Revista 8 ASPESM

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FICHA TÉCNICA

TÍTULO | TITLE: Revista Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Journal of Mental Health Nursing

EDIÇÃO E PROPRIEDADE | PUBLISHING AND PROPERTY:

Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental | Portuguese Society of Mental Health Nursing

DIRETOR | MANAGING DIRECTOR: Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal

COORDENADOR | COORDINATOR

COORDENADOR DA COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL COMMITEE COORDINATOR Francisco Sampaio, MSc – Hospital de Braga, Portugal

COMISSÃO EDITORIAL | EDITORIAL COMMITEE

COMISSÃO CIENTÍFICA | SCIENTIFIC REVIEWERS

Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal

Amadeu Gonçalves, MSc - Escola Superior de Enfermagem, Instituto Politécnico de Viseu Bruno Santos, MSc – Casa de Sáude do Bom Jesus - Braga Carlos Vilela, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto Francisco Sampaio, MSc – Centro Hospitalar de Braga Maria Júlia Martinho, MSc - Escola Superior de Enfermagem do Porto

Agustín Simónelli Muñoz, PhD - Universidad Católica San Antonio, Múrcia, Espanha Aida Mendes, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Beatriz Araújo, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Carlos Sequeira, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal Carme Ferré Grau, PhD - Universitat Rovira i Virgili. Tarragona, Espanha Francisca Manso, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Lisboa, Portugal José Carlos Carvalho, PhD - Escola Superior de Enfermagem do Porto, Portugal José Carlos Gomes, PhD - Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, Portugal José Carlos Santos, PhD - Escola Superior de Enfermagem de Coimbra, Portugal Luís Sá, PhD - Instituto de Ciências da Saúde - Universidade Católica Portuguesa, Porto, Portugal Margarida Sotto Mayor, PhD - Hospital de Magalhães Lemos, Porto, Portugal Michell Araújo, PhD - Faculdade Católica Rainha do Sertão / Enfermeiro PSF-Fortaleza e Hospital de Messejana, Brasil Odete Pereira, PhD - Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo, Brasil Raul Cordeiro, PhD – Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Portalegre, Portugal Teresa Lluch, PhD – Escola Universitària d’Infermeria - Universitat de Barcelona, Espanha Zeyne Scherer, PhD – Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo, Brasil

Público-alvo: INDEXAÇÃO:

Enfermeiros, médicos, psicólogos, assistentes sociais terapeutas ocupacionais e outras pessoas com interesse na área da saúde mental.

A Revista da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental foi aceite para indexação em:

Objectivo: SciELO - Scientific Electronic Library Online Divulgação de evidências científicas sobre a promoção da A revista cumpre os principais critérios de qualidade estabelecidos saúde, prevenção de doenças, tratamento, reabilitação e pela metodolgia SciELO e foi aceite para integrar a plataforma reintegração das pessoas com doença mental ao longo da SciELO. Brevemente estará disponível em formato electrónico. vida. LATINDEX - Sistema Regional de Informação

Âmbito: em linha para Revistas científicas da América Latina, Caraíbas, Políticas e design dos cuidados de saúde; Espanha e Portugal .

Avaliação, diagnóstico, intervenções e resultados de enfermagem; Sistemas de informação e indicadores em saúde mental; CIBERE - Conselho Iberoamericano de Editores de Revistas Ética e desenvolvimento de boas práticas de saúde mental; de Enfermagem e Afins Direitos e deveres dos doentes mentais; Formação e investigação em enfermagem em saúde mental. CINAHL®, the Cumulative Index to Nursing and Allied SUBSCRIÇÃO | SUBSCRIPTIONS Health Literature Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é publicada duas A Revista cumpre os principais critérios de qualidade estabelecidos vezes por ano, Junho e Dezembro pela metodologia EBSCO e foi aceite para integrar esta base de O preço por número é: para instituições € 10.00; para particulares € 8.00 dados. Brevemente estará disponível em formato electrónico. Portuguese Journal of Mental Nursing is published twice a year, June and December. Aviso: The price of each number is: for institutions € 10.00; for private subscribers € 8.00 Os artigos publicados são propriedade da Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental pelo que não podem ser reproduzidos, em parte ou no todo, sem a SECRETARIADO | SECRETARIAT devida autorização da SPESM, exceptuando o uso legal. Bruno Santos; Francisco Sampaio; António Carlos Amaral A Responsabilidade pela idoneidade e conteúdo dos artigos é única e exclusiva dos seus autores.

ISSN: Fotos

1647-2160 Luís Silva ENDEREÇO Prof. Carlos Sequeira - Escola Superior de Enfermagem do Porto DEPÓSITO LEGAL | LEGAL REGISTRATION: 294975/09 Rua Dr. António Bernardino de Almeida, s/n, 4200-072, Porto, Portugal URL: www.spesm.org E-mail: revista.spesm@gmail.com


Índice 1

EDITORIAL ................................................................................................................................

ARTIGOS DE REVISÃO/INVESTIGAÇÃO

2

CONCEÇÃO DE UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO NA MEMÓRIA PARA IDOSOS COM

DÉFICE COGNITIVO LIGEIRO ................................................................................................... 7

3

COMPETÊNCIA EMOCIONAL EM PROFESSORES - CONTRIBUTOS DA

PSICOEDUCAÇÃO .................................................................................................................. 16

4

A PERSONALIDADE DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA CONJUGAL ............................................. 25

5

PROGRAMA SAÚDE MENTAL SEM ESTIGMA: EFEITOS DE ESTRATÉGIAS DIRETAS E

INDIRETAS NAS ATITUDES ESTIGMATIZANTES .................................................................. 30

6

TERAPIA DE GRUPO PARA FAMILIARES DE PESSOAS COM PERTURBAÇÃO MENTAL

GRAVE: ESTUDO DE CASO MÚLTIPLO ................................................................................... 38

7

IMPACTO DA PSICOTERAPIA DE GRUPO EM DOENTES ALCOÓLICOS RELATIVAMENTE

À AUTO-ESTIMA E CONTROLO DO CRAVING ....................................................................... 45

ARTIGOS DE BOAS PRÁTICAS/REFLEXÃO

8

DIAGNÓSTICOS E INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM CENTRADAS NO PROCESSO

FAMILIAR DA PESSOA COM ESQUIZOFRENIA ..................................................................... 52

9

CUIDADOS CONTINUADOS EM SAÚDE MENTAL: REFLEXÃO SOBRE RESPOSTAS PARA

PESSOAS ................................................................................................................................ 58

5

INFORMAÇÕES

Proposta de sócio

Normas para a submissão de artigos à revista da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de

Saúde Mental

Programa científico do Congresso 2013: Ficha de inscrição; Normas para a submissão de resumos e modelo de estrutura de proposta de comunicação Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 3


4 | Revista Portuguesa de Enfermagem de SaĂşde Mental, 8 (DEZ.,2012)


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EDITORIAL

Caros (as) colegas, O número 8 da Revista da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental é editado em Dezembro de 2012, está associado a uma etapa significativa, diríamos até evolutiva, no processo de edição da revista. A partir deste número, Janeiro de 2013, esperamos ter o processo de indexação na SciELO - Scientific Electronic Library Online, concluído. Por isso, alertamos todos os potenciais autores para consultarem e seguirem de forma rigorosa, as normas de publicação. Informamos que as normas foram revistas, de forma a facilitar o trabalho de edição e de revisão. A Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental integra na avaliação dos artigos uma revisão Double Blinded, através de dois elementos da comissão científica (Peer Reviewers). Este tem sido um dos trabalhos difíceis, devido à nacionalidade dos revisores, especificidade dos artigos, dificuldades no cumprimento dos prazos pelos autores e revisores, integração das sugestões dos revisores, entre outros. Por outro lado, os artigos submetidos têm revelado algumas lacunas no cumprimento da totalidade as normas de publicação da revista, o que também tem dificultado o trabalho de revisão. Nesse sentido, adoremos um novo procedimento que visa otimizar todo o processo. A partir de 2013, os artigos serão alvo de duas revisões: i) uma revisão técnica que avalia o cumprimento das normas da revista, em termos de estrutura dos artigos, número de carateres, citações e referências bibliográficas; ii) uma revisão científica por dois revisores para avaliar a qualidade científica do artigo. Os artigos só serão enviados para os revisores científicos após obterem parecer positivo da revisão técnica. Em todos os processos se garantirá uma revisão cega, uma vez que, após a submissão, são eliminados todas as referências que identifiquem os artigos. Nos últimos números, em especial no ano de 2012, verificou-se um número crescente de submissões de artigos, o que é para nós, equipa editorial, uma enorme satisfação e nos fornece mais opções na divulgação do conhecimento científico. A intenção é selecionarmos artigos que tenham rigor científico e simultaneamente interesse clinico, pelo facto de nos trazerem um maior “aporte” em termos de conhecimento, ou, uma nova forma de avaliar/intervir numa situação/problema.

Nesse sentido, privilegiamos artigos de investigação empírica, sem contudo, asfixiarmos a revista de artigos de revisão teórica, de reflexão ou de boas práticas fundamentais para a melhoria dos padrões de qualidade, nos contextos onde os enfermeiros inscrevem o seu exercício profissional. Reiteramos a necessidade dos artigos apresentarem um abstract com melhor qualidade, pois com a indexação estes ficam acessíveis a todos, e, são estes o nosso cartaz para número significativo de leitores. O ideal era termos um revisor de Inglês que nos validasse a tradução do resumo de Português para “Inglês”, mas como sabem, isso tem custos que não podemos suportar. Estamos a estudar outras alternativas que nos garantam a qualidade da tradução do português/Inglês, de modo a progressivamente melhorarmos todos os parâmetros da revista. O esforço para que a única revista portuguesa e especifica de Enfermagem de saúde mental aumente os seus padrões de qualidade é de todos, principalmente dos profissionais que se interessam por esta área do conhecimento. Assim, sugerimos aos estudantes de licenciatura, mestrado ou doutoramento, aos enfermeiros da prática clinica e outros profissionais o envio dos seus artigos. A revista sendo de Enfermagem, é aberta a qualquer profissional. O único critério está relacionado com a qualidade e o interesse dos artigos para a Enfermagem de Saúde Mental. A partilha do conhecimento entre as diferentes áreas do saber é em nosso entender, promotor de um “melhor” conhecimento, entendendo o “melhor”, como aquele que se adequa às necessidades das pessoas. Por isso, estaremos sempre abertos a contributos de qualquer profissional que nos queira preitear com o seu trabalho. Procuraremos dar uma resposta com a brevidade que nos for possível, dentro de um espaço mínimo de três meses. A otimização dos processos permitir-nos à ter um processo mais ágil e mais próximo dos autores. Em 2013, renovamos o nosso endereço eletrónico, no qual iremos colocar um espaço específico dedicado às regras e estratégias de submissão de artigos, bem como à discussão sobre as principais temáticas com interesse acrescido para a área de Enfermagem de Saúde mental. Atualmente a nossa localização na web é: www.aspesm.org Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 5


Neste espaço, iremos também implementar um novo menu, onde divulgaremos os artigos que ainda não foram publicados. A nossa intenção é divulgar todos os trabalhos, num formato facilmente acessível a todos, deixando para os leitores a apreciação e eventual depuração dos conteúdos que entendam como mais relevantes para a sua prática. Neste número 8 da revista da ASPESM, privilegiamos artigos de investigação que abordam: i) Conceção de um programa de intervenção na memória para idosos com défice cognitivo ligeiro; ii) Competência emocional em professores - contributos da psicoeducação; iii) A personalidade das vítimas de violência conjugal; iv) Programa saúde mental sem estigma: efeitos de estratégias diretas e indiretas nas atitudes estigmatizantes; v)Terapia de grupo para familiares de pessoas com perturbação mental grave: estudo de caso múltiplo; vi) Impacto da psicoterapia de grupo em doentes alcoólicos relativamente à auto-estima e controlo do craving; e dois artigos de boas práticas/ reflexão intitulados: i) Diagnósticos e intervenções de enfermagem centradas no processo familiar da pessoa com esquizofrenia; ii) Cuidados continuados em saúde mental: reflexão sobre respostas para pessoas.

6 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 87 (DEZ.,2012) (JUN.,2012)

Deixamos ainda a informação que em outubro de 2013 iremos realizar o nosso Congresso, na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (Pólo B), este ano dedicado aos Padrões de Qualidade em Enfermagem de Saúde Mental. Poderá consultar mais informações no final da Revista. Brevemente confirme no nosso endereço eletrónico, o programa, e outros detalhes relacionados com o mesmo. Por isso, marque na sua agenda o dia 10 e 11 de outubro de 2013, e, venha partilhar os seus contributos. Os nossos votos de um 2013 portador de alegria, felicidade e boa saúde mental para todos.

Porto, 31 de dezembro de 2012 O Diretor da Revista d’ ASPESM


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CONCEÇÃO DE MEMÓRIA PARA

UM PROGRAMA DE INTERVENÇÃO A IDOSOS COM DÉFICE COGNITIVO LIGEIRO

| Lia Sousa1; Carlos Sequeira2 |

RESUMO

ABSTRACT

O Défice Cognitivo Ligeiro (DCL) é a fase de transição entre as alterações cognitivas próprias do envelhecimento e o estádio inicial de uma demência. Os idosos com DCL têm maior probabilidade de desenvolver quadros demências em curtos espaços de tempo, pelo que é importante intervir precocemente, nomeadamente através de programas de intervenção na cognição. Estes programas visam capacitar os indivíduos e as suas famílias/ cuidadores para conviverem com as alterações cognitivas, dotando-os de informação e estratégias capazes de melhorar o seu quotidiano. O objetivo é sistematizar o conteúdo mínimo que deve integrar um programa de intervenção na memória para idosos com DCL amnésico. O método utilizado foi a técnica de Delphi, recorrendo-se a um painel de 29 peritos na área para validar o conteúdo de um programa de intervenção na memória em grupo. O programa final validado pelos peritos tem duração de 8 semanas, sendo realizada 1 sessão de grupo com os idosos por semana e 2 sessões de grupo com os familiares, na segunda e sextas semanas. O programa compreende ainda 3 momentos de avaliação, um inicial, um final e um follow-up 3 meses após o final do programa. O programa consiste num conjunto de atividades, organizadas e estruturadas em sessões, que visam o treino da memória. O programa proposto tem diversas vantagens para a prática clínica, nomeadamente pode ser aplicado em diferentes contextos; reúne estratégias e intervenções de vários programas e de diferentes autores; pode ser aplicado por qualquer profissional de saúde com formação na área. É um programa simples e de fácil aplicação, independentemente dos meios disponíveis. Por ser pouco rígido pode ser adaptado ao contexto e aos participantes, podendo servir como um instrumento padrão que oriente os profissionais que atuam nesta área.

Mild cognitive impairment is the transition between the cognitive changes of aging and early stage of dementia. Older people with mild cognitive impairment are more likely to develop dementia frames in short time, so it is important to intervene early, namely with cognitive stimulation programs. These programs aim to empower individuals and their families/caregivers to live with cognitive impairment, providing them with information and strategies to improve their daily lives. Its main purpose is to systematize the contents of a memory stimulation program for seniors with amnestic mild cognitive impairment. The method used was Delphi technique, involving the use of a panel of 29 experts in the field to validate the contents of an intervention program memory. The final program validated by experts consists of 8 weeks, a group session held with elderly per week for 8 weeks and 2 group sessions with family members in the second and sixth weeks. The program also consists of three stages of evaluation, an initial and a final follow-up 3 months after the end of the program. The program consists of a set of activities, organized and structured in sessions, aimed at training the memory. The proposed program has several advantages for clinical practice, such can be applied in different contexts; gathers strategies and interventions of various programs and different authors, can be applied by any health care professional with training in the area. It’s a simple and easy to apply, irrespective of the means available. Because little drive can be adapted to the context and participants, which may serve as a standard instrument that guides professionals working in this area. KEYWORDS: mild cognitive impairment; cognitive program; memory; elderly.

PALAVRAS-CHAVE: défice cognitivo ligeiro; programa cognitivo; memória; idosos. 1 Enfermeira Especialista em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Serviço de Neurologia Adultos do Centro Hospitalar de São João, EPE, liasousa_27@hotmail.com 2 Professor Coordenador da Escola Superior de Enfermagem do Porto, Doutor em Ciências de Enfermagem, carlossequeira@esenf.pt Submetido em: 30-09-2012 – Aceite em 30-11-2012 Citação: Sousa, L., & Sequeira, C. (2012). Conceção de um programa de intervenção na memória para idosos com défice cognitivo ligeiro. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental (8), 7-15 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 7


INTRODUÇÃO O envelhecimento é um processo complexo, dinâmico e gradual, comum a todos os seres humanos. Neste processo ocorrem modificações morfológicas, funcionais, bioquímicas e psicológicas que levam a uma maior vulnerabilidade e um aumento dos processos patológicos, culminando na morte (Netto, cit. por Freitas et al., 2002). Entre as mudanças esperadas para esta etapa da vida e as alterações de cariz patológico existe uma linha muito ténue. O DCL é um período de transição entre o envelhecimento normal e o diagnóstico provável de uma demência em estádio inicial (Petersen, 2004). Esta transição pode apresentar períodos de sobreposição, devido à dificuldade associada a este diagnóstico, uma vez que as mudanças/ queixas cognitivas podem ser muito subtis. Os critérios de diagnóstico sobre esta entidade clínica foram instituídos por Petersen (2004) e consistem em: 1) queixa de défice de memória por parte do individuo, sendo esta corroborada por um informante; 2) défice objetivo de memória para a idade do indivíduo (mediante avaliação neuro psicológica); 3) preservação das restantes funções cognitivas; 4) preservação da autonomia nas atividades de vida diária; e, 5) não ter critérios diagnósticos de demência. O “típico” indivíduo com DCL é aquele que refere défice de memória, mas mantém a normalidade das restantes funções cognitivas. Contudo, devido à heterogeneidade deste conceito, atualmente, aceitam-se alguns subtipos de DCL, sendo de acordo com Ghetu, Bordelon e Langan (2010): DCL amnésico - a principal manifestação é o défice objetivo de memória, para a idade e nível de escolaridade, mantendo-se a pessoa sem outras queixas cognitivas ou funcionais e sem critérios para ser considerado demente; DCL multidomínios - aplica-se a indivíduos com défices em vários domínios cognitivos e funcionais com défice de memória (DCL multidomínios amnésico) ou sem défice de memória (DCL multidomínios não amnésico) e DCL monodomínio não amnésico - o indivíduo apresenta um único défice no seu desempenho cognitivo ou funcional que não é a memória. A probabilidade de desenvolvimento de demência está aumentada nos indivíduos com DCL. Aproximadamente 12% das pessoas com mais de 70 anos têm DCL, sendo que apresentam 3 a 4 vezes maior probabilidade de desenvolver Demência de Alzheimer. Segundo alguns estudos longitudinais, entre 10 a 15% dos indivíduos com DCL desenvolvem demência no período de um ano (Petersen et al., cit. por Simon e Ribeiro, 2011), enquanto pessoas saudáveis evoluem entre 1 a 2% ao ano. A maioria dos indivíduos com DCL desenvolve demência em 3 a 6 anos (Troyer et al., 2008). 8 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Estes números revelam a importância de uma intervenção precoce e preventiva. Ainda não existe um tratamento eficaz para o DCL, mas os seus efeitos podem ser minimizados. A abordagem a este problema deve ser “combinada”, contemplando uma vertente farmacológica e uma abordagem cognitiva, através da intervenção na cognição. A intervenção na cognição consiste num processo de cooperação entre o indivíduo com défice cognitivo e os profissionais de saúde, familiares e membros da comunidade mais ampla, tendo por objetivo compensar ou atenuar os défices cognitivos resultantes do dano neurológico (Wilson, cit. por Pais, 2008). Consiste num conjunto de estratégias e de técnicas cognitivas, que visam inicialmente a restauração clínica de funções e, depois, a compensação de funções, com o objetivo de minimizar os distúrbios de atenção, de linguagem, de processamento visual, memória, raciocínio e resolução de problemas, além dos de funções executivas (Capovilla, cit. por Pais, 2008). Existem várias abordagens de intervenção na cognição. Segundo Pais (2008) podemos distinguir entre estimulação da cognição (consiste numa abordagem cognitiva mais abrangente), reabilitação da cognição (é uma intervenção que se centra em estratégias de orientação temporal e espacial) e treino da cognição (diz respeito à prática de tarefas/funções específicas). Estas abordagens podem ser desenvolvidas de forma individual ou em grupo. Para que a eficácia das diferentes técnicas de intervenção na cognição seja maximizada importa que sejam organizadas e realizadas de forma sequencial e periódica, com objetivos específicos delineados, daí a importância dos programas de intervenção na cognição para idosos. Um programa de estimulação da cognição consiste num conjunto de estratégias e exercícios que visam potenciar determinadas áreas da cognição, podendo ser implementados individualmente ou em grupo, habitualmente realizados num determinado período de tempo, procurando cumprir determinados objetivos específicos. Antes de iniciar qualquer tipo de programa de intervenção na cognição é importante avaliar o perfil cognitivo do indivíduo, identificando as funções cognitivas preservadas e comprometidas. Claire e Woods (2004) fazem uma distinção entre os diferentes tipos de programas de intervenção na cognição, podendo ser: A) de estimulação cognitiva; B) de reabilitação cognitiva; C) de treino cognitivo.


A) Os programas de estimulação cognitiva envolvem estimulação cognitiva geral e abordagens de orientação para a realidade, englobando uma série de atividades e discussões em grupo que visam obter uma melhoria geral do funcionamento cognitivo e social dos indivíduos (Claire & Woods, 2004). Estes programas não se focalizam em funções específicas, mas visam estimular a cognição como um todo. B) Os programas de reabilitação cognitiva assentam numa abordagem biopsicossocial e tem como objetivo ajudar as pessoas a alcançar ou manter um nível ótimo de funcionamento físico, psicológico e social, no contexto dos défices específicos decorrentes de doença ou lesão, facilitando a participação do indivíduo em atividades significativas e valorizando a manutenção dos papéis sociais (Claire, & Woods, 2004). Esta abordagem foca-se no desenvolvimento de tarefas que sejam significativas para o quotidiano do indivíduo e da sua família. C) Os programas de treino cognitivo envolvem geralmente a prática guiada num conjunto de tarefas específicas, que visam intervir em funções cognitivas concretas, como a memória, a atenção, a linguagem ou a função executiva. Este tipo de programa baseiase no pressuposto de que a prática regular de determinadas funções cognitivas pode ajudar a melhorar ou manter essa função, para além do contexto da formação imediata (Claire, & Woods, 2004). Dentro deste tipo de programas podemos incluir os programas de treino de memória, cujo objetivo é treinar a memória de forma a melhorar o desempenho diário dos indivíduos, sendo essencial a realização de exercícios diários e o treino de estratégias de compensação de memória. O programa apresentado focaliza-se no treino de memória, contudo, independentemente da estratégia de intervenção na cognição a utilizar existem alguns critérios essenciais para o seu sucesso, que se relacionam entre si. Esses critérios são: o envolvimento da família/cuidadores em todo o processo; a adaptação do ambiente do idoso às suas novas necessidades, sendo para tal essencial o apoio da família/cuidadores; o treino de estratégias de compensação e a possibilidade de realização de exercícios de estimulação diários, numa perspetiva de estimulação 24 horas, o que mais uma vez requer o envolvimento da família/ cuidadores. A importância dos programas de intervenção na cognição revela-se nos seus benefícios, sendo eles amplamente divulgados em vários artigos científicos. Como exemplo temos a melhoria da orientação do doente; melhoria das funções executivas, da linguagem e da

memória; melhoria da performance do doente nas atividades de vida diárias; manutenção da autonomia por mais tempo; diminuição da sobrecarga dos cuidadores e/ou família; facilitação da interação social e melhoria da qualidade de vida do idoso/família (Sequeira, 2007). A sistematização e implementação de programas de intervenção na cognição, nomeadamente na memória, são uma necessidade da sociedade atual, cada vez mais envelhecida. Atualmente em Portugal, 19% da população é idosa (INE, 2011), o que favorece um aumento da incidência e prevalência das demências, sendo necessário intervir preventivamente nos idosos com DCL. Para conhecer melhor a temática, antes da conceção do programa proposto realizou-se uma revisão da bibliografia para saber quais os estudos que existem na área e quais os principais resultados encontrados, de forma a compreender o que se tem feito e qual o estado atual do conhecimento. Para o efeito utilizou-se o método PICO (Sackett et al., cit. por Santos, Pimenta e Nobre, 2007) para construir a pergunta de partida: “Qual a efetividade dos programas de intervenção cognitiva em idosos com DCL?”. Para responder a esta questão recorreu-se à revisão bibliográfica, em bases de dados creditadas, selecionandose 6 artigos, dos 243 encontrados. A seleção teve por base os seguintes critérios: 1º) a adequação ao tema da pesquisa, devendo ser referentes a programas de intervenção na cognição aplicados a idosos com DCL; 2º) datas de publicação compreendida entre os anos de 2005 e 2012; 3º) o acesso ao texto integral ser gratuito; 4º) estarem escritos em Inglês, Espanhol ou Português. Os programas de estimulação cognitiva apresentados nos 6 artigos selecionados apresentam alguns aspetos comuns entre si, nomeadamente, o número de participantes/amostra, que varia entre 1 e 84 indivíduos, sendo a média de participantes de 35. A grande maioria das abordagens é em grupo. A duração e número de sessões do programa variam de três semanas e um ano e o número de sessões varia de diárias e semanais. Quanto ao tipo de intervenção, a maioria dos estudos revistos utilizam treino cognitivo e estimulação cognitiva, dando especial atenção ao treino de estratégias adaptativas, ao treino de memória e ao fornecimento de informações. Metade dos estudos incluiu a família/cuidadores no programa. Os resultados destes programas apontam para os benefícios da sua implementação, contudo é necessário realizar mais estudos e aprofundar estes dados. Os principais dados resultantes da revisão bibliográfica podem ser observados no quadro 1. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 9


Autor/Ano Simon e Ribeiro, 2011 Metodologia - Revisão sistemática Participantes (15 estudos)

Kurz,Ramsenthaler, Pohl e Sorg, 2009

Em 5 dos 15 estudos.

