principalmente o maneio das explorações agrícolas, através da beneficiação dos caminhos agrícolas e florestais, do abastecimento de água e das redes de eletricidade que se estendem até aos assentos de lavoura. Através da IROA, a Região soma um investimento, no conjunto do anterior quadro comunitário (2007/2013) e do atual (2014/2020), de cerca de 37,5 milhões de euros, em infraestruturas de apoio à agricultura, sendo que, em média, 15% desta verba provém do orçamento regional. Na beneficiação de caminhos agrícolas contam-se 63 projetos que totalizam um valor de 15,8 milhões de euros, no abastecimento de água somam-se 132 empreitadas, com um investimento de 19,6 milhões de euros e, por fim, na eletricidade, foram executadas 45 intervenções que totalizam 2,1 milhões de euros de investimento. No atual quadro comunitário, até final de 2018, as intervenções no âmbito da melhoria das infraestruturas agrícolas dotaram 1,405 explorações com melhores acessos, 1,902 passaram a usufruir de abastecimento de água e 129 foram beneficiadas ao nível da eletricidade.

63 Número de projetos desde 2007


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As mais valias diretas destes investimentos são muitas, podendo-se destacar as duas mais visíveis, nomeadamente o aumento da competitividade das explorações agrícolas e a melhoria das condições de trabalho dos agricultores. Os exemplos concretos são o facto de as vias de acesso permitirem a utilização de máquinas agrícolas mais especializadas, tendo como consequência direta o aumento da produtividade das explorações; no caso do abastecimento de água as vantagens passam pelo ganho de tempo despendido nesta tarefa e pela redução dos custos da mesma; e, por sua vez, o fornecimento de eletricidade permite utilizar equipamentos necessários às tarefas diárias das explorações, sem recorrer a soluções menos práticas e mais poluidoras, como a utilização de geradores, permitindo, ainda, a instalação de equipamentos de frio, de importância acrescida para a produção de leite, já que assegura a sua maior valorização junto da indústria. Além disso, o contributo deste investimento para o emparcelamento é notório. Verifica-se que os agricultores, cujas explorações dispõem de bons acessos e de água na pastagem, tendem a criar um assento de lavoura fixo, com ganhos de produtividade e eficiência assinaláveis, que os incentivam a uma reestruturação do parcelário e ao

emparcelamento. Todavia, há que planear o futuro. Como é sabido o setor agroalimentar é dos mais dinâmicos em termos económicos e nas tendências, e só a preparação prévia pode dar garantias de se estar à altura dessas dinâmicas. É por isso que, no capítulo do abastecimento de água e a par de uma das maiores preocupações dos próximos tempos em todo o planeta, a IROA está a desenvolver um Plano Estratégico de Abastecimento de Água à Agricultura, para um intervalo temporal de 10 anos, que maioritariamente irá coincidir com o próximo quadro comunitário de investimento. De acordo com os objetivos delineados para a próxima PAC, poder-se-á dizer que o trabalho diário desenvolvido na melhoria e construção de infraestruturas de apoio à agricultura, e principalmente aquele que já está a ser preparado para o futuro, está em estreito alinhamento com os objetivos gerais e específicos da PAC Pós 2020, nomeadamente na promoção de um setor agrícola resiliente, dotado de explorações mais competitivas e resilientes; no alcance dos objetivos ambientais e climáticos, por intermédio da gestão eficiente dos recursos; e o reforço do tecido socioeconómico das zonas rurais, com a criação de condições de sustentabilidade dessas localidades. Contudo, a IROA tem preconizado um outro papel de extrema importância

no meio rural de todas as ilhas do arquipélago, as suas ações são um contributo inestimável para a manutenção das populações nos territórios rurais, marcando assim, também, o seu cunho no combate à desertificação. Uma problemática que hoje assume lugares cimeiros nas preocupações da Comissão Europeia, dos governos e dos próprios municípios. Através do trabalho realizado por esta empresa pública, emergem melhores condições de vida para os agricultores, que são os principais agentes socioeconómicos do mundo rural. A melhoria de caminhos agrícolas, a criação de redes de abastecimento de água coletiva ou às explorações, bem como a sua eletrificação, são ações fomentadoras de uma maior competitividade da nossa agricultura, incentivando a permanência dos agricultores nas suas localidades e o desenvolvimento sustentado do meio rural. Em algumas ilhas, esta dinâmica é mesmo o principal motor da sua vida económica e social. Em suma, o papel da IROA é imprescindível no panorama rural dos Açores, as suas ações são impactantes não só diretamente na agricultura, mas, também, de forma indireta na economia, no ordenamento do território e na organização social das nossas ilhas.

15 793 592,42€

19 588 511,83€

2 107 872,43€

caminhos agrícolas

abastecimento de água

eletrificação agrícola

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