Catálogo Transamazônica - Imaginários Compartilhados

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Tr a n s a m a z 么 n i c a Imagin谩rios Compartilhados


Tr a n s a m a z 么 n i c a Imagin谩rios Compartilhados

Arthur do Carmo e Luana Navarro Curadoria Marcio Doctors

Museu da Fotografia Cidade de Curitiba Setembro e Outubro 2012


No dia 17 FEV 2010 um sedex sairia de Curitiba e atravessaria 3.156 kilômetros pelo país, destinado às margens da rodovia Transamazônica, ou BR-230, na fronteira entre o Pará e o Amazonas. Os destinatários eram Luana Navarro e eu, que realizávamos o projeto Imaginários Compartilhados pelo Rede Nacional Funarte Artes Visuais 2009. Mal sabíamos nós que a encomenda enviada pela artista Lídia Ueta, contendo várias câmeras descartáveis kodak, filmes 120, uma obra de Hélio Leites, um punhado de terra do Paraná (imagem ao lado) e duas cartas, só chegaria para nós no dia 13 DEZ 2010. O fato é que a própria remetente recebeu o sedex. Voltamos à Amazônia paraense desta vez com o projeto Fordlândia, realizado pela edição seguinte do rede nacional Funarte, e Lídia Ueta estava conosco no projeto. Não sabemos exatamente por onde passou esse sedex, o rastreio indicava que ele havia chego no destino (a cidade de Itaituba, por onde atravessa a BR-230) no mês de maio. O envelope chegou para nós aberto, pelas mãos do secretário de cultura do município de Aveiro, Waldeci Rodrigues, em Fordlândia (Arthur do Carmo). Página 05 - Leve e traga o essencial (2010, Lídia Ueta). Em nossa primeira partida para a Amazônia, em um de seus gestos característicos de generosidade, recebemos alguns presentes para viagem da artista Lídia Ueta, e entre eles se encontrava esse bilhete. 2

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Viajando pelo coração do outro Arthur do Carmo e Luana Navarro nos convidam para acompanhá-los em uma viagem pela Amazônia, realizada em 2010, quando foram contemplados no edital Rede Nacional Funarte Artes Visuais, e percorreram um trecho da Transamazônica, partindo de Curitiba até Itaituba no Pará de ônibus comum, transporte alternativo e balsa. Mas esta não foi uma viagem tradicional no sentido turístico e aventureiro. Propuseram-se algo diverso: uma incursão no imaginário. Penetraram num universo de descobertas de um mundo que lhes era desconhecido, mas que exercia um fascínio porque os acompanhava como uma lembrança coletiva de um tempo quando ainda não tinham nascido, mas que é forte e presente no imaginário nacional: que é a construção da transamazônica.

A quarta, quinta e sexta salas trazem instalações que são como depurações daquele momento vivido pelos artistas transfigurados em poemas visuais de ocupação dos espaços. A terra, o espelho e o neon, da quarta sala, nos indicam uma terra devastada e rachada pela ganância e por sentimentos de abandono e solidão, atravessados pela pulsão sexual. A quinta sala é uma ação épica mínima sobre a devastação e que faz do palito e da chama do fósforo um canto paradoxal de destruição e esperança: Da floresta Amazônica ao palito de fósforo. A última sala: Mapa para não ver a paisagem é a reconstrução do mapa do Brasil com os nomes de cidades que fazem referência à paisagem que deu origem ao nome da cidade, cujas paisagens hoje talvez nem existam mais.

A partir de um interesse jornalístico surgiu o desejo de entender esse momento recente da história do Brasil. No entanto, a percepção que extraíram dessa curiosidade de quase arquivistas foi maior do que uma simples narrativa factual. A viagem que empreenderam transformou-se no desejo de revelarem uma realidade que não fosse meramente descritiva, mas que nos trouxesse as mesmas sensações como as que a invenção na arte permite. Queriam revelar a transparência do mistério desse solo que se apresenta como um território de misturas de riqueza e miséria, pujança e decadência, aventura, solidão e desafio. O resultado é esse convite para sermos parceiros de uma incursão por uma Amazônia em que compartilharemos com eles nossa imaginação, a partir da suas percepções sutis.