Follow-up

Resultados Major

6 meses (10 sessões)

3 semanas (12 sessões)

Jean et al., 2010

Estudo Piloto (24 participantes + parceiros de programa)

10 semanas (9 sessões)

6 semanas (12 sessões)

Treino de estratégias de compensação Treino cognitivo Associação de memória. computadorizado. nome/face.

Em 7 dos 15 estudos (1 a 6 meses)

Sim

Não

3 meses

Não

Sim Não

Greenaway et al., 2008

Estudo Experimental Controlado – 22 participantes (11+11)

Sim (grupo de apoio 1h/semana) Não Não Não

Informar sobre DCL Em 4 dos 15 estudos

Talassi et al., 2007

Estudo Experimental Estudo Experimental Estudo Experimental Controlado – 40 Controlado – 48 Controlado – 66 participantes(18+12) participantes (24+24) participantes (54+12)

Duração e nº de χ = 11,5 semanas 4 semanas sessões (4 a 12 sessões) (22h/semana) Reabilitação cognitiva Treino cognitivo; Exemplos de (2); Treino cognitivo grupo de informação intervenções (12); Psicoterapia (1) para cuidadores. Inclusão da família/ cuidadores

Troyer et al., 2008

Sim 4 semanas

Treino de uma estratégia de compensação de memória.

Sim (em todas as sessões) Não 8 semanas

Melhores resultados Melhoria das AVD’S Maior conhecimento e Melhoria cognitiva; Aumento do uso de estra-Aumento do uso da estracognitivos e funcionais; humor e habilidades maior uso de estratégias diminuição da ansiedade tégias de compensação de tégia de compensação de aumento da aceitação cognitivas. de compensação de e depressão. memória no quotidiano. memória no quotidiano. do DCL. memória

Quadro 1 - Resumo dos dados da revisão da bibliografia

Na revisão bibliográfica realizada não foram encontrados dados sobre a seriação deste tipo de programas em Portugal, nem sobre o impacto da ação dos Enfermeiros de Saúde Mental e Psiquiatria neste âmbito. Este estudo tem como principal objetivo sistematizar o conteúdo de um programa de intervenção na memória para idosos com DCL amnésico, de modo a que possa ser testada e avaliada a sua efetividade em contexto clinico.

METODOLOGIA O método selecionado para realizar este estudo foi a Técnica de Delphi. Esta técnica consiste num processo estruturado de recolha e síntese de conhecimentos sobre determinado assunto, através de um grupo prédefinido de peritos no tema, por meio da aplicação de uma série de questionários e de um feedback organizado das opiniões. Para a elaboração deste trabalho segundo esta técnica percorreram-se as etapas que constam no quadro 2.

Quadro 2 - Etapas realizadas ao longo do estudo Etapas Descrição 1ª Revisão bibliográfica Utilizou-se o método PICO (Sackett et al., cit. por Santos, Pimenta e Nobre, 2007) para construir a pergunta de partida: “Qual a efetividade dos programas de intervenção cognitiva em idosos com DCL?”. Para responder a esta questão recorreu-se à revisão bibliográfica, em bases de dados creditadas, selecionando-se 6 artigos. 2ª Formulação do programa Constituição do programa de intervenção na memória para idosos com DCL amnésico, através da seleção das estratégias que constam em, pelo menos, 50% dos artigos analisados na revisão da bibliografia. 3ª Critérios de seleção dos Os critérios estabelecidos para os participantes no grupo de peritos foram: peritos que integram o grupo 1) Experiência profissional, de pelo menos 2 anos, com idosos com défice cognitivo; 2) Formação na área da enfermagem de saúde mental e psiquiatria, neurologia, psiquiatria ou psicologia. 4ª Identificação dos peritos e Através de: obtenção dos contactos • Contacto via telefone e via correio eletrónico com instituições de saúde e associações não-governamentais que prestam cuidados a idosos com défices cognitivos e demência, solicitando os nomes dos profissionais que atuam nesta área; • Contacto com profissionais de saúde com trabalho conhecido na área e solicitação de nomes de outros peritos - Técnica de amostragem por redes (“bola de neve”). • Contactos obtidos através da internet e via artigos científicos publicados. Identificou-se um grupo de 69 peritos, composto por 44 enfermeiros de saúde mental e psiquiatria; 10 neurologistas; 10 psicólogos e 5 psiquia- tras, entre 19 Março e 13 Maio de 2012. 5ª Envio da 1ª ronda A proposta de programa de intervenção na memória foi convertida num questionário eletrónico, através do aplicativo Google Docs e foi en viado entre 31 Março e 13 Maio de 2012, aos 69 peritos identificados, solicitando-se as respostas até dia 31 Maio de 2012. O questionário era composto por três partes, a primeira abordava a caracterização sociodemográfica dos peritos; na segunda colocavam-se duas perguntas abertas e, finalmente, na terceira parte apresentava-se cada um dos itens que compõem o programa e pediu-se aos peritos que assinal- assem a sua concordância através de uma escala tipo Likert. Como a adesão dos peritos foi baixa enviou-se uma mensagem de correio electrónico personalizada, a cada um deles, a apelar à participação e enviou-se novamente o questionário. No final do prazo, obtiveram-se 29 respostas, de 23 enfermeiros de saúde mental e psiquiatria; 2 neurolo gistas; 3 psicólogos e 1 psiquiatra. 6ª Análise estatística das Através dos operativos Microsoft Excel 2010 e Google Docs calculou-se: respostas ao questionário • Distribuição de frequências (frequência absoluta e relativa das respostas a cada item). • Medidas de tendência central (média). As respostas foram selecionadas através dos critérios de concordância estabelecidos, seriam rejeitados os itens que não obtivessem “concordância positiva”: • Concordância positiva = % respostas “concordo” + % respostas “concordo totalmente”. • Concordância positiva ≥ 70%. Os níveis de consenso estabelecidos foram: • Consenso perfeito - 100% de respostas no “concordo totalmente”. • Consenso forte - 90% ≤ Concordância positiva ≤100%. • Consenso moderado - 70% ≤ Concordância positiva <90%. Como se alcançou concordância positiva em todos os itens, não se avançou para a segunda volta. 10 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


O que se propõe é um programa de treino cognitivo, nomeadamente de treino de memória, com uma abordagem teórica e prática, multifatorial (indivíduo/ família/interação social), cujo principal objetivo é estimular a memória de idosos com DCL amnésico e capacitar o utente e a sua família/cuidadores com conhecimentos e estratégias que permitam treinar a memória no quotidiano e, consequentemente, potenciar a autonomia. Sendo que os seus objetivos específicos são: • Estimular a memória de idosos com DCL amnésico; • Informar os idosos sobre o DCL; • Ensinar e treinar estratégias de compensa ção de memória; • Potenciar a autonomia do indivíduo com DCL; • Promover a interação social dos partici pantes; • Capacitar a família/cuidadores com con hecimentos e estratégias que permitam trein ar a memória do indivíduo no quotidiano e potenciar a autonomia. Este programa poderá aplicar-se a indivíduos que consintam realizá-lo e que obedeçam aos seguintes critérios de inclusão: • Idosos com idades compreendidas entre os 65 e os 75 anos; • Idosos com DCL, com comprometimento da memória (critérios de Petersen et al., 2004); • Idosos sem diagnóstico clínico de depressão ou outra patologia de foro mental. A duração do programa é de 8 semanas, sendo realizada uma sessão em grupo por semana para os utentes, com duração de 90 minutos. Os grupos de participantes serão constituídos no máximo por 10 elementos. O programa engloba a família/cuidadores, com duas sessões de grupo, a realizar na segunda e sexta semana, com duração de 60 minutos/cada. Nestas sessões, os objetivos são: • Informar sobre DCL e sobre estratégias de compensação a utilizar no quotidiano; • Dar apoio emocional; • Discutir aspetos relevantes para a família/ cuidadores; • Esclarecer dúvidas. Para atingir estes objetivos, as sessões de grupo com os familiares/cuidadores centram-se na transmissão de informação, na partilha em grupo, no reforço e no treino de estratégias.

APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS SOBRE O PROGRAMA A primeira parte do questionário visava a caracterização sociodemográfica dos peritos. Estes são maioritariamente do sexo feminino, casados ou solteiros, enfermeiros de saúde mental e psiquiatria, com experiência profissional com idosos com défice cognitivo entre 6 a 10 anos, atuando principalmente em cuidados de saúde primários, na região Norte do país. O resumo da caracterização sociodemográfica dos peritos consta no quadro 3. Quadro 3 - Resumo da caracterização sociodemográfica do grupo de peritos

Variáveis Género Estado civil

Área de formação profissional

Resultados [% (nº)] 59% (17) mulheres 41% (12) homens 41,4% (12) casados/ 41,4% (12) solteiros 13,8% (4) união de facto/ 3,4% (1) outra 79,3%(23) enfermeiros de saúde mental e psiquiatria

6,9% (2) neurologistas/ 3,4% (1) psiquiatra 10,3% (3) psicólogos

Anos de experiência 31,0% (9) 2 a 5 anos/ 34,5% (10) 6 a 10 anos 13,8% (4) 11 a 15 anos com idosos com 20,7% (6) mais de 15 anos défice cognitivo

Área de actuação profissional

Área geográfica

onde trabalham

27,6% (8) cuidados de saúde diferenciados 51,7% (15) cuidados de saúde primários 20,7% (6) outros 82,8% (24) Região Norte/ 10,3% (3) Região Sul 3,4% (1) Arquipélago dos Açores 3,4% (1) Arquipélago da Madeira

Na segunda parte do questionário propunha-se ao grupo de peritos assinalar a sua concordância relativamente aos objetivos e procedimentos delineados para cada uma das sessões do programa, através de uma escala tipo Likert, composta por cinco níveis, desde o discordo totalmente até ao concordo totalmente. Os níveis de consenso obtidos relativamente aos aspetos gerais do programa constam no quadro 4.

Quadro 4 - Níveis de consenso obtidos nos aspetos gerais do programa proposto

Aspetos gerais do programa

O programa proposto tem a duração de 8 semanas (1 sessão de grupo por semana, com duração de 1,5 horas) Serão realizadas 2 sessões para os familiares, com duração de 1 hora cada, na segunda e sexta semana do programa.

O grupo de participantes será constituído, no máximo, por 10 elementos.

Nível do Consenso (NC)

79,31% (moderado)

79,31% (moderado)

72,42% (moderado)

Neste artigo apresentam-se apenas os pontos principiais de cada uma das sessões do programa de intervenção na memória proposto. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 11


Neste artigo apresentam-se apenas os pontos principiais de cada uma das sessões do programa de intervenção na memória proposto. No quadro 5 constam os procedimentos essenciais do 1ºcontacto com os idosos e suas famílias, da 1ª e 2ª sessões de grupo com os idosos e da 1ª sessão com os familiares. Nestas sessões utiliza-se maioritariamente a terapia por reminiscências e a transmissão de informação. Quadro 5 - Principais aspetos que integram o programa de intervenção na memória para idosos com DCL e consensos obtidos pelo grupo de peritos (1ºcontacto;1ª e 2ª sessões de grupo com os idosos e 1ª sessão com os familiares)

NÍVEL DE OBJETIVOS/PROCEDIMENTOS SESSÃO CONSENSO (NC)

O 1º contacto com o participante e com o seu familiar/cuidador será individual e ocorrerá no mês anterior ao início do programa.

1º CONTACTO

1º SESSÃO

2º SESSÃO

1ª SESSÃO DE GRUPO COM OS FAMILIARES / CUIDADORES

93,10% (forte)

Estabelecer o primeiro contacto com o participante e o familiar/cuidador.

100,00% (forte)

Avaliação inicial e caracterização dos participantes, através de um questionário que contém a caracterização sociodemográfica e os antecedentes de saúde dos participantes; a avaliação cognitiva (mini-exame do estado mental, teste do relógio e escala de avaliação da demência) e avaliação funcional (índice de Lawton e índice de Barthel). Apresentar o programa e verificar a disponibilidade do idoso e do familiar/cuidador para o integrarem. Estimular a memória a longo prazo episódica. Utiliza-se a Terapia por Reminiscências para os idosos construírem um marcador colorido identificativo que utilizarão em todas as sessões. Tarefa de casa: refletir sobre as alterações cognitivas que sentem no seu quotidiano, escrevê-las num papel (ou pedir a alguém que as escreva) e trazer para a próxima sessão.

96,55% (forte)

96,55% (forte) 89,66% (moderado) 89,66% (moderado) 100,00% (forte)

Distribuição de material didático sobre DCL. Tarefa de casa: discutir com a família os efeitos dos sinais e sintomas que apresentam no seu quotidiano e mostrar o material didático fornecido. Informar sobre o DCL e suas implicações no quotidiano dos utentes. Perceber a perspetiva dos familiares sobre o DCL. Discutir em grupo quais os sinais que os seus familiares apresentam e de que forma influenciam o quotidiano da família. Informar sobre estilos de vida e gestão do regime terapêutico. Apresentação de estratégias de compensação para os défices de memória (listas, mnemónicas, agendas, alarmes, diários, etc. Incentivar a utilização diária das estratégias compensatórias de memória. Tarefa de casa para os familiares: executar diariamente uma das

96,56% (forte) 96,55% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 96,55% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte)

No quadro 6 constam os procedimentos essenciais da 3ª, 4ª, 5ª e 6ª sessão de grupo com os idosos e da 2ª sessão com os familiares. Estas sessões centram-se no ensino e treino de estratégias de compensação de memória. Quadro 6 - Principais aspetos que integram o programa de intervenção na memória para idosos com DCL e consensos obtidos pelo grupo de peritos (3ª, 4ª, 5ª e 6ª sessões de grupo com os idosos e 2ª sessão com os familiares)

NÍVEL DE CONSENSO (NC)

Informar sobre as estratégias que podem ser utilizadas no

3ª SESSÃO

4ª SESSÃO

Apresentação de estratégias de compensação para os défices de memória (listas, mnemónicas, agendas, alarmes, diários, etc.). Tarefa de casa: discutir as estratégias apresentadas com os familiares.

6ª SESSÃO 2ª SESSÃO DE GRUPO COM OS FAMILIARES/ CUIDADORES

Treinar o uso dos auxiliares internos de memória (mnemónicas e repetição de palavras e números). Tarefa de casa: treinar as estratégias apreendidas com os familiares.

Tarefa de casa: treinar as estratégias aprendidas com os familiares. Utilizar a técnica de associação nome/face: Associar fotografias de 10 figuras históricas/públicas (fotografias com o mesmo tamanho) ao nome e relembrar algo que tenham feito: qual o nome desta pessoa? Qual a sua profissão? Recorde algo que esta pessoa tenha feito?.

Esclarecer dúvidas. Rever estratégias.

100,00% (forte) 93,10% (forte) 100,00% (forte)

Treinar as estratégias de compensação de memória. Treinar o uso dos auxiliares externos de memória (listas, diários, agendas): • Fazer a lista de ingredientes para um bolo. • Escrever numa folha de agenda, as atividades para o dia seguinte. 5ª SESSÃO

100,00% (forte)

quotidiano para lidar com os problemas de memória.

Treinar as estratégias de compensação de memória.

7ª SESSÃO 8ª SESSÃO CONTACTO FINAL COM OS IDOSOS COM DCL E SUA FAMÍLIA / CUIDADORES

Promover a orientação temporal.

100,00% (forte)

Leitura de 2 notícias de jornais/revistas da semana.

100,00% (forte)

Realização de algumas perguntas sobre o que foi lido.

100,00% (forte)

Evocação de acontecimentos sociais marcantes de que os utentes se lembrem

100,00% (forte)

Reforço de algumas estratégias de compensação de memória aprendidas.

100,00% (forte)

O último contacto com os idosos com DCL e suas famílias/cuidadores será individual e ocorrerá na semana seguinte ao fim do programa, através de marcação de hora individualmente com as famílias. Avaliação final dos utentes, através do mesmo questionário utilizado na avaliação inicial. Verificação da opinião dos utentes e família sobre o programa. Reforço da importância de continuar com as estratégias de estimulação cognitiva no domicílio.

Orientação para o follow-up.

FOLLOW UP

NÍVEL DE CONSENSO (NC)

O Follow-up será individual e será realizado 3 meses após o fim do programa Avaliação dos utentes, através do mesmo questionário utilizado nas outras avaliações.

Verificação das estratégias de estimulação que a família tem utilizado. Esclarecimento de dúvidas.

96,55% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 86,20% (moderado) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte)

Perceber a perspetiva dos familiares sobre o DCL.

100,00% (forte)

Marcação de nova consulta de follow-up, se necessário.

100,00% (forte)

Quadro 7 - Principais aspetos que integram o programa de intervenção na memória para idosos com DCL e consensos obtidos pelo grupo de peritos (7ª e 8ª sessões de grupo com os idosos, contacto final e follow-up)

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

100,00% (forte) 93,11% (forte)

Informar sobre o DCL e suas implicações no quotidiano dos utentes. Discutir em grupo quais os sinais que cada um apresenta e de que forma influenciam o seu quotidiano.

SESSÃO OBJETIVOS/PROCEDIMENTOS

OBJETIVOS/PROCEDIMENTOS SESSÃO

Obtenção de feedback sobre a implementação das estratégias de compensação de memória. Reforço de estratégias de compensação da memória.

96,59% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 96,55% (forte) 82,76% (moderado) 96,55% (forte) 96,55% (forte) 100,00% (forte)

96,56% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte) 100,00% (forte

No quadro 7 constam os procedimentos essenciais da 7ª e 8ª sessões de grupo com os idosos, do contacto final e do follow-up. Nestas sessões o foco é a promoção da orientação temporal e o reforço de estratégias. 12 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

O programa proposto reuniu concordância positiva por parte do grupo de peritos logo na primeira volta da técnica de Delphi, assim todos os itens que o constituem foram aprovados pelo grupo de peritos. Contudo existem alguns aspetos que geraram mais controvérsia e que podem ser analisados. Em primeiro lugar, apesar da duração e constituição do programa ter reunido um consenso moderado por parte dos peritos, não existe consenso na literatura sobre o tema. Os estudos realizados apresentam uma grande variedade de amplitude, com duração de três semanas a um ano, variando de acordo com a tipologia do programa e com as técnicas utilizadas, sendo que esta diversificação está também relacionada com os objetivos estabelecidos para os programas. Na revisão bibliográfica efetuada para este trabalho, os cinco estudos experimentais utilizados (Talassi et al., 2007; Greenaway, Hancnda, Lepore & Smith, 2008; Troyer et al., 2008; Kurz, Ramsenthaler & Sorg, 2009; Jean et al., 2010) apresentam uma média de duração dos programas de 10 semanas, sendo realizadas desde sessões únicas a 5 sessões por semana, dependendo da durabilidade do programa. Na revisão sistemática (Simon e Ribeiro, 2011), a média de duração dos programas foi de 11,5 semanas. Metade dos estudos apresenta programas de 8 semanas, ocorrendo entre 4 a 12 sessões durante o programa. Nos estudos avaliados, a duração das sessões varia de 40 a 120 minutos, sendo que a sua média de duração é de 72 minutos. Apesar de concordarem com a tipologia do programa proposto, o grupo de peritos sugeriu que se aumentasse o tempo de realização do programa para o mínimo de 4 meses e que se realizassem mais sessões de grupo e com uma duração mais curta.


Relativamente aos momentos de avaliação, os testes utilizados vão de encontro aos achados bibliográficos e o grupo de peritos demonstra concordância positiva relativamente a eles. O especto mas controverso foi o timing do follow-up, 3 meses, que apesar de ser o período de tempo que surge mais vezes citado na revisão bibliográfica, os peritos referem que uma avaliação mais estreita no tempo seria mais vantajosa. Relativamente aos objetivos e intervenções propostas ao longo do programa, as que suscitaram mais discussão entre os peritos foram as relacionadas com o informar sobre o DCL e as suas implicações no quotidiano, reunindo uma concordância positiva de 89,66% (consenso moderado). O propósito desta intervenção é levar os participantes a refletir sobre a sua condição e sobre as dificuldades que sentem no quotidiano, promovendo assim a consciencialização e a partilha das dificuldades com os elementos do grupo. Alguns autores propõem uma abordagem teórica nos seus estudos, como é o caso de Kurz, Pohl, Ramsenthaler e Sorg (2009) que propõem um programa de reabilitação cognitiva para o DCL com várias componentes, inclusivamente abordam aspetos de educação para a saúde e de informação clínica. Estes autores concluíram que um programa de reabilitação cognitiva multivariado acarreta melhorias para as atividades de vida diária, para o humor e para as habilidades cognitivas de pessoas com DCL. Também Troyer et al. (2008) propõem um programa de intervenção na memória para indivíduos com DCL, no qual integram aspetos informativos que vão desde a nutrição às estratégias de compensação de memória e como principais resultados verificaram que os indivíduos do grupo experimental demonstraram melhores conhecimentos e maior utilização das estratégias de memória, tanto no laboratório, como no quotidiano, comparativamente ao grupo controlo. Apesar da mudança de comportamentos ser difícil, nomeadamente na área da saúde, os autores atribuem o sucesso do seu programa à abordagem teórica que realizaram. Como se constata, dar informação aos participantes pode ser uma mais-valia para a eficácia de um programa de intervenção na cognição, pelo que, o que se pretende no programa proposto neste trabalho é informar sobre o DCL de uma forma simplificada, explicando aos participantes o que se está a passar com eles, desmistificando o problema e explicando a importância dos exercícios de treino da memória e da implementação de estratégias de compensação da memória no dia-a-dia. Com esta vertente orientadora pretende-se aumentar a motivação e a adesão dos participantes através da informação.

