CatalogoMARS

Page 1

Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul


Governador do Estado do Rio Grande do Sul Tarso Fernando Genro Secret谩rio de Estado da Cultura Luiz Ant么nio de Assis Brasil Diretor do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul Walmir da Silva Pereira Agradecimentos Heinz Huyer Eloisa Capovilla Maria Cristina Vigiano Sinara Robim Josias Melo Roberto Schmitt Prym Aline Moreira

Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul Rua dos Andradas, 1234 | sala 1009 Porto Alegre - RS CEP 90020-008 Fone: (51) 3228.7664 e-mail: mars@sedac.rs.gov.br http://museuantropologico.blogspot.com.br/


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul Organização e Coordenação Geral Walmir Pereira

Patrocínio Cultural

Realização


ÍNDICE APRESENTAÇÃO

pg. 6

EMENTÁRIOS INSTITUCIONAIS E TÉCNICOS

pg. 12

TRADIÇÃO UMBU

pg. 14

TRADIÇÃO HUMAITÁ

pg. 24

TRADIÇÃO TUPIGUARANI

pg. 32

ARQUEOLOGIA HISTÓRICA

pg. 48


ETNOLOGIA INDÍGENA

pg. 56

TRAJETÓRIAS E TERRITORIALIDADES NEGRAS

pg. 74

LITURGIA CATÓLICA

pg. 90

MEMÓRIAS, MIGRAÇÕES E SOCIALIDADES

pg. 104


TÍTULO 1 Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. 6


TEXTO ASSIS BRASIL

Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. 7


TÍTULO 2 Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. 8


TEXTO WALMIR

Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. Texto de introdução. 9


TÍTULO 3

10


TITULO

Promover e valorizar a identidade cultural do povo gaúcho e a diversidade de sua formação através dos tempos é uma das grandes responsabilidades do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul. Agregar não apenas signos, crenças e costumes próprios de uma região, mas a transmissão destes bens culturais como herança às futuras gerações é condição imperiosa para a conscientização do individuo como parte importante deste processo permanente e constante, situando-o como um elo de grande valor entre o passado e o presente. O projeto “Novo MARS” busca resgatar um espaço digno e adequado para a conservação e a exposição de um dos mais importantes acervos culturais do Estado e que, atualmente, encontra-se em condições precárias de preservação e incorrendo em sua degeneração, caso não haja condições em tempo hábil de reverte-lo. Torna-se necessário abrigar tal acervo em um novo espaço físico, moderno e construído dentro de condições apropriadas e de acordo com normas técnicas que assegurem sua conservação, com vistas a estabelecer um novo foco na preservação da diversidade cultural do nosso Estado e proporcionando uma nova dimensão à nossa comunidade quanto à importância da valorização dos aspectos culturais que formam a sociedade rio-grandense. Um povo com fortes características regionais, como o gaúcho, está desprovido atualmente de um espaço adequado que ajude a compreender e a valorizar a dinâmica dos diferentes contextos sócio-culturais que o formaram e ao qual está inserido atualmente. Por isso, é de vital importância tornar pública ao povo gaúcho, a existência de um acêrvo documentado e conservado e expô-lo de forma digna, para fins de educação, estudo e lazer. Para tanto, torna-se extremamente importante a recuperação do material, em condições atualmente não convenientes à sua integridade, para um local apropriado aos seus fins.

11


O Museu Antropológico do Rio Grande do Sul – MARS – é uma instituição pública de memória antropológica vinculada à Secretaria de Estado da Cultura que, desde a sua criação no final da década de 1970, desenvolve uma politica institucional museológica descentralizada concernente à pesquisa, formação e exposição de acervo antropológico e arqueológico. No tempo presente, tem fomentado parcerias, cooperação técnico-científica e artistico-cultural, com centros de estudos antropológicos, universidades públicas e privadas, escolas das redes de ensino estadual e municipais, organizações nãogovernamentais, povos e coletividades socioétnicas e instituições públicas, com vistas à intensificação das potencialidades de ação museal e da instituição de uma memoria antropológica regional. Diferentemente de instituições museológicas que têm seus acervos formados por doação de objetos ou de coleções de artefatos, cujos critérios de tombamento são definidos por valores de natureza artística ou histórica ou concedidos pelo caráter de raridade, o acervo do MARS é formado, majoritariamente, por objetos oriundos de pesquisas etnográficas e etnoarqueológicas, realizadas no Rio Grande do Sul. Diante da conjuntura exposta, o agenciamento e a socialização da pesquisa etnográfica, por meio da investigação de diferentes contextos, redes culturais, valores, identidades sociais, fluxos de significação que permeiam, informam e orientam os distintos grupos sociais e étnicos rio-grandenses, tem circunscrito a tônica de atuação institucional, com vistas a reinterpretar as diversas identidades/alteridades, memórias e patrimônios culturais locais e regionais constitutivos do Estado. Necessário ressaltar que o conjunto desses elementos, cada um com suas especificidades, conformaram uma instituição historicamente empenhada com um processo configurativo de estudos e pesquisas para recuperar elementos representativos dos diversos aspectos da dinâmica sociocultural e patrimonial, expressão do respeito e reconhecimento da diversidade cultural e do patrimônio antropológico e arqueológico no Estado. Na presente gestão reiteramos o compromisso e denodo institucional com a promoção, o respeito e o reconhecimento da diferença cultural, apreendida como valor signifcativo 12


EMENTÁRIOS INSTITUCIONAIS E TÉCNICOS

e postulado norteador da ação antropológica no mundo moderno e contemporâneo. Ademais reafirmamos o papel do MARS enquanto instituição museal de memória social e patrimonio regional, empenhada com a manutenção da diversidade cultural planetária e da pluralidade socioétnica formadora da sociedade rio-grandense.

Ementário I - De acordo com convenção internacional incorporada no país pela Associação Brasileira de Antropologia – ABA - adotada em âmbito cientifico e professada por nós, a grafia dos povos e coletividades indígenas, referenciadas neste Catálogo do Acervo Arqueológico e Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul, aparece sempre no singular e em letras maiúsculas.

Ementário II - No presente documento optamos por não reproduzir os dados e informações tradicionalmente constantes em documentos similares existentes sobre as peças acervadas em instituições de memórias – arquivos e museus incluso -, que remetem ao número de registro contido nos livros tombo ou em classificações análogas que servem para orientação ao virtual leitor. Nossa perspectiva levada à efeito na presente publicação, espécie de documento identitário do MARS, foi privilegiar a descrição etnográfica das peças, objetos, documentos e imagens selecionadas para compor o catálogo da presente gestão museal da instituição. Ademais o Catálogo do Acervo Arqueológico e Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul representa um recorte parcial, em certo sentido arbitrário, do conjunto de cerca de 30.000 peças arqeuológicas e 5.000 peças etnográficas.

13



TRADIÇÃO UMBU

A tradição Umbu é marcadamente caracterizada pela presença de pontas de projétil e de uma indústria lítica com lascas recompostas. Os grupos pertencentes à Tradição Umbu ocupavam áreas de vegetação não muito fechada, em campos de bosques mistos, ou nas bordas da floresta subtropical. Esses grupos dispersaram-se em várias áreas, principalmente na planície sul e nas zonas contínuas à encosta do planalto. Sua alimentação era baseada na caça e complementada com a coleta de frutos e raízes. Os artefatos desta tradição se caracterizam por serem lascados, com retoques por pressão. Para a Arqueologia os grupos portadores dessa tradição são os antepassados dos Charrua e dos Minuano, cujos vestígios arqueológicos mais antigos receberam datações que recuam há 9 mil anos A.P. (antes do presente).


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As bolas de boleadeira são peças líticas finamente trabalhadas em pedra possuindo na sua porção média um sulco que permite amarrar uma tira de couro ou de fibra vegetal. Poderiam ser de uma, duas ou três bolas. A primeira, conhecida como “bola perdida” era apenas uma bola lisa ou, mais frequente, uma mamilar, composta por várias pontas conhecida como “rompe cabeça”. As boleadeiras com duas e três bolas eram geralmente utilizadas na caça tanto da ema (Rhea americana) como de outros animais. Seu uso foi difundido pelos grupos indígenas do pampa brasileiro e uruguaio e, dada sua eficiência, acabou sendo incorporada como artefato típico da cultura gaúcha, sendo utilizada até hoje em exibições artísticas.

16


TRADIÇÃO UMBU

17


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

18


Tradição Umbu

19


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As pontas de projétil são os melhores exemplos da longa tradição caçadora dos grupos humanos. Feitas a partir de lascas de pedra podiam ter diferentes formatos conforme o gosto e uso de seu possuidor. As pontas estavam encaixadas na extremidade de uma haste de madeira formando o que conhecemos como flecha, podendo ser lançadas com arcos.

20


Tradição Umbu

As pontas de projéteis poderiam ser usadas tanto para caçar animais de maior porte, como nos combates com outros grupos rivais.

21


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As pontas em pedra da Tradição Umbu são delicadamente lascadas em diferentes matérias-primas como calcedônia e quartzo, que são as mais comuns.

22


Tradição Umbu

23



TRADIÇÃO HUMAITÁ

Na Arqueologia Brasileira contemporânea os grupos humanos produtores de instrumentos morfologicamente maciços sobre uma massa central, designados blocos ou seixos, normalmente desprovida de pontas de projetil de pedra, representam a tradição Humaitá. Essa tradição é integrada por diversas culturas, dentre as quais temos como preponderantes a cultura Altoparanaense e o Complexo Itaqui. Seu instrumental característico são os talhadores alongados, picões, raspadores plano-convexos, furadores e machados bumerangoides. Os grupos pertencentes à Tradição Humaitá viviam nas florestas do sul do Brasil, por volta de 8.000 anos atrás, deveriam ser pequenos grupos estabelecidos em acampamentos temporários, próximo de riachos e sangas e em alguns casos em abrigos sob rocha. Viviam da pesca, da caça e da coleta de frutos. Seus instrumentos compõem-se de grandes enxós, raspadores, talhadores e cunhas lascadas, picões, facas, furadores e simples lascas completam os restos. Quase nunca aparecem instrumentos polidos. Em alguns abrigos no vale do rio Jacuí (RS) foram encontradas gravações com formas de pisadas de animais (gatos, veados e aves) e símbolos sexuais masculinos e femininos.


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

A tradição Humaitá está associada a grupos de caçadores-coletores da região do Planalto que viveram em sitios abertos, raramente ocupando abrigos, em áreas florestadas localizadas ao longo dos rios e córregos. Os arqueólogos conjeturam que esses grupos seriam os antepassados dos atuais Kaingang.

26


TRADIÇÃO HUMAITÁ

27


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

28


Tradição Humaitá

29


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

30


Tradição Humaitá

Artefatos líticos da Tradição Humaitá: picões, machado bumerangoide e pequeno biface retilíneo em basalto.

31



TRADIÇÃO TUPIGUARANI

Parte considerável do acervo arqueológico do MARS – aproximadamente 70% de sua coleção – traz à baila vestígios e objetos da cultura material dos Guarani, referentes aos períodos pré-colonial e missioneiro. O ambiente ecológico do Guarani, por excelência, é a mata subtropical, nas margens de rios e lagoas, nas proximidades do Oceano Atlântico e na encosta do Planalto Meridional. Deslocando-se da bacia amazônica no início da era cristã, em sucessivos movimentos migratórios, os Guarani colonizaram o Rio Grande do Sul onde introduziram o cultivo de várias plantas: milho, mandioca, batata-doce, amendoim, abóbora, fumo, feijão, urucum e algodão. A dieta alimentar era complementada pela caça e pesca. A datação mais antiga obtida em território gaúcho, na calha do rio Jacuí, é do ano 400 da era cristã.


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

34


TRADIÇÃO TUPIGUARANI

Os Guarani, até o final do século XVIII, contrastaram no espaço regional frente ao avanço da ocupação europeia, permanecendo em grupos familiares e buscando sempre lugares ambientalmente preservados para desenvolverem o nanderekó. A grande maioria dos sítios desta tradição encontra-se a céu aberto, o que torna quase impossível a conservação de restos orgânicos.

35


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

A cultura material dos Guarani pré-históricos que aqui se estabeleceram é vasta e diversificada. Parte dela, constituída por fragmentos cerâmicos provenientes e vasilhas usadas no dia a dia dessas populações, vem sendo recuperada pela arqueologia. A análise desses fragmentos é importante porque, mediante técnicas de laboratório, pode-se reconstituir a forma do recipiente cerâmico e, por comparação, relacionar esses fragmentos com recipientes inteiros encontrados.

36


Tradição Tupiguarani

37


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

38


Tradição Tupiguarani

As vasilhas cerâmicas variam muito de tamanho e forma, tendo sido, quase todas, confeccionadas pela técnica de acordelado. Partindo de uma base cônica, a artesã guarani ia sobrepondo e juntando roletes, através de pressões regulares do dedo polegar, em sentido perpendicular à borda, modelando o formato e a dimensão desejados. Sua marca distintiva é o tratamento dado à superfície externa. Dentre as muitas variações e combinações, predominam a corrugada, escovada, ungulada e pintada (mono ou policrômica).

39


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

40


Tradição Tupiguarani

41


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

42


Tradição Tupiguarani

Os vasilhames de cerâmica guarani conservados inteiros foram quase todos encontrados em sepultamentos primários ou secundários, sendo utilizados como “urnas funerárias”. Sua função primordial, no entanto, teria sido a de transportar e armazenar líquidos. As vasilhas recebiam várias denominações: yapepó (panelas); cambuchi (talhas); ñaêmbé (pratos). A nominação das peças está associada à forma e à função. Talhas de grandes dimensões, que podiam alcançar até mais de um metro de altura e/ou diâmetro máximo, eram utilizadas para armazenar bebidas preparadas a partir da fermentação do milho ou da mandioca. Vasilhas um pouco menores serviam para transportar água.

43


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Os Guarani também foram artesãos líticos, como atestam os percutores, os machados petaloides, as pontas de projétil, as mãos de pilão, os tembetás (adornos labiais masculinos) e diversos outros artefatos em pedra. Os machados polidos são amplamente utilizados no processo de desmatamento e preparação das roças para o cultivo. O encabamento podia ser feito de quatro formas diferentes. Na primeira forma, a lâmina de pedra era encaixada em uma vara de madeira e esta dobrada ao meio, sendo então fortemente amarrada com fibra vegetal de forma a fixar todo o conjunto.

44


Tradição Tupiguarani

A segunda forma consistia em incrustar a lâmina em um cabo de madeira. Na terceira forma, utilizada normalmente em lâminas de machado mais alongadas, a lâmina traspassa um orifício feito no cabo, sendo então o conjunto amarrado. E, na última forma, a lâmina poderia ser fortemente amarrada a um cabo de madeira e recoberta com látex ou mesmo cerol. Neste caso, a lâmina de machado poderia apresentar, na sua porção oposta ao gume, um entalhe que lhe facilitasse a amarração.

45


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As mãos de pilão são usadas, juntamente com os pilões, para triturar e quebrar alimentos sólidos como grãos, sementes ou mesmo castanhas, de modo a facilitar o processo de preparação desses alimentos. Além das peças em pedra como esta, encontradas nos registros arqueológicos pela sua facilidade de preservação, também podiam ser feitas em madeira, não encontradas em contextos arqueológicos, mas amplamente utilizados pelos grupos indígenas atuais. As peças em pedra raramente excedem os 50cm de comprimento, são produzidas normalmente em basalto colunar ou em rochas que apresentem formas alongadas e são polidas em sua extensão. Na porção basal possuem marcas do impacto com o pilão, indicando seu uso.

46


Tradição Tupiguarani

Os machados polidos triangulares são mais raros. A julgar pelo sulco na extremidade oposta ao gume, deveriam ser encabados. Acredita-se que sua utilização esteja associada a fins rituais, ou represente um distintivo de hierarquia para o seu possuidor. O que se percebe, do ponto de vista arqueológico, é que se tratam de peças bem acabadas, com um polimento esmerado, além de serem raras se comparadas aos outros tipos de machados encontrados.

47



ARQUEOLOGIA HISTÓRICA

O termo “Arqueologia Histórica” tradicionalmente vem sendo usado, em particular na América do Norte, para estudos realizados em todo o conhecimento Americano, após processos de contato e povoamento europeu. A arqueologia histórica no Brasil trata das pesquisas arqueológicas realizadas em sítios relacionados à chegada dos conquistadores europeus no continente americano. Neste sentido, revelam o modo de vida destes primeiros colonizadores, seus artefatos, sua adaptação à nova terra e os contatos realizados com os habitantes autóctones. É um campo muito fértil de pesquisas, pois permite conhecer melhor a vida cotidiana dos brasileiros, muito além do que nos dizem os documentos escritos. Seus contatos comerciais, suas condições de higiene e saúde, seu poder econômico e seus gostos. Estudos e pesquisas relativamente recentes, no âmbito da Arqueologia Histórica no Rio Grande do Sul, vêm trabalhando com sítios que evidenciam contatos entre as populações autóctones e as populações europeias alóctones, assim como os grupos humanos remanescentes de quilombos e de sociedades urbanas e industriais (séculos XVIII ao XX), o que reflete o alargamento de seu campo de pesquisa.


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Faiança colonial europeia utilizada pelos primeiros povoadores de origem europeia em solo sul-riograndense. São fragmentos de pires, pratos e outras louças provenientes do Sítio Arqueológico da Estância do Yapeju.

50


ARQUEOLOGIA HISTÓRICA

51


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

O vidro desde muito tempo tem sido utilizado para armazenar bebidas. No período colonial, as garrafas de vidro eram normalmente utilizadas para armazenar remédios, especialmente as de cor verde escuro, visto que protegiam o conteúdo da ação da luz. Garrafa parcialmente reconstituída a partir de fragmentos recolhidos no Sítio do Forte de Santa Tecla (Bagé – RS)

52


Arqueologia Hist贸rica

53


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

54


Arqueologia Hist贸rica

55



ETNOLOGIA INDÍGENA

Em sua significação original a ciência etnológica - a Etnologia - designava o estudo dos povos e sociedades originárias não ocidentais. Por sua vez, a Etnologia Indígena desenvolve-se no País, nas décadas iniciais do século XX, como uma das áreas temáticas fundadoras das Ciências Sociais e da Antropologia Social, em particular. A própria aplicação do conhecimento está associada e implicada às condições socioculturais e políticas que propiciaram o surgimento da Antropologia no Brasil. Contemporaneamente despontam, entre outros, os seguintes temas e linhas de pesquisa: Organização Social, Cosmologia, Parentesco, Mitologia, Rituais, Relações Interétnicas, Interculturalidade, Corpo, e Saude, Etnoconhecimentos, Xamanismo, Etnicidade, Gênero, Bilinguismo, Política Indígena e Indigenismo.


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As pequenas esculturas figurativas produzidas pelos Guarani Mbya são representações de seres com os quais compartilham seu universo social e cultural. No princípio, os seres da mata eram pessoas como os Mbya. Os “parentes”, foram transformados em seres da mata pelo Pai Primordial, pois teriam cometido deslizes e perdido, desta forma, seu estatuto de humanos.

58


ETNOLOGIA INDÍGENA

Por meio de suas narrativas mito-poéticas sobre a origem dos animais, os Guarani Mbya explicam e contextualizam não apenas o “existir”, como também as características comportamentais e de agência de seres humanos e sobre-humanos, naturais e sobrenaturais.

59


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

60


Etnologia IndĂ­gena

61


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

As esculturas zoomórficas são confeccionadas em madeiras de árvores consideradas sagradas pelos Guarani Mbya, como a guajuvira e o ygari. Para os indígenas esses “bichinhos” expressam cópias de criações do demiurgo Ñanderu. Cada animal possui agência e simbologia específica, distinguidas e reveladas em plano onírico. Na cosmovisão dos Guarani, a onça, tivi, figura no mito de criação do mundo, sendo criatura conhecida pelos indígenas desde os tempos primordiais; é o animal que, de modo perfeito, simboliza os atributos de força, coragem e liderança.

62


Etnologia IndĂ­gena

63


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Nas sociedades indígenas, não há distinção ou separação entre objetos produzidos para serem utilizados e objetos estéticos, produzidos para serem contemplados. Os grafismos encontrados no trançado Guarani Mbya invocam as relações dos humanos com os ex-humanos, evidenciando os domínios da natureza e da sobrenatureza. Além disso, os seres aí representados remetem aos “tempos míticos primevos, nos quais humanos e divinos habitavam a mesma terra”. *

*SILVA, S. B. Etnoarqueologia dos Grafismos 'Kaingang': um modelo para a compreensão das sociedades Proto-Jê meridionais, p. 229. Tese de doutorado, PPGAS USP 2005. Segundo o autor, a representação de seres primordiais na arte Mbya “aponta para conceitos cosmológicos, evidenciando em seus padrões gráficos os domínios da natureza e da sobrenatureza”.


Etnologia IndĂ­gena

65


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

66


Etnologia Indígena

Os padrões gráficos sagrados foram ensinados aos Guarani Mbya por Ñanderu e não são vendidos aos juruá (brancos). O padrão, ipará korá (desenho fechado quadrado), bem como o ipará panambi pepó (desenho da asa da mariposa) são comercializados. Estes grafismos são designados como ‘inventados’ pelos Guarani Mbya, isto é, “não teriam sido ensinados pelo filho de Nanderuvusu”. * Nas tekoas (aldeias) Mbya, é a mulher que confecciona os cestos. Segundo narrativa mítica Guarani Mbya, o cesto, na sua origem, está ligado à mulher e os grafismos sagrados à pintura facial feminina.

*SILVA, S. B. Etnoarqueologia dos Grafismos ‘Kaingang’: um modelo para a compreensão das sociedades Proto-Jê meridionais, p. 228. Nanderuvusu aparece nas narrativas míticas fundadoras dos Guarani como o deus criador, o qual teria dado origem aos primeiros Guarani, os irmãos Kuarahy e Jasy.


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

O cesto com alça é utilizado pelo povo Kaingang quando chega a época de celebrar a festa do kiki ; o kujá reúne com os péj, (ajudante de kujá) e com os membros da comunidade para trabalharem na preparação dessa festa. Ao chegar à mata fazem cestos de taquaruçu (taquara mais resistente) para transportar o mel coletado até o kujá. Os péj ficam com a responsabilidade de preparar a madeira na qual o mel permanecerá por sete dias. Este tipo de cesto, feito com menos resistência, também é comercializado.

68


Etnologia Indígena

O cesto sem alça é feito para guardar alimentos como, por exemplo, milho, pinhão; também é comercializado. Este tipo de cesto é decorado com grafismos que expressam significados culturais: representam as pinturas corporais e as marcas tribais denominadas kamé e kairu. Todos os kamé são parentes, primos e irmãos. Os kairu seguem esta mesma regra social e costume kaingang.

69


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Este arco com flecha é usado para enfeite, pois não é utilizado para a caça kaingang. O arco é decorado com casca de cipó e com criciúma (espécie de taquara), assim reproduzindo o grafismo encontrado na pele dos animais, como os animais pintados: tigre e onça; as penas da decoração referenciam algumas aves que vivem nas matas próximas das aldeias.

70


Etnologia IndĂ­gena

71


72


Etnologia Indígena

Este arco kaingang não pode ser feito de qualquer madeira, pois ele vai ser utilizado para a caça. Depois que estiver pronto, ele é enterrado no barro e ali permanece por quinze dias. Quando retirado, a pessoa que o fez derruba uma palmeira para retirar dela o cordão que será utilizado no arco; porque este cordão é forte suficiente para ser utilizado no arco.

73



TRAJETÓRIAS E TERRITORIALIDADES NEGRAS

As experiências e trajetórias sociais dos negros no Brasil expõem a complexidade e as tensões de uma sociedade marcada por hierarquizações e desigualdades, ao mesmo tempo que se constituem em reelaborações criativas de referências culturais, no cruzamento tenso de diferentes tradições frente a experiências de rupturas e desenraizamentos, e a marca da construção de novas territorialidades, pertencimentos e socialidades. Desenraizamentos de diversas tradições de povos africanos – bantus, nagôs, jejes, fulas, fanti, ijexás, cabinda, mandingas, entre outros – que se reinventaram fragmentária e criativamente como visão de mundo em novas religiosidades que se cruzaram com tradições católica, espírita e com os xamanismos indígenas, nas diversas religiões afrobrasileiras, marcando a rica diversidade cultural de vivências, estéticas e interpretações de realidade. Rupturas e violências desestabilizadoras da época da escravidão, vivas na memória social, e que são restituídas em movimentos estéticos e políticos pela cidadania e direitos humanos dos movimentos negros, ou nas territorializações cotidianas de comunidades quilombolas, nas performances musicais de sambistas, rappers e em diferentes formas de lidar com racismos e desigualdades presentes.


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

76


TRAJETÓRIAS E TERRITORIALIDADES NEGRAS

As comunidades remanescentes de quilombos, no Rio Grande do Sul, organizadas por redes de parentesco, habitam territórios e paisagens comuns em que se enraizam na lida cotidiana do trabalho e da moradia, nas festas religiosas e de família. Essas comunidades narram pertencimentos de longa duração, atualizando memórias coletivas de ancestralidade escrava e resistência cultural. Na imagem, quilombolas da comunidade de Cerro-Espumoso, “na lida” entre o roçado e a casa.

77


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Nas fotografias e reproduções doadas por familiares, imagens que se desdobram em narrativas de lembranças por elas evocadas, pode-se trilhar percursos sociais que os negros experienciaram em suas complexas inserções no tecido social brasileiro e gaúcho.

78


Trajetórias e Territorialidades Negras

Na trajetória de formação das casas de Nação e das Famílias de Santo da religião do Batuque no Rio Grande do Sul, observa-se, no retrato, o gesto – linguagem corporal – de Mãe Apolinária (ao centro), que exibe prestígio e respeito da importância de seu estabelecimento na década de 1950. 79


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Na imagem, Mãe Deolinda de Xangô Iomé, segurando carneiro e com filhos de sua Casa de Religião em Porto Alegre, início do século XX, em contexto de pós-abolição, quando rituais de matriz de tradição africana eram proibidos e veementemente perseguidos pelo Estado. Importante na formação das Famílias de Santo e do cenário religioso da época, Mãe Deolinda deu origem a diversas casas de culto de tradição Ijexá.

80


Trajet贸rias e Territorialidades Negras

81


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Formada entre as cidades de Rio Grande e Pelotas, a religião do Batuque, ou Nação, assim como o Candomblé baiano ou o Tambor de Mina maranhense, é uma religião de culto de orixás, entidades de origem de nações africanas, em diálogo com o catolicismo popular brasileiro e seu culto aos santos, que são reelaborados. Percurso religioso que cria uma profusão de formas simbólicas coerentes na lógica de seus rituais de possessão e visão de mundo, na forma em que se estabelece o relacionamento entre homens e orixás.

82


Trajetórias e Territorialidades Negras

Fotografia, da década de 1980, de Mãe Onira de Ogum, filha de Mãe Apolinária, em seu Quarto de Santo e o panteão de Santos e entidades cultuados.

83


Catรกlogo do Acervo Arqueolรณgico & Etnogrรกfico do Museu Antropolรณgico do Rio Grande do Sul

Alguidares usados para as oferendas aos orixรกs e entidades.

84


Trajet贸rias e Territorialidades Negras

85


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Pesquisas sobre as diferentes formas dos cultos afro-brasileiros repercutem suas performances rítmicas e musicais, tão presentes nas procissões e no nos rituais do Batuque e da Umbanda. Da evocação do sagrado no toque do tambor, “chamando” as “presenças” dos orixás e das entidades, à manifestação de estéticas sonoras vivenciadas na forma da festa, a atenção etnográfica para a musicalidade religiosa afro brasileira possibilita a compreensão de significados culturais profundos.

86


Trajetórias e Territorialidades Negras

Tamboreiros e ritmistas na Procissão de Oxalá de 1994, em Pelotas, na 37ª Festa de Oxalá protagonizada pela Sociedade Africana Divino Espirito Santo. 87


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Elementos simbólicos presentes nos cultos afro brasileiros participam da composição de suas visões de mundo particulares. Na Umbanda, religião brasileira de cruzamentos, reelaboração e síntese de diversas religiosidades, em que homens se relacionam cotidianamente com entidades e forças espirituais, a figa é um amuleto contra “mau-olhado”; os Exus Tiririca e Pomba-Gira Cigana são senhores das encruzilhadas e das agências transformadoras das vidas daqueles que os cultuam.

88


Trajet贸rias e Territorialidades Negras

89



LITURGIA CATÓLICA

A liturgia cristã, em particular a do catolicismo romano, representa ação consagrada da Igreja, ato pelo qual os fiéis e devotos glorificam o Ser Divino e são santificados por Ele, em Cristo, por meio de ritos sensíveis. O Concilio Vaticano II* trata da liturgia na Constituição Sacrosanctum Concilium, mencionada nos livros e referenciais religiosos com a abreviatura SC. Na tradição religiosa dos cristãos católicos a Missa tem seu ponto litúrgico culminante na celebração da Eucaristia.

O Concílio Vaticano II foi a assembléia de deliberação da Igreja Romana ocorrida entre os anos de 1962 a1965. Ela foi presidida inicialmente pelo Papa João XXIII e, após sua morte, encerrada pelo seu sucessor, o Papa Paulo VI. A assembléia eclesiástica propôs e implementou uma série de importantes reformas no cerne da Igreja, como a celebração das missas na língua local (antigamente celebrada universalmente em latim), o sacerdote voltado para o público (antes voltado para o Cristo eucarístico, consequentemente de costas para a platéia), a Eucaristia com a opção de também ser recebida nas mãos e, a liberdade do Primado de Roma em realizar visitas pastorais pelo mundo ( Paulo VI foi o primeiro papa a realizar uma viagem neste sentido na década de 1960, visitando a Terra Santa).


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Na Liturgia Católica a casula tem a importante função de vestir os sacerdotes ou bispos em diferentes celebrações. Existem diversos tipos de casulas, usadas conforme a época do ano litúrgico e/ou a celebração que o sacerdote realiza. A casula gótica é uma peça feita em tecido leve e tem forma ovalada. Esta peça indica, pela cor preta, o seu uso litúrgico em cerimônias fúnebres como enterros, encomendações, Missas do Sétimo Dia ou, ainda, era usada na Sexta-Feira da Paixão. A cruz latina aplicada no centro da casula e os motivos florais que a ornamentam caracterizam o estilo gótico. A frase “CONSUMMATUM EST”, bordada na parte inferior da casula reporta às últimas palavras de Jesus antes de sua morte. A casula de cor preta era usada no período anterior ao Concílio Vaticano II, sendo depois substituída por casulas de cor roxa. 92


Liturgia Católica

LITURGIA CATÓLICA

No período anterior ao Concílio Vaticano II, as sacras eram usadas como “memos”, isto é, memórias que auxiliavam os sacerdotes a recitar orações enquanto se paramentavam para a missa. Estas pequenas memórias eram necessárias para que não houvesse o esquecimento das orações, já que tal gesto poderia implicar em pecado (havia um número em torno de 150 pecados mortais que o sacerdote poderia cometer no ato de vestir-se e celebrar a missa). As sacras ficavam localizadas na sacristia e no altar. Esta peça trata do “Evangelho de São João” e, possivelmente, se localizava na sacristia já que seu texto é uma oração recitada, ao que tudo indica, no final da Eucaristia. Isto fica evidente pela presença do “Deo gratiae” no final do texto 93


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

94


Liturgia Católica

As campainhas de quatro tons têm uso litúrgico. Elas são usadas nas missas festivas para indicar momentos de maior solenidade, como a consagração e a elevação. São utilizadas para anunciar, aos fiéis, momentos que merecem maior atenção, especialmente a consagração da Eucaristia. Quando as missas eram celebradas em latim (antes do Concílio Vaticano II), muitos fiéis faziam novenas, rezavam terços, etc. Então, quando chegava o momento da consagração eucarística, os auxiliares tocavam as campainhas/sinetas para que todos parassem e voltassem a atenção ao altar. Nas demais missas são as campainhas comuns, de um só toque, que anunciam os momentos culminantes do ato religioso. Assim como os sinos têm a finalidade de chamar os fiéis para as missas, as sinetas também objetivam “chamar atenção” para o momento mais importante da celebração.


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

96


Liturgia Católica

Dentro do arcabouço estrutural do ser humano, as manifestações de religiosidade de homens e mulheres se expressam de muitas maneiras, entre as quais as manifestações artísticas. É o caso dos escultores sacros que pintam ou entalham, na madeira, representações da figura de santos ou do próprio Cristo, como esta cabeça esculpida em um tronco de árvore. Possivelmente seja uma figura pertencente ao ciclo da Via Sacra, pois representa um Cristo coroado de espinhos, num momento de grande sofrimento.

97


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

A Capa de Asperges é um manto retangular que o sacerdote ou o Bispo usa para dar a bênção do Santíssimo. Em momentos de liturgia solene como a da Sexta-Feira Santa ou da Procissão de Corpus Christi, a capa tem a função de proteger o cibório (cálice onde se conservam as hóstias) e o ostensório (peça na qual se ostenta a hóstia consagrada, onde vai o Santíssimo) enquanto são transladados. A cor amarelo/dourada da peça indica solenidade e os bordados representando o trigo simbolizam o pão e a boa semeadura. Já o trigo junto com a uva representam a Eucaristia, isto é, o pão e o vinho transformados no corpo de Deus.

98


Liturgia Cat贸lica

99


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

100


Liturgia Católica

Batina é uma peça do vestuário de sacerdotes, padres ou abades. A veste que compõe o acervo litúrgico do MARS é, pelas suas características físicas, uma batina pertencente aos padres do clero secular. As batinas eram também vestimenta de estudantes seminaristas. Na Companhia de Jesus, dos padres jesuítas, por exemplo, a batina era a veste dos estudantes que freqüentavam a Universidade de Sorbonne. Hoje, a batina já está em desuso, mas é facultativo o seu uso pelos sacerdotes. 101


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

102


Liturgia Católica

Véu é uma peça usada pelas mulheres para cobrir a cabeça ao entrar na Igreja. Seu uso era uma exigência ao frequentar um templo católico. Este véu, por ser de cor negra, avalia-se que tenha pertencido a uma senhora viúva ou casada. As moças geralmente usavam véu branco para cobrir a cabeça ao entrar na Igreja.

103



MEMÓRIAS, MIGRAÇÕES E SOCIALIDADES

Migrar é movimento de partida da terra de origem e, ato continuo, abertura incerta no rumo de diferentes horizontes em espaços territoriais e socioambientais, no mais da vezes, ignorados. Emigrar é cortar laços, é cortar o cordão umbilical. Ser imigrante envolve a aventura do risco, do além-mundo conhecido e da experienciação do novo. Implica a ocupação de um lugar em um país desconhecido. Quando empreendeu o movimento de emigração, o emigrante trouxe consigo bagagens, compostas, na maioria das vezes, por coisas pessoais como roupas e objetos. Junto com essa bagagem, ele também trazia as lembranças de sua terra, representadas pela língua, pelas histórias, pelos cantos e danças. O cenário da imigração/emigração e a experiência vivenciada por pessoas e comunidades açorianas no século XVIII e alemães, italianos, espanhóis, portugueses, sírios-libaneses e outros grupos socioétnicos nos séculos XIX e XX ofereceram ao Sul do Brasil, como área receptora de imigrantes, características próprias e uma cultura plural marcada pela lembrança dos países de origem, que se manifesta, entre outros lugares, nos objetos e imagens incorporadas ao acervo do MARS.


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

106


Memórias, Migrações e Socialidades

A sociabilidade na área de imigração alemã ocorreu, ao longo da história, em espaços como bailes e festas, sendo uma delas o kerb. Na sua origem o kerb é uma festa religiosa, mas é, também, a festa votiva da paróquia*. É a festa mais típica da colônia alemã e hoje, tendo perdido seu caráter religioso, permanece como uma grande ocasião para um encontro de famílias quer à noite, nas danças, quer durante o dia, nas refeições feitas em grupo. À noite sempre há baile, o que constitui o essencial do kerb. Moças e rapazes se preparam para o kerb usando vestidos e ternos novos e dançam valsas, marchas, sambas, tangos e, muitas vezes, também a polonaise.

* conforme aponta Jean Roche (1969:642)

107


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Os objetos da vida cotidiana usados pelos imigrantes logo que chegaram ao Brasil são, muitas vezes, objetos que os acompanharam na travessia para a América. Um moedor de pimenta ou um moedor de café são instrumentos de cozinha bastante úteis, mas podem ser, ao mesmo tempo, peças que atestam a evolução tecnológica dos objetos, facilitando a vida das mulheres imigrantes no serviço doméstico. Quando passam a compor acervos museológicos, tais peças se transfiguram: não são mais simples moedores de pimenta, mas testemunhos de um almoço ou jantar, participantes de um sabor distinto de uma carne ou de um peixe ou, ainda, lugar do sabor na cozinha das nonas ou das omas.

108


Memórias, Migrações e Socialidades

109


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

O tamanco é fabricado com pedaços de madeira, cepo de laranjeira que jamais racha e, além disso, imprime melhor som no bailado de tamancos, o Fandango. Dança rápida, cantada e sapateada, fortemente ritmada, tem origem espanhola.

110


Memórias, Migrações e Socialidades

O fandango chegou ao nosso litoral com os primeiros casais de colonos açorianos, por volta de 1750. Passou a ser “batido” principalmente durante o “entrudo” (precursor do carnaval).

111


Cat谩logo do Acervo Arqueol贸gico & Etnogr谩fico do Museu Antropol贸gico do Rio Grande do Sul

112


Memórias, Migrações e Socialidades

113


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Historiadores afirmam que já no século XVII os oleiros eram numerosos nos Açores. Eles também eram chamados azuladores, talvez por aplicarem a cor azul ao barro. Esta característica acompanha até hoje a louça da região. A cerâmica açoriana, desde o início da sua produção, era de uso decorativo – cinzeiros, vasos, samovares – e utilitário - peças de faiança, do tipo jarros, panelas, louças, canecas e penicos.

114


Memórias, Migrações e Socialidades

115


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Entre as festas mais populares do Brasil encontra-se a festa do Divino Espírito Santo. Oriunda de Portugal, espalhou-se pelos domínios portugueses vindo para o Brasil, onde tomou um caráter de festa religiosa festejada em todo o território brasileiro. Nos Açores, a festa tem sua origem na “magnanimidade dos senhores” para com a população camponesa, para quem mandavam distribuir carne, pão e vinho. Hoje, a festa tem este caráter, ainda, mas é uma festa popular. Os cantadores e músicos, integrados às folias do Divino, vestidos a caráter, seguiam atrás do cortejo, cantando versos ao Espírito Santo.

116


Memórias, Migrações e Socialidades

117


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

Uma transformação ritual. O artesanato em bonecas é recorrente em várias sociedades. Secar a palha do milho, cortá-la e recortá-la para produzir personagens em variadas atividades é o objetivo das artesãs. As bonecas de palha de milho seca são feitas no final de cada colheita, em agradecimento, enquanto são queimadas as do ano anterior.

118


Memórias, Migrações e Socialidades

119


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul

A arte árabe penetrou na Península Ibérica no final da Idade Média e o tempo que por lá permaneceu foi o suficiente para inscrever sua marca nos desenhos -os arabescos – nas joias, azulejos, paredes e outras superfícies. Os muçulmanos espanhóis, batizados por ordem do rei, são conhecidos como mouriscos. Os alarifes mouriscos executam o traçado românico, empregando materiais com toda a autenticidade possível. Esta bandeja é típica representante dessa arte. 120


Memórias, Migrações e Socialidades

121


CRÉDITOS Equipe MARS

Arienei Abreu | Técnico em Assuntos Culturais

Carlos Schaun | Técnico em Assuntos Culturais

Cecília Guimarães | Bolsista FAPERGS - Ciências Socias

Estela Galmarino | Técnica em Assuntos Culturais

Mariana Meira | Técnica em Assuntos Culturais

Maria Helena Sant ' Ana | Técnica em Assuntos Culturais

Renata Foletto | Estagiária FDRH - Ciências Sociais

Walmir Pereira | Antropólogo, Sociolólogo e Diretor do MARS

Todas as imagens e objetos do Catálogo integram o acervo da Instituição, pertencendo às Reservas Técnicas de Arqueologia e Etnografia do MARS.


Textos Arienei Abreu Eloisa Capovilla Ramos Estela Galmarino Josias de Mello Marcus Vinicius Beber Maria Helena Sant’ Ana Sinara Robin Walmir Pereira Revisão Textual Estela Galmarino Mariana Meira Walmir Pereira Fotógrafos Aline Moreira | pg. 74, 89 116, 117 e 119 Miriam Chagas | pg. 76 e 77 Neiva de Abreu Fernandes | pg. 83 e 87 Roberto Schmitt Prym | demais imagens

Projeto Editorial e Edição de Imagens Natalia Lassance


Catálogo do Acervo Arqueológico & Etnográfico do Museu Antropológico do Rio Grande do Sul Todos os direitos reservados desta publicação pertencem ao Museu Antropológico do Rio Grande do Sul – MARS

Espaço reservado para ISBN e tipo de impressão - Corag. Ficha catalográfica




Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.