Imaginários compartilhados é uma exposição-viagem pelo coração do outro, em que somos convidados a compartilhar nossos sentimentos com os dos artistas que, ao nos apresentarem uma Amazônia que reproduz de uma maneira singular o que dela percebemos, nos aproximam de uma forma delicada e contundente dos habitantes e dos problemas de uma região do país que nos é tão próxima e tão distante. Esta é uma exposição que propõe ser um local de trocas de sentimentos e percepções, sem deixar de evidenciar a nossa perplexidade com o destino que o homem tem dado à natureza. Marcio Doctors

A exposição está dividida em seis salas. A primeira apresenta a obra fotográfica Entreterras e o vídeo registro Ação noturna, no qual a música Noturna, de Edith de Camargo, percorre espaços da cidade de Itaituba/PA pelas caixas de som de uma bicicleta, meio de divulgação de informação da cidade. As duas obras são maneiras diferentes de aproximar duas realidades distintas que se encontram através da ação dos artistas; de nos aproximar dessa realidade. A segunda sala traz a instalação Pelo coração do outro, que é constituída por um trapiche com redes em que o público poderá assistir aos vídeos produzidos durante a viagem dos artistas. É um convite para percebermos a alteridade. A terceira sala é o Arquivo orgânico, em que propõem um espaço para minha ação curatorial, para além de toda a troca que aconteceu ao longo da preparação dessa exposição. A proposta de ser um espaço orgânico me permitiu fazer uma ação mais integrada com minha forma expressiva, em que apresento o que significa para mim a Amazônia como local de cobiça, de descoberta, de ruína e esperança e de possibilidade de um devir para o homem, que é o índio, que traz guardada nas suas entranhas.

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Páginas 06 e 07 – fotografias feitas pelos artistas das casas de palafitas à beira do Rio Tapajós em Itaituba/PA durante a viagem pela Transamazônica em 2010 (Luana Navarro). páginas 08, 09 e 11 – Pelo coração do outro (2012, Arthur do Carmo e Luana Navarro), instalação montada com doze televisores de vários tamanhos, sobre um trapiche de aproximadamente 15m X 7m, com dois níveis, de 50cm e 70cm, em disposição aleatória. Em algumas televisões rodavam vídeos produzidos durante a viagem dos artistas (frames ao lado) enquanto outras sintonizavam sem antenas canais abertos ou ainda permaneciam desligadas. Entrecruzando os corrimãos do trapiche e os espaços vazios de sua estrutura, diversas redes formavam um local de encontro e permanência na obra. 10

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O que é a Amazônia? Explorar esse vasto rio e essa vasta floresta que nos oferece o mistério (o mistério?) da natureza, que questiona nossa incredulidade diante das forças da vida, que lá, de forma incondicional, se apresenta solicitando de nós, no mínimo, humildade. Que mistério é este que essa floresta carrega consigo e que convive com ela há milênios, pedindo para não ser incomodada, e nós (curiosos que somos), queremos sempre desbravá-la, procurando algum sentido, que certamente não lhe interessa. A Amazônia é uma força: é a potência da presença que insidiosamente nos ameaça e convida para nos dar a chance da vida, que talvez só determinados artistas, filósofos e cientistas carregam consigo. É uma forma de certeza presente que nos oferece à imaginação, a ilusão de que nós homens poderíamos ser alguma outra coisa, que não a busca desenfreada da técnica, da tecnologia, do controle e do domínio. Há camuflada na floresta, uma forma de vida humana revelada, que traz consigo a possibilidade explicita de sermos como ela: de sermos como o índio, de sermos menos “demasiadamente humanos”.

