O Silêncio do Delator.

Page 59

Especial O Silêncio do Delator. Fortuna Crítica e Fragmento da Obra humano que levanta em nosso espírito. O que é a vida? O que é a morte? Serão duas coisas conjugadas? As duas faces da mesma moeda? O sim e o não, o que existe e o que não existe? Nesse sentido, seu romance deixa de ser direto, objetivo, linear, e ganha foros de profundidade, por vezes de natureza metafísica nas relembranças que ocorrem à memória. Estamos, queiramos ou não, atrelados ao caos que a todos atinge: pelo pecado, pelas circunstâncias, talvez pelo destino. São mais ou menos estes os temas, os assuntos mais dramáticos, das histórias deste romance em que há um pouco de tudo: assédio, vício, delicadeza, ironia, heroísmo e amor. É este um livro de intertextos que se aproximam da realidade vivida pela inquietude do dia-a-dia. Essa inquietude e essa avalanche nos toma de súbito como um furacão e nos atira ao nada que somos e subverte a ordem natural das coisas em seu clima quase profético. Mas nem tudo está perdido, fica em algumas passagens um saldo positivo na esperança e na alegria que apesar de tudo José Nêumanne passa virtuosamente para seus leitores. As fantasias não desertaram de todo do espectro do livro. O poeta, o bom poeta que ele é, frui e refrui na maré de bons augúrios. Assim também se apresenta sua ficção em toda a grandeza de seus lances ambíguos, desconcertantes e dramáticos. O silêncio do delator é um texto feliz, rico pela sutil plasticidade da linguagem, estilo muito pessoal do autor, de que se nutre em sua escritura em seus recursos éticos e estéticos sob os vários aspectos de sua criatividade. E por esses atributos José Nêumanne nos liberta das convenções sociais, das limitações e costumes que a tradição e a sociedade nos legou. Fica-nos, ainda, a lição de que o homem nunca é demais e que em qualquer parte é um pedaço do chão, e nunca perde sua identidade nem seu sentimento, pois a ele está confiado o destino do homem. Desse acerto e ambivalência é feita a natureza dos personagens de Nêumanne. O silêncio do delator por vezes lembra uma tese. Tem algo de profético na ordem e na desordem que regem os conflitos humanos. Não podemos dizer que ele se aproxima de Lins do Rego ou Graciliano Ramos, por exemplo, para citar apenas dois de nossos grandes escritores da atualidade. Não é um texto de natureza psicológica nem introspectiva. Podia lembrar “Memórias Póstumas de Brás Cubas” (o morto contando sua história) mas está tão distante deste como Canópus da Terra. Não há a menor aproximação. Tampouco se identifica com “Primo Basílio”, que Machado quase o copia por inteiro. 58


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.