História de Portugal

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OS ARGONAUTAS PORTUGUESES E O SEU VELO DE OURO (SÉCULOS XV-XVI)

ras ibéricas, que ondulavam por uma monarquia universal católica, consumiam boa parte da riqueza. E vejam só. No século XVI veio mais prata e ouro das Américas do que a que tiveram todos os reis de Espanha desde o tempo do rei Pelágio. Apesar disso, Carlos V quebrou em 1554, Filipe II em 1560, 1575, 1596 até que se acabou o crédito e não há memória de um cerro tão rico em prata como o de Potosi. Em suma, o crédito e as forças da contratação sobrepunham-se ao poder das armas.15

A MENTE MOVE-SE A expansão européia repercutiu-se profundamente nas mentalidades e na ideologia. Mudavam-se os tempos e as vontades, atropelavam-se os códigos da moral, mudavam-se as idéias, mudava-se a própria mudança. Os livros impressos constituem uma boa amostragem da “propaganda” e do universo mental das elites. No século XVI publicaram-se em Portugal cerca de 1.904 títulos. Os livros de doutrina e relativos à organização da Igreja somavam 651. Juntando-lhes os livros de moral e os que serviam de material para as aulas, majoritariamente de Direito Canônico, o número subia a 1.099. As publicações relacionadas com os serviços do Estado e as de doutrina civil rondavam os 278. A literatura somava 139 títulos, as biografias, hagiografias e orações fúnebres 98, os livros de filosofia-teologia ficavam pelos 38, os de astronomia, matemática com o repositório dos tempos 31, os relatórios de viagens 23, os livros de questões médicas 18 e os relativos às artes e técnicas 14.16 O peso da Igreja no mundo do livro é esmagador e contrasta com a escassez das obras no terreno científico e técnico. Na aridez doutrinária sobressaem na literatura as obras maiores de Camões e Gil Vicente e um tratado científico de enorme relevância teórica, os Colóquios dos Simples e das Drogas de Garcia da Orta, publicados pela imprensa de Goa. A febre da riqueza consomia largos estratos da sociedade. Todos os dias arriscavam a vida não só pela sobrevivência mas pela busca de riquezas; todos os dias se exercitavam os diferentes modos da arte de furtar. O dinheiro medrava sobre o serviço, como escrevia ao rei D. João III, em 1533, o vigário-geral da Índia: os que andam a ganhar dinheiro têm-no e levam muito boa vida e depois pedem as mercês; e os que servem são pobres e pobres vivem. Tudo se comprava e vendia até os cargos públicos, as viagens, os soldos, os corpos. A Igreja está muito preocupada com a ortodoxia e com a riqueza e o poder dos mercadores portugueses. No seu Tratado do Câmbio, o jesuíta Fernão Rebelo defende que “nada se receba, por pouco que seja, à conta

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