Neste programa propõe-se um documento informativo para entregar aos participantes e aos familiares/ cuidadores, que explica de forma simples e global o que é a memória, o que é o DCL, quais os seus possíveis fatores de risco e quais as possibilidades de intervenção. O principal objetivo ao fornecer este material é informar através de um suporte de fácil leitura e com uma linguagem clara e direta. A aprendizagem e o treino de estratégias de memória integram vários programas de intervenção na cognição. Exemplos disso são o estudo de Troyer et al. (2008), onde os autores fornecem aos participantes uma visão geral sobre as estratégias de memória e instroem sobre a realização de um “livro de memória”; e o estudo de Greenaway et al. (2008), cujo estudo visava desenvolver e treinar o uso de um sistema compensatório de memória. Atendendo a que o programa proposto neste trabalho se centra na memória é indiscutível o papel relevante que as estratégias de compensação assumem. Assim, das 8 sessões de grupo propostas, 4 são dedicadas a esta temática (3ª, 4ª, 5ª e 8ª sessões). Estas intervenções reuniram um consenso forte pelo grupo de peritos, resultados que são conducentes com os dados da bibliografia, onde é afirmado que a intervenção na memória implica o desenvolvimento de habilidades e estratégias específicas, que raramente são utilizadas de forma espontânea, necessitando de treino. O objetivo do treino de estratégias é melhorar o desempenho diário e, com os idosos, não só é necessário treinar essas novas técnicas, mas também demonstrar-lhes que estas trazem resultados positivos para a sua performance, daí a importância da incorporação de sessões de treino de estratégias nos programas de treino de memória. Um aspeto fundamental nos programas de intervenção na cognição é o envolvimento da família/cuidadores. Na revisão da literatura não há consenso sobre qual o timing e duração ideal para a intervenção junto dos familiares. Neste programa propõe-se a realização de duas sessões para os familiares, com duração de 60 minutos cada, na segunda e sexta semana do programa. Esta proposta reuniu um consenso moderado (79,31%) por parte do grupo de peritos, que referem ainda que a realização de mais sessões para a família/cuidadores de forma a aumentar a sua interação ao longo do programa. As intervenções sugeridas passam por: abordar o tema DCL, obter o feedback sobre o material didático que os seus familiares levaram para casa no final da última sessão, discutir em grupo quais os sinais/ sintomas que os seus familiares apresentam e de que forma influenciam o quotidiano da família, informar Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 13


sobre estilos de vida e gestão do regime terapêutico, abordar os défices de memória e como influenciam o dia-a-dia dos seus familiares, apresentar de estratégias de compensação para os défices de memória (listas, mnemónicas, agendas, alarmes, diários, etc.) e incentivar a partilha de sentimentos entre o grupo de familiares. Para facilitar esta integração familiar no processo de reabilitação é fornecido aos familiares/cuidadores uma lista com estratégias externas e internas de compensação da memória e um quadro de registo semanal, para puderem assinalar e comentar a sua utilização. Sendo que a tarefa de casa proposta para os familiares passa exatamente por executar diariamente uma das estratégias de memória e apontar no quadro de registo. Na segunda sessão, além de se obter o feedback sobre a implementação das estratégias utilizadas, realiza-se o reforço das estratégias de compensação da memória e a partilha de experiências. O envolvimento da família/cuidadores é um fator fundamental para o êxito da intervenção na cognição. Intervenções de suporte para a família/cuidadores tem vários benefícios, entre os quais reduzir sintomatologia psiquiátrica, melhorar a qualidade de vida do familiar e do idoso, alterar a estrutura familiar de forma a fortalecer vínculos e a promover a adaptação ao problema (Santos, Moura e Haase, 2008). Assim, “a associação de intervenções para os idosos e para os seus cuidadores é mais promissora que intervenções isoladas” (Claire cit. por Idem, p. 26). CONCLUSÕES Na sua generalidade o programa apresentado reuniu consenso forte pelos peritos, de tal modo que não foi necessário realizar a segunda ronda do questionário, pois todos os itens abordados apresentaram uma concordância positiva acima dos 70%. As intervenções de treino de estratégias de compensação de memória e a inclusão da família/cuidadores são os pontos que reuniram consenso forte pelos peritos (93,10% a 100,00%). Os pontos que suscitam mais discussão são o informar sobre o DCL e a tipologia do programa, que reuniram consenso moderado por parte dos peritos (de 72,42% a 89,66%). O programa de intervenção na memória resultante deste estudo apresenta vantagens para a prática clínica dos profissionais que trabalham com idosos com DCL e que se encontram em diferentes contextos, como os lares, a geriatria, a psiquiatria, mas principalmente na comunidade, ou seja, sob a vigilância dos cuidados de saúde primários. Este programa: 14 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

• Pode ser aplicado em diferentes contextos. • Reúne estratégias e intervenções de vários programas e de diferentes autores. • Pode ser aplicado por qualquer profissional de saúde com formação na área. • Pode servir como linha orientadora para o desenvolvimento de outros estudos. • É um programa simples, económico e de fácil aplicação, independentemente dos meios disponíveis. • Por ser pouco rígido pode ser adaptado ao contexto e aos participantes. Após a conceção deste programa, é de máxima importância divulga-lo e implementa-lo de modo a aferir na prática a sua utilidade e validade clínica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Claire, L., & Woods, R. (2004). Cognitive training and cognitive rehabilitation for people with early-stage Alzheimer’s disease: A review. Neuropsychological Rehabilitation. 14 (4). Wales, 385-401. Acedido em http://scottsdale.brainadvantage.com/PDF/clare%20 and%20woods%202004%20neuro%20rehab.pdf Da-Silva, S. L., Pereira, D. A., Veloso, F., Satler, C. E., Arantes, A., & Guimarães, R. M. (2011). Programa de reabilitação neuropsicológica da memória aplicada à demência: um estudo não controlado intrasujeitos. Estudos de Psicologia, 28(2), 229-240. Acedido em http:// www.google.com/search?q=Programa+de+reabilita %C3%A7%C3%A3o+neuropsicol%C3%B3gica+da+ mem%C3%B3ria+aplicada+%C3%A0+dem%C3%A Ancia%3A+um+estudo+n%C3%A3o+controlado+intrasujeitos1&ie=utf-8&oe=utf-8&aq=t&rls=org. mozilla:pt-PT:official&client=firefox-a Freitas, E. V., & Py, L. (Eds.) (2002). Tratado de geriatria e gerontologia. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan S.A. Gehring, K., Aaronson, N. K., Taphoorn, M. J. B., & Sitskoorn, M. M. (s.d.). A description of a cognitive rehabilitation programme evaluated in brain tumour patients with mild to moderate cognitive deficits. Clinical Rehabilitation, 25(8), 675-692. Acedido em http://web.ebscohost.com/ehost/pdfviewer/pdfview er?vid=18&hid=119&sid=de37bfff-96c4-44ec-a0b5710098faed92%40sessionmgr12 Ghetu, M. V., Bordelon, P. C., & Langan, R. C. (2010). Diagnosis and Treatment of Mild Cognitive Impairment. Clinical Geriatrics, 30-36. Acedido em http:// www.clinicalgeriatrics.com/node/3612


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Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 15


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COMPETÊNCIA EMOCIONAL EM PROFESSORES – CONTRIBUTOS DA PSICOEDUCAÇÃO | Lénea Verde Martins Coelho1 |

RESUMO

ABSTRACT

Estudo quantitativo quasi-experimental, do tipo préteste pós-teste, que envolveu um processo de educação de professores (intervenção psicoeducativa orientada para capacitar professores face à competência emocional). A população-alvo foi uma amostra intencional de seis professores na Escola Básica e Secundária de Ourém. Foi aplicada a Escala MHI-5 e a Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional (EVBCIE). As escalas foram aplicadas antes e depois da intervenção psicoeducativa. Está subjacente à construção da EVBCIE e aos conteúdos da intervenção psicoeducativa o modelo teórico da Inteligência Emocional de Goleman. A EVBCIE é composta por cinco subescalas: autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia, e gestão de emoções em grupo. A intervenção de base psicoeducativa foi constituída por oito sessões semanais que decorreram em dois meses. Verifica-se que após a intervenção psicoeducativa as médias obtidas no nível de saúde mental, autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia e gestão de emoções em grupo e na competência emocional (total) são superiores às médias antes da intervenção. Após tratamento estatístico com Teste de Wilcoxon para amostras emparelhadas, com grau de significância para p<0.05, verificou-se que as diferenças antes e depois da intervenção são estatisticamente significativas para as subescalas autoconsciência (p=0.046), gestão de emoções (p=0.028), gestão de emoções em grupo (p=0.046) e para a EVBCIE no seu total (p=0.046). As diferenças foram estatisticamente não significativas no nível de saúde mental e nas dimensões automotivação e empatia. Em Portugal não existem estudos quasi-experimentais comparativos contudo, em Espanha, Ibáñez e Alzina (2006) obtiveram melhorias no coping dos professores e, consequentemente, na relação interpessoal com os alunos em sala de aula. A intervenção psicoeducativa permitiu um processo de capacitação dos professores que visou a melhoria da qualidade de vida e saúde. No futuro serão necessárias replicações do estudo e constituir grupo de controlo para reforçar os resultados.

This quasi-experimental quantitative study, type pretest post-test, involved a process of teachers’ education (psychoeducational intervention aimed to train teachers on emotional competence). The study was a purposive sample (N=6) teachers who taught on Escola Básica e Secundária de Ourém, in which it was applied MHI-5 and Escala Veiga Branco Capacidades da Inteligência Emocional (EVBCIE). The scales were applied before and after psychoeducational intervention. Underlies the construction of the EVBCIE and content psychoeducational intervention are founded on Goleman’s. The EVBCIE consists of five subscales: self-consciousness, managing emotions, motivation, empathy and managing emotions on group. The basic psychoeducational intervention consisted on eight weekly sessions on two months. It is verified that after psychoeducational intervention averages obtained at the level of mental health, self-awareness, managing emotions, motivation, empathy and managing emotions and group emotional competence (total) are higher than those before the intervention. After statistical analysis with Wilcoxon test for paired samples with significance level of p<0.05, it was found that the differences before and after intervention were statistically significant for the self-consciousness subscales (p=0.046), management of emotions (p=0.028), emotions management group (p=0.046) and for EVBCIE in total (p=0.046). The differences were not statistically significant at the level of mental health and self-motivation and empathy dimensions. In Portugal there are no quasi-experimental comparative studies. However, in Spain, Ibáñez and Alzina (2006) obtained improvements in coping of teachers and consequently in the interpersonal relationship with students in the classroom. The basic psychoeducational intervention used in this study allowed the process of teacher training that aimed to improve the quality of life and health. On future, the replication of this study will be required, as well as the use of a control group to strengthen the results.

PALAVRAS-CHAVE: Inteligência Emocional; Professores; Educação

KEYWORDS: Literacy; Mental Health; Teenagers and Youth

1 Enfermeira, Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica, ACES Médio Tejo - Unidade de Saúde de Fátima - Unidade de Cuidados na Cova da Iria, leneacoelho@gmail.com Submetido em: 09-07-2012 – Aceite em 20-10-2012 Citação: Coelho, L.. (2012). Competência emocional em professores – contributos da psicoeducação. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 16-24 16 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


INTRODUÇÃO A profissão de professor é, por natureza, delicada e complexa e, por isso, certamente nunca existiram épocas em que fosse fácil exercê-la. Num mundo em crise social e ambiental global, os professores exercem a sua profissão em sociedades cada vez mais abertas e cheias de desequilíbrios de natureza vária e em escolas que, no meio de sucessivas reformas, tardam em encontrar um rumo que vá ao encontro das necessidades dos diferentes alunos e pais. A Ordem dos Enfermeiros (2010, p. 23) definiu como uma das áreas prioritária de investigação em Enfermagem a “capacitação (empowerment) dos clientes”, surgindo o contributo da psicoeducação na competência emocional dos professores, num sentido de capacitação dos mesmos. Neste estudo pretendeu-se avaliar o contributo da psicoeducação no perfil de Competência Emocional dos Professores da Escola Básica e Secundária de Ourém (EBSO). A pertinência deste trabalho reside na importância da promoção da saúde mental com base na aquisição de competências. Lehtinen (2008, p. 40) refere que: “O desenvolvimento de competências pessoais, tais como o autoconhecimento, a melhoria da autoestima, um sentimento de controlo e de auto eficácia, as relações interpessoais e competências comunicacionais, a resolução de problemas e estilos de coping tem demonstrado promover a saúde mental e ajudar as pessoas a exercer mais controlo sobre a sua vida e sobre o ambiente em que vivem”. Para trabalhar estas competências é necessário compreender o comportamento humano, no seu agir e no seu sentir. Nesta perspetiva, Goleman (2006, p. 54) evidencia o conceito de Inteligência Emocional como: “a capacidade de a pessoa se motivar a si mesma e persistir a despeito das frustrações: de controlar os impulsos e adiar a recompensa; de regular o seu próprio estado de espírito e impedir que o desanimo subjugue a faculdade de pensar; de sentir empatia e de ter esperança”. O Regulamento nº 129/2011 de 18 de fevereiro (p. 8672), refere que o enfermeiro especialista em saúde mental “coordena, desenvolve e implementa programas de psicoeducação”, sendo que esta intervenção visa contribuir para a capacitação. Deste modo emergiu a intervenção “psicoeducação” para capacitar os professores face à competência emocional. Os professores assumem uma enorme responsabilidade educativa. Estrela (2010, p. 35) refere que “a compreensão que o professor tiver da sua história de vida o poderá ajudar a lidar de forma eficaz com as incertezas

e dúvidas no exercício da profissão” e, consequentemente, adotar comportamentos mais adequados. Na mesma linha de pensamento surge outro conceito empowerment centrado nas pessoas. Numa vertente nacional, o Plano Nacional de Saúde Escolar, segundo o Ministério da Saúde (2006, p. 22), é mais específico, referindo a execução de programas “dando prioridade a novas áreas de formação, como as metodologias de intervenção activas-participativas, o trabalho interpares, e a promoção de competências pessoais e sociais, pelo potencial de comunicação interpessoal que promovem na escola”. A intervenção “psicoeducação” pretende ser o vetor desta capacitação para a mudança positiva. Como educador o professor é uma figura modelo para o aluno. Veiga Branco (2005) refere que as tonalidades emocionais do professor na relação pedagógica geram emoções e comportamentos nos alunos, e este processo remetenos para importância da educação emocional. Pensando num contexto escolar, e conjugando com a área da investigação, sobressai o domínio das competências dos professores. Num estudo nacional com professores, Veiga Branco (2005, p. 70) refere que: “Há dois factores não ultrapassáveis: primeiro, os cidadãos do futuro dependem das escolas do presente, e no presente as escolas dependem dos professores que têm (…) e por conseguinte, têm de ser detentores de características competenciais, para operacionalizar de forma eficaz, o que lhe é atribuído: a educação”. Articulando os referenciais legais e concetuais capacitar professores, na sua dimensão emocional, é pertinente, sendo também uma necessidade sentida pelos professores, tal como corrobora Estrela (2010, p. 53) referindo que “os professores sabem que há necessidade de autorregularem as suas emoções, de forma a evitarem o descontrolo emocional que pode ter reflexos negativos na sua ação pedagógica”. A Competência Emocional deriva do conceito “Inteligência Emocional” muito estudado por Goleman (2006, p. 65), que salienta cinco domínios: “Autoconsciência – conhecer as nossas próprias emoções, reconhecer um sentimento enquanto ele está a acontecer – é a pedra base da inteligência emocional, crucial a introspecção psicológica e o autoconhecimento. Gerir as emoções – lidar com as sensações de modo apropriado é uma capacidade que nasce do autoconhecimento. Motivarmo-nos a nós mesmos – mobilizar as emoções ao serviço de um objetivo é essencial para concentrar a atenção, para a competência e para a criatividade. O autocontrolo emocional – adiar a recompensa e dominar Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 17


a impulsividade – está subjacente a todo o tipo de realizações. Reconhecer as emoções dos outros – a empatia, outra capacidade que nasce da autoconsciência, é a mais fundamental das aptidões pessoais. Gerir relacionamentos – a arte de nos relacionarmos é, em grande medida, a aptidão para gerir as emoções dos outros. Estão na base da liderança e eficácia interpessoal”. Goleman (2006, p. 66) distingue a autoconsciência, gestão de emoções e automotivação, classificando-as como competências pessoais (intrapessoais), pois “determinam a forma como nos gerimos a nós próprios”, e a empatia e gestão de relacionamentos como competências sociais (interpessoais), pois “determinam a forma como lidamos com as relações”. A psicoeducação tem sido uma intervenção dinamizada na área da saúde mental, contudo, direcionada para a doença mental (perturbação bipolar e esquizofrenia), como referem Gonçalves-Pereira, Xavier, Neves, Barahona-Correa e Fadden (2006). Os mesmos autores abordam o conceito como um conjunto de abordagens para capacitar o indivíduo/família para melhor lidar com os problemas, perspetivando uma melhoria nos seus comportamentos futuros. Katsuki et al. (2011) reconhecem a psicoeducação como um recurso importante e eficaz na capacitação da pessoa. Embora sejam escassos os estudos portugueses na área da Competência Emocional/Inteligência Emocional, Veiga Branco, em 1999, cria a Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional em Professores (EVBCIE) (N=250). A mesma autora em 2005 replicou o estudo noutro grupo de professores (N= 464), onde revalidou a escala, onde considerou que deverão ser replicados no futuro outros estudos que visem o contexto dos professores, compreendendo os diversos níveis do sistema educativo, desenvolvendo capacidades no sentido de uma melhor gestão da profissão “professor”. Dada a pertinência desta escala, ela tem sido utilizada em outras áreas profissionais. Vilela, em 2006, validoua em enfermeiros. Em Espanha existem vários estudos sobre a educação emocional em contexto escolar (Ibáñez y Alzina, 2006; Pena e Repetto, 2008; PérezGonzález, 2008). Ao nível concetual, para além do modelo de Goleman, de 1995, Alzina (2003) e Seal e Andrews-Brown (2010) revelam novas abordagens da inteligência emocional.

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METODOLOGIA Este estudo classifica-se como quasi-experimental do tipo pré-teste pós-teste sem grupo de controlo (Fortin, 2003), dado que se pretende conhecer a influência de uma intervenção (neste caso, psicoeducação em grupo) sobre a variável em estudo. O estudo foi constituído por dois tempos intercalados pela intervenção. No primeiro tempo efetuou-se a avaliação inicial das competências emocionais em professores. Posteriormente, ocorreu a intervenção que assentou na psicoeducação contribuindo para o aumento dessas mesmas competências. O segundo tempo baseou-se numa nova avaliação, de forma a verificar se a intervenção foi adequada e se existiram benefícios para os professores. O quadro 1 sintetiza os objetivos principais de cada sessão, com base na psicoeducação sobre inteligência emocional. QUADRO 1 – Estruturação das sessões de psicoeducação da Inteligência Emocional aos professores INTELIGÊNCIA EMOCIONAL

SESSÕES OBJETIVOS

Ensinar noções gerais sobre a inteligência emocional Abordar o primeiro domínio da inteligência emocional – a autoconsciência

1º Sessão

Estimular a formação do grupo Avaliar a sessão com os professores Propor a realização de trabalho para casa (TPC) – as qualidades que me definem

Reforçar a importância do desenvolvimento de competências enquanto pessoa Abordar a autoconsciência como pilar da inteligência emocional

2º Sessão

Promover o desenvolvimento da autoconsciência dos participantes Propor a realização de TPC – a situação que mais me incomodou em sala de aula Avaliar a sessão com os professores

3º Sessão

4º Sessão

5º Sessão

6º Sessão

Transmitir conhecimentos da dinâmica das emoções Promover o desenvolvimento da reflexão e autorrevelação Treinar técnica de gestão de emoções (diálogo interno, feedback construtivo) Propor a realização do TPC – pensamentos causam sentimentos Avaliar a sessão com os professores Abordar as técnicas de relaxamento como estratégia de gestão de emoções Treinar técnicas de relaxamento – treino Autogénico de Schultz e respiração abdominal profunda Propor a realização de TPC – sentimentos causam comportamentos Avaliar a sessão com os professores Reforçar a importância do empowerment nos professores Treinar comportamentos assertivos, em contexto de relação pedagógica, usando técnicas psicodramáticas Promover a gestão de emoções no relacionamento com os outros Propor a realização de TPC – motivar é... Avaliar a sessão com os professores Promover o desenvolvimento do autoconhecimento face à automotivação Abordar a teoria da hierarquia das necessidade de Maslow e a teoria de fatores de higiene – motivação de Herzberg

Discutir o tema – o professor como motivador Propor a realização de TPC – na pele do outro Avaliar a sessão com os professores

Transmitir a noção de empatia Promover a aquisição de comportamentos resilientes

7º Sessão

Discutir os modeladores das perceções Propor a realização de TPC – agora, o que vai mudar na sala de aula? Avaliar a sessão com os professores

Dinamizar as psicodinâmicas de grupo com aplicação na relação pedagógica

8º Sessão

Avaliar as sessões com os professores Promover a interação grupal durante o lanche convívio

Com a elaboração deste estudo pretendeu-se avaliar o impacto da psicoeducação no perfil de Competência Emocional em Professores. A intervenção “psicoeducação” consistiu em oito sessões de 90 minutos cada, utilizando técnicas psicoterapêuticas, psicodramáticas e cognitivo-comportamentais, com semelhanças com outros programas, tal como referem Pibernik-Okanovic’, Adjukovic’, Lovrencic’ e Hermanns (2011), que elaboraram uma intervenção baseada de psicoeducação com as seguintes caraterísticas:


seis sessões com intervalos semanais, com duração entre 60-90 minutos, constituídas por quatro a seis elementos; aplicação de técnicas cognitivo-comportamentais com enfoque nos problemas relacionados com a temática a tratar; utilização de técnicas promotoras de coping sendo prática em todas as sessões enviar trabalho para casa (TPC). A intervenção de psicoeducação estruturada tenta dar ao professor princípios e técnicas que lhe permitem compreender e intervir eficazmente no processo ensino-aprendizagem, capacitando-o nestes diferentes domínios da Competência Emocional, levando a um funcionamento mais eficaz da dinâmica escolar, tal como refere Fernández-Berrocal e Extremera (2002): “a capacidade do professor para captar, entender e controlar emoções dos seus alunos é o melhor índice de equilíbrio emocional da sua classe”. Identificam-se como objetivos: • Caracterizar social e demograficamente os professores em estudo (N=6) da Escola Básica e Secundária de Ourém; • Avaliar o nível de saúde mental dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção psicoeducação: • Avaliar o perfil de competência emocional dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção “psicoeducação”; • Avaliar o impacto da intervenção de psicoeducação no perfil da competência emocional dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém. Desta forma, com a elaboração do quadro de referências do presente estudo, foram elaboradas as seguintes questões de investigação: • Qual é o impacto da intervenção “psicoeducação” na competência emocional nos Professores da Escola Básica e Secundária de Ourém (N=6)? • Qual é o nível de saúde mental dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção “psicoeducação”? • Qual é o perfil de competência emocional dos professores da Escola Básica e Secundária de Ourém, antes e depois da intervenção “psicoeducação”? Assim, de acordo com o construto, foi definida a seguinte hipótese: H1 - Existem diferenças estatisticamente significativas entre o nível de saúde mental e o perfil da competência emocional dos professores, antes e depois da psicoeducação.

Participantes A população deste estudo abrangeu os professores que lecionavam na EBSO no ano letivo 2010/2011. A amostra é intencional e compreendeu os professores interessados em participar no estudo. Para Maroco (2007, p. 31), neste tipo de amostra “os elementos são selecionados pela sua conveniência, por voluntariado”.

Instrumentos O instrumento utilizado foi um questionário de questões fechadas (na sua grande maioria), constituído por duas partes, a primeira para colheita de dados sociodemográficos dos professores em estudo, e a segunda inclui a escala MHI-5, validada para a população portuguesa por Pais Ribeiro (2001), e a Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional (EVBCIE), construída e validada para a população portuguesa por Veiga Branco (2005). O nível de saúde mental da amostra foi avaliado pela escala Mental Health Inventory-5 (MHI-5) (Pais Ribeiro, 2001), destinada a caraterizar a mesma. Pais Ribeiro (2001, p. 86) refere que a escala é um “teste de rastreio útil na avaliação de saúde mental”. É uma escala constituída por 5 itens em que 3 itens têm cotação invertida (questões nº 1, 3 e 4 que correspondem aos itens 17, 19 e 27 da escala MHI com 38 itens). Os resultados são constituídos pela soma dos valores brutos de cada item. Os itens são pontuados de 1 a 6, traduzindo-se o resultado de 5 a 30. O resultado obtido tem que ser transformado segunda a fórmula ((MHI5)-5)x(100/25), obtendo valores entre 0 de 100, sendo o ponto de coorte 52. A EVBCIE foi construída e utilizada para avaliar a Competência Emocional dos professores, com um conjunto de 85 itens divididos por cinco subescalas. Cada uma destas subescalas representa uma das cinco Capacidades da Inteligência Emocional, segundo o modelo teórico de Goleman, de 1995. Cada domínio (subescala) compreende várias funções num total de 18. A cada um dos itens ou afirmações corresponde a escala temporal, tipo Likert, de 1 a 7, sendo que 1 corresponde a nunca, 2 a raramente, 3 a pouco frequente, 4 a por norma, 5 a frequentemente, 6 a muito frequente e 7 corresponde a sempre. Os respondentes têm ainda a oportunidade de responder em cada conjunto de expressões a uma questão aberta, no item Outra. Os scores para cada item variam de 1 a 7. O quadro 2 aborda a caraterização da escala. QUADRO 2 - Caraterísticas da Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional Domínios (Sub-escalas) I Autoconsciência (20 itens score 20-140) α 0.70