A projeção (Expedição Roosevelt – Rondon, 1913-1914), (frame acima) apresentada nesta sala era um registro de época de uma expedição realizada nos anos de 1913 / 1914, quando Theodore Roosevelt, ex-presidente americano, vem ao Brasil acompanhado por uma equipe de cientistas, financiado pelo Museu de Historia Natural de Nova York, para realizar pesquisas sobre a fauna e a flora da região Amazônica. No entanto, na ocasião de sua chegada ao Rio de Janeiro, o ex-presidente foi surpreendido pelo convite do governo brasileiro, para que dividisse o comando da expedição de reconhecimento do Rio das Dúvidas, ao lado do Marechal Rondon, sertanista, expedicionário, que estava imbuído da determinação de construir uma linha telegráfica na Amazônia. Rondon é certamente uma das figuras mais eminentes de nossa história, convictamente comprometido com a causa indígena (Marcio Doctors). Página 15 – Arquivo orgânico (2012, Marcio Doctors). A concepção do espaço nomeado Arquivo orgânico se desenvolveu a partir da leitura do texto O que é a Amazônia (ao lado) lido por diferentes pessoas, com diferentes timbres, e disponibilizados em fones de ouvido descidos do alto. Espalhadas, cadeiras de ferro e espaguetes de PVC coloridos foram distribuídas pela sala. Duas projeções de uma das primeiras incursões civilizatórias na Amazônia somado a um texto contextual (fragmento acima) em vinil finalizavam a composição da instalação. 12

O índio que ela conserva nas suas entranhas nos questiona sobre as incertezas que nossa ação no mundo desencadeou. E duvidamos de nós mesmos e de nossas escolhas, pela devastação que ocasionamos no mundo, por esquecermos que dele não somos o centro, como se não nos bastasse simplesmente esquecer a Amazônia como desafio e aceitá-la como oferenda. Esquecê-la para entregá-la ao seu fluxo de diversidade estonteante, sem que tenhamos necessidade de fatiá-la pela má ciência e pela má política ou desbravá-la sem humildade para transformá-la em troféu de riqueza que poderá nos empobrecer. Abrir caminhos. Ir ao encontro da vastidão como se aquela terra plena e prenha necessitasse algo e precisasse do nosso sentido para preenchê-la. Doce ilusão de uma ganância ingênua que se traveste de esperteza... Mas a Amazônia, Senhora e Solitária na sua grandeza, nos ameaça ainda com sua presença, nos questionando, sem nos perguntar, fazendo brotar a dúvida que carregamos diante de nossa escolha civilizatória. A Amazônia é uma reserva de dúvidas que nos desafia; que nos coloca diante de nós mesmos, questionando o sentido que demos ao mundo, ou melhor, o sentido que demos a nós no mundo. Mas ela é como um canto de inspiração que nos dá a chance de retornar para algo tão próximo e tão desejado, que é sentir o fulgor da vida. O fulgor de vida que ela tornou-se reserva é o que desafia nossa imaginação e que nos indica a possibilidade de um devir outro para nós. Este outro nos traz a idéia de origem. É isto que nela nos atrai e queremos de alguma forma destruir. É isso que desejamos conhecer e que nos desafia. Ela nos revela a certeza de que nela se concentra a vida na sua forma mais intensa. Isto nos assusta, nos atrai e atiça a cobiça. Sua energia é a sua capacidade cíclica de destruição e reconstrução; de nascer e reviver. Onde há mudança, há invenção. Onde há vida em mutação, há criação em processo. 13


Há na Amazônia uma pulsão de recomeço porque ela é como uma reserva do início dos tempos. Como se depois do processo civilizatório seremos nela de novo; voltaremos a ela. Por detrás de toda idéia de colapso do futuro há um encontro com a idéia do começo. A Amazônia é para nós o início, por isso a desejamos. A Amazônia, tanto quanto uma reserva natural é uma reserva espiritual. É a força capaz de nos indicar a vida na sua simplicidade e complexidade. Isso que nos desafia, nos confunde e nos atrai e é isto que agredimos pelo medo que a desconfiança gera. Há na Amazônia a mesma força da arte que é a capacidade de resistir. Por mais que queiramos desbravá-la, esquadrinhá-la para o conhecimento, cortá-la com estradas para fomentar a economia, fazer dela pasto, comercializando sua madeira e queimando a floresta, ela resiste. Ela resiste como um desafio que nos questiona sobre o sentido que queremos dar ao mundo; sobre o que queremos para nós e nosso futuro. Ela é a resistência do começo; é a certeza da plenitude da imanência na solidão mais profunda imposta por sua grandiosidade, quando nos sentimos pequenos diante do gigantismo de sua força. Há nessa solidão profunda um encontro com o fulgor da vida. A vastidão da Amazônia, assim como a vastidão branca da Antártida, é a reserva de solidão da “humanidade”, que nos faz debruçar diante do mistério do que veio antes e do que ainda virá: faz-nos mistério. Imagino às vezes que a Amazônia e os índios que nela habitam são o que restou de uma civilização como a nossa que foi engolida pela força da natureza, ao deixar de lado sua crença civilizatória, quando descobriu que não valia à pena estar no mundo como estamos. Imagino que um dia sejamos no mundo como a Amazônia e nela como os índios são. Marcio Doctors

