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Mercado e FInanças
Mais experiência e capital é o que a chevron proMete. Mas quando?
A sexta maior aquisição da história do sector do oil & gas gerou ondas de espanto. Em Moçambique também. Mas as consequências da mudança não deverão causar entraves ao processo já iniciado pela Anadarko
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em abril de 2019, a Chevron anunciava ao mundo a aquisição da Anadarko Petroleum, por surpreendentes 33 mil milhões de dólares, mais a assunção da dívida de 17 mil milhões da empresa de petróleo e gás de Houston, o que eleva a operação para perto de 50 mil milhões de dólares, transformando-a no sexto maior acordo na área do petróleo e gás da História. A principal razão pela qual a Chevron — um gigante que na Fortune 500 está classificada como a terceira maior empresa norte-americana e uma das 20 maiores no mundo — avançou para a compra de uma empresa que nunca foi tão grande como os seus sonhos, a Anadarko não está, no entanto, em Moçambique. Na voz da grande maioria dos analistas do mercado, fê-lo para fazer crescer a sua posição dominante em pontos estratégicos do sector petrolífero. Matt DiLallo, analista do sector, não esconde a sua surpresa pelo negócio. “A minha reacção ainda é de surpresa. A Chevron não necessitava de fazer negócios e, no entanto, aqui estão eles, a chocar-nos a todos com o sexto maior contrato de petróleo de sempre. Quanto mais investigo, mais entendo que é um bom negócio para a Chevron. Faz todo o sentido porque adiciona ao portefólio coisas que eles não tinham”, escreve. O que a Chevron na verdade pretende adquirir (a compra só ficará oficialmente selada no segundo semestre do ano, por estar dependente da aprovação dos accionistas da Anadarko) é uma posição de liderança na Bacia Permiana (a zona de maior produção de petróleo dos Estados Unidos, que se estende pelo Texas e Novo México) onde compete com a Exxon Mobil, a Apache, a Occidental e a Concho Resources. Como a Chevron aponta, o acordo vai permitir a ligação de vários de seus campos, criando um corredor de 75 milhas de largura na Bacia, uma área que permitirá a perfuração de laterais mais longas, o aumento da produção de petróleo em cada poço e uma redução dos custos de produção por barril. Se a Chevron já era uma das maiores proprietárias de terras na região, esta aquisição impulsiona a área detida em 100 mil hectares, para mais de 550 mil
na Bacia de Delaware, a zona forte da nova economia que nasceu a partir da exploração do petróleo de xisto. Mas há mais benefícios desta mega-operação: é que o negócio também irá reforçar a presença da gigante do petróleo nas Rocky Mountains (no centro-norte da Pensilvânia e no Texas) onde a empresa já detém mais de 12 mil quilómetros de pipelines, e está envolvida no negócio de colecta, compactação, tratamento, processamento e transporte de gás natural, petróleo bruto e recolha e eliminação de águas produzidas. Assim, a Chevron garante imediatamente uma pegada dominante em todo este território. E fica igualmente com as posições de águas profundas da Anadarko no Golfo do México. Por fim, um brinde que nunca é de menosprezar, mas que não passa disso mesmo nesta gigantesca movimentação de peças: o grande projecto de gás natural liquefeito (GNL) em Moçambique que irá colocar a Chevron “à mesa” com os seus rivais de sempre: a Shell, a BP e, particularmente, a Exxon Mobil, que também detém, como se sabe, activos importantes em Moçambique. Robert Rapier, com mais de 25 anos de experiência no sector de energia como engenheiro e investidor, escrevia recentemente na edição norte-americana da Forbes que “a Chevron não tem sido um participante importante no ‘mid stream’, que envolve o transporte e armazenamento de petróleo e gás. Este acordo dá-lhe isso mesmo, através de uma participação de 55% na Western Midstream Partners, uma sociedade limitada de 16 mil milhões de de acções negociadas em bolsa. Os accionistas da Anadarko ficam, sem dúvida, satisfeitos com o aumento imediato de 37% no preço das suas acções, as várias outras concorrentes viram as suas acções subirem por arrasto. Todos ficam contentes”. Por tudo isto, quando o acordo for oficializado, a Chevron tornar-se-á a segunda maior petrolífera do mundo ao nível da produção “Isto “tornará uma grande empresa numa maior ainda”, afirmou o presidente executivo da Chevron, Michael Wirth, aquando do anúncio do acordo com a Anadarko. Este prevê que a Chevron pague 7 mil milhões de dólares em dinheiro e entregue 200 milhões de acções à Anadarko, explica a agência Bloomberg. “É uma transacção que dá poder à Chevron”, diz Wirth, acrescentando que o negócio trará vantagens nas águas profundas do Golfo do México” e criará “oportunidades em áreas que reforçam as operações da empresa”. .
65
dólares O valOr de cada acçãO da anadarkO, um acréscimO de 37% sObre Os 46,80 a que estavam as acções da petrOlífera nO mOmentO da cOmpra
o ‘brinde’ em forma de reserva à escala mundial Claro que, onde estamos, o brinde do Rovuma que a Chevron comprou no ‘pacote Anadarko’ é ‘só’ o factor em que assentaram as grandes expectativas e previsões de crescimento da economia nacional na última década. Quem segue os envolvimentos e desenvolvimentos do processo de exploração das Áreas da Bacia do Rovuma saberá que não eram novos os rumores da compra da Anadarko. Eles têm ecos, pelo menos, desde 2014, quando já se falava insistentemente da aquisição “iminente” dizia-se, à época, por parte da Exxon Mobil. Acabou por ser a Chevron (a Occidental Petroleum também tinha feito uma oferta) a consumá-la, anos depois. Até porque a Exxon, se esteve para o fazer, preferiu optar por outro caminho, adquirindo uma participação de 25% na Área 4 de Moçambique (da ENI East Africa) em Dezembro de 2017, e assumindo, por essa via, uma postura mais activa no mercado, trabalhando para garantir outras concessões ao longo da costa de Moçambique. Casos dos “offshore” Delta Zambeze Z5-C, “offshore” Angoche – A5-B e “offshore” Angoche – Z5-D, nas províncias de Nampula, Sofala e Zambézia, que serão operados por um consórcio que, além da multinacional norte-americana, inclui a empresa russa Rosnef e a Empresa Moçambicana de Hidrocarbonetos (ENH). Voltando à Anadarko que sempre foi vista como companhia de ganhar concessões, lançar os projectos e passá-los aos grandes players, o seu destino parece, enfim, cumprir-se. No entanto, fez o seu trabalho. E não foi pouco. Fez avançar o processo, garantindo importantes acordos para a comercialização da exploração (já angariou clientes para adquirirem 8 milhões de toneladas cúbicas de gás por ano) e, por via disso, avançou na busca do financiamento necessário para avançar para a construção da fábrica de liquefação onshore, que teria um custo total na casa dos 20 mil milhões de dólares. Estaria por um trimestre a apresentação da decisão final de investimento. Estará ainda?
em Moçambique Michael Wirth não esqueceu, de resto, Moçambique no momento da compra, considerando que o projecto de exploração de gás natural da Anadarko pode ser “um bom negócio” a longo prazo.
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Muda a concessionária, mantém-se o projecto. A questão estará, agora, nos timings do início da exploração
A Chevron tem experiência em regiões com conflitos em curso, alavancagem financeira, clientes e toda a cadeia de valor. E também herda um projecto quase acabado. O que falta?
O ‘longo prazo’ levantou celeuma, claro. Não faltou quem augurasse que todo o processo de exploração de gás no país pudesse estar, uma vez mais, comprometido. Wirth não foi, no entanto, conclusivo. “A Anadarko tem um importante projecto de GNL que irá adequar-se bem ao nosso portefólio. Pensamos que o GNL é um bom negócio a longo prazo, de acordo com o objectivo mundial de se alcançar um mix de energia limpa, particularmente, para a produção de energia eléctrica”. Embora grande parte do foco da aquisição seja a corrida para dominar a Bacia do Permiano, o que Moçambique pode dar à Chevron é uma nova e substancial expansão offshore na área do GNL. Porque, como sabemos, a Área 1 da Bacia do Rovuma, até agora liderada pela Anadarko, será uma das maiores instalações de exportação de GNL do mundo. Por outro lado, o que a Chevron pode dar, é a sua experiência quando se trata de desenvolver operações deste calibre. Algo que, se recuarmos no tempo, foi muitas vezes apontado à Anadarko, especialmente pelas demoras ao longo do processo, que chegou a estar, no início da década, com previsão de conclusão para 2018. É que a Chevron tem no seu historial os colossais projectos australianos de Gorgon e Wheatstone para além de parcelas de capital no Angola GNL (Soyo), com uma capacidade de produção de 5,2 milhões de toneladas por ano. O que nos leva a uma conta simples: os 33 mil milhões da aquisição até podem parecer um preço significativo (até por superarem em 37% o valor actual das acções da Anadarko em Bolsa), mas diluem-se facilmente quando comparados com os 130 mil milhões de receita previstos para os 25 anos da concessão da Anadarko na Bacia do Rovuma onde será feito o maior investimento na História em África. Mas, para além do histórico, a Chevron tem o conhecimento e a capacidade financeira para ver o projecto de forma integrada. Não será a primeira vez que enfrenta questões como a insurgência rebelde” a que se assiste no norte de Moçambique, é uma empresa petrolífera internacional forte, experiente e bem capitalizada que, de acordo com os relatórios iniciais apresentados, tem todas as intenções de prosseguir com o cronograma de desenvolvimento proposto pela Anadarko cujo FID não se deverá manter para Julho, ao que se sabe, mas que poderá ser lançado no início de 2020. Ao nível fiscal, das mais-valias do negócio, o que se pode esperar é... pouca coisa. É preciso perceber quanto dos 33 mil milhões de dólares vale a operação de Moçambique. Não será muito, dada a dimensão do património da Anadarko noutros países e irá demorar meses até que se perceba quanto. Até lá, novidades aguardam-se.
