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MEU INÍCIO

CAPÍTULO 2 MEU INÍCIO MEU INÍCIO

Não é fácil falar sobre sua própria vida. Mas acho que ficará mais fácil entender o início e o desenvolvimento da Narina a partir de algumas informações básicas sobre minha pessoa.

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Meus pais são portugueses, da Ilha da Madeira. Meus tios já moravam em São Bernardo do Campo, no bairro de Ferrazópolis. Eles vieram de Portugal, montaram um barzinho e foram tocando a vida. Meu pai veio ao Brasil em 1954 e ficou morando uns quatro meses na casa de minha tia. Logo que pôde, arrumou uma casinha e mandou dinheiro para minha mãe, que veio em 1955 com meu irmão, Manoel, e minha irmã, Lídia. Foram 11 dias de navio em condições nada confortáveis. Nasci nasci em 1955 em São Bernardo e minha irmã Sara em 1957.

Meu pai era lavrador em Portugal e quando veio para cá fez primeiramente alguns serviços de jardinagem para manter a família e juntar dinheiro. Era época do ápice do desenvolvimentismo e a indústria metalúrgica crescia em largas proporções. Juscelino Kubitschek se elegeu presidente em 1956 e instituiu o plano “50 anos em 5”, incentivando a indústria a se estabelecer no Brasil. Em 1957 terminavam a construção da pista sul da Rodovia Anchieta, que finalizava a obra que foi um marco da engenharia brasileira. O mais importante nisso é que ela ligava o Porto de Santos a São Paulo, tornando-se um importante corredor de negócios. Logo centenas de indústrias e empresas começaram a se instalar em suas margens, atraindo grandes empreendimentos para São Bernardo.

Meu pai resolveu se aproveitar desse frenesi industrial e tentou postos na Volkswagen e em outras montadoras, sem sucesso. Semianalfabeto, as portas não se abriram para ele, exceto uma: conseguiu emprego na Panex, no Ipiranga, tradicional fabricante de panelas. Trabalhava na fundição, exposto o tempo todo a fornos com centenas de graus. Acabou se aposentando por essa empresa. Ganhava pouco, mas conseguiu juntar um dinheirinho e comprar um terreno onde fez duas casinhas, tirando algum ganho do aluguel que ajudava nas despesas. Minha mãe, como boa portuguesa, bordava muito bem. Então ela desenhava, montava os moldes, comprava tecidos, pintava, bordava e vendia, ganhando algum dinheiro também, que era economizado. Quando ela morreu em 2012, tinha uma conta poupança.

Quando teve que ir para uma clínica, já doente, ela mesma pagava suas despesas. Essa era a vidinha de meus pais: ela sempre bordando em casa e meu pai na fundição.

Eles tinham uma linha dura na educação em casa, mas não fiquei amargurado nem me arrependo de nada. Pelo contrário, agradeço as palmadas que recebi. Acabei passando um pouco dessa educação rígida para meus filhos, como respeito e disciplina. Eles não são perfeitos, mas têm uma boa conduta. Me orgulho deles, que hoje trabalham comigo na Narina.

Toda a minha infância se passou no bairro de Nova Petrópolis, em São Bernardo. Inclusive minha irmã, Lídia, ainda mora em nossa antiga casa. Todos nós crescemos ali, frequentamos escola, vivemos a infância. Naquele tempo era tudo muito aberto, tinha chacrinhas, olaria, pegávamos frutas e passarinhos, jogávamos futebol e se pescava e se nadava no rio próximo, onde hoje é a Av. Peri Ronchetti, junto com o pessoal do bairro. Corríamos com carrinhos de rolimã perto da caixa d’água do bairro e, com o tempo, montamos um campo de futebol do outro lado do rio. Minha mãe costurava e bordava uniformes com sacos de pano que comprávamos.

Quando chegou a época de enfrentar a escola aconteceu uma curiosidade: eu não parava em nenhuma. Comecei no Grupo Escolar Maria Iracema Munhoz, na Praça Lauro Gomes. Aí passei para o Grupo Escolar e Ginásio Maurício Antunes Ferraz, em Nova Petrópolis, mais perto de casa, que tinha o apelido carinhoso de “Gegão”, abreviatura de “Grupo Escolar e Ginásio”. Mas acabei voltando para o Iracema por algum tempo e depois terminando o curso primário no Maurício, novamente. Acompanhou? O vai e vem entre Nova Petrópolis e o Iracema Munhoz aconteceu várias vezes. Depois fiz admissão ali no Maurício Ferraz e durante o ginásio eu fui parar no Ginásio Wallace Cochrane Simonsen, onde comecei outra peregrinação. Eu tinha muita dificuldade em parar e me adaptar em alguma escola. Quando sentia alguma dificuldade eu já saía dali. Estudei no Wallace, no MMDC na Vila Brasília; fui para o Cacique Tibiriçá e de lá para o Leonor Mendes de Barros, onde fiz o curso de técnico em química durante algum tempo. Como não arrumei estágio nessa área, acabei desistindo do curso. “Acabei passando um pouco dessa

Certo dia eu estava no educação rígida para banco atendendo e um meus filhos, como professor que trabalhava na respeito e disciplina. Volkswagen e era meu cliente, me sugeriu que estudasse na Me orgulho deles, ETI Júlio de Mesquita, em que hoje trabalham Santo André, no curso técnico comigo na Narina.” para ferramenteiro/torneiro mecânico, porque depois poderia trabalhar na montadora. Mas meu negócio era mesmo a parte administrativa, não me adaptava na área técnica. Depois de alguns meses o próprio professor reconheceu isso.