II Gestão de Emoções (18 itens score 18-126) α 0.80

III Automotivação (21 itens score 21-147) α 0.78

IV Empatia (12 itens score 12-84) α 0.88 V

Gestão de Emoções em Grupo

(14 itens 14-98) α 0.87

Total (Competência Emocional) *Itens invertidos

Funções

Itens

Scores Mínimos e Máximos

F1 – Perceção positiva de si

1e, 1g, 3b, 3c, 3d, 3f, 3h

7- 49

F2 – Alterações relacionais e racionais

1f*, 2a*, 2b*, 2c*, 2d*

5-35

F3 – Reações de instabilidade, absorção

1b*, 1c*, 3a*, 3e*, 3g*

5-35

F4 – Autoperceção consciente

1a, 1d, 1h

3-21

F5 – Intrusão, Isolamento, explosão

2a*, 2b*, 3a*, 3e*, 4a*, 4c*

6-42

F6 – Racionalizar a raiva

1e, 1f, 2c, 2d, 3c, 3d

6-42

F7 – Afastamento passivo

1a, 1b, 1c, 3b

4-28

F8 – Transformação de energia emocional em física

1d, 4b

2-14

F9 – Iliteratos, manipulados pela energia emocional negativa

1c*, 1d*, 1e*,1f*, 2d*, 3a*, 3c*, 3d*, 3e*

9-63

F10 – Literatos usam a energia emocional

1a, 1b, 1g, 1h, 1i, 2g, 3b

7-49

F11 – Estado de fluxo em atividade

2a, 2b, 2e

3-21

F12 – dependentes, ruminativos

2c*, 2f*

2-14

F13 – Valorização da expressão

2a, 2b, 2c, 2d, 2e

5-35

F14 – Sintonia relacional

1a, 1b, 1c, 1d

4-28

F15 – Ser literato em conflito

3a, 3c, 3b*

3-21

F16 – Percepção emocional

1a, 1b,1c,1d,2b

5-25

F17 – Sincronismo

2a, 2c,2d,2f

4-28

F18 – controlo emocional e relacional

1e,1f, 1g, 1h,2e

5-25 85-595 Legenda: α – Coeficiente de Alfa Cronbach; F - Função

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 19


Segundo Veiga Branco (2005, p. 219), o instrumento inclui “as cinco categorias de contextos, perfeitamente diferentes entre si, onde aparecem situações hipotéticas, com o objectivo de induzir o sujeito respondente a identificar-se com elas. A cada uma das situações correspondem um ou mais conjuntos de expressões, e a cada uma destas expressões corresponde a escala de frequência temporal. Tem como objectivo identificar a frequência com que os comportamentos e as atitudes expressos, são vivenciados pelos respondentes”. Após a intervenção realiza-se o “2º tempo”, com a avaliação das Competências Emocionais em Professores e comparando os dados com os resultados do “1º tempo”, a fim de verificar se as estratégias utilizadas da psicoeducação contribuíram para a melhoria dos domínios da Competência Emocional dos Professores. Procedimentos A operacionalização do estudo teve em conta os procedimentos formais e éticos. Assim, nos procedimentos formais, primeiro foi efetuado o contacto com o Centro de Saúde de Ourém – UCC a fim de verificar a pertinência do estudo, pois é esta unidade funcional que articula com a Escola Básica e Secundária de Ourém (EBSO), o que mereceu resposta positiva. Posteriormente, efetuou-se o pedido de autorização, via e-mail, para utilização da Escala Veiga Branco das Capacidades da Inteligência Emocional à Doutora Maria Augusta Veiga Branco, tendo sido de imediato concedido. Ao nível da EBSO, foi solicitado e posteriormente concedido o pedido de autorização para a realização do estudo e intervenção nos professores da referida escola. Foi solicitada e concedida autorização, via e-mail, para a utilização da escala MHI-5 ao Doutor José Luís Pais Ribeiro. Foi explicado todo o processo do estudo aos professores, de modo a que, de livre vontade, pudessem escolher participar ou não, tendo sempre em conta os direitos e responsabilidades mútuas, com vista a assegurar o consentimento informado. A confidencialidade de todos os dados dentro do grupo é outro dos aspetos a respeitar. Os instrumentos a preencher pelos participantes eram anónimos. No início do estudo foi solicitado o consentimento informado para os professores da amostra. A aplicação dos instrumentos foi efetuada em março de 2011 e maio de 2011, tendo a intervenção decorrido de março de 2011 a maio 2011. Os dados estatísticos foram processados no programa PASW Statistics 18, licenciado para o Instituto 20 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Politécnico de Leiria. Na análise dos dados recorreuse a diferentes procedimentos estatísticos, nomeadamente à estatística descritiva, utilizando as frequências absolutas e relativas, medidas de tendência central (média, mediana e moda), medidas de dispersão (desviopadrão e amplitude de variação). Dada a dimensão da amostra e o tipo de estudo recorreu-se a análise inferencial através de um teste não paramétrico para amostras emparelhadas. Deste modo o Teste de Wilcoxon revelou-se o mais adequado (Maroco, 2007). ANÁLISE DOS RESULTADOS A amostra dos professores em estudo (N=6) carateriza-se por ser uma amostra maioritariamente feminina (2 homens, 4 mulheres), com uma média de idades de 49 anos (mínimo de 34 e máximo de 59 anos). Cinco dos professores têm o grau académico de licenciatura e de mestrado, com uma média de 21 anos de docência e com um desvio-padrão de 9.85 (mínimo de 10 e máximo de 33 anos). A maioria leciona ao nível do 2º e 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário (4) e os restantes só ao nível do secundário (2). Na escola onde foi realizado o estudo (EBSO), o tempo médio de docência foi de 13 anos para um desvio-padrão de 11.98 (mínimo de 2 e máximo de 28 anos). Face ao nível de saúde mental, os professores (N=6), antes da intervenção, apresentavam uma média de 56.67 (DP=17.04), representando um valor indicativo de boa saúde mental, verificando-se um valor mínimo de 28 e um valor máximo de 80. Após a intervenção, os professores (N=6) apresentavam uma média de 61.33 (DP=10.93) mantendo valores indicativos de boa saúde mental, contudo o valor mínimo aumentou para 44 e o valor máximo diminuiu para 76, tal como sugere o quadro 3. QUADRO 3 - Comparação do nível de saúde mental antes e depois da intervenção N

Xmin

Xmáx

M

DP

ANTES

6

28

80

56.67

17.04

DEPOIS

6

44

76

61.33

10.93

Legenda: N – Valor absoluto; Xmin – Valor mínimo; Xmáx – Valor máximo; M – Média; DP – Desvio Padrão

Verificou-se que o nível de saúde mental, a autoconsciência, a gestão de emoções, a automotivação, a empatia, a gestão de emoções em grupo e a competência emocional (total) apresentaram valores médios melhores depois da intervenção. Os valores mínimos e máximos de ambas as dimensões em estudo, à exceção do valor máximo da empatia depois, também apresentaram valores melhores depois da intervenção.


No global dos valores apresentados verifica-se uma melhoria após a intervenção, tal como se observa no quadro 4.

DEPOIS

ANTES

QUADRO 4 - Comparação das dimensões autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia e gestão de emoções em grupo antes e depois da intervenção N

Xmin.

Xmáx.

M

DP

Total (Competência Emocional)

6

292

423

355.50

47.00

Autoconsciência

6

60

106

82.17

18.03

Gestão de emoções

6

61

76

69.00

5.48

Automotivação

6

51

120

90.00

23.26 6.92

Empatia

6

52

70

59.50

Gestão de emoções em grupo

6

45

66

54.83

8.04

Total (Competência Emocional)

6

378

460

413.67

32.00

Autoconsciência

6

82

118

97.30

12.70

Gestão de emoções

6

75

88

83.33

5.17

Automotivação

6

89

127

106.66

14.51

Empatia

6

56

68

63.83

4.40

Gestão de emoções em grupo

6

57

72

62.50

6.06

Legenda: N – Valor absoluto; Xmin – Valor mínimo; Xmáx – Valor máximo; M – Média; DP – Desvio Padrão

De modo a ilustrar melhor os resultados apresentados no quadro anterior optou-se por elaborar um gráfico comparativo das médias antes e depois da intervenção face às diferentes dimensões em estudo: autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia, gestão de emoções em grupo. Inclui-se também a competência emocional no seu total, bem como o nível de saúde mental, tal como se pode observar no gráfico 1.

GRÁFICO 1 – Comparação das médias da autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia, gestão de emoções em grupo e o nível de saúde mental, antes e depois da intervenção

A nível nacional não existem estudos comparativos com a mesma metodologia. Veiga Branco aplicou a escala em dois estudos, contudo, num só momento de avaliação. Vilela (2006) adapta a EVBCIE a enfermeiros, mas com aplicação da escala num único momento. Para verificação da hipótese foi realizado o teste estatístico de Wilcoxon para amostras emparelhadas. Relativamente ao nível de saúde mental, apesar da amostra apresentar melhores resultados após a intervenção, sugerindo uma melhoria da saúde mental dos professores, segundo o teste estatístico de Wilcoxon a diferença não é estatisticamente significativa (Z=-0.527; p>0.05). Verificaram-se também três ordens positivas e três ordens negativas, tal como se verifica no quadro 5.

QUADRO 5 - Resultados da aplicação do Teste Wilcoxon para o nível de saúde mental Posições de ordens Nível de saúde Ordens positivas mental depois_ Ordens negativas nivel saúde mental Empates antes

N

Média de ordens

3

Z

p

2.67

3

4.33

0

-0.527

0.598

Legenda: N – Valor absoluto; Z – Teste de Wilcoxon ; p – Significância estatística

Avaliando as diferenças estatísticas antes e depois da intervenção (no 1º e 2º tempo), para p<0.05, face às cinco subescalas da EVBCIE, verificou-se que após a intervenção existem diferenças estatisticamente significativas para as dimensões autoconsciência (Z=-1.992; p≤0.05), gestão de emoções (Z=-2.201; p≤0.05) e gestão de emoções em grupo (Z=-1.997; p≤0.05). Nas dimensões automotivação (Z=-1.363; p>0.05) e empatia (Z=-1.577; p>0.05) verifica-se que, após a intervenção, as diferenças não são estatisticamente significativas. Deste modo, rejeita-se a hipótese nula para as dimensões (subescalas) autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo. Verifica-se a hipótese nula para as dimensões (subescalas) automotivação e empatia. Numa análise global dos resultados para o perfil de competência emocional, verifica-se que existem diferenças estatisticamente significativas na competência emocional antes e depois da intervenção (Z=1.992; p≤0.05). Através do teste estatístico de Wilcoxon verifica-se que não existiram empates de ordem em qualquer das subescalas. Verifica-se o melhor resultado para a gestão de emoções, seguida da autoconsciência e gestão de emoções em grupo, o que corrobora com as hipóteses verificadas. O quadro 6 aborda os resultados descritos da aplicação do teste de Wilcoxon. Posições de ordens

N

Total (Competência Emocional Depois_ Total (Competência Emocional) Antes

Ordens positivas

5

Ordens negativas

1

Empates

0

Autoconsciência Depois _ Autoconsciência Antes

Ordens positivas

5

Ordens negativas

1

Empates

0

Gestão de Emoções Depois_Gestão de Emoções Antes

Ordens positivas

6

Ordens negativas

0

Empates

0

Automotivação Depois_ Automotivação Antes

Ordens positivas

4

Ordens negativas

2

Empates

0

Empatia Depois_Empatia Antes

Ordens positivas

4

Ordens negativas

2

Empates

0

Ordens positivas

5

Ordens negativas

1

Empates

0

Gestão de Emoções em Grupo Depois_ Gestão de Emoções em Grupo Antes

Médias de Ordem

Z

p

1.00 4.00

-1.992

0.046

1.00 4.00

-1.992

0.046

0.00 3.50

-2.201

0.028

2.00 4.25

-1.363

0.173

1.50 4.50

-1.577

0.115

1.00 4.00

-1.997

0.046

Legenda: N – Valor absoluto; Z – Teste de Wilcoxon ; p – Significância estatística

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 21


Os resultados obtidos sugerem que a intervenção foi promotora de capacitação dos professores, originando uma mudança comportamental face à sua competência emocional. A análise dos empates de ordem sugere que os professores melhoraram a sua competência emocional, mas sobretudo na dimensão autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Analisando a intervenção realizada e os resultados obtidos, verifica-se que as dimensões autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo foram trabalhadas em duas sessões para cada dimensão. As dimensões automotivação e empatia, foram trabalhadas em apenas uma sessão para cada. É de valorizar o tempo despendido na abordagem de cada dimensão. Numa próxima replicação do estudo é pertinente aumentar o tempo dedicado às dimensões automotivação e empatia. Verifica-se que os valores das médias, valores mínimos e máximos melhoraram após a intervenção, com exceção da empatia no 2º tempo, dado que confrontado com os resultados anteriormente descritos corroboram com o evidenciado. Face à educação emocional, Alzina (2003) aborda a emoção sobre três estados: neurofisiológico, cognitivo e comportamental. Damásio (2000) centra-se numa abordagem neurofisiológica da emoção. De uma forma mais global Seal e Andrews-Brown (2010) abordam um modelo integrador da Inteligência Emocional, fazendo uma abordagem que incide em três dimensões: as capacidades inatas do indivíduo (emotional habilities), os traços emocionais (emotional traits) e os comportamentos aprendidos (emotional competence), no sentido de potenciar o indivíduo a regular as suas emoções e as dos outros. Integrando os conceitos anteriores torna-se importante, na intervenção psicoeducativa, fazer uma abordagem mais aprofundada às capacidades do indivíduo e aos seus traços emocionais, que se revelam nos seus comportamentos, promovendo assim uma maior capacitação do indivíduo na sua competência emocional. Ao nível nacional não existem estudos publicados com a metodologia quasi-experimental sobre inteligência emocional em professores. Contudo, em Espanha Ibáñez e Alzina (2006), num estudo quasi-experimental, avaliam quantitativa e qualitativamente um programa de educação emocional denominado Programa Educativo de Conciencia Emocional, Regulación y Afrontamiento (PECERA). Verificou que os professores 22 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

em estudo do grupo experimental, face ao grupo de controlo, melhoraram a dimensão de coping, melhorando as suas relações interpessoais com os alunos, capacitando-os a lidar com situações de ira e frustração dos alunos, a diminuir a tensão nas aulas e a promover a confiança dos alunos. Concluiu que o programa de educação emocional adotado produziu ganhos nas relações interpessoais dos professores com os alunos. Por sua vez, Pérez-González (2008) lança uma proposta de avaliação dos programas de educação emocional na escola, concluindo que os programas têm que ter uma base sólida num modelo concetual da inteligência emocional. O mesmo autor salienta a necessidade de abordar a Inteligência Emocional como capacidade e caraterística, fator igualmente salientado pelos autores Pena e Repetto (2008), referindo que na construção de programas de educação emocional a inteligência emocional deve ser abordada como caraterística e habilidade. Face a estes resultados, o presente estudo prima por um programa de psicoeducação baseado no modelo de Goleman, de 1995 (2006), que foi avaliado por uma escala com a mesma base de construção, validada e construída para a população portuguesa (professores), pelo que sobressai a congruência da intervenção psicoeducativa com o instrumento de avaliação, sugerindo ter sido favorecedor dos resultados alcançados. Outra sugestão pertinente num estudo futuro é a criação de um grupo de controlo, podendo tornar as conclusões mais consistentes. Numa outra linha, parece vantajoso aumentar a dimensão da amostra para este tipo de estudo. Contudo, em consequência das dinâmicas usadas, não é aconselhável um grupo superior a 10 a 12 pessoas, segundo Guerra e Lima (2005). Na globalidade houve capacitação dos indivíduos face à autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo, independentemente do nível de saúde mental. CONCLUSÕES Os professores em estudo apresentaram melhores valores médios ao nível da saúde mental, bem como em todas as dimensões (autoconsciência, gestão de emoções, automotivação, empatia e gestão de emoções em grupo), e competência emocional na sua totalidade da EVBCIE após a intervenção psicoeducativa. Destacam-se as diferenças estatisticamente significativas nas dimensões autoconsciência, gestão de emoções e gestão de emoções em grupo, tal como na competência emocional na sua totalidade, antes e depois da intervenção.


O nível de saúde mental, a automotivação e empatia foram dimensões que apresentaram melhorias das médias após a intervenção, contudo, a diferença estatística não foi significativa. Estas competências foram apenas abordados numa única sessão, o que poderá ter contribuído para este resultado. Os resultados obtidos atendendo à amostra de professores não permite a generalização dos resultados para toda a população, porém, os dados obtidos dão indícios de qual o caminho a seguir em futuros estudos com a mesma metodologia. O presente estudo apresenta como fragilidades o tamanho da amostra, a inexistência de um grupo de controlo e a duração da intervenção. Apesar da utilização de estratégias de divulgação adequadas (cartazes, panfletos, contato pessoal e reuniões de professores) a adesão foi baixa, sendo os motivos apresentados pelos professores o excesso de atividades, formação sem creditação, e não estar contemplada no programa anual de formação. Perante esta realidade sugere-se, no futuro, a inclusão destas sessões no plano anual de formação do estabelecimento de ensino e, se possível, com a creditação da formação. Após a análise realizada torna-se pertinente a reformulação da intervenção da psicoeducação, ou seja, aumentar o número de sessões e prolongá-las por um período de tempo correspondente a um período letivo. Será como que criar um “clube de inteligência emocional”, numa primeira fase envolvendo os professores e depois, consoante os resultados, porque não avançar para os alunos, outros profissionais ligados à educação e pais? Afinal, estes são todos os intervenientes no processo educativo. Na abordagem psicoeducativa as técnicas a utilizar devem ser proativas e adaptadas ao grupo alvo, por forma a que todos os participantes criem identidade com o “clube de inteligência emocional”. A metodologia seguida neste estudo, investigação-ação com base numa intervenção psicoeducativa, revelou-se uma boa estratégia de ação, tendo promovido a capacitação dos professores no âmbito da competência emocional. Deste modo, faz sentido replicar o estudo envolvendo a mesma metodologia. É pertinente, em estudos futuros, reformular o conteúdo face à automotivação e empatia, integrando conceitos mais recentes da inteligência emocional, abordando o conceito como capacidade inata, traço pessoal e comportamento aprendido. Posteriormente há que pensar no impacto da capacitação dos professores face à competência emocional no comportamento dos alunos, tal como Estrela (2010, p. 21) refere: “assiste-se a uma viragem da investigação (...)

passando a considerar a relação entre as variáveis do comportamento do professor em sala de aula e o rendimento ou comportamento dos alunos”. Nesta linha de pensamento parece pertinente a introdução de uma componente qualitativa num estudo futuro, tentando apurar as perceções dos professores face aos seus resultados em sala de aula. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Alzina, R. B. (2003). Educación Emocional y competencias básicas para la vida. Revista de Investigación Educativa, 21 (1), 7-43. Damásio, A. (2000). Sentimento de si – o corpo, a emoção e a neurobiologia da consciência. Lisboa: Europa-América. Estrela, M. T. (2010). Profissão docente - dimensões afectivas e éticas. Porto: Areal Editores. Fernández-Berrocal, P., & Extremera, N. (2002). La inteligência emocional como una habilidade essencial en la escuela. Revista Iberoamericana de Educación, (29), 1-6. Fortin, M. F. (2003). O processo de investigação – da concepção à realização (3ª ed.). Loures: Lusociência. Goleman, D. (2006). Inteligência emocional. Espanha: Sic Idea y Creación Editorial. Guerra, M., & Lima, L. (2005). Intervenção psicológica em grupos em contextos de saúde (1ª ed.). Lisboa: Climepsi Editores. Ibáñez, M. M., & Alzina, R. B. (2006). Evaluación de un programa de educación emocional para la prevención del estrés psicosocial en el contexto del aula. Revista Ansiedad e Estrés, 12(2-3), 401-412. Katsuki, F., Takeuchi, H., Konishi, M., Sasaki, M., Murase, Y., Naito, A., Toyoda, H., Susuki, M., Shiraishi, N., Kubota, Y., Yoshimatsu, Y., & Furukawa, T. A. (2011). Pre-post changes in psycosocial functioning among relatives of patients with depressive disorders after Brief Multifamily Psychoeducation: A pilot study. BMC Psychiatry, 11(56), 1-7. Lehtinen, V. (Coord.) (2008). Building up good mental health: Guidelines based on existing knowledge. Finlândia: Stakes. Maroco, J. (2007). Análise Estatística: com utilização do SPSS (3ª ed.). Lisboa: Edições Sílabo. Ministério da Saúde. (2006). Programa Nacional de Saúde Escolar. Lisboa: Direcção-Geral da Saúde. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 23


Ordem dos Enfermeiros (2010). Áreas Prioritárias para Investigação em Enfermagem e Relatório Bienal. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Pais Ribeiro, J. L. (2001). Mental Health Inventory: um estudo de adaptação à população portuguesa. Psicologia, saúde & doença, 2(1), 77-79. Pena, M., & Reppeto, E. (2008). The state of research on Emotional Intelligence in Spain. Electronic Journal of research in Education and Psychology, 15(6), 400-420. Pérez-González, J. C. (2008). Propuesta para la evaluación de programas de educación socioemocional. Revista eletrónica de Investigación Psicoeducativa, 6(2), 523-546. Pibernik-Okanovic’, M., Adjukovic’, D., Lovrencic’, M., & Hermanns, N. (2011). Does treatment of subsyndromal depression improve depression and diabetes related outcomes: protocol for a randomized controlled comparison of psycho-education, physical exercise and treatment as usual. Trials Journal, 12(17), 1-8.

24 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Seal, C. R., & Andrews-Brown, A. (2010). An integrative model of emotional intelligence: emotional ability as a moderator of the mediated relationship of emotional quotient and emotional competence. Organization Management Journal, (7), 143-152. Veiga Branco, M. A. R. (2005). Competência emocional em professores, um estudo em discursos do campo educativo. Tese de Doutoramento, Universidade do Porto, Porto. Vilela, A. C. L. (2006). Capacidades da Inteligência Emocional em enfermeiros: validação de um instrumento de medida. Tese de Mestrado, Universidade de Aveiro, Aveiro.


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A PERSONALIDADE DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA CONJUGAL | Marisa Pinto1; Ana Margarida Varela2; António Vinhal3 |

RESUMO A violência conjugal é considerada pela Organização Mundial de Saúde (2002) um problema de saúde pública, com nefastas repercussões ao nível da saúde física e mental da vítima, dificultadoras do pleno desempenho familiar, social e laboral. Neste sentido a presente investigação teve como objetivos: caracterizar as vítimas de violência conjugal e descrever as dimensões da personalidade desta população. Para tal, realizou-se um estudo transversal e descritivo. A amostra foi selecionada através de um tipo de amostragem não probabilística obtida por conveniência tendo ficado constituída por 37 vítimas de violência conjugal. Para se alcançar os objetivos pretendidos foi aplicado um protocolo de investigação composto por um questionário sociodemográfico e o NEO-FFI-20 (Bertoquini e Pais-Ribeiro, 2006). Os resultados obtidos revelam que as vítimas de violência conjugal são do sexo feminino, têm entre 20 e 69 anos e encontram-se desempregadas, embora não dependam economicamente do agressor. Relativamente aos tipos de violência os mais praticados são a violência psicológica e física. As dimensões de personalidade que caracterizam as vítimas de violência conjugal são a conscienciosidade e o neuroticismo. PALAVRAS-CHAVE: Violência conjugal; vítimas; personalidade. ABSTRACT The domestic violence is considered by the World Health Organization (2002) a public health problem, with disastrous repercussions for the physical and mental health of the victim, and something that hampers the performance of the full family, social and labor. In this point of view the present investigation aimed to characterize the victims of domestic violence and describe the dimensions of personality in this population. For this,

we performed a cross-sectional and descriptive study. The sample was selected through a kind of non-probability sample having been obtained by convenience consisting of 37 victims of domestic violence. To achieve the intended goals was applied a research protocol that consists on a sociodemographic questionnaire and the NEO-FFI-20 (Bertoquini e Pais-Ribeiro, 2006). The results show that victims of domestic violence are female, between 20 and 69 and unemployed, but not economically dependent on the abuser. The most practiced types of violence are: psychological and physical violence. The personality dimensions that characterize victims of domestic violence are conscientiousness and neuroticism. KEYWORDS: Domestic violence, victims; personality.

INTRODUÇÃO Há mais de uma década que a violência é considerada um problema de saúde pública pela Organização Mundial de Saúde (OMS, 2002). A violência doméstica engloba todos os comportamentos/omissões que tenham por objetivo proporcionar, repetidamente e com intensidade, danos físicos, sexuais, mentais, económicos ou até mesmo o homicídio, de forma directa ou indirecta a um indivíduo que habite no mesmo agregado, ou que não habitando no mesmo agregado que o agressor seja cônjuge/ex-cônjuge, ou companheiro marital/ex-companheiro marital. Esta problemática atinge mulheres, homens, crianças, jovens, idosos, deficientes e dependentes (Matos, 2002). A violência conjugal ocorre no seio de uma relação, nomeadamente quando uma das partes recorre ao uso da força ou do constrangimento com a finalidade de promover ou perpetuar o domínio da outra parte. Neste fenómeno padece uma relação assimétrica, isto é, diferentes posições e poderes entre o casal (Alves, 2005; Nunes, 2003).

