A transpariencia impossivel: lirica e hermetismo na poesia brasileira atual

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60 CAPÍTULO 3 LÍRICA E MODERNIDADE

3.1. A Lírica Antiga

A modernidade esfumou as fronteiras entre poesia e prosa. Os escritores, ficcionistas e poetas, tiraram proveito disso. Como se todas as regras prescritivas dos antigos tivessem se volatizado numa força escritural superior, uma linguagem absoluta, não respeitando a fronteira dos gêneros literários e buscando a potencialização de suas forças criativas. Aí se encontra a drástica imagem, iniciada no romantismo, do compromisso poético moderno: o do trabalho obsessivo com as palavras. No Romantismo principia a crítica à vigência dos cânones literários, com as basilares figuras de Friedrich Schlegel e Novalis. Schlegel escrevia num dos fragmentos da Lyceum: “Todos os gêneros poéticos clássicos em seu purismo rigoroso são agora ridículos”.99 Schlegel cria em resposta a caducidade dos gêneros clássicos, um novo gênero – o fragmento crítico. Esse novo gênero literário que ele mesmo cultivou foi, rapidamente, apreendido pelos seus companheiros de movimento, tendo se tornado Novalis um de seus principais cultores. Durante o Romantismo também, o francês Aloysius Bertrand escreveu poemas em prosa, inspirando poetas e entre eles Baudelaire que levaria esse pequeno gênero a uma excelência só emparelhada talvez por Rimbaud e Mallarmé. A modernidade significou a fragmentação da divisão de gêneros, possibilitando o surgimento de novos ou a emergência histórica de alguns que teciam seu desenvolvimento na sombra e quase de maneira marginal, como foi o caso do romance. A dissolução, porém, da rígida divisão da literatura em gêneros não foi o foco da revolução moderna – foi uma conseqüência. A natureza da transformação foi mais radical e estrutural, pondo em xeque a própria distinção entre prosa e poesia. Uma rápida visada nos principais nomes modernos, poetas e ficcionistas, é suficiente para verificar que ambos se reconhecem nos mesmos valores, aplicáveis tanto à composição do poema quanto à estruturação da narrativa.

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In: CHIAMPI, Irlemar. Fundadores da Modernidade. São Paulo: Ática, 1991. p.36


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