A formação do setor educativo do museu do café de Santos

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A formação do setor educativo do Museu do Café de Santos Neiva Mota*

A Instituição Localizado no coração do Centro Histórico de Santos, o Museu do Café tornou-se referência cultural na Baixada Santista no que diz respeito a patrimônio material e educação não-formal. Para entender sua importância, deve-se fazer uma consulta ao passado histórico do Brasil. A economia brasileira, durante muito tempo, pautou-se em monoculturas e ciclos econômicos visando o mercado externo. Ao mesmo tempo, a Europa conhecia uma nova bebida de origem africana que transformaria o país: o café. Em um primeiro momento, o café era uma bebida exótica e atingia poucos consumidores.

Porém,

suas

propriedades

estimulantes

tornaram-no

muito

requisitado. A princípio, o cultivo do café foi voltado para o público interno, mas as excelentes condições climáticas encontradas no sudeste brasileiro fizeram com que a produção crescesse rápido em um período relativamente curto. Em poucos anos, o produto tornou-se uma das principais commodities do país. A cidade de Santos foi escolhida para abrigar o porto pois sua localização mostravase ideal para o escoamento de mercadorias. Outro fator importante para a escolha da cidade como ponto de escoamento do café foi a construção da primeira ferrovia do Brasil em 1867, a São Paulo Railway, que ligava Santos a Jundiaí. A nova ferrovia trazia uma quantidade bem maior de café em menor tempo por este motivo em 1892, o porto de Santos foi modernizado para atender a demanda de exportação de sua preciosa carga. Com as condições ideais para plantio e exportação do café, a economia em torno do produto foi aumentando e mostrando-se muito importante para Estado de São Paulo e para o país como um todo. Nesse contexto, viu-se necessário a criação de um órgão que regulasse a venda, compra e preço do café em São Paulo. Em 1914 foi criada a Bolsa Oficial de Café, que começaria suas atividades apenas em 1917 por causa da Primeira Guerra Mundial (1914-1918). Desde sua idealização, havia o


desejo de construir um prédio que representasse a imponência da economia cafeeira para abrigar a Bolsa Oficial de Café. No dia 7 de setembro de 1922 foi inaugurado o novo prédio da Bolsa Oficial de Café. O prédio foi projetado para ser –literalmente- uma propaganda institucional, pois com sua arquitetura eclética e aspecto imponente retrataria o poder e importância do café para a economia no Brasil. Posterior ao término do funcionamento da Bolsa Oficial de Café em 1986, o Palácio do Café passou por um período de degradante abandono patrimonial por aproximadamente dez anos. Após esse interregno um grupo de representantes de órgãos públicos e privados da comunidade santista se preocupou em revitalizar o prédio, símbolo da história da riqueza e desenvolvimento da cidade. em 2007 foi inaugurado o Museu do Café. O Museu do café passou a fazer parte dos museus mantidos pela Secretaria de Estado de Cultura de São Paulo em 2008 e atualmente a mesma Organização Social gere o Museu do Café em Santos e o Museu da Imigração em São Paulo. Setor Educativo Desde 2012 o Museu do Café possui um setor educativo multidisciplinar. Fundamenta suas ações a partir do estudo e a difusão de seus eixos temáticos tendo como base a pesquisa e investigação. Fazer parte de uma equipe desta natureza em um museu histórico é um grande desafio posto que uma das principais dificuldades reside no imaginário do visitante que espera uma visita didática tal qual na sala de aula, desconhecendo o conceito de educação não formal. A partir da análise das atividades e visitas realizadas pelo educativo, foi verificado que os museus ainda são reconhecidos por seu aspecto de “conservador da história” onde há uma série de objetos antigos que não podem ser tocados, o que em algumas ocasiões acarreta na falta de entendimento do público sobre o porquê da importância da preservação do acervo do contato humano para manter a sua natureza e sua função histórica.


Portanto é importante deixar registrada a experiência que foi vivenciada por esta equipe, pois ainda é um desafio pensar em estratégias de que criem uma relação sólida entre educação e público diversificado. E mesmo com todos os obstáculos que apareceram no caminho o grupo tem conquistado um espaço de reconhecimento junto aos parceiros que fizeram parte das ações oferecidas pelo setor educativo. Os trabalhos foram iniciados com um educativo composto por pessoas muito jovens que haviam saído da Universidade com nenhuma experiência em educação não formal. Este fato foi positivo, já que a formação partiu de dentro para fora com a colaboração de todos enquanto equipe. Fazer com que os educadores entendessem as rotinas administrativas e em conjunto buscar soluções que fossem práticas para minimizar os conflitos e executar os trabalhos da maneira mais construtiva possível, possibilitou que todos participassem da construção de instrumentos básicos de funcionamento do Setor. Ainda em 2012 foi contratada uma consultoria que entre outras ações auxiliou a equipe na construção de uma base teórica comum que direcionasse a formação de todos na mesma missão. A partir deste ponto podia-se dar inicio aos projetos destinados a aproximação ao museu dos públicos especificos, e aperfeiçoar o atendimento ao público escolar que naquele momento já representava uma parcela importante dos visitantes. Para a equipe que já estava trabalhando com o público há algum tempo com o conceito de monitoria onde a partir de um conhecimento básico sobre a história do produto café e do museu, faziam visitas palestras pelas exposições oferecidas, foi difícil a adaptação a uma rotina administrativa que parecia engessada em um primeiro momento. Com o passar do tempo a práxis foi-se moldando de acordo com as demandas da equipe, e no ano seguinte foi possível ampliar a oferta de atividades no plano de trabalho de acordo com o crescimento da instituição e do próprio setor. A experimentação e o conhecimento adquirido a partir da formação levou o grupo a buscar uma situação de aprendizagem que adequasse a linguagem destinada ás


diferentes tipologias de visitantes, intermediando as questões que o público tem sobre o produto e o seu papel nas artes, economia e reconhecimento da história do Brasil sem tornar essa experiência maçante, incentivando a curiosidade e às descobertas que podem ter uma série de vertentes impulsionadas pela história individual de cada um. Desmitificar o que o visitante pensa que vai encontrar quando planeja a visita em um museu é uma tarefa diária, já que cada individuo é único e para executar as ações com qualidade, foram levantadas algumas questões norteadoras que amparam a visita educativa no momento do acolhimento e definem para o educador como será a estratégia utilizada com aquele grupo. Entre as questões estão: O grupo já visitou outras instituições culturais antes? Conhecem o museu do café? Visitarão outras instituições em Santos? Se é de outras cidades: Conhece a cidade de Santos? Vocês gostam de café?

Questões tanto de investigação e identificação do grupo como “O grupo já visitou outras instituições culturais antes?” como “Vocês gostam de café?” são importantes para criar um vínculo de confiança entre o educador e o visitante. Para auxiliar a equipe no desenvolvimento das estratégias de transmissão do conhecimento foi iniciado um trabalho conjunto entre pesquisa e educativo. Se fizeram comuns as reuniões entre as equipes onde os pesquisadores apresentavam a bibliografia especifica de cada exposição temporária e os educadores a partir desta base teórica desenvolviam estratégias de atendimento, se antecipando assim as possíveis questões que poderiam vir a ser levantadas pelo público. Também são discutidas diferentes formas de proporcionar uma certa autonomia ao visitante espontâneo lhe oferecendo a oportunidade de ter as suas próprias


impressões sobre a exposição e temática abordada pela instituição, caso um educador não possa acompanhar a sua visita. As ações educativas foram pensadas para ser um espaço de criação e ação, trazendo à tona questões contemporâneas para serem discutidas durante as mediações ou em momentos de construção de conhecimento. Por este motivo limitar a ação educativa em um museu histórico, a uma extensão da aula obtida em sala, restringe toda e qualquer dinâmica que de alguma maneira possa ter um impacto significativo na formação de um individuo. Reconhecer o público é fundamental para se pensar nas ações que serão oferecidas. Por estar em uma cidade turística o educativo do Museu do café atende a um público bem diversificado durante o ano. Os turistas nacionais e estrangeiros costumam vir durante todo o ano, embora se intensifique no período de alta temporada entre novembro e março. Como plano de ampliação e manutenção do que se está oferecendo ao público, devemos relacionar os museus com as crescentes formas de lazer sem perder o foco do objetivo e conteúdo educativo. Considera-se que não há um método correto, já que os desacertos também levam a reflexão do que o visitante que vai a um museu espera, e como a partir dos saberes pode-se oferecer uma experiência marcante. Existem formas de leitura e interpretação que serão transmitidas ao grupo ou visitante a partir da sensibilidade que o educador terá no momento do acolhimento A educação em museus está em um contínuo processo de desenvolvimento e felizmente a forma com que os visitantes são acolhidos estão na pauta das Instituições. Trazer estratégias de atuação como a ludicidade, discussões temáticas, leitura de imagens e outras mais, herdadas da experiência dada em museus de arte e de ciências, enriquece o debate, aguça a curiosidade e instiga aos educadores que sigam buscando alternativas para que as ações, atividades e mediações sejam educativas e atraentes.


Manter um olhar atento às metodologias trabalhadas em outras instituições auxilia muito neste processo, a partir da observação de atendimento, expografia, atividades e oficinas oferecidas entre todas as expertises que possam auxiliar em uma melhora do próprio trabalho, contribui para a construção de um discurso mais sensível a condição de seu ouvinte. Depois de 4 anos do inicio dos trabalhos o setor educativo do Museu do Café continua no processo de aprendizado, ampliando o alcance das ações realizadas além dos muros da Instituição. A implantação de um programa extramuros onde as ações do educativo são realizadas nas instituições parceiras está levando o setor a um processo de amadurecimento e responsabilidade com o trabalho que vem sendo desenvolvido. Essa equipe cresceu junto com a Instituição, levando o Museu a ser reconhecido como uma referência na baixada Santista. Ter o trabalho acolhido pelo público é o maior incentivo para seguir em contínuo processo de conhecimento..

Bibliografia Bondía, Jorge Larrosa - Notas sobre a experiência e o saber de experiência. Nicolau, Evandro – Artigo: Exposições de arte e recepção educativa do público Chiovatto, Mila Milene – Educação líquida Gohn, Maria da Glória - Educação não-formal na pedagogia social Bianconi, M. Lucia e Caruso, Francisco - Apresentação Educação não formal Conceitos-chave da Educação em Museus – Documento aberto para discussão Hilst Selli. Paula - Crianças, Museus e Formação de Público em São Paulo - Editora cultura Acadêmica 2013


Moraes, Silvia Elizabeth - Interdisciplinaridade e Transversalidade mediante projetos temáticos - Nº 2013-214 Pág. 38-54 Zacharias, Maria Paula ¿Como debe ser el museo del siglo XXI? http://www.eltiempo.com/entretenimiento/arte-y-teatro/museos-del-siglo-xxi/1655395


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