1 Psicóloga Estagiária para a OPP, Agrupamento de Escolas de Moimenta da Beira, marisapintopsi@gmail.com 2 Professora Assistente do Curso de Psicologia, Instituto Piaget/ISEIT/Viseu, margaridavarela@gmail.com 3 Professor Auxiliar do Curso de Psicologia, Instituto Piaget, ISEIT/Viseu, antoniovinhal@hotmail.com Submetido em: 24-09-2012 – Aceite em 28-11-2012 Citação: Pinto, M., Varela, A., & Vinhal, A. (2012). A personalidade das vítimas de violência conjugal. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 25-29 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 25


A personalidade está relacionada com os diferentes desejos, sentimentos e com a forma de expressar tais sentimentos/emoções. As pessoas diferem uma das outras pelo autoconceito, pelas suas perspectivas no que diz respeito ao mundo e ao futuro (Gleitman, Fridlund, & Reisberg, 2009). A personalidade é o que torna o indivíduo único, tendo sido identificadas cinco dimensões que distinguem a individualidade – Modelo Big Five (Dias, 2004; Hansenne, 2003). Não há um perfil delineado para as vítimas, apenas se constatam algumas características típicas, nomeadamente, serem envergonhadas, caladas, incapazes de reagir, conformadas, passivas, emocionalmente dependentes e deprimidas (Alves, 2005). Actualmente, não se investiga se a personalidade influencia a saúde, mas antes quais as circunstâncias relativas a que aspectos da saúde ou a que comportamentos saudáveis e com que implicações praticas é que a personalidade influencia a saúde. Para este tipo de investigação, o modelo dos cinco factores evidencia-se o mais adequado para ajudar a esclarecer a relação entre o self psicológico e o self fisiológico (Holroyd, & Coyne, 1987). METODOLOGIA Participantes A população em estudo foram as vítimas de violência conjugal, com idade superior ou igual a 18 anos. A amostra foi seleccionada através de um tipo de amostragem não probabilística obtida por conveniência, uma vez que apenas foram incluídas as vítimas de violência conjugal que estavam disponíveis ou que se voluntariaram para participar no estudo (Carmo e Ferreira, 1998). No seguimento dos objectivos delineados para a presente investigação aplicaram-se os instrumentos de recolha de dados a 37 vítimas de violência conjugal, todos do género feminino, ou seja, correspondem a 100% da amostra, não existindo nenhum sujeito do género masculino. A idade das vítimas de violência conjugal da presente investigação varia entre os 20 e os 69 anos, sendo a média das idades que compõem a amostra de 38 anos. A maioria das vítimas são casadas (43,2%); têm filhos (81,1% - 30 indivíduos), variando o número de filhos entre 1 e 8. Na sua maioria têm o 3º ciclo e estão desempregadas. Instrumentos O protocolo de investigação utilizado compõem-se de: a) Questionário sociodemográfico elaborado pelo próprio investigador que permitiu recolher informações sobre a caraterização das vítimas de violência conjugal; 26 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

b) NEO-FFI-20 desenvolvido por Bertoquini e Pais-Ribeiro (2006) para avaliar a personalidade das vítimas de violência conjugal, tendo por base o modelo dos cinco grandes fatores (Neuroticismo (N); Extroversão (E); Abertura à Experiência (O); Amabilidade (A); Conscienciosidade (C)). Procedimento Para alcançar os objectivos em estudo foi delineado um estudo transversal descritivo. Para a realização do presente estudo enviou-se um ofício, a solicitar a autorização para a realização do estudo a 320 locais de atendimento a vítimas de violência conjugal de Portugal, incluindo a Madeira e os Açores. Após a obtenção dessa autorização foi solicitado o consentimento informado aos elementos que constituíram a amostra para a participação voluntária na investigação. Findo o percurso de recolha de dados junto da amostra obtida, iniciou-se a etapa referente ao tratamento estatístico. Para tal, recorreu-se ao software informático SPSS 19.0 Base Windows, começou-se por construir a base de dados de acordo com os instrumentos utilizados onde foram inseridos os dados recolhidos. Para tal, recodificaram-se os itens que eram cotados de forma invertida; de seguida efectuou-se o cálculo do valor das variáveis de acordo com os autores dos instrumentos utilizados. ANÁLISE DOS RESULTADOS A prevalência da violência conjugal é um problema complexo que não será facilmente resolvido. Assim, o objectivo central deste estudo foi conhecer As características e a personalidade das vítimas de violência conjugal em Portugal. Os dados obtidos nesta amostra revelam que as vítimas de violência conjugal portuguesas: são do sexo feminino; têm idades compreendidas entre os 20 e os 69 anos; casadas; com filhos, nomeadamente, entre 1 e 8 filhos. No que concerne às habilitações literárias prevalece o 3º ciclo. Na sua maioria encontram-se desempregadas, embora indiquem que não dependem economicamente do agressor. Quanto aos tipos de violência predominantemente praticados são a violência psicológica e a violência física. O detalhe da violência física de que as vítimas normalmente são alvo é o uso da força física por parte do agressor. Já o detalhe da violência psicológica mais executado contra a vítima é o agressor chamar-lhe de nomes, insultá-la e atribuir-lhe amantes. Enquanto o detalhe da violência sexual que o agressor aplica à vítima é a obrigação em esta ter relações sexuais contra a sua vontade.


Por norma o agressor não possuía nem utilizou armas no momento da violência; estes são na sua maioria consumidores de álcool, mas não consome estupefacientes. As situações violentas foram presenciadas por menores e a vítima ficou com ferimentos ligeiros. O local onde foi praticada a violência foi na residência particular do casal e o motivo da agressão esteve relacionado com o estado alterado do agressor devido ao consumo de álcool e/ou drogas. No que concerne às dimensões de personalidade que caracterizam as vítimas de violência conjugal, estas apresentam valores elevados ao nível da conscienciosidade e neuroticismo. De seguida surge a extroversão, a amabilidade e, por fim, a abertura à experiência DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A literatura indica que os resultados obtidos em várias investigações realizadas no sentido de caracterizar as vítimas de violência conjugal não permitem tirar conclusões claras e objetivas (Costa e Duarte, 2000). No que concerne à caracterização da amostra e tendo por base os dados estatísticos mais recentes relativamente às vítimas de violência conjugal, recolhidos pela APAV em 2010, o presente estudo confirma que a violência conjugal é praticada maioritariamente contra as mulheres, uma vez que a amostra não inclui nenhum indivíduo do sexo masculino. Relativamente à idade das vítimas esta varia entre os 20 e os 69 anos, englobando assim as faixas etárias (entre os 26 e os 45 anos) descritas na literatura como sendo o predominante. Conclui-se que o estado civil que prevalece nesta amostra é casado, corroborando com o estado de arte. Os dados obtidos confirmam que o tipo de família é nuclear com filhos, acrescentando-se com a presente investigação que o número de filhos varia entre 1 e 8 filhos por vítima. No que concerne às habilitações literárias nesta amostra a maioria tem o 3º ciclo e o nível de ensino superior, sendo este último o predominante de acordo com a teoria, logo neste estudo os resultados obtidos não corroboram na totalidade. Contrariamente ao estado de arte a maioria encontra-se desempregada e só depois surgem as mulheres que se encontram empregadas, no entanto as participantes no estudo não dependem economicamente do agressor. Tendo por base, novamente, os dados descritos pela APAV (2010), ao nível da violência conjugal, os tipos de violência mais praticados são os maus-tratos psicológicos e os maus-tratos físicos, corroborando com os resultados obtidos no presente estudo.

A vitimização conjugal múltipla, de acordo com Pinto (2009), consiste em maus tratos físicos; isolamento social; maus tratos emocionais, verbais e psicológicos; recurso a privilégios masculinos ou femininos; ameaças; violência sexual; e controlo económico. Os dados auferidos acrescentam ao estado de arte os detalhes de cada tipo de violência (física, psicológica e sexual) que são frequentemente exercidos contra a vítima. Assim, ao nível da violência física o agressor na maioria das vezes utiliza a força física contra a vítima; relativamente à violência psicológica constata-se que homem insulta e atribui amantes à mulher; e, por fim, no que diz respeito à violência sexual o mais comum é o agressor obrigar a vítima a ter relações sexuais contra a sua vontade. A literatura salienta que na maioria dos casos não há recurso a arma na prática do crime (APAV, 2010). Os dados obtidos no presente estudo corroboram com os resultados da APAV, uma vez que a maioria das vítimas nega o recurso a arma aquando do momento da agressão. Costa e Duarte (2000) referem que as pessoas alcoólicas têm uma maior predisposição para praticar a violência conjugal, verificando-se tal facto em 56,8% da presente amostra. A APAV (2010) constatou que a probabilidade de ocorrência da violência é maior quando o agressor é dependente de substâncias (álcool, drogas), contrariamente, neste estudo apenas uma minoria das vítimas afirma que o agressor é consumidor de estupefacientes. A existência de violência na família de origem (emitida pelos pais através de maus-tratos ou de uma disciplina severa; assim como terem assistido aos maus-tratos conjugais) provoca consequências diretas ou indiretas no indivíduo, podendo este vir a ser violento na conjugalidade (Fernandes, 2002). Daí a relevância em se identificar se os atos violentos foram praticados na presença de menores, verificando-se que em cerca de 59,5% dos casos os filhos assistiram à violência conjugal exercida entre os seus progenitores. Almeida (2009) refere que as consequências para a pessoa vítima de violência conjugal são diversas e de extrema gravidade. Todavia, o estudo revela que a maioria das participantes ficou com ferimentos ligeiros. Dias (2004) menciona que o local onde frequentemente se pratica a violência conjugal é no domicílio onde habita a família, realçando igualmente este facto o presente estudo. Sendo a residência particular do casal o local onde a maioria das mulheres admite ter sido alvo das agressões. Quanto ao motivo da agressão o que é mais realçado é o consumo de álcool e/ou drogas não legais, o que vai de encontro a um dos motivos que as abordagens centradas no indivíduo defendem (Cunha, 2009). Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 27


Desta forma, atingiu-se o primeiro objetivo a que o estudo se propôs: descrever a caracterização das vítimas de violência conjugal. O segundo objetivo centrou-se na descrição das dimensões da personalidade das vítimas de violência conjugal, concluindo que a dimensão com maior predominância é a conscienciosidade, ou seja, são indivíduos zelosos e disciplinados, apresentando características como honestidade, engenhosidade, cautela, organização e persistência. De seguida, os dados demonstram que o neuroticismo também está fortemente presente na personalidade das vítimas de violência conjugal, isto é, são pessoas que evidenciam instabilidade emocional e, por isso, tendem a ser bastante preocupados, melancólicos e irritados; geralmente são ansiosos e apresentam mudanças frequentes de humor e depressão; e tendem a sofrer de transtornos psicossomáticos e apresentar reações muito intensas a todo tipo de estímulos. Em terceiro lugar, as vítimas de violência conjugal apresentam como características de personalidade a extroversão, simbolizando assim que são pessoas ativas, com alto nível de energia, disposição, otimismo e afetuosidade. De seguida surge a amabilidade como fator de personalidade presente nas características das vítimas, espelhando deste modo pessoas que são socialmente agradáveis, calorosos, dóceis, generosos e leais. Por fim, identifica-se a abertura à experiência como fator de personalidade enraizado neste tipo de amostra, ou seja, são mulheres com flexibilidade de pensamento, fantasia e imaginação, interesses culturais, versatilidade e curiosidade (Silva, Schlottfeldt, Rozenberg, Santos e Lelé, 2007).

Com a presente investigação esperamos ter contribuído de alguma forma para um aprofundamento do conhecimento sobre as características e a personalidade das vítimas de violência conjugal, podendo auxiliar na intervenção técnica com estas vítimas.

CONCLUSÃO

Fernandes, F. C. P. (2002). A Mulher Vítima de Violência Conjugal. Porto: Faculdade de Medicina da Universidade do Porto.

Tendo em consideração os dados obtidos neste estudo é possível concluir que os estudos nesta área são pertinentes pois permitem identificar grupos de risco que possam ser alvo de acções de prevenção e intervenção, assim como se poderá identificar as principais características e os traços de personalidade predominantes nas vítimas. No seu conjunto, estes resultados demonstram o quão importante é o reforço das equipas técnicas, ao nível do apoio psicossocial a estas mulheres, uma vez que apresentam-se desprovidas de qualquer suporte afectivo e emocional. Este aspecto deverá revestir-se de singular importância uma vez que, sem uma adequada estrutura mental, será muito difícil para estas mulheres reerguerem-se e reiniciarem a sua vida em tranquilidade. 28 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Almeida, M. V. (2009). Violência Conjugal e Álcool: (In)Existência de uma Relação Causal?. Coimbra: Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra. Alves, C. (2005). Violência Conjugal. Acedido a 2 de Fevereiro de 2011 em http://www4.fe.uc.pt/fontes/trabalhos/2004010.pdf APAV. (2010). Manual Alcipe: Para o Atendimento de Mulheres Vítimas de Violência. Acedido a 23 de Março de 2011 em http://www.apav.pt/pdf/alcipe_compreender.pdf Bertoquini, V., & Pais-Ribeiro, J. (2006). Estudo de formas muito reduzidas do Modelo dos Cinco Factores de Personalidade. Psychologica, (43), 193-210. Carmo, H., & Ferreira, M. (1998). Metodologia da Investigação para auto-aprendizagem. Lisboa: Universidade Aberta. Costa, M. E., & Duarte, C. (2000). Violência Familiar. Porto: Edições Afrontamento. Cunha, D. M. M. (2009). Impacto da Violência Conjugal nas Práticas Educativas Parentais: Olhar da Mãe. Porto: Universidade Fernando Pessoa. Dias, I. (2004). Violência na Família: Uma Abordagem Sociológica. Porto: Edições Afrontamento.

Gleitman, H., Fridlund, A. J., & Reisberg, D. (2009). Psicologia (8ª ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian. Gonçalves R. A., & Machado C. (2002). Violência e vítimas de crime. Coimbra: Quarteto. Hansenne, M. (2004). Psicologia da Personalidade. Lisboa: Climepsi Editores. Holroyd, K. A., & Coyne, J. (1987). Personality and health in the 1980’s: psychosomatic medicine revisited?, Journal of Personality, 55 (2), 359-375.


Matos, M. (2002). Violência Conjugal. In R. A. Gonçalves & C. Machado (Coords.), Violência e Vítimas de Crimes, Vol. 1 – Adultos, (pp. 81-130). Coimbra: Quarteto Editora. Nunes, A. S. (2003). Violência Conjugal. Acedido a 27 de Janeiro de 2011 em http://www.apmcg.pt/files/54/ documentos/20080304120751375635.pdf OMS. (2002). Relatório sobre a Saúde no Mundo 2001. Saúde mental: nova concepção, nova Esperança. (1ª ed.). Lisboa: Direcção-Geral da Saúde/WHO.

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PROGRAMA SAÚDE MENTAL SEM ESTIGMA: EFEITOS DE ESTRATÉGIAS DIRETAS E INDIRETAS NAS ATITUDES ESTIGMATIZANTES | Sandra Oliveira1; Luísa Carolino2; Adriana Paiva3; |

RESUMO Introdução: As abordagens educativas, sustentadas em factos e baseadas na evidência, contribuem para promover a literacia em saúde mental, potenciando a reflexão e a mudança de atitudes. Estas são condições essenciais à desconstrução de crenças negativas associadas às doenças mentais, mas também, ao desenvolvimento de competências de identificação e reconhecimento de fatores de risco e sinais relacionados com determinadas perturbações mentais. A sua ação, porém, parece ser restrita no tempo. Os programas de prevenção e intervenção na área da saúde mental serão, deste modo, tanto mais eficientes se: i) incluírem estratégias que permitam aumentar a Educação e o Contacto, conduzindo a resultados mais positivos, ou seja, promovendo maior conhecimento, confiança e empatia; ii) implementados localmente; iii) dirigidos a grupos específicos, particularmente, adolescentes. A escola é, pois, um local privilegiado e os adolescentes um público-alvo promissor devido à fase de desenvolvimento em que se encontram. Estes representam, ainda, a próxima geração de utilizadores e profissionais de saúde, tornando o seu papel indispensável no que se refere à manutenção ou redução do estigma social. Objetivos: O presente trabalho tem como objetivos estudar as opiniões de estudantes do ensino secundário acerca das doenças mentais, aumentar os níveis de conhecimento e literacia em saúde mental, diminuir preconceitos e atitudes negativas e, consequentemente promover comportamentos mais inclusivos. Método: Participaram no estudo 843 estudantes, avaliados com a versão portuguesa do Opinions about Mental Illness Scale (OMI) antes e depois da aplicação do Programa de Sensibilização SMS Estigma (Saúde Mental Sem Estigma). Constituíram-se dois grupos: o grupo 1 teve acesso a uma Campanha Anti Estigma e o grupo 2 para além da campanha, participou em Sessões de Educação e Contacto. Resultados e Conclusões: Os resultados demonstram e corroboram a eficácia da combinação de estratégias de

Educação e Contacto na redução do estigma associado às doenças mentais. Verificou-se uma diminuição significativa nas atitudes estigmatizantes face à doença mental em ambos os grupos, com resultados mais positivos no grupo 2. Após o Programa de Sensibilização SMS Estigma, os estudantes revelaram, também, mais competências para identificar e reconhecer sinais/sintomas relacionados com problemas de saúde mental, tanto em si próprio, como nos outros. Programas anti estigma, integrados numa estratégia nacional e regional, de caráter permanente e dirigida a diferentes grupos-alvo, poderão contribuir significativamente para diminuir estereótipos, preconceitos e comportamentos de discriminação, tornando-se, pois, fundamental a continuidade deste tipo de intervenções. PALAVRAS-CHAVE: Estigma; Saúde Mental; Literacia; Adolescentes. ABSTRACT Introduction: The educational approaches, supported by facts and evidence based contribute to promote literacy in mental health, raising reflection and attitude changes. These conditions are essential to the deconstruction of negative beliefs associated to mental illness, but also to develop abilities to identify and recognize risk factors and signs related to certain mental disorders. However, its action seems to be restricted in time. Prevention and intervention programs in mental health will be, therefore, more efficient if they: i) include strategies capable of increasing the Education and Contact, leading to more positive outcomes, in other words, promoting further knowledge, confidence and empathy; ii) are locally implemented; iii) are targeted to specific groups, particularly, adolescents. The school is, indeed, a privileged place and adolescents are a promising target because of their developmental phase. They represent the next generation of health users and professionals, making their role regarding the maintenance or reduction of social stigma, indispensable.

1 Psicóloga, Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor, sandraeholiveira@gmail.com 2 Psicóloga, Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor, luisa.couto@ceerdl.org 3 Psicóloga, Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor, adriana.paiva.psi@hotmail.com Submetido em: 30-09-2012 – Aceite em 28-11-2012 Citação: Oliveira, S., Carolino, L., & Paiva, A. (2012). Programa saúde mental sem estigma: efeitos de estratégias diretas e indiretas nas atitudes estigmatizantes. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 30-37 30 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


Aims: This work has the goals of studying the opinions of secondary students about mental illness, increasing literacy and knowledge about mental health, reducing prejudices and negatives attitudes and consequently promoting more inclusive behaviors. Method: 843 students participated in this study, assessed with the Portuguese version of the Opinions about Mental Illness Scale before and after application of the Programa de Sensibilização SMS Estigma (Saúde Mental Sem Estigma). Two groups were composed: group 1 had access to the Anti stigma Campaign and the group 2 in addition to the Campaign, participated in Education and Contact sessions. Results and Conclusions: The results demonstrate and confirm the effectiveness of the combination of Education and Contact strategies in reducing stigma associated with mental illness. There was a significant decrease in stigmatizing attitudes towards mental illness in both groups, with more positive results in group 2. After the Programa de Sensibilização SMS Estigma (Saúde Mental Sem Estigma), students also showed more skills to identify and recognize signs/symptoms, in itself and in others, related to mental health problems. Anti stigma programs, integrated into national and regional strategy, permanently and directed to different target groups, may contribute significantly to reduce stereotypes, prejudice and discrimination behaviors, becoming essential the continuity of this type of interventions. KEYWORDS: Stigma; Mental Health; Literacy; Adolescents. INTRODUÇÃO Dados epidemiológicos a nível mundial revelam que a prevalência de crianças e adolescentes com problemas de saúde mental é aproximadamente de 20% (World Health Organization [WHO], 2005) e que metade dos adultos com algum tipo de perturbações teve o início da doença aos 14 anos (Kessler et al., 2005, cit. por WHO, 2005). De acordo com os dados referidos, a intervenção nesta área assume-se como uma prioridade. Com base em estratégias da Organização Mundial de Saúde (OMS) privilegiam-se aspetos como: “a promoção global da saúde mental; a prevenção da doença mental; a inclusão social e proteção dos direitos e da dignidade das pessoas com doença mental com o objetivo de melhorar a qualidade de vida; e, por fim, a criação de um sistema comunitário de informação, investigação e conhecimento no domínio da saúde mental” (Comissão das Comunidades Europeias, 2005, p. 8).

Em países desenvolvidos, verifica-se que o estigma é a barreira mais significativa com 80% (M = 68,1%) no que concerne ao acesso a cuidados de saúde mental (WHO, 2005). Por estigma entende-se uma desaprovação social de indivíduos ou grupos com caraterísticas diferentes da norma (Goffman, 1963; McDaid, 2008) baseada em estereótipos e preconceitos negativos que conduzem à discriminação e que, não raras vezes, se traduz na redução de igualdade de oportunidades (Corrigan, 2000a). Uma das consequências fundamentais do estigma é o esforço das pessoas para não serem associadas à doença mental e evitar, assim, o tratamento essencial à sua reabilitação (Corrigan, & Wassel, 2008; McDaid, 2008). O estigma impede, ainda, uma integração social adequada, prejudica o acesso às oportunidades sociais, nomeadamente, ao emprego (McDaid, 2008; Tsang, et al., 2007), habitação (Corrigan, Marcowitz, Watson, Rowan, & Kubiak, 2003; Corrigan, 2006), saúde (Vogel, Wade, & Hackler, 2007) e suporte social (Larson, & Corrigan, 2008). Alguns dos estereótipos e preconceitos negativos prendem-se com mitos, fortemente enraizados na sociedade, de que as pessoas com doenças mentais são perigosas, incompetentes e responsáveis pela sua doença (Ahmedani, 2011; Watson, Corrigan, Larson & Sells, 2007). Estas opiniões negativas preconcebidas são influenciadas, ainda, por generalizações acerca da origem e curso da doença (Ahmedani, 2011), muitas vezes associado a um mau prognóstico. A escassez ou distorção da informação contribuem, de facto, para a manutenção de crenças irrealistas (Kelly, Jorm, & Wright, 2007) e atitudes estigmatizantes associadas às doenças mentais. Justificam-se, portanto, intervenções com grupos específicos, nomeadamente, com adolescentes (Thornicroft, Brohan, Kassam, & Lewis-Holmes, 2008). Nesta fase, e especificamente, na faixa etária dos 14-18 anos, os adolescentes encontram-se a consolidar a sua identidade pessoal e social, sendo que estão mais predispostos a integrar informação relacionada com as suas experiências emocionais (Schulze, Richter-Werling, Matschinger, & Angermeyer, 2003). O aumento de conhecimento acerca das doenças mentais, para além de contribuir para a redução do estigma, aumenta a literacia, potenciando o reconhecimento e procura de ajuda atempada e, consequentemente pode contribuir para um prognóstico mais favorável (Kelly et al., 2007). Em termos de estratégias de redução do estigma, Corrigan (2000a) identifica três tipos de ação, nomeadamente, o protesto, a educação e o contacto. Vários estudos têm conduzido a diversos resultados (Couture & Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 31


Penn, 2003), sendo que a educação e o contacto, sobretudo o contacto direto, parecem ser mais eficazes (Rüsch, Angermeyer, & Corrigan, 2005; Schulze, et al., 2003; Thornicroft et al., 2008). Com base nesses resultados, diversos projetos têm vindo a ser realizados no sentido de reduzir o estigma associado às doenças mentais. As estratégias utilizadas passam pela realização de campanhas informativas (Crisp, Cowan, & Hart, 2004), sessões de educação dirigidas a grupos específicos, nomeadamente, jovens (Campos et al., 2012; Pinfold, Stuart, Thornicroft, & ArboledaFlórez, 2005) e a combinação das estratégias de educação e contacto (Pinfold et al., 2003; Schulze et al., 2003). No entanto, apesar da evidência de que a eficácia das intervenções de combate ao estigma parece aumentar quando inclui o contacto direto com pessoas com doença mental (Corrigan, & Wassel, 2008; Rüsch et al, 2005), numa revisão realizada por Stuart (2009), a autora revela que o formato mais comum inclui estratégias de educação e, apenas, um terço dos programas utilizam o contacto direto. Partindo desta evidência o atual Programa de Sensibilização SMS Estigma, desenvolvido pelo Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor, constitui, uma iniciativa local que integra as estratégias de Educação e Contacto. Tem como objetivos o estudo das opiniões de estudantes do ensino secundário acerca das doenças mentais, o aumento dos níveis de conhecimento e literacia, a diminuição de preconceitos e atitudes negativas e, como consequência, a promoção de comportamentos mais inclusivos. Espera-se que após a intervenção os estudantes revelem opiniões mais favoráveis e positivas face às pessoas com problemas de saúde mental. Espera-se ainda que estes jovens melhorem os níveis de literacia em saúde mental, nomeadamente, aumentando o desenvolvimento de competências de identificação e reconhecimento de fatores de risco e sinais relacionados com determinadas perturbações mentais. METODOLOGIA Participantes Este estudo contou com a participação de 843 alunos do ensino secundário, de 47 turmas e 4 escolas de Caldas da Rainha, 346 (41%) do sexo masculino e 497 (59%) do sexo feminino, com idades compreendidas entre os 14 e 26 anos (M=16,7; DP=1,57 e M=16,42; DP=1,35). Frequentavam o ensino regular 64,7% dos alunos e 35,3%, o ensino profissional. Do total, 45,2% encontravam-se no 10º, 28,5% no 11º e 26,3% no 12º ano de escolaridade. 32 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