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Entreterras (2010, Arthur do Carmo e Luana Navarro) – fotografias em acrílico transparente 5mm.


Prainha

Uraricoera

Alto Alegre Pinheiro Ilhas Crandes

Campo Alegre

Morros Terra Alta

Ilha Providência Ilha do Inferno

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Bravas

Ponta de Pedras

Ilha Terra Preta

Bonito

Lago Verde

Barreirinhas

Brejo

Lagoa Alegre Areia Branca Grossos Pedra Grande Pureza Trairão Montes Altos Pendências Pasto Bravo Estreito Porto Acre Monte Ilha Comprida Encanto Pasto Bons Água Azul Pedra Preta Carrasco Alegre Rio Crespo Rio Sereno do Norte Água Nova Ilha Areal Jardim do Mulato Rio Vermelho Rio Tinto Venha-Ver Rio Tem-Medo Lagoa Seca Água Branca Ministro Andreazza Pau D`Arco Alta Serra Redonda Rio Branco Presidente Médici Floresta Pedra Branca Rio Sono Campos Lindos Floresta Várzea Branca Água Preta Coqueiro Monte Lagoa da Águas Belas Seco Riacho Frio Negro Serra Azul Novo Horizonte Confusão Belo Monte Manidão do Norte Flor da Serra Areia Branca Remanso Campos Belos Pedra Mole Riozinho Sorriso Saúde Rio do Sangue Poço Verde Talismã Surpresa Barro Alto Água Fria Salto do Céu Bonito Serra Preta Rio Quente Pedras Negras Água Boa Belo Campo Monte Porto Serra Azul Barro Preto Azul Campo Verde Mato Estrelas Barro Alto Floresta Azul Tesouro Água Limpa Campo Verde Águas Várzea Vermelhas Azul Rio Verde Grande Cristalina Monte Pedra Azul Sonora Lagoa Formoso Água Boa Cachoeira Formosa Costa Rica Rio Negro Dourada Ferros Rio Vermelho Cascalho Rico Água Doce Brejo Alegre Campo Belo Horizonte Morro Agudo Ouro Preto Pedra Pedregulho Florido Rio Brilhante Lagoa Dourada Bonita Vista Alegre Ilha Comprida Pedra Dourada do Alto Ouro Verde Bela Vista Ouro Fino Flora Rica Matão Terra Rica Barra Bonita Terra Boa Fartura Serra Negra Terra Roxa Ventania Mato Rico Cerro Azul Céu Azul Água Azul Matinhos Saudades Rio Negro Cerro Águas Negro Mornas Erval Seco Turvo Jóia Vale Verde Restinga Seca Fonte Boa

Mapa Para Não Ver a Paisagem (2011, Arthur do Carmo e Luana Navarro). A obra resgata os nomes de cidades de todo o Brasil que fazem referência às paisagens que talvez foram encontradas algum dia. A paisagem se perde no processo civilizatório, assim como os nomes indicativos delas perdem a ideia de uma natureza e passam a fazer parte de uma referência política. A instalação foi montada com um vidro 10mm e 1,5m X 1,5m, distanciado 10cm da parede com nomes de cidades selecionados impresso sobre ele em adesivo recorte, disposto na posição do Brasil no mapa delineado da América Latina. Uma luz laranja projetava a sombra dos nomes na parede e outras duas luzes vermelhas banhavam a parede ao redor.