Nesse vai e vem acabei perdendo dois anos e resolvi fazer o supletivo no Santa Inês. Eu tinha que recuperar esse tempo, coisa que eu conseguiria com o supletivo. Mantendo a

tradição, mudei de escola no meio do curso e fui para o Colégio Anchieta, onde terminei o supletivo. A melhor lição que eu tirei disso tudo é de que não se pode desistir, por maiores que sejam suas dificuldades. Nunca.

Meu irmão Manoel sempre falava “seja lá o que for, não deixe de fazer uma faculdade. Aos trancos e barrancos você vai e faz. E vai usar lá na frente”. Nunca me esqueci disso. Com o diploma equivalente ao Ensino Médio atual em mãos, prestei exame em 1978 na Escola Superior de Administração de Negócios de São Bernardo do Campo (ESAN), para administração. Mas como tinha feito um colégio muito fraco, remendado, aos trancos, eu não consegui me adaptar na ESAN. O ensino era muito puxado e fiz só o primeiro ano e acabei tendo que sair. Meus amigos e família me recomendaram a não desistir e tentar a Faculdade Senador, em Santo André, para onde fui em 1979. Terminei o curso de Administração naquela faculdade em 1984, com muita ajuda dos colegas. A matéria em que eu ia melhor era marketing, o que já mostrava algo do que seria meu futuro.

Quando estava na ESAN eu já trabalhava no Banco Nacional, dentro da Volkswagen, onde comecei em 1974. Fiquei dois anos lá, junto com vários colegas da faculdade. O meu cunhado Alaor, que também trabalhava lá, saiu desse banco e foi para o Banco Lar Brasileiro, me chamando para acompanhá-lo porque estavam precisando de gente. Fui para o Lar Brasileiro e fiquei por nove anos. Enquanto estava trabalhando na agência em São Bernardo estava tudo bem, perto de casa e da faculdade. Mas de repente eu fui transferido para a agência da Av. Brigadeiro Luiz Antônio, no Centro de São Paulo, para o departamento de cobrança. Então eu fazia a faculdade de manhã,

“Quando eu estava no último ano de faculdade, fiz um trabalho de marketing sobre o skate. O Cacio compareceu na faculdade com amigos skatistas, fazendo demonstração do esporte. O sucesso foi tão grande que tivemos que apresentar o trabalho em duas outras salas.”

Batizado do Danilo com tios e avós.

Batizado do Douglas.

Douglas e tio Cacio. Banco Lar Brasileiro.

Douglas em SBC. Toca do Mosquito, em Aracaju.

Danilo, Marcia, Douglas, Denise e Giba. pegava o trem em Santo André e ia até a Estação da Luz para chegar à Brigadeiro. Fiz isso por quatro ou cinco anos. Em 1981 comprei um pequeno apartamento no bairro do Irajá, em São Bernardo, onde ainda moro. Era um bom investimento e o coloquei para alugar por algum tempo.

Conheci a Marcia, que viria a ser minha esposa, em 1982. Nós nos conhecemos na quermesse junina da Igreja Matriz, no centro da cidade. Eu estava com um amigo e vimos duas garotas que chamaram nossa atenção. Eu fiquei com a Marcia e meu amigo com a prima dela. Depois saímos por uns três meses, mas tudo acabou e não nos encontramos mais, a não ser na rua, por acaso. Depois de algum tempo nos reencontramos e alguma coisa se acendeu e começamos a namorar firme. Ela era técnica em enfermagem e trabalhava no Instituto do Câncer, em Nova Petrópolis. Depois teve um concurso na prefeitura de São Bernardo e ela passou, começando sua carreira de professora de costura, profissão que aprendeu com a mãe, costureira profissional de mão cheia. Durante nosso relacionamento conheci seu irmão, José Acácio de Oliveira, conhecido como Cacio “Narina”.

Enquanto isso, no banco, eu cuidava da cobrança e do clube esportivo: era encarregado do futebol, montando times e organizando campeonatos. Casei-me em 1984, mesmo ano em que me formei em Administração de Empresas.

Nesse tempo todo meu cunhado Cacio “Narina” já andava de skate há anos. Quando eu estava no último ano de faculdade, fiz um trabalho de marketing sobre o skate. O Cacio compareceu na faculdade com os amigos skatistas, levando adesivos e vídeos (coisa rara na época) e fazendo demonstração do esporte. O sucesso foi tão grande que tivemos que apresentar o trabalho em duas outras salas a pedido do professor. Isso me chamou muito a atenção e pensei comigo mesmo: “Caramba, isso aí pode ser um bom negócio”. Em 1985 o Cacio já fazia joelheiras e algumas outras coisas para os amigos. Não existia material de qualidade no Brasil e o grupo de amigos dele comprava os equipamentos que ele fazia com outro colega. Saí do banco no começo de 1986 e propus montar uma empresa de material de skate com ele. Minha vida estava tomando um rumo inesperado.