No que respeita às caraterísticas do agregado familiar 37,4% dos estudantes viviam com o pai e com a mãe, 30% coabitavam também com irmãos enquanto 14% eram oriundos de famílias monoparentais. Dos restantes alunos, 5% residiam com um dos pais e irmãos, 4,9% num contexto familiar mais alargado, 4,3% com um dos pais e respetivo(a) companheiro(a) e 4% com outros cuidadores. Relativamente à situação de saúde, 153 (18,1%) dos estudantes referiram ter problemas de saúde, dos quais 139 identificaram uma doença física e 7 indicaram ter um problema de saúde mental. Quanto ao facto de conhecerem pessoas com problemas de saúde mental, 18,2% dos alunos responderam afirmativamente. Destes, 12,4% indicaram que essa pessoa é um familiar de primeiro grau , 41,8% declaram tratarse de outro familiar , 34% referiram ser um amigo(a) enquanto 8,5% mencionaram tratar-se de um conhecido afastado. Ainda, 255 dos estudantes disseram conhecer pessoas com problemas específicos, nomeadamente, de alcoolismo (N = 53; 21%), toxicodependência (N = 53; 21%) e deficiência (física e/ou mental; N = 88; 34,9%) ou uma ou mais pessoas com uma ou mais das problemáticas referidas (N = 58; 23,1%). Instrumentos Opinions about Mental Illness Scale – Versão Portuguesa (OMI) (Oliveira, 2005) A Escala de Opiniões sobre a Doença Mental trata-se de um instrumento de auto-resposta constituído por 51 itens de uma escala tipo Likert de 6 pontos (de 1 – Aprovo plenamente até 6 – Desaprovo plenamente) que avalia as opiniões acerca da doença mental no que respeita à natureza, causa e tratamento. Resultados elevados em cada fator correspondem a níveis superiores de atitudes estigmatizantes, à exceção do fator Ideologia de Higiene Mental, no qual os níveis elevados de atitudes negativas resultam de scores baixos. Assim, valores elevados no fator Autoritarismo indicam uma opinião sobre a pessoa com doença mental como pertencente a uma classe de pessoas inferiores. O fator Benevolência representa uma visão moralista, paternalista e protetora face a pessoas com doença mental. Pontuações elevadas no fator Ideologia de Higiene Mental expressam uma opinião da pessoa com doença mental como sendo uma pessoa igual às outras. No fator Restrição Social, resultados elevados traduzem-se numa perspetiva da pessoa com doença mental como um perigo para a sociedade defendendo, assim, a restrição da liberdade destas pessoas. Por fim, scores altos no fator Etiologia Interpessoal apontam uma opinião


de que a saúde mental é objeto das escolhas individuais feitas ao longo da vida. Para efeitos do estudo das qualidades psicométricas, foi realizada uma Análise Fatorial Exploratória, em componentes principais, com rotação Varimax. Após a análise interpretativa dos itens da versão original e versão portuguesa, optou-se por considerar a análise fatorial apresentada pelos autores originais (Struening, & Cohen, 1963), conforme as caraterísticas do instrumento expostas na Tabela 1. Tabela 1: Fatores, cotação e consistência interna do instrumento (OMI)

Cotação Fatores

Nº do item Normal

Autoritarismo

Consistência interna (alpha de Cronbach)

Nº do item Invertido

Original

Estudo SMS Estigma

1, 6, 9, 11, 16, 19, 21, 39, 43, 46, 48

0.79

0.52

Benevolência

26, 32, 34, 36, 37, 40, 49

2, 12, 17, 18, 22, 27, 47

0.71

0.53

Ideologia de Higiene Mental

31

3, 13, 23, 28, 33, 38, 44, 50

0.34

0.47

Restrição Social

8, 41

4, 7, 14, 24, 29, 42, 45, 51

0.73

0.68

5, 10, 15, 20, 25, 30, 35

0.66

0.67

Etiologia Interpessoal

Programa de Sensibilização SMS Estigma (Saúde Mental Sem Estigma) O programa de sensibilização realizado nas escolas é constituído por uma campanha anti estigma e por uma sessão de educação e contacto direto. Campanha Anti Estigma: Esta campanha integra a divulgação de informação sobre estigma e saúde/doença mental através da distribuição de folhetos informativos e do blog construído para o efeito (www.smsestigma. blogspot.pt). Foram disponibilizados, nas escolas, cartazes com 10 mitos associados à doença mental, que se traduz em informação errada e a respetiva informação correta. Os mitos foram, também, divulgados através de marcadores de livros e ainda, individuais de mesa nos refeitórios das escolas. Sessão de Educação e Contacto: As sessões foram estruturadas com a duração de 90 minutos, com grupos entre 10 a 25 alunos, em sala de aula, e assentes nas estratégias propostas por Corrigan (2000a). A vertente de Educação foi dinamizada por duas psicólogas e após a apresentação da equipa e do projeto, procurou refletir, com os alunos, conteúdos cuja informação assentou em dois temas principais: 1. Estigma: a) explorar o conceito e desenvolvimento do processo de estigmatização, em diferentes grupos sociais; b) manutenção e consequências do estigma social face à doença mental; c) desconstrução de mitos e adoção de

atitudes inclusivas. 2. Saúde e Doença Mental: a) apurar possíveis causas e fatores de risco para o desenvolvimento de doenças mentais; b) analisar o contínuo entre saúde e doença mental, primeiros sinais e manifestações; c) diagnóstico, prevalência, prognóstico, tratamento e recursos em saúde mental. A vertente do Contacto traduziu-se no testemunho de uma pessoa com diagnóstico de Perturbação Bipolar desde há 12 anos e que se encontra em acompanhamento pelo Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor. Esta descreveu, sobretudo o processo de desenvolvimento da sua perturbação e reabilitação psicossocial (sintomas, adaptação social, estigma, dificuldades no acesso ao emprego). Procedimentos Após a autorização oficial por parte dos Agrupamentos das Escolas Secundárias e o Consentimento Informado assinado pelos encarregados de educação, para a participação dos seus educandos, deu-se início ao estudo com a primeira recolha de dados realizada entre Novembro de 2011 e Fevereiro de 2012. Posteriormente, estabeleceram-se dois grupos experimentais para a aplicação do Programa de Sensibilização: o grupo 1 (N = 437) teve acesso à campanha anti estigma. O grupo 2 (N = 298) para além da campanha anti estigma participou na Sessão de Educação e Contacto. O primeiro momento da avaliação, através do instrumento OMI, foi realizado a todos os participantes antes de dar início ao Programa de Sensibilização. O segundo momento de avaliação foi realizado quinze dias após a campanha anti estigma para o grupo 1, e no final de cada sessão para o grupo 2. ANÁLISE DOS RESULTADOS Análise de dados: A análise estatística dos dados recolhidos foi realizada através do Statistical Package for Social Sciences (SPSS, v. 17). Recorreu-se à estatística descritiva para a caraterização sociodemográfica, para avaliação dos níveis de conhecimento / literacia e das opiniões dos estudantes acerca da doença mental. As comparações em função do sexo realizaram-se através das análises dos testes-t. A fim de avaliar as diferenças dos resultados pré-pós Programa de Sensibilização utilizou-se a Análise da Variância (ANOVA) a um fator. Opiniões dos estudantes acerca da doença mental: As opiniões dos estudantes acerca da doença mental situam-se numa posição intermédia (entre o 2,81 e 4,55). Os resultados deste estudo, quando comparados com os da amostra obtida para a realização da versão portuguesa Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 33


da escala (N = 261), revelam maiores níveis de estigma no fator Benevolência (M = 63,64 vs. M = 39,45), tendo-se verificado, menores níveis de estigma nos fatores Restrição Social (M = 30,27 vs. M = 37,03), Etiologia Interpessoal (M = 19,63 vs. M = 28,45), Ideologia de Higiene Mental (M = 39,65 vs. M = 25,79) e Autoritarismo (M = 40,05 vs. M = 42,09). Preconceitos e atitudes negativas após a intervenção: A análise dos resultados do Programa de Sensibilização revelou a existência de diferenças estatisticamente significativas, na comparação pré-pós intervenção, em todos os fatores analisados neste tópico tendo-se verificado uma melhoria das opiniões nos fatores Autoritarismo, Restrição Social e Etiologia Interpessoal (Gráfico 1).

No segundo momento da avaliação, a tendência dos participantes mantém-se tanto no grupo 1, como no grupo 2 (Tabela 3). Tabela 3: Diferenças das médias obtidas através dos fatores do instrumento OMI, em função do sexo, nos diferentes momentos de avaliação.

Médias Momento

Fatores

Masc.

Fem.

t

p

Pré-Teste

A

3,69

3,60

2,507

.012**

Pós-Teste Grupo 1

Gráfico 1: Resultado dos participantes antes e depois do Programa de Sensibilização para os cinco fatores

Pós-Teste Grupo 2

No que se refere ao Grupo 1 (Campanha Anti Estigma), registou-se uma melhoria das opiniões dos estudantes no segundo momento de avaliação nos fatores Autoritarismo, Restrição Social e Etiologia Interpessoal. No grupo 2 (Campanha Anti Estigma + Sessão de Educação e Contacto) verificam-se diferenças mais positivas, nas opiniões sobre a doença mental antes e após a intervenção em todos os fatores com exceção do fator Benevolência que aumentou com a intervenção. Os resultados da comparação entre os dois grupos demonstraram que os participantes do grupo 2 revelaram uma diminuição mais significativa dos níveis de estigma nos fatores Autoritarismo e Restrição Social. No entanto, maior estigma é percebido no fator Benevolência (Tabela 2). Tabela 2: Resultados da Análise da Variância (ANOVA) a um fator, segundo os diferentes momentos de avaliação e os fatores do instrumento (OMI) Pré-Teste Pós-Teste Grupo 1 Pós-Teste Grupo 2

Fatores

M

DP

M

DP

M

DP

F

p

A

3,64

0,51

3,50

0,55

3,14

0,60

95,908

.000*

B

4,55

0,43

4,53

0,47

4,71

0,45

16,967

.000*

C

4,41

0,49

4,42

0,51

4,49

0,47

3,010

.050**

D

3,03

0,62

2,91

0,63

2,57

0,58

60,920

.000*

2,81

0,75

2,66

0,76

2,59

0,71

11,490

.000*

Legenda: A – Autoritarismo; B – Benevolência; C – Ideologia de Higiene Mental; D – Restrição Social; E – Etiologia Interpessoal *p<.001 **p≤.05

No que concerne às diferenças entre sexo, antes da intervenção, verifica-se que o sexo masculino apresenta maiores níveis de estigma nos fatores Autoritarismo, Restrição Social e Etiologia Interpessoal. No fator Benevolência os rapazes revelam menor estigma. 34 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

4,46

4,61

-5,087

.000*

4,37

4,43

-1,618

.106

D

3,09

2,98

2,568

.010**

E

2,87

2,76

2,169

.030**

A

3,58

3,44

2,735

.006**

B

4,40

4,63

-5135

.000*

C

4,40

4,44

-.808

.420

D

3,00

2,84

2,745

.006**

E

2,82

2,54

3,969

.000*

A

3,28

3,05

3,302

.001*

B

4,55

4,81

-5,022

.000*

C

4,42

4,53

-1,876

.062

D

2,69

2,49

2,978

.003**

E

2,79

2,46

4,103

.000*

Legenda: A – Autoritarismo; B – Benevolência; C – Ideologia de Higiene Mental; D – Restrição Social; E – Etiologia Interpessoal; Masc. = Masculino; Fem. = Feminino *p≤.001 **p≤.05

Legenda: A – Autoritarismo; B – Benevolência; C – Ideologia de Higiene Mental; D – Restrição Social; E – Etiologia Interpessoal

E

B C

Níveis de conhecimento e literacia: A avaliação dos níveis de conhecimento e literacia, através do fator Ideologia de Higiene Mental (OMI), via análise dos testes Post Hoc, revelaram diferenças estatisticamente significativas antes e depois da intervenção, apenas, para o grupo 2 (Tabela 2). Os resultados demonstram um aumento da capacidade de reconhecimento de sinais e sintomas relacionados com a saúde mental, no próprio, quando comparados os resultados do pré-teste (1%) e do pós-teste, no grupo 2 (2,7%). No que respeita à identificação/conhecimento de alguém com problemas de saúde mental, os resultados foram mais relevantes em ambos os grupos, quando comparadas com o pré-teste (18,2%). O grupo 1 aumentou a identificação dos sinais e sintomas no outro para 24,5% e o grupo 2 para 40,6%. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A existência de crenças irrealistas associadas a pessoas com problemas de saúde mental e a necessidade da sua diminuição têm sido amplamente estudadas. Da mesma forma, esforços têm sido feitos no sentido de diminuir o estigma e promover a aceitação destas pessoas. Os resultados de vários anos de trabalho, desenvolvidos um pouco por todo o mundo, têm demonstrado que campanhas anti estigma generalistas podem mostrar-se ineficazes e insuficientes.


Programas direcionados a grupos específicos com recurso a estratégias de contacto direto, parecem ser mais benéficos e promotores de mudança de atitudes (Stuart, 2005). A importância de incluir o contacto direto nos programas de intervenção é corroborada pelo presente estudo. As opiniões mais favoráveis face à doença mental são verificadas, no grupo de estudantes que participaram nas Sessões de Educação e Contacto diminuindo, assim, as opiniões de que as pessoas com doença mental pertencem a uma classe inferior, precisam de estar internadas em hospitais psiquiátricos e, portanto, afastadas da sociedade, nunca irão recuperar e são responsáveis pela doença devido a escolhas feitas ao longo da vida. Com isto, a presença da estratégia de Contacto, neste trabalho, parece ser uma iniciativa com resultados positivos que justificam a sua futura replicação. Importa, porém, evitar que as opiniões sejam deslocadas de uma perspetiva mais autoritária para outra mais protetora, paternalista e moralista , igualmente negativa. Para isso, pode ser fundamental um maior enfoque nas competências e autonomia das pessoas com doença mental, em grande parte, possibilitados pelas condições de tratamento farmacológico e psicossocial atuais e que podem contribuir para uma melhoria significativa da sua qualidade de vida. No que respeita às diferenças em função do sexo, a literatura não apresenta resultados conclusivos. No estudo de Schumacher, Corrigan e Dejong (2003), apesar de verificarem que as raparigas revelam mais preocupações quanto à violência, não se aferem diferenças entre sexo significativas face às opiniões sobre a doença mental. Outro estudo verificou que as mulheres manifestam menos preconceitos negativos e comportamentos de discriminação do que os homens (Corrigan, & Watson, 2007). Os resultados que obtivemos corroboram a tendência menos estigmatizante e aceitante nas raparigas, porém, verifica-se uma maior tendência para a adoção de uma visão benevolente, significativamente superior nas raparigas que nos rapazes. Atendendo à necessidade de desconstruir mitos e crenças discriminatórias mas também prevenir problemas de saúde mental o mais precocemente possível, é fundamental o aumento da informação no que respeita às doenças mentais, especificamente, quanto aos fatores de risco, caraterísticas de cada doença mental, recursos profissionais e tratamentos (Kelly et al., 2007), mas também no que toca à tendência para a procura tardia de ajuda profissional devido, maioritariamente ao estigma e, em parte, à falta de capacidade em identificar, em si próprio, sinais de problemas de saúde mental (Gulliver, Griffiths, & Christensen, 2010).

Esta situação torna-se, inevitavelmente, mais importante quando se trata de adolescentes, por ser uma fase de desenvolvimento na qual tendem a surgir os primeiros sintomas e são os jovens que mais carecem de informação para reconhecimento dos mesmos (Jorm, 2011). Concordando com esta necessidade e com base nos resultados deste estudo, conclui-se que as estratégias utilizadas tiveram influência no aumento da literacia. Concluímos, pois, que a utilização de materiais informativos por si só revelaram-se insuficientes para a mudança de opiniões, bem como, para aumentar a capacidade de identificar/reconhecer sinais e sintomas relacionados com problemas de saúde mental em si próprio e nos outros. A este nível, destaca-se que as sessões de Educação e Contacto revelaram o dobro da eficácia quanto à literacia e uma melhoria significativa em relação às opiniões face à doença mental. Assim, podemos considerar que as estratégias de Educação e Contacto parecem influenciar, positivamente, os níveis de a literacia em saúde mental, cujos resultados poderão ser melhor aprofundados com estudos especificamente direcionados para esta questão. Finalmente, este estudo apresenta algumas limitações: o facto de não ser possível distinguir os efeitos da estratégia de Educação face ao Contacto. Também a brevidade de implementação deste Programa não facilitou o aprofundamento e desmistificação de crenças erradas específicas e associadas aos diferentes tipos de doença mental (Corrigan, 2000b). A ausência de follow up limitou a avaliação da eficácia do Programa de Sensibilização SMS Estigma, dado tratar-se de um estudo piloto, que procurou testar estratégias de intervenção reconhecidas como mais eficazes. Tampouco possibilitou verificar se a alteração das opiniões se traduzirá em comportamentos de maior aceitação, nomeadamente, em outros contextos. CONCLUSÕES A aplicação do Programa SMS Estigma permitiu sensibilizar alunos do ensino secundário para as problemáticas do estigma associado aos problemas de saúde mental. A eficácia da combinação de estratégias de Educação e Contacto no combate ao estigma ficou demonstrada, quer ao nível da diminuição das opiniões estigmatizantes face à doença mental, quer no que diz respeito ao aumento dos níveis de literacia, nomeadamente, através da melhoria das capacidades de identificação/ reconhecimento de sinais e sintomas em si próprio e nos outros. Este tipo de intervenção assume-se da maior relevância pois, por um lado, os jovens são a geração futura de Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 35


utilizadores e profissionais de saúde, mas também porque, embora se verifique que a falta de conhecimento e de informação parece conduzir a comportamentos de rejeição e ao aumento de atitudes estigmatizantes, estes não são apenas adotadas pelos membros menos informados da sociedade mas também por profissionais de saúde, e até mesmo os mais treinados e experientes (Keane, 1990, cit. por Corrigan, & Watson, 2002). Justificar-se-ia, pois, a integração destas questões nas componentes letivas em vários graus de ensino e áreas de formação, mas também em contextos plurissectoriais, com inclusão de diversos interventores, desde os próprios e seus familiares, profissionais e organizações que trabalham neste setor e outros que os representam, bem como órgãos de gestão e decisão política. Projetos futuros deverão ter em conta a redução do estigma noutros públicos-alvo e tornar o combate ao estigma uma realidade diária dos diferentes serviços públicos e privados (Sartorius, 2010). Informação: O Programa de Sensibilização SMS Estigma, está integrado no Projecto PAR (Programa de Ajuda-mútua e Reabilitação) e financiado pela DirecçãoGeral de Saúde. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Ahmedani, B. K. (2011). Mental Health Stigma: Society, Individuals, and the Profession. Journal of Social Work Values & Ethics, 8(2). Campos, L., Palha, F., Dias, P., Lima, V. S., Veiga, E., Costa, N., & Duarte, A. I. (2012). Acções de Sensibilização pró-saúde mental em escolas. Journal of Human Growth and Development, 22(2), 259-266. Comissão das Comunidades Europeias (2005). LIVRO VERDE: Melhorar a saúde mental da população, Rumo a uma estratégia de saúde mental para a União Europeia. Bruxelas. Corrigan, P. W. (2000a). Mental Health Stigma as Social Attribution: Implications for research methods and attitude change. American Psychology Association, 7(1), 48-67. Corrigan, P. W. (2000b). Stigma Attributions about Mental Illness. Journal of Community Psychology, 28(1), 91-102. Corrigan, P. W. (2006). Erase the Stigma: Make Rehabilitation Better Fit People with Disabilities. Rehabilitation Education, 20(4), 225-234. Corrigan, P., Markowitz, F. E., Watson, A., Rowan, D., & Kubiak, M. A. (2003). An Attribution Model of Public Discrimination towards Persons with Mental Illness. Journal of Health and Social Behavior, (44), 162-179. 36 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

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TERAPIA DE GRUPO PARA FAMILIARES DE PESSOAS COM PERTURBAÇÃO MENTAL GRAVE: ESTUDO DE CASO MÚLTIPLO | Marina Heleno Pereira1; José Carlos Gomes2; |

RESUMO A família desempenha um papel fundamental no processo do cuidar da pessoa com perturbação mental grave. Este facto acarreta não só benefícios mas também repercussões na sua saúde e qualidade de vida dos familiares, sendo necessário que os enfermeiros desenvolvam intervenções que visem também o seu bemestar. As evidências apontam ainda para que as intervenções em grupo familiares promovam a resolução dos problemas, a redução do isolamento social bem como da sobrecarga das famílias. Desenvolveu-se assim um trabalho de investigação que pretendeu avaliar o impacto da terapia de grupo ao nível da resolução de problemas de familiares de pessoas com perturbação mental grave, realizada por enfermeiros especialistas em saúde mental. Tratou-se de um estudo de caso múltiplo do tipo exploratório com experimentação, dado que antes e após a intervenção foram avaliadas os problemas familiares com recurso ao Questionário dos Problemas Familiares, traduzido e adaptado para a população portuguesa por Xavier e Caldas de Almeida em 2002. Foram respeitados todos os aspetos formais e éticos. A seleção da amostra realizou-se de forma não probabilística/intencional, tendo sido constituída por três elementos. Esta intervenção desenrolou-se ao longo de nove sessões, durante nove semanas, com a duração de uma hora e trinta minutos. Para cada sessão foram desenvolvidas antecipadamente várias intervenções de enfermagem especializadas em saúde mental adequadas aos elementos participantes. O tratamento dos dados foi efetuado informaticamente, com recurso ao programa Statistic Package for the Social Sciences, versão 14.0 para Windows XP, sendo utilizada a estatística descritiva (frequências absolutas). Os resultados obtidos realçam a importância deste tipo de intervenção na resolução de problemas de familiares de pessoas com perturbação mental grave, não tendo sido contudo evidente num caso.

PALAVRAS-CHAVE: Saúde mental; Família; Resolução de problemas; Terapia de grupo ABSTRACT The family plays a key role in caring people with severe mental disorder. However, this entails not only benefits but also an impact on their health and quality of life. Therefore, it is necessary that nurses develop interventions to improve their welfare. The evidence also point to group therapy as an excellent resource to promote the resolution of family problems and to reduce social isolation and burden on families. There by it was developed a research to assess the impact of group therapy at the level of solving problems of relatives from people with severe mental disorder, performed by specialists nurses in mental health. This research it’s about a multiple case study with an exploratory experiments, given that each participant of the sample completed a questionnaire to assess the family problems before and after the intervention, using the Questionário dos Problemas Familiares, translated and adapted to Portuguese by Xavier and Caldas de Almeida in 2002. All the formal and ethical aspects were respected. Sample selection was non-probabilistic intentional and was composed by three elements. This intervention consisted in nine sessions, developed in a weekly bases, for a period of one hour and thirty minutes. In all the sessions, several specialized interventions in mental health nursing, appropriate to each participant, were developed. The data obtained was processed in computer, using the Statistic Package for Social Sciences program, 14.0 version for Windows XP, and using the descriptive statistics (absolute frequencies). The results highlight the importance of this type of intervention to solve problems of family members of people with severe mental disorder. However, these results were not clear in one case. KEYWORDS: Mental Health; Family; Problem Solving; Group Therapy

1 Enfermeira, Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Centro de Saúde Dr. Arnaldo Sampaio, marina_leiria@hotmail.com 2 Professor Coordenador, Escola Superior de Saúde de Leiria do Instituto Politécnico de Leiria, jcrgomes@ipleiria.pt Submetido em: 12-08-2012 – Aceite em 28-11-2012 Citação: Pereira, M., &, Gomes, J. C. (2012). Terapia de grupo para familiares de pessoas com perturbação mental grave: estudo de caso múltiplo. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 38-44 38 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


INTRODUÇÃO Os familiares são, frequentemente, os prestadores de cuidados mais importantes para as pessoas com perturbação mental grave (PMG), sendo o tipo de apoio fornecido pela família dependente das necessidades e problemas do doente. Contudo, também apresentam necessidades que necessitam de serem satisfeitas, que muitas vezes não são valorizadas. O enfermeiro deve identificar na família as suas dificuldades e forças, para que dessa forma consigam estabelecer estratégias de satisfazer as necessidades familiares e contribuir para a resolução de problemas (Waidman, & Elsen, 2004). Conviver com uma pessoa com PMG pode causar sobrecarga emocional, financeira e social pesada, na medida em que afeta o relacionamento familiar, trabalho e a vida social dos familiares que cuidam destas pessoas (Borba, Schwartz, & Kantorski 2008; Campos 2009; Guedes, 2008; Jorge, Freitas, Luz, Cavaleiro e Costa, 2008). Melman (2001) e Saunders (2002, cit. por Zanetti e Galera, 2007) referem que o impacto da PMG na família traduz-se em sofrimento, sobrecarga dos cuidadores e isolamento das atividades sociais. O mesmo autor refere que para a família a única alternativa para ajudar a pessoa com perturbação mental é o isolamento, uma vez que não dispõem de redes de apoio na comunidade que lhes permita realizar atividades sociais. Também Sales, Schuhli, Santos, Waidman e Marcon (2010) referem a falta de suporte das redes sociais como fator primordial para a existência da sobrecarga familiar. Esta engloba habitualmente duas componentes: • Sobrecarga objetiva (impacto concreto e observável resultante da presença da pessoa com perturbação mental na família, como por exemplo alteração das rotinas familiares, redução das atividades sociais, dificuldades no trabalho e financeiras) (Bandeira e Barroso, 2005; Gonçalves-Pereira, Xavier, Neves, Barahona-Correa e Fadden, 2006). • Sobrecarga subjetiva (conjunto de perceções pessoais sobre a situação, incluindo sentimentos de tristeza, culpa, vergonha, perda, tensão, medo) (Bandeira et al., 2005; Gonçalves-Pereira et al., 2006). As mudanças que ocorrem devido à presença de PMG na família vão prejudicar o relacionamento e a manutenção de sentimentos positivos no dia-a-dia, contribuindo para o aumento da sobrecarga subjetiva (Bandeira et al., 2005). Estes autores referem ainda que a existência de sobrecarga vai afetar a saúde mental dos familiares e consequentemente a sua qualidade de vida e por outro lado pode ainda contribuir para o aumento de situações conflituosas na família.