Monte Alegre

Cachoeira Grande

Breu Branco

Bom Lugar

Matões Morrinhos

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Noturna (Edith de Camargo) Sobreviver à mais longa noite Que se estende mais um dia Que nos leva a um sono profundo Que nos leva à primeira aurora À primeira palavra O primeiro silêncio carrega palavras Jamais escutadas Jamais Sobreviver à mais longa noite Diluido no mundo e sentido por adiar o que nunca mais consegue falar.

Nossa última noite na Amazônia. Estamos no meio do que já foi uma floresta fechada e hoje é uma cidade onde os barcos chegam e partem todo dia o dia inteiro. Há por todos os espaços uma organização caótica, onde pouco se fala e pouco se escuta. O que se escuta muito são os famosos ritmos brega e tecnobrega. As mesmas músicas tocam por quase todos os lugares. As ruas possuem alto-falantes, os carros e os barcos são equipados com equipamentos de som, fora os players portáteis. Como se fossem necessários para ocupar o espaço de silêncio deixado pelo não-dito. A cidade não é tão povoada: um pouco mais de 100 mil habitantes, numa densidade demográfica de 1,62 habitantes por KM2. Itaituba já foi conhecida como cidade faroeste. Uma extração intensa de ouro fez o lugar ter o aeroporto mais movimentado do mundo na década de 70, com a média de 460 pousos e decolagens por dia. A maior parte desta riqueza do minério não permaneceu, entretanto, conta-se que cinco anos atrás ainda predominavam por algumas ruas uma relação de muita violência com cobrança de pedágio e desentendimentos políticos e sociais. As histórias de crimes passionais, pedofilia e acerto de contas são comuns e chegam a ser banais nas reportagens nos jornais diários. Imersos nesse ambiente, sendo constantemente observados, convivendo com esses espaços tomados pela música e pelo não-dito, fomos levados também nós à quietude, numa tentativa de escuta. Esse nosso silêncio nos levou a observar nós mesmos neste lugar. Nossa permanência durante esses dias começou a gerar uma necessidade de fala. Uma vontade de troca, de se colocar neste ambiente de forma autêntica, sem ser conivente com as relações autoritárias e seus jogos de poder diários. Procurar essa fala de uma maneira a ser ouvido sem perder a postura fez com que inseríssemos também nós uma música neste lugar. Um ritmo e uma fala na qual nos sentíssemos presentes. Com ternura agradecemos a Edith por ter nos cedido a música para inserção na cidade. Arthur do Carmo e Luana Navarro Itaituba/PA - 08/03/2010 22

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Da Floresta Amazônica ao palito de fósforos (2010, Arthur do Carmo e Luana Navarro). No dia de abertura esta sala recebeu a performance relacionada à instalação e executada por Débora Vecchi. Os índices remanescentes da performance (palitos de fósforos queimados na frente de três troncos com a seiva vermelha sangrada) permaneceram no decorrer de toda exposição. Além deste material, um televisor de plasma rodava a mesma performance feita para o vídeo. 24

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Amava e Sonhava (2012, Arthur do Carmo e Luana Navarro) – com a entrada bloqueada por troncos de eucaliptos, o público avistava a obra apenas da porta de entrada. Pelo chão, uma espessa camada de terra e um espelho de 2m X 2m. Acima desses materiais, uma frase escrita de maneira invertida, dando a leitura apenas pelo espelho, em luz neon amarela: “Amava as meninas/ prostituídas / e sonhava ter dentes de ouro.” 26

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Não ter tido qualquer contato com a região da Transamazônica propriamente dita surgia como a questão central no início do trabalho proposto com Imaginários Compartilhados. Todo o primeiro levantamento de imaginário feito por Luana Navarro e por mim estava baseado na distância compartilhada em relação à Transamazônica. Não sabíamos ao certo qual sua posição geográfica, quais estados ela percorria, suas origens e motivações, suas conseqüências e futuras intervenções, tanto nela mesma, quanto na vida fluída ao redor. As probabilidades de tornar a Transamazônica uma presença passaram a se relacionar diretamente com as promessas publicitárias presentes na Revista Realidade de 1971. Nós partimos da imaginação já construída historicamente sobre um lugar para nós, até então, desconhecido, voltando-nos à reinvenção deste imaginário a partir da experiência. Mas o que eu me propunha a ouvir e falar desse lugar? Na tentativa de experimentar a Transamazônica sem nunca ter posto os pés na Amazônia, parti em busca de coisas palpáveis com as quais pudesse dialogar antes da residência em Itaituba, no Pará. Encontrei livros, teses, artigos, fotos, vídeos… e mapas. No início do projeto, em 2009, eu me perguntava: se de todo material que tenho lido e visto a respeito da Amazônia são os mapas dos quinhentos aos setecentos que me atraem, como posso me interessar pelo cotidiano travado nesse território? Nenhuma informação ou documentação precisa me seduzia tanto quanto as fabulações cartográficas. Desde então, nas minhas práticas artísticas (abrangendo as posições de crítico e curador), passaram a me interessar as configurações poéticas de um território, seja ele um lugar geográfico ou um documento. Qual potência poética do que está aqui? Como ela pode ser traduzida, numa experiência outra, além de si mesma? Arthur do Carmo

Ao lado (2010, Luana Navarro). Dia 05 da viagem com Arthur do Carmo. Rodovia Transamazônica, BR230,em algum lugar entre Marabá/PA e Itaituba/PA. 28

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Existia uma imagem, uma imagem encadeada em tantas outras. Não havia um corpo de árvores sendo tocado pelas mãos de um outro, um outro que caminhava sozinho pela noite, que amava as meninas prostituídas e sonhava ter dente de ouro. Não havia um rio. Não havia o barulho das moto-serras de direções que não se podia identificar. E não havia o cheiro de suor, e nem o encontro de um corpo com a água de um rio. E não havia o leite sendo extraído de um tronco já marcado, e nem a marca no corpo daquele que marcava o tronco. E não havia a foice enferrujada. O pasto não corria pela janela, e a poeira não entrava no nariz. E não era imensidão. E não havia quem da política a fantasia construiu, como se escondesse ouro na terra para que depois fosse encontrado. Retirar, colocar, encontrar, e perder de novo. Se a pisada fosse mansa não haveria som para escutar. E havia incerteza, e é nela que queremos ainda nos banhar. Luana Navarro

Ao lado (2010, Luana Navarro). Dia 05 da viagem com Arthur do Carmo. Rodovia Transamazônica, BR230,em algum lugar entre Marabá/PA e Itaituba/PA. 30

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Arthur do Carmo Nasceu em Curitiba/PR em 1986. Conclui o curso de Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná. Estudou fotografia e arte contemporânea com Milla Jung e Felipe Prando no Núcleo de Estudos da Fotografia em Curitiba entre 2007 e 2010. Em 2009 e 2010 realizou os projetos Imaginários Compartilhados e Fordlândia através do Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais. Integrante do corpo editorial do Revista LAB#. Atualmente participa como artista experiente da 6a Edição do Bolsa Produção, promovido pela Fundação Cultural de Curitiba. Trabalha no espaço recentemente batizado de OCAE – Onde o Coiote Atravessa a Estrada, também em Curitiba. Exposições individuais 2012 Projeto Armazém Museu da Gravura Cidade de Curitiba Curitiba/PR – Brasil Exposições coletivas 2012 Turnê – organizado por Regina Melim Galeria SIM Curitiba/PR – Brasil 2012 Fordândia (com Lidia Ueta e Luana Navarro) Espaço Tardanza Curitiba/PR – Brasil 2011 Tijuana - Feira de Arte Impressa Galeria Vermelho São Paulo/SP – Brasil 2011 Publicações de artistas – curadoria Paulo Reis e Ana González Museu da Gravura Cidade de Curitiba / Solar do Barão Curitiba/PR – Brasil 2011 Fordlândia – exposição/conversa (com Lidia Ueta e Luana Navarro) Núcleo de Estudos da Fotografia Curitiba/PR – Brasil 2011 Imaginários Compartilhados (com Luana Navarro) SESC Pato Branco/PR – Brasil 2011 Projeto Mutirão (organizado por Graziela Kunsch) All That Fifts: The Aesthetics of Journalism – quad Gallery Londres/ING 2010 Imaginários Compartilhados (com Luana Navarro) Salão de Artes Audiovisuais do Recôncavo Salvador/BA – Brasil 2010 Transamazônica: Imaginários Compartilhados/Mostra de Processo (com Luana Navarro) Núcleo de Estudos da Fotografia Curitiba/PR - Brasil 2010 Diálogos (com Caio Leão) Photoespaço, Sesc da Esquina Curitiba/PR - Brasil 2010 Cicle Cine Cinemateca de Curitiba Curitiba/PR - Brasil

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2010 Recontextualizações Afetivas (com Lídia Ueta e Luana Navarro) Arte Bicicleta & Mobilidade 2010 Curitiba/PR - Brasil 2009 O Indivíduo no Coletivo Arte Urbana/Transporte Coletivo Curitiba/PR – Brasil 2009 Olivetti Livre Fuzarca – Casa das Caldeiras São Paulo/SP – Brasil 2009 Despublicidade I Bienal de Fotocópias Mendoza-ARG 2009 Despublicidade Mostra SESC de Artes Universitárias Curitiba/PR - Brasil 2008 O que desejo não tem nome Galeria Estreita Curitiba/PR – Brasil Curadorias 2012 Orgânico – artistas convidados Constance Pinheiro, Denise Bandeira, Elenize Dezgeniski e Faetusa Tezelli, Fran Ferreira, Janete Anderman, Laura Miranda, Luana Navarro, Marília Diaz, Susan Sant'Anna SESC Paço da Liberdade Curitba/PR - Brasil Prêmios 2012 Bolsa Produção em Artes Visuais VI – Categoria Artista Experiente – Fundação Cultural de Curitiba 2011 Edital de Ocupação de Espaços da Fundação Cultural de Curitiba – projeto: Imaginários Compartilhados, em parceria com Luana Navarro com curadoria de Marcio Doctors 2010 Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais 2010 – projeto: Fordlândia 2009 Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais 2009 – projeto: Imaginários Compartilhados 2008 Fundação Cultural de Curitiba - Edital Arte Urbana / Transporte Coletivo

Contato + 55 41 8467-0509 arquivodoarthur@gmail.com

Levinus Hulsius, Mapa America Meridional (1602), Biblioteca Digital Mundial, UNESCO. Mapa em duas folhas; 46 x 32 centímetros dobrada em 2 folhas (27 x 33 centímetros e 23 x 32 centímetros). Coleção Hans and Hanni Kraus Sir Francis Drake (Library of Congress). 35


Luana Navarro

Nasceu em Maringá, PR em 1985. Formada em Jornalismo pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná/2009, possui especialização em História da Arte Moderna e Contemporânea pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná / 2011. Aprofundou seus estudos sobre fotografia no Núcleo de Estudos da Fotografia em Curitiba no período de 2007 a 2010. Em 2009 e 2010 realizou os projetos Imaginários Compartilhados e Fordlândia através do Programa Rede Nacional Funarte Artes Visuais. Em 2012 participou do Programa Especial de Estancias para Creación Artística de la Convocatoria de Becas para Extranjeros realizando uma residência artística na Cidade do México junto ao Centro de la Imagen. Vive e trabalha em Curitiba. Exposições individuais 2012 Hoje, só emergências Museu da Gravura Cidade de Curitiba Curitiba/PR – Brasil 2012 Projeto Fordlância (com Arthur do Carmo) Espaço Tardanza Curitiba/PR - Brasil 2011 Imaginários Compartilhados (com Arthur do Carmo) SESC Pato Branco/ PR – Brasil 2010 Corpo Urbano SESC Pato Branco /PR - Brasil 2008 Corpo Urbano Photoespaço, Sesc da Esquina Curitiba/PR - Brasil Exposições coletivas 2012 Orgânico, curadoria de Arthur do Carmo, Paço da Liberdade / SESCPR Curitiba/Pr-Brasil 2012 Fábulas e Encontros, curadoria de Georgia Quintas, Galeria Fauna São Paulo/SP-Brasil 2011 Publicações de artistas, curadoria Paulo Reis e Ana González Museu da Gravura Cidade de Curitiba / Solar do Barão Curitiba/PR - Brasil 2011 Fordlândia – exposição/conversa (com Lidia Ueta e Arthur do Carmo) Núcleo de Estudos da Fotografia Curitiba/Pr – Brasil 2010 Possíveis Conexões II Museu de Arte Contemporânea do Paraná Curitiba/PR – Brasil 2010 Imaginários Compartilhados (com Arthur do Carmo) Salão de Artes Audiovisuais do Recôncavo Salvador/BA - Brasil

2010 Corpo Urbano DeVercidade Fortaleza/CE - Brasil 2010 Transamazônica: Imaginários Compartilhados/Mostra de Processo (com Arthur do Carmo) Núcleo de Estudos da Fotografia Curitiba/PR - Brasil 2010 Aparências do estar – Arte Urbana/Transporte Coletivo Curitiba/PR - Brasil 2009 Material em processo de secagem para posterior remoção Parque São Lourenço (Expressões OI) Parque São Lourenço Curitiba/PR – Brasil 2008 O que desejo não tem nome Galeria Estreita Curitiba/PR - Brasil

Prêmios 2010 XI Prêmio Funarte de Fotografia Marc Ferrez Produção crítica e teórica Bolsas e residências artísticas 2012 Programa Especial de Estancias para Creación Artística de la Convocatoria de Becas para Extranjeros. Residência artística na Cidade do México junto ao Centro de la Imagen. 2011 Bolsa Produção para Artes Visuais 05 – Fundação Cultural de Curitiba

Contato + 55 41 9969-1743 luananavarro85@gmail.com www.luananavarro.com

Anotação em diário de viagem. (2010, Luana Navarro) 34


Artistas Arthur do Carmo e Luana Navarro Interlocutor e Curador Marcio Doctors Assistente de pesquisa da curadoria Maria Pierro Gripp Produção Dayana Zdebsky de Cordova e Milena Buzzetti Montagem Ricardo Leiva Assistente de montagem Alecsander Mattos Montagem neon Maria Lígia Freire Guilherme Iluminação Trio Luz Áudio Case-RTA Assessoria de imprensa Paula Melech Design Gráfico Adriana Alegria Fotografia Patricia Lion Vozes da sala Arquivo Orgânico Anjolilo Carlos Buzzetti, Arthur do Carmo, Maria Cristina Horta, Fabio Costa, Ligia Maria Virmond Stockler, João Caserta, Marcel Szymanski, Marília Sette, Milena Buzzetti, Siciane Geruntho. Execução da performance Da Floresta Amazônica ao palito de fósforo Débora Vecchi Monitores Breno Canedo e Miriane Figueira Agradecimentos Atty Skazi, Ana Larousse, Ana Gonzalez, Anayr Ivete Spack L. do Carmo, Alessandra Nasser, Antonio de Souza, Blenda Freire, Carlos Kenji, Dagoberto Navarro, Elenize Dezgeniski, Eduardo Spiller, Edith de Camargo, Felipe Prando, Guadalupe Presas, Lidia Ueta, Maria Lígia Freire Guilherme, Maria de Lourdes Navarro, Marlene Suizani, Mauro Lauriano do Carmo, Meio Fio Cultural, Milla Jung, Nângela Nasser, Paulo Botas, Ricardo Corona, Secretaria do Meio Ambiente de Curitiba, Processo MultiArtes, Ponto Cultura de Ouro, Ronie Rodrigues, Sônia Pereira, Waldely Fernandes e a todos os participantes das oficinas realizadas em Itaituba/PA.

PROJETO REALIZADO COM O APOIO DA PREFEITURA MUNICIPAL DE CURITIBA, FUNDAÇÃO CULTURAL DE CURITIBA, FUNDO MUNICIPAL DA CULTURA – PROGRAMA DE APOIO E INCENTIVO À CULTURA

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