Lucíola - José de Alencar

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LUCÍOLA

uma raiva e desespero, que me davam ímpetos de estrangular o meu algoz. Passado esse suplício restava uma vaga sensação de dor e um rancor profundo pelo ente miserável que me arrancara o prazer das entranhas convulsas!Comovida e lacrimosa, ela atirou-se ao meu peito, e enlaçou-me com os braços trêmulos: — Perdão! Houve um momento bem rápido em que o odiei também! Como sofri, meu Deus! Devia resgatar essa dor a felicidade que pela dor havia perdido! Lúcia concluindo essa narração, que a fatigara em extremo, enxugou as lágrimas e deu algumas voltas pela sala. — Se eu ainda tivesse junto de mim todos os entes queridos que perdi, disse-me com lentidão, veria morrerem um a um diante de meus olhos, e não os salvaria por tal preço. Tive força para sacrificar-lhes outrora o meu corpo virgem; hoje depois de cinco anos de infâmia, sinto que não teria a coragem de profanar a castidade de minha alma. Não sei o que sou, sei que começo a viver, que ressuscitei agora. Ainda duvidará de mim? — Tu és um anjo, minha Lúcia!

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