O distanciamento social é comum nos familiares de pessoas com transtorno mental, bem como o cansaço físico e emocional. Apesar de surgirem frequentemente conflitos familiares, estas famílias preocupam-se sempre com o bem-estar do doente, ficando melhor preparadas para cuidar dos seus familiares se receberem informação adequada sobre a doença e o tratamento, bem como se receberem aconselhamento familiar que lhes dê apoio emocional e conselhos práticos sobre como controlar o comportamento da pessoa doente (Navarini & Hirdes, 2008). Os grupos de apoio podem ser uma boa fonte de informação para a família, uma vez que as intervenções em grupo são feitas em função dos problemas de vida quotidiana. A sua utilidade reside na possibilidade de melhorar as capacidades de comunicação, de ensino e de aprendizagem de estratégias para lidar com o stress para que a família consiga cuidar melhor da pessoa com PMG (Guimón, 2002). Reduzem também o isolamento social e o estigma associado à possível doença ou ao sofrimento que a própria pessoa se impõe (Bechelli e Santos, 2004). Para este estudo foi considerado o grupo psicoterapêutico e psicoeducacional com liderança de um enfermeiro com formação em saúde mental que possa intervir nas necessidades e resolução de problemas, de cada elemento participante, uma vez que a questão de investigação colocada foi: “Como é que a Terapia de Grupo promove a resolução de problemas dos familiares de pessoas com PMG?”. Definindo-se como objetivo: avaliar o impacto da terapia de grupo ao nível da resolução de problemas de familiares de pessoas com PMG. METODOLOGIA O tipo de estudo utilizado para este trabalho foi o estudo de casos múltiplos, do tipo exploratório com experimentação (Fortin, 2003), dado que antes e após a intervenção de enfermagem, foram avaliados os problemas familiares com recurso a um questionário, de cada elemento participante. O instrumento de avaliação foi constituído por duas partes. A primeira parte foi composta pelos dados pessoais, familiares e clínicos e a segunda parte foi constituída pelo Questionário de Problemas Familiares (FPQ), traduzido e adaptado para a população portuguesa por Xavier e Caldas de Almeida em 2002. A autorização formal para a utilização do FQP foi pedida e concedida por meio de correio eletrónico pelo autor principal que mantêm os direitos autorais do instrumento. Para se proceder ao estudo foi solicitado autorização formal ao diretor executivo do Agrupamento Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 39


de Centros de Saúde Oeste Norte para a recolha dos dados e antes do início da mesma. A participação da amostra foi voluntária, tendo sido respeitados os princípios éticos. A intervenção consistiu na realização de 9 sessões de terapia de grupo de base psicoterapêutica e psicoeducativa, desenvolvidas semanalmente, durante uma hora e trinta minutos. Nesta, foi dado ênfase a estratégias terapêuticas de base cognitivo-comportamental para lidar com os problemas familiares. A seleção da amostra realizou-se de forma não probabilística/intencional. Tendo sido constituída por três familiares de pessoas com PMG, em idade adulta, a efetuarem terapêutica injetável psiquiátrica na unidade de saúde, e a conviverem no mesmo domicílio, que aceitaram participar no grupo. O tratamento estatístico dos dados recolhidos foi efetuado informaticamente, com recurso ao programa Statistic Package for the Social Sciences, versão 14.0 para Windows XP, sendo utilizada a estatística descritiva (frequências absolutas). ANÁLISE DOS RESULTADOS • Caso A A senhora A com 30 anos é filha de uma utente com 60 anos, com o diagnóstico de doença bipolar. Vivia no momento da intervenção com ela, sendo a principal cuidadora da mãe. Acompanha frequentemente a mãe às consultas de psiquiatria a nível privado e gere a terapêutica no domicílio, apesar de tentar que a mãe mantenha as suas atividades de vida diárias de uma forma mais independente possível. Na entrevista inicial, com uma postura tensa e fácies triste. Manteve um contacto fácil e um humor depressivo. No que diz respeito às suas emoções e afetos, salientou-se alguma labilidade emocional e preocupação, relacionada com a doença da mãe e sobrecarga familiar. Manifestou interesse em adquirir algumas estratégias para “ter paciência”, pois nem sempre é fácil lidar com ela e “o que fazer quando a medicação seja tomada quando estamos ausentes” e “apoios sociais, económicos e psicológicos existentes atualmente e tratamentos, medicamentos e ou técnicas mais eficazes”. Apesar de se encontrar desempregada, manifestou nas sessões iniciais não ter tempo para si, nem para fazer algumas coisas de que gosta. Os pais são divorciados há cerca de 15 anos, tendo esta na altura ficado com a mãe e o irmão, mais velho, ficado com o pai. Referiu manter um relacionamento com o pai e o irmão distante mas cordial, considerando que para o divórcio dos pais também contribuiu a incapacidade que o pai teve em conseguir lidar com a doença da mãe. 40 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Referiu que a mãe começou a manifestar a doença, a cerca 40 anos, tendo ficado mais exacerbada após o seu nascimento, no entanto só foi feito o diagnóstico de doença bipolar a cerca de 10 anos. Mencionou ainda que também tem um tio materno com o diagnóstico de esquizofrenia, sendo neste caso a principal cuidadora a avó com 92 anos, sentindo necessidade de a ajudar sempre que possível. Com a evolução da intervenção, tendo apenas faltado à sessão número quatro, foi evidente a mudança de atitude e comportamento da senhora A. No final da intervenção, com uma aparência cuidada manteve uma postura expansiva e fácies alegre. No que diz respeito às suas emoções e afetos, apesar de manifestar alguma preocupação com a mãe, não apresentou no entanto labilidade emocional. Conseguiu estabelecer alguns planos de resolução de problemas, bem como colocá-los em prática, nomeadamente relativamente a forma de comunicar com a mãe e relacionamento com os seus familiares, indo de encontro ao descrito por Bechelli et al. (2004), Brito (2006), Guimón (2002), Gonçalves-Pereira et al (2006), Navirini et al. (2008) e Pereira e Pereira Jr. (2003), que as intervenções em grupo facilitando a resolução de conflitos familiares melhoram as capacidades de comunicação e diminuem o isolamento social. Relativamente aos resultados obtidos no questionário estes encontram-se descritos na figura 1.

Figura 1: Resultados obtidos no FQP – Caso A

Dos problemas familiares avaliados pelo FQP salientase os valores obtidos nas dimensões da sobrecarga objetiva e subjetiva em que se verifica uma diminuição em 13 pontos e 5 pontos antes e depois da intervenção respetivamente. Relativamente à dimensão da ajuda recebida verifica um aumento em cerca de 7 pontos após a intervenção, uma vez que a utente recebeu ajuda dos profissionais de saúde ao longo destas semanas, sendo esta uma necessidade evidenciada pela utente ao longo das sessões. Verifica-se ainda uma ligeira melhoria da atitude positiva bem como uma diminuição da sua atitude crítica para como o familiar e situação de vida, após a intervenção indo de encontro às atitudes e comportamentos demonstrados com o evoluir da intervenção.


Em síntese a intervenção efetuada ao longo destas sessões permitiu que a utente conseguisse adquirir estratégias de coping de forma a resolver alguns dos problemas identificados, tendo contribuído para diminuição da sobrecarga objetiva e subjetiva. Referiu manter atualmente um relacionamento com a mãe mais assertivo, contribuindo para o seu bem-estar e familiar. • Caso B O senhor B com 53 anos, pai de um utente com 24 anos, com o diagnóstico de esquizofrenia e consumo de substâncias associado, e marido de uma utente com 61 anos, também com o diagnóstico de esquizofrenia. Coabitava, no momento da intervenção, com o filho, a esposa e a mãe desta, numa aldeia perto da cidade. Sendo o principal cuidador, acompanha os restantes elementos às consultas de psiquiatria. Com uma idade aparente superior à real (60 anos), na entrevista inicial, a sua motricidade apresentou-se inquieta, com uma postura tensa e fácies triste. Manteve um contacto fácil e um humor depressivo. Não apresentando alterações a nível do discurso, no entanto manteve um pensamento perseverante quanto a necessidade de “ajuda diária na gestão de dinheiro”. No que diz respeito às suas emoções e afetos, salientou-se alguma labilidade emocional e preocupação relacionada com a dificuldade em gerir a situação de doença na família. Mostrou interesse em adquirir algumas estratégias para ter “paciência” e alguns “conhecimentos sobre a doença e de como lidar com ela”. Encontrando-se, no momento da intervenção, sem trabalho, ocupava algum do seu tempo na agricultura, não tendo vontade em sair de casa nem de manter outra atividade. Não beneficiava de nenhum apoio social, vivendo dos rendimentos obtidos no café. Referiu ainda que os restantes elementos do agregado familiar usufruíam da reforma. Sendo com esse dinheiro, que conseguem gerir o orçamento familiar. Tinha seis irmãos com os quais mantinha uma boa relação, ajudando-o pontualmente com o filho. Com este referiu que mantinha um relacionamento difícil e por vezes conflituoso, devido à questão da gestão do dinheiro. Com a esposa e a sogra, mantêm um relacionamento cordial, no entanto fica “aborrecido” quando estas ajudam o filho com dinheiro. Considera que a sogra sempre foi muito protetora e permissiva com o neto. Mencionou também que a esposa já teve vários internamentos, tendo sido o último a cerca de 14 anos, em Condeixa. Nessa altura, o filho teria 10 anos e começou com alterações do comportamento em casa e na escola. No entanto apenas com cerca de 20 anos e associado aos consumos de substâncias, foi-lhe diagnosticado esquizofrenia.

O senhor B esteve presente em todas as sessões do grupo e com a evolução da intervenção, foram observadas algumas mudanças na atitude e comportamento. No final da intervenção, com uma aparência cuidada demonstrou uma postura expansiva e fácies expressivo. Manteve um contacto fácil e um humor eutímico, não apresentando alterações a nível do discurso nem do pensamento. No que diz respeito às suas emoções e afetos, manteve a preocupação relacionada com a dificuldade em gerir a situação de doença do filho na família, apesar de ter encontrado algumas soluções. Não referindo alterações das funções biológicas vitais, nomeadamente as ideação suicida que manifestou durante algumas sessões. Conseguiu tomar consciência da sua situação familiar e necessidade de estabelecer alguns planos de resolução de problemas nomeadamente quanto a forma de conviver com a doença dos seus familiares Relativamente aos resultados obtidos no questionário estes encontram-se descritos na figura 2.

Figura 2: Resultados obtidos no FQP – Caso B

Dos problemas familiares avaliados pelo FQP no caso B, observa-se que os valores obtidos na dimensão da sobrecarga objetiva diminuem ligeiramente (4 pontos) depois da intervenção e que ocorre uma subida ligeira de 2 pontos na sobrecarga subjetiva. Relativamente à dimensão da ajuda recebida, observa-se uma alteração de 1 ponto nos dois momentos de avaliação e no que diz respeito à dimensão do criticismo não se verifica qualquer variação. Por outro lado, verifica-se uma melhoria significativa (5 pontos) na dimensão da atitude positiva, indo de encontro às alterações observadas a nível da postura e comportamento ao longo das sessões. Em suma, a intervenção efetuada ao longo destas sessões permitiu que o utente conseguisse identificar e exprimir os seus problemas, bem como executar algumas soluções que foi encontrando ao longo da intervenção, tendo esse facto contribuído para a diminuição da sobrecarga objetiva. Quanto à sobrecarga subjetiva apesar de ter aumentado ligeiramente, verifica-se que mantém uma atitude mais positiva para com a situação, conseguindo identificar estratégias de coping ao longo das intervenções. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 41


• Caso C A senhora C, com 73 anos é mãe de uma utente com 33 anos, com esquizofrenia e história de consumos de substâncias associada durante cerca de 10 anos. Referiu no momento da intervenção, que a filha deixou de consumir há cerca de 3 anos. Viúva vive em casa própria com esta filha e com um filho que se encontra paraplégico há cerca de 7 anos e com a companheira do filho e a filha desta. Apesar de a filha ser independente nas atividades de vida diária, demonstra preocupação com a ocupação dela ao longo do dia, uma vez que não tem nenhuma atividade. Na entrevista inicial a sua motricidade apresentou-se livre, com uma postura expansiva e fácies expressivo. Manteve um contacto fácil e um humor eutímico. No que diz respeito às suas emoções e afetos, salienta-se alguma preocupação relacionada com ao facto da sua filha ponderar deixar a medicação. Não mencionando alterações das funções biológicas vitais, referiu alterações da memória recente. Mostrou interesse em adquirir alguns conhecimentos para “compreendê-la”, “o que fazer quando está com a crise…. Como é que devo lidar com a minha filha….”. Encontrando-se reformada ocupando o seu tempo na lida da casa, passeios com as amigas e ida à igreja. Referiu ainda que mantêm um relacionamento muito próximo com os filhos, no entanto com a filha mais nova surgem alguns conflitos e dificuldades em conseguir comunicar com ela. Com os restantes elementos da família refere manter um bom relacionamento. Com a evolução da intervenção, não foi evidente a mudança de atitude e comportamento da Sra. A., dado a que ela só participou em metade das sessões previstas, tendo sido observado uma crescente preocupação e ansiedade com a situação familiar. Relativamente aos resultados obtidos no questionário estes encontram-se descritos na figura 3.

Figura 3: Resultados obtidos no FQP - Caso C

Dos problemas familiares avaliados pelo FQP no caso C, observa-se que os valores obtidos na dimensão da sobrecarga objetiva aumentam um ponto depois da intervenção e que ocorre uma diminuição ligeira de dois pontos na sobrecarga subjetiva. 42 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Relativamente à dimensão da ajuda recebida, observase uma diminuição de dois pontos e no que diz respeito à dimensão da atitude positiva verifica-se uma diminuição em quatro pontos entre os dois momentos de avaliação. Observa-se ainda um aumento de um ponto a nível da dimensão do criticismo. Em síntese, a intervenção efetuada ao longo destas sessões, neste caso especifico apenas cinco, não mostrou ter causado impacto positivo, evidenciando-se apenas uma diminuição ligeira da sobrecarga subjetiva, tendo as outras dimensões sofrido alterações negativas. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS A utilização de uma intervenção psicoterapêutica e psicoeducacional em grupo possibilitou que os intervenientes para além de reconhecer no outro semelhanças com a sua situação, permitiu a expressão de sentimentos relativos a mesma bem como desenvolver estratégias para fazer face aos problemas do dia a dia. Estes resultados vão de encontro ao referido por Guimón (2002), Bateman, Brown e Pedder (2003), Bechelli e Santos, (2005) e Guerra e Lima (2005) que referem a importância da terapia de grupo neste aspeto, uma vez que os participantes podem mais facilmente descobrir como o seu comportamento e atitudes podem ser prejudiciais, permitindo ainda a comunicação e expressão de sentimentos que de outra forma não aconteceria. As primeiras sessões foram importantes para o estabelecimento da relação terapêutica, tendo sido apenas efetuado intervenções a nível da expressão emocional. Tal como referem Bateman et al. (2003, p. 156), “o terapeuta pode assim facilitar, explicar e interpretar numa primeira fase […] ajudar na criação de uma atmosfera terapêutica e na descoberta, pelo grupo, das soluções capacitadoras face às inevitáveis tentações que ele experimenta.” De salientar que os problemas identificados neste grupo foram de encontro ao descrito no enquadramento teórico deste capítulo, no entanto, o planeamento da intervenção deverá ser sempre direcionado para os participantes em questão de forma a usufruírem da intervenção na globalidade. No que diz respeito aos resultados obtidos ao nível dos problemas familiares e mais concretamente à dimensão da sobrecarga objetiva verifica-se uma diminuição nos casos A e B e um aumento ligeiro no caso C. Enquanto a nível da sobrecarga subjetiva verifica-se uma diminuição nos casos A e C e um aumento ligeiro no caso B. Tal como refere Borba et al. (2008), Brito (2006), Gonçalves-Pereira et al. (2006), Guedes (2008) e Jorge et al. (2008), a sobrecarga em familiares de pessoas com PMG é comum, sendo que as intervenções para famílias


em grupo podem diminuir os níveis da mesma. Nestes casos específicos verifica-se uma diminuição mais concreta a nível da sobrecarga objetiva relacionada com o impacto nas rotinas familiares, redução das atividades sociais e dificuldades financeiras. Relativamente à dimensão da ajuda recebida verifica-se a nível do caso A um aumento significativo no segundo momento de avaliação. É importante realçar que esta dimensão estando relacionada com ajuda fornecida pelos profissionais de saúde e rede social existente, foi uma necessidade evidenciada pela utente no início da intervenção e obtida ao longo da mesma, não só parte dos enfermeiros envolvidos na intervenção mas também pelos familiares da utente, tal como referido por esta em algumas sessões. Brito (2006) e Waidman et al. (2004) referem também a importância dos enfermeiros no desenvolvimento de intervenções de forma a ajudar os familiares a satisfazerem as suas necessidades e contribuir para a resolução de problemas. No que diz respeito ao caso B verificou-se apenas o aumento de um valor, sugerindo que a ajuda recebida percecionada por este utente não se alterou significativamente, de notar no entanto que já possuía antes da intervenção de uma rede de apoio a nível da saúde e de familiares a quem recorria com alguma frequência. No que se refere ao caso C mais concretamente houve uma diminuição de dois valores, sugerindo que a ajuda recebida ao longo da intervenção quer por parte dos profissionais de saúde quer pelos familiares não foi percecionada. De ressalvar que no final da intervenção a utente referiu algumas dificuldades em conseguir conciliar os horários da intervenção com as atividades domésticas, podendo também este facto ter contribuído para o agravamento, mesmo que ligeiro, da sobrecarga objetiva. Na dimensão da atitude positiva verifica uma melhoria significativa no caso A e B depois da intervenção, demonstrado que estes dois utentes se encontram mais satisfeitos com o seu familiar no que esse refere a cooperação deste com a família e reconhecem neles mais qualidades, indo de encontro ao descrito por Maldonado, Urízar e García (2009) que as intervenções psicoeducativas modificam as atitudes negativas relativas ao familiar com PMG. De salientar o caso B que considerou inicialmente que o filho não teria qualidades numa das sessões e onde se obteve mais alterações em termos de resultado quantitativo depois da intervenção comparativamente com os outros casos. No que se refere ao caso C, obteve-se uma diminuição da atitude positiva relativa à situação do familiar, destacando-se no entanto a sua ausência em várias sessões ao longo da intervenção.

Brito (2006) e Gonçalves-Pereira et al. (2006) referem que as intervenções familiares, partindo das necessidades e problemas das famílias, devem ter pelo menos seis semanas de duração. De facto a utente do caso C apenas esteve presente em cinco sessões e de forma descontinuada, sendo apenas possível deduzir que serão necessárias mais intervenções, no entanto de uma forma contínua no tempo, para que se possa avaliar a eficácia da mesma na utente ou se por outro lado se mantém os mesmos resultados. De facto a intervenção não tendo sido efetuada de uma forma contínua, não permitiu que a utente estabelece com os intervenientes uma relação terapêutica nem conseguisse identificar os seus problemas ou desenvolver estratégias de coping para conseguir solucionar os mesmos. Refletindo sobre os resultados obtidos no caso C e sabendo que existem variáveis que não foram controladas, poderemos questionar o efeito negativo desta intervenção em caso de descontinuidade quer pela falta do utente ou pelo profissional de saúde. Guimón (2002) refere que na terapia de grupo orientada para a ação, utilizando técnicas cognitivo comportamentais, é importante estabelecer o objetivo terapêutico de uma forma clara, para que se consiga estabelecer o limite temporal da intervenção. Sendo o utente uma parte ativa da intervenção e responsável pelo resultado da intervenção é fundamental que se mantenha a assiduidade às sessões de forma a obter benefícios, sendo também esta uma regra da terapia de grupo. Apesar de se ter efetuado uma sessão zero em que se procurou conhecer individualmente os participantes bem como as suas necessidades, pode ser necessário um período inicial de terapia individual a fim de se conhecer melhor os mesmos e a que estes usufruam mais significativamente deste tipo de intervenção. Boch e Aveline (1999) e Bateman et al. (2003) reconhecem a importância de uma intervenção inicial entre terapeuta e utente, de modo a que se motivem os participantes para o tratamento e se consiga planear adequadamente a intervenção de acordo com as características dos elementos. Relativamente aos resultados obtidos na dimensão do criticismo, esta relacionada com a satisfação da situação vivenciada e de se obter algo positivo apesar das condicionantes, verifica-se alterações pouco significativas nos três casos em estudo. Apenas no caso A se verifica uma diminuição de um valor, obtendo-se o inverso no caso C. Estes valores obtidos não vão de encontro ao referindo por Bandeira et al. (2007) e Campos (2009) que falam das repercussões positivas percecionadas ao conviver com uma pessoa com PMG tais como a satisfação e o desenvolvimento pessoal. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 43


CONCLUSÕES Através da análise e discussão dos resultados obtidos neste estudo podemos concluir que a intervenção efetuada em grupo com vista a avaliar o impacto ao nível da resolução de problemas familiares de pessoas com PMG contribuiu para a resolução de alguns problemas identificados pelos participantes, não tendo sido contudo evidente ao nível do caso C. Através das técnicas utilizadas em grupo foi possível que os familiares identificassem as suas necessidades e problemas atuais, tendo sido útil na promoção da resolução de alguns problemas destes familiares de pessoas com PMG. Permitiu ainda a aproximação destes utentes aos cuidados de saúde, estabelecimento de uma rede de ajuda e interação entre alguns elementos, identificação de estratégias de como atuar perante os problemas, diminuição da sobrecarga e promoção do bem-estar. O número de sessões efetuadas bem como a amostra reduzida constituem limitações do estudo na medida em que com um maior número de sessões e de participantes se poderá chegar a resultados mais credíveis, apesar daqueles que se obtiveram indicarem que esta intervenção poderá ser uma opção. O instrumento utilizado na avaliação dos problemas familiares revelou-se útil na medida em que permitiu identificálos e reconhece-los nos elementos em estudo, no entanto poderia ter sido utilizado um instrumento que permitisse avaliar mais concretamente a comunicação em família, uma vez que este foi um dos problemas identificados pelos três casos. A realização deste estudo evidenciou assim importância deste tipo de intervenção na resolução de problemas de familiares de pessoas com PMG, não só pelos resultados obtidos da aplicação das escalas de avaliação, mas também pelo comportamento e verbalização dos utentes. Foi também o ponto de partida, para que na unidade de saúde onde decorreu se continuasse a desenvolver este tipo de intervenção com características semelhantes. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Bandeira, M., & Barroso, S. (2005). Sobrecarga das famílias de pacientes psiquiátricos. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 54 (1), 34-46. Bandeira, M., Barroso, S., & Nascimento, E. (2007). Sobrecarga de familiares de pacientes psiquiátricos atendidos na rede pública. Revista de Psiquiatria Clínica, 34 (6), 270-277. Bateman, A., Brown, D., & Pedder, J. (2003). Princípios e prática das psicoterapias (2ª ed.). Lisboa: Climepsi Editores. Bechelli, L., & Santos, M. (2004). Psicoterapia de grupo: como surgiu e evoluiu. Revista Latino Americana de Enfermagem, 12, 242-249. 44 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

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IMPACTO DA PSICOTERAPIA DE GRUPO EM DOENTES ALCOÓLICOS RELATIVAMENTE À AUTO-ESTIMA E CONTROLO DO CRAVING | Manuel Brandão1; Celso Silva2; |

RESUMO A Unidade de Tratamento e Recuperação de Alcoólicos (U.T.R.A.) de Portalegre foi o recurso organizacional proposto para a execução do projecto apresentado. Esta Unidade funciona nas instalações do Serviço de Psiquiatria Agudos do Departamento de Saúde Mental e Psiquiatria do Hospital Doutor José Maria Grande de Portalegre. Esta Unidade destina-se a indivíduos a partir dos 18 anos, de ambos os sexos, que residem no distrito de Portalegre O estudo científico que aqui se apresenta pretendeu estudar o impacto da abordagem psicoterapêutica em relação a duas dimensões que julgamos essenciais no tratamento e recuperação dos doentes alcoólicos, designadamente, a auto-estima e o craving. Optou-se pela realização de um estudo do tipo exploratório, descritivo-analítico e longitudinal, utilizando uma abordagem quantitativa. Utilizámos neste estudo uma amostra por conveniência, tendo sido utilizada a escala de Auto-estima de Rosenberg para avaliar o nível de auto-estima da pessoa. Foi também utilizada a escala Penn Alcohol Craving Scale (PACS), com o intuito de avaliar o controlo do craving por parte dos sujeitos de estudo. Ambas as escalas são questionários de auto-administração e foram distribuídas, a todos os sujeitos, ao mesmo tempo antes do início da 1ª sessão, no final da 3ª e no final da 6ª sessão. Assim nas amostras emparelhadas relacionando a auto-estima e o craving, foi possível encontrar diferenças estatisticamente significativas nos diferentes momentos de pesquisa. Este aspecto indica-nos a existência clara de diferenças estatisticamente significativas entre a auto-estima e o craving nos três momentos de pesquisa efectuados. Este facto, conjugado com as alterações de médias encontradas, indica-nos que a intervenção psicoterapêutica efectuada contribuiu de forma determinante para essas mesmas alterações estatísticas encontradas. Evidencia-se, assim, claros ganhos em saúde, para os indivíduos pertencentes à amostra, relativamente ao controle do craving e ao aumento da auto-estima o que são elementos fundamentais para a manutenção da abstinência alcoólica.

PALAVRAS-CHAVE: Alcoolismo; Craving; Autoestima; Psicoterapia ABSTRACT The Unit of Treatment and Rehabilitation of Alcoholics (UTRA) in Portalegre was the organizational resource proposed for the project presented. This unit works on the premises of Acute Psychiatry Service of the Department of Mental Health and Psychiatry, Hospital Dr. José Maria Grande Portalegre. This unit is intended for individuals from 18 years of both genders, living in the Portalegre district. The scientific study presented here aims to study the impact of psychotherapeutic approach in relation to two dimensions that we consider essential in the treatment and recovery of alcoholism, namely, self-esteem and craving. We chose to conduct an exploratory, descriptive, analytical and longitudinal study, using a quantitative approach. In this study we have used a convenience sample. The Rosenberg SelfEsteem scale was used to assess the level of self-esteem of the person. It was also used the Penn Alcohol Craving Scale (PACS), in order to evaluate the control of craving by the study subjects. Both scales are self-administered questionnaires and were distributed to all at the same time before the start of a session at the end of 3rd and 6th session. So, in a paired relationship between self-esteem and craving, it was possible to find statistically significant differences in the different moments of research. This gives us the clear existence of statistically significant differences between self-esteem and craving in research carried out three times, which coupled with changes in mean values indicates that the psychotherapeutic intervention made a decisive contribution to these same statistical changes found, clearly showing health gains for individuals belonging to the sample, in relation to craving control, and increased self-esteem that are fundamental to the maintenance of alcohol abstinence. KEYWORDS: Alcoholism; Craving; Self-esteem; Psychotherapy

1 Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Departamento de Saúde Mental e Psiquiatria do Hospital Doutor José Maria Grande de Portalegre, quintadobacelo@sapo.pt 2 Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria, Mestre em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiatria, Departamento de Saúde Mental e Psiquiatria do Hospital Doutor José Maria Grande de Portalegre, celsosilva30@gmail.com Submetido em: 10-04-2012 – Aceite em 20-10-2012 Citação: Brandão, M., & Silva, C. (2012). Impacto da psicoterapia de grupo em doentes alcoólicos relativamente à auto-estima e controlo do craving. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 45-51 Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 45


INTRODUÇÃO O consumo de álcool é um facto amplamente aceite pela sociedade. Quando o seu consumo se torna excessivo, transforma-se num problema relevante que envolve consequências sérias e o coloca entre um dos principais problemas de saúde pública actuais. O álcool é das substâncias psicoactivas mais consumidas no mundo e aquela que provoca mais graves consequências para a saúde pública, sendo actualmente considerado como o principal determinante de saúde relacionado com os estilos de vida (Babor, 2009). A Organização Mundial de Saúde (OMS) define a expressão Problemas Ligados ao Álcool (PLA) para nomear as consequências nocivas do consumo de álcool, que atingem não só o indivíduo, mas também a família e a comunidade em geral. Uma perspectiva alargada do risco do álcool e da doença alcoólica, nas suas múltiplas repercussões e incapacidades, atingindo diferentes grupos e estendendo-se aos mais variados campos e sectores, tem obviamente vindo a engrossar o vasto leque dos PLA, cuja tipologia poderá ser esquematizada (Mello et al., 2001): Problemas ligados ao álcool no Indivíduo: efeitos episódicos agudos de um forte consumo de álcool, consequências de um consumo excessivo e prolongado de álcool, efeitos de um consumo de álcool em determinadas circunstâncias (ex: gravidez, aleitamento e menoridade); Problemas ligados ao Álcool, na Família do bebedor: perturbação da família e do lar do alcoólico, a descendência do alcoólico – crianças “filhas de alcoólicos” e suas perturbações; Problemas ligados ao Álcool, no Trabalho: diminuição de rendimento laboral, aumento do absentismo e de acidentes, reformas prematuras; Problemas ligados ao Álcool, na Comunidade: perturbações nas relações sociais e da ordem pública, delitos, actos violentos, criminalidade, desemprego, degradação da saúde e do nível de vida e bemestar da comunidade, e, acidentes de viação. O Plano Nacional Contra o Alcoolismo (2002) expõe que o álcool é a maior toxicodependência dos Portugueses. Não sendo uma substância ilegal, e sendo a sua ingestão um hábito e para alguns uma necessidade social, a dependência do álcool já se tornou um problema grave no nosso país. Ainda que nem todos os consumidores venham a sofrer os problemas persistentes e graves relacionados com o álcool, ou seja, Alcoolismo, não nos podemos esquecer que o álcool é a substância psicoactiva lícita de abuso mais consumida em Portugal: aproximadamente 1.8 milhões de portugueses são bebedores excessivos ou doentes alcoólicos crónicos, segundo dados do Relatório da Organização Mundial de Saúde (2005). Com uma prevalência e incidência tão 46 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

significativa como aquela que estes estudos nacionais e internacionais demonstram, urge a necessidade de uma resposta efectiva, quando a saúde mental não prevalece perante as adversidades da vida, como acontece no caso do Alcoolismo. A Unidade de Tratamento e Recuperação de Alcoólicos (U.T.R.A.) de Portalegre é o recurso organizacional proposto para a execução do projecto apresentado. Esta Unidade funciona nas instalações do Serviço de Psiquiatria Agudos do Departamento de Saúde Mental e Psiquiatria do Hospital Doutor José Maria Grande de Portalegre, que integra a Unidade Local de Saúde do Norte Alentejano, E.P.E. (ULSNA). A ULSNA engloba os Agrupamentos dos Centros de Saúde de Elvas e Portalegre e os Hospitais de Santa Luzia de Elvas e Doutor José Maria Grande em Portalegre. Esta Unidade destina-se a indivíduos a partir dos 18 anos, de ambos os sexos, que residem no distrito de Portalegre. A U.T.R.A. é constituída por elementos do Departamento de Psiquiatria, uma equipa multidisciplinar composta por um Médico Psiquiatra, um Enfermeiro Especialista em Saúde Mental, uma Enfermeira Graduada, uma Terapeuta Ocupacional, uma Técnica Superior de Serviço Social, que desenvolvem actividades específicas com os doentes com problemas ligados ao álcool. O tratamento do doente alcoólico em internamento hospitalar está a cargo de toda a equipa multidisciplinar do Serviço de Psiquiatria Agudos. Estes indivíduos são referenciados pelos médicos de família, outras instituições ou serviços, nomeadamente o Serviço de Urgência, por iniciativa própria, ou respectiva família. Para que se dê a admissão, o individuo passa primeiramente pela Consulta Externa do Serviço de Psiquiatria Agudos, onde o Enfermeiro ou Assistente Social realizam uma entrevista inicial e posteriormente é o Psiquiatra que analisa e encaminha para o tratamento, que segundo a condição médica, aditiva, mental, relações interpessoais, suporte familiar e financeiro e problemas legais do indivíduo, determina em concordância com este, se o tratamento se iniciará em contexto de internamento ou de domicílio. Aquando da admissão do doente alcoólico para tratamento em internamento Hospitalar, é seleccionado após reunião da equipa, um Enfermeiro responsável, que desempenha o papel de tutor, e que faz o acompanhamento do doente de acordo com as suas necessidades. O tratamento de alcoólicos em internamento hospitalar neste serviço tem uma duração de duas a três semanas, dependendo da condição do doente e evolução clínica. As sessões de terapia de grupo da Unidade de Tratamento e Recuperação de Alcoólicos de Portalegre


atendem grupos de indivíduos de ambos os sexos (entre cinco a dez pessoas, por sessão) que vêm do serviço de internamento, consultas externas, entre outros; em sessões semanais, com a intervenção autónoma da inteira responsabilidade do Enfermeiro Especialista em Saúde Mental e Psiquiatria com formação especifica na área o que o torna elemento fundamental em todo o processo terapêutico sendo que esta actividade se enquadra perfeitamente nas suas competências especificas decorrente do Regulamento n.º 129/2011 publicado no Diário da República, 2º série de 18 de Fevereiro de 2011, dessas competências especificas realça-se “prestar cuidados de âmbito psicoterapêutico, socioterapêutico, psicoeducacional, à pessoa ao longo do ciclo de vida mobilizando o contexto e dinâmica individual, familiar de grupo ou comunitário, de forma a melhorar e recuperar a saúde”. Essas sessões psicoterapeutas seguem um esquema já instituindo desde 2000, tendo por base a abordagem seguida no Centro Regional de Alcoologia de Coimbra Maria Lucília Mercês de Mello e como base os critérios da DSM-IV-TR para o grupo “Abuso de substâncias“ Ao longo de 6 sessões são abordadas temáticas de forma sequencial, recorrendo ao apoio de meios visuais como de instrumento de trabalho. As primeiras sessões abordam os conteúdos que constam no quadro 1. Quadro 1: Sessões Iniciais da UTRA

Sessão

Tema

Tipo de Intervenção

Terapeuta

1

Acolhimento - Apresentação da equipa, significado da sigla, objectivos, o porquê da terapia em grupo, regras de funcionamento do grupo, quem está e porquê, contrato terapêutico, consulta Alcoolismo o que é? ””Estrada do álcool” importância do alcoolismo como doença crónica;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

2

Bebidas alcoólicas e outras, percentagem e tipos de álcool, o álcool e o organismo (absorção). Taxa de alcoolemia. Perturbações físicas, perturbações neurológicas e psiquiátricas;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

3

Implicações: na família, no trabalho, na sociedade;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

4

Falsos conceitos o que são; o álcool ajuda a digestão? O álcool é remédio?;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

5

O álcool aquece? O álcool mata a sede? O álcool dá força?;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

6

O álcool ajuda a conviver? O álcool/sexualidade. Reflexão;

Psicoeducação e Psicoterapia

Enf.º Especialista em Saúde Mental

Na segunda parte de cada sessão são esclarecidas dúvidas e efectuada a análise individual dos problemas de cada elemento das suas dificuldades em lidar com esses problemas, assim como a forma de os tentar ultrapassar sempre, com o contributo de todos os elementos do grupo. As seis sessões referidas anteriormente são parte integrante do esquema de terapia de grupo, que dura aproximadamente 3 anos.

O estudo que aqui se apresenta pretende estudar o impacto da abordagem psicoterapêutica anteriormente referida em relação a duas dimensões que julgamos essenciais no tratamento e recuperação dos doentes alcoólicos, designadamente, a auto-estima e o craving. O craving define-se como um desejo irreprimível, com uma componente obsessivo e compulsivo, que se introduz nos pensamentos de quem abusa do álcool. Vários modelos teóricos têm tentado explicar de um modo holístico a sensação de craving. O modelo neurobiológico do craving põe em destaque a activação dos processos de reforço, com substrato neuroanatómico na via dopaminérgica mesocorticolimbica e em áreas adjacentes como, a área tegmental ventral, o núcleo de accumbens, o cortéx frontal e a amígdala (Kelley, & Berridge, 2002; Roberts, & Koob, 1997). Por exemplo, estímulos (memórias) relacionados com o consumo de álcool podem activar o centro de recompensa e compelir o indivíduo a experienciar craving. Na perspectiva de Tiffany (1990), o craving apenas emerge quando a pessoa está impedida de aceder ao álcool, ou quando em consciência tenta suprimir o consumo de tal substância (Pombo, 2008). A auto-estima segundo o criador, da escala utilizada, Rosenberg (1965) é uma atitude positiva ou negativa que o indivíduo apresenta em relação a si próprio. Este conceito representa a capacidade que um individuo tem de confiar em si próprio, de se sentir capaz de poder enfrentar os desafios da vida, expressando de forma adequada para si e para os outros as próprias necessidades e desejos. Traduz uma auto-avaliação que tem por base o nível emocional e comportamental de cada indivíduo. Estudos efectuados correlacionam uma auto-estima elevada com a sua aceitação do mundo, assim como com a sua vontade pessoal de cooperar para os interesses do grupo ou comunidade na qual se encontra inserido. Porém, um individuo com uma baixa autoestima, é um indivíduo que não pretende cooperar com o grupo ou comunidade no qual se encontra inserido, apresentando medo da sua própria existência, manifestando uma atitude comunicacional agressiva no sentido de se enaltecer e manter a sua necessidade de superioridade permanente. Neste sentido, uma auto-estima alta ou baixa, irá ser determinada por uma adaptação/evitamento que constituem a base de uma auto-aceitação adequada (André, & Lelrod, 2000). Para André e Lelord (2000) a formação da auto-estima é determinada pela auto-percepção que cada indivíduo faz de si próprio, assim como pelos comportamentos adoptados, que serão observados e avaliados pelos outros com os quais se relacionam. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 47


Assim sendo, uma auto-estima adequada caracteriza-se por um bom desenvolvimento psicológico, bem como pela ausência de problemas de saúde mental, todavia, uma auto-estima baixa, encontra-se associada a problemas de saúde mental, tais como depressões, ansiedade patológica, insatisfação com a vida e comportamentos aditivos (Castelo-Branco, 2001). MATERIAIS E MÉTODOS Através de algum contacto diário com a realidade dos doentes com problemas de álcool e tudo o que estas acarretam para o seu portador e para quem o rodeia, a após uma leitura diversificada dos estudos efectuados anteriormente surgem questões, que reportam a base deste estudo neste sentido interessa responder à seguinte questão de investigação. - Será que a psicoterapia de grupo em doentes com problemas ligados ao álcool aumenta a auto-estima e o controlo do craving? Após a abordagem conceptual efectuada no sentido de compreender de forma mais aprofundada a problemática em estudo, definiu-se como principal objectivo de estudo avaliar o impacto da psicoterapia de grupo em doentes com problemas ligados ao álcool nas dimensões auto-estima e controlo do craving. Para alcançar o objectivo central do estudo definido, foram determinados objectivos específicos: 1. Identificar os diferentes níveis de auto-estima dos doentes com problemas de álcool; 2. Identificar os diferentes níveis de controlo do craving dos doentes com problemas de álcool; Não tendo como objectivo proceder a generalizações dos resultados, mas sim compreender em profundidade e pelo contacto directo a situação e o contexto de uma determinada realidade, optou-se pela realização de um estudo de tipo exploratório, descritivo, inferencial e longitudinal, utilizando uma abordagem quantitativa (Hill, & Hill, 2000). Considerou-se de tipo exploratório porque se procurou analisar uma realidade específica, através dos relatos dos actores intervenientes, para conhecer as suas concepções e posturas face ao fenómeno em estudo, as influências contextuais e as formas como condicionam e podem ser condicionadas pelas estratégias definidas pelos mesmos. Caracterizou-se como um estudo longitudinal devido ao facto dos procedimentos efectuados para a recolha de dados terem decorrido num momento temporal específico (Richardson, 1989), possibilitando a descrição do fenómeno em estudo pelos sujeitos prédeterminados, nesse dado período. Trata-se de uma pesquisa do tipo investigação aplicada, longitudinal, na 48 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

medida em que se prolonga num determinado espaço de tempo, a realizada de 19 de Abril de 2011 a 24 de Maio de 2011, existindo seis momentos de intervenção e três colheitas de dados. Trata-se ainda de um estudo descritivo na medida em que pretende-se descrever as relações existentes entre as variáveis em estudo. A Escala de Craving pelo Álcool de Penn (Penn Alcohol Craving Scale), foi desenvolvida por Flannery et al. (1999). Trata-se de uma escala multi-item unifactorial, auto-administrada de forma bastante breve, constituída por cinco questões. As três primeiras questões dizem respeito à frequência, intensidade e duração dos pensamentos acerca do consumo do álcool. A quarta questão pede ao sujeito que registe a sua capacidade de resistir ao consumo de bebidas alcoólicas, quando estas estão disponíveis, e, a questão final (5ª questão) pede ao sujeito que avalie o nível médio de craving que experienciou durante a semana precedente. Esta escala foi validada para a população portuguesa em 2008 No artigo de introdução da escala, esta apresentou boas qualidades psicométricas de fiabilidade (α Cronbach = 0.92) e validade concorrente, discriminante e preditiva (Flannery et al.,1999; Pombo et al., 2008). A escala de auto-estima de Rosenberg foi elaborada por Rosenberg em 1965, sendo actualmente um dos instrumentos mais aceites pela comunidade científica para medir este constructo de natureza psicológica, a autoestima. Interessa a este nível salientar que o autor refere que valores encontrados no instrumento de medida por si elaborado que indiciam uma elevada auto-estima, não traduzem o sentimento do indivíduo de se sentir necessariamente superior aos seus pares, porém um indivíduo com valores elevados neste instrumento de medida, indicam segundo o autor que o esse indivíduo reconhece as suas limitações pessoais, no sentido de poder melhorá-las, e, eventualmente até mesmo modificá-las. Dentro destas ideias, no estudo original efectuado por Rosenberg para a elaboração do seu instrumento de medida, utilizou uma amostra constituída por 5000 adolescentes, em que o autor procurou construir uma medida unidimensional do auto-conceito geral que chamou de auto-estima. Nesta medida, o autor utilizou uma escala do tipo Guttman, com número idêntico de itens positivos e negativos, com o intuito de controlar a tendência do sujeito para a concordância. A adaptação deste instrumento de medida para a população portuguesa foi efectuada por Seco (1991), utilizando a escala original elaborada por Rosenberg com quatro opções de resposta, constituída por dez itens


(cinco de formulação positiva e cinco de formulação negativa), sendo possível obter uma cotação máxima de 60 pontos e mínima de dez pontos. O valor de consistência interna do estudo de adaptação do instrumento de medida à população portuguesa, avaliado através do valor de α Cronbach foi de 0.84, traduzindo um índice de fidelidade adequado, optando a investigador por manter a escala adaptada à população portuguesa, idêntica à escala na sua versão original (Seco, 2000). A amostra compreendeu 6 indivíduos do sexo masculino dependentes do álcool. A idade varia entre os 39 e os 54 anos, com uma média de 47,67 anos, sendo a sua raça caucasiana (100%). No que se refere ao estado civil, 50,0% são casados, 16,7% são solteiros e 33,3% divorciados. A escolaridade varia entre os quatro e os 12, com uma média de 6,6 anos. Todos os sujeitos do estudo tiveram o primeiro contacto com o álcool com idade inferior aos 10 anos, tendo a imoderação iniciado com uma média de 33,33 anos. No respeitante à profissão 50,0% estão desempregados Três indivíduos (50,0 %) já estiveram internados por alcoolismo Os indivíduos que compõem a amostra, são utentes dependentes do álcool, de acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2004), em seguimento em grupos psicoterapêuticos, na Unidade de Tratamento e Recuperação de Alcoólicos do Hospital Doutor José Maria Grande em Portalegre. Os dados recolhidas através de questionários auto-administrados, no inicio do programa psicoterapêutico da UTRA, após 3 sessões e após 6 sessões foram analisados através de estatística inferencial e descritiva no programa informático SPSS® (Statistical Package for the Social Sciences) versão 18.0 para Windows.

do questionário, foi explicado aos utentes pelo investigador, qual o objectivo da recolha de dados, bem como o âmbito no qual estava inserido e que os dados não seriam usados para outro fim. Garantiu-se o anonimato e declarou-se a não obrigatoriedade de resposta ao questionário, foi entregue formulário para consentimento informado e solicitado ao Concelho de Administração de Unidade Local Do Norte Alentejano autorização para desenvolver estudo. APRESENTAÇÃO E ANALISE DE DADOS Devido ao tamanho da amostra, 6 utentes, e às características das variáveis em estudo, efectuou-se a aplicação de testes não paramétricos que corroboram na questão enunciada: A psicoterapia de grupo em doentes com problemas ligados ao álcool aumenta a auto-estima e o controlo do craving. A análise descritiva das médias da auto-estima e do craving na primeira aplicação dos instrumento (anterior à intervenção), permitiu verificar que a média global da auto-estima era de 29, enquanto que a do craving era de 15.17. A mesma análise descritiva efectuada às médias globais da auto-estima e do craving efectuada no terceiro momento, ou seja após a intervenção preconizada no estudo em causa, permitiu verificar que comparativamente às médias obtidas no primeiro momento, a média global de auto-estima aumentou para 43.67. enquanto que a do craving desceu para 6.33. No quadro 2 podemos verificar a evolução das médias nos três momentos de aplicação das escalas sendo que o segundo momento nos reforça as conclusões este serviu para avaliação intermédia do processo. Quadro 2: Análise descritiva das médias da auto-estima e do craving no primeiro, segundo e terceiro momento de estudo

1º Momento

3º Momento

N

Média

Desvio padrão

Média

Desvio padrão

Média

Desvio padrão

Auto-estima

6

29,00

5,621

36,34

5,537

43,67

4,082

Craving

6

15,17

8,773

11,50

8,068

6,33

4,589

PROCEDIMENTOS DE NATUREZA ÉTICA Como sabemos que existem aspectos éticos e deontológicos que importam respeitar durante a realização de um estudo, pois “Qualquer investigação efectuada junto de seres humanos levanta questões morais e éticas” (Fortin, 1999, p. 113), optou-se por salvaguardar a confidencialidade do ambiente organizacional, bem como, dos participantes no estudo, esperando assim não gerar qualquer impacto ético-social no seio da instituição. No momento da recolha de dados e para que as respostas de cada utente não fossem influenciadas pela opinião dos colegas, optámos por reunir todos os utentes num único espaço, distribuindo o questionário a todos ao mesmo tempo antes do inicio da 1ª sessão, no final da 3ª e no final da 6ª sessão. Antes de iniciarem o preenchimento

2º Momento

Em termos de análise, e em função do tamanho da amostra foi aplicado um teste estatístico não-paramétrico, teste de Wilcoxon (signed-ranks) para a mediana μ de uma amostra ou para comparação de duas amostras emparelhadas. Assim as amostras emparelhadas a relação entre a auto-estima e o craving, testes estatísticos inferenciais efectuados posteriormente, apresentam resultados, os quais podem ser observados no quadro 3, em que pelos valores estatísticos encontrados nos três momentos de estudo foi possível encontrar valores estatisticamente significativos nos diferentes momentos de pesquisa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 49


Este aspecto indica-nos a existência clara de diferenças estatisticamente significativas entre a auto-estima e o craving nos três momentos de pesquisa efectuados, o que conjugados com as alterações de médias encontradas, indicam-nos que a intervenção psicoterapêutica efectuada contribuiu de forma determinante para essas mesmas alterações estatísticas encontradas. Quadro 3: Análise inferencial da relação entre a auto-estima e o craving

Craving Momento 3 – Craving Momento 1

Craving Momento 2 – Craving Momento 1

Craving Momento 3 Craving Momento 2

Auto-estima Momento 3 - Auto-estima Momento 1

Auto-estima Momento 2 - Auto-estima Momento 1

Auto-estima Momento 3- Auto-estima Momento 2

N

Média das ordens

Ordens negativas

6

3,50

Ordens Positivas

0

0,00

Empates

0

Total

6

Ordens negativas

6

3,50

Ordens Positivas

0

0,00

Empates

0

Total

6

Ordens negativas

5

3,00

Ordens Positivas

0

0,00

Empates

1

Total

6

Ordens negativas

0

0,00

Ordens Positivas

6

3,50

Empates

0

Total

6

Ordens negativas

0

0,00

Ordens Positivas

6

3,50

Empates

0

Total

6

Ordens negativas

0

0,00

Ordens Positivas

6

3,50

Empates

0

Total

6

Z

p

-2,207

0,027*

-2,214

0,027*

-2,041

0,041*

-2,207

0,027*

-2,214

0,027*

-2,207

0,027*

* Estatisticamente significativos (p ≤ 0,05)

DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Verificámos através da evolução descritiva das médias nos diferentes momentos de intervenção que a média da auto-estima no primeiro momento de intervenção, assim como a do craving foram significativamente diferentes no último momento de intervenção. Nesta medida, enquanto a média da auto-estima subiu de forma acentuada, a do craving verificou uma redução. Esta evolução estatística das médias encontradas, permite-nos afirmar, com os devidos cuidados metodológicos, que existiu uma variável que contribuiu para a alteração das médias encontradas e que assume a responsabilidade pelas diferenças verificadas. Podemos afirmar assim, que a intervenção psicoterapêutica efectuada no estudo que aqui se apresenta é particularmente pertinente na melhoria da auto-estima dos doentes com problemas alcoólicos, pois como as análises estatísticas 50 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

efectuadas demonstram, ao fomentar a sua auto-estima, auto-estima esta que neste tipo de doentes frequentemente encontra-se em valores muito reduzidos como se verificou pela média obtida no primeiro momento de pesquisa, contribuímos para a redução do craving, fazendo com que estes doentes sejam capazes de forma mais precoce deixar o consumo do álcool. Estas ideias estão de acordo com estudos anteriormente efectuados e que suportam os resultados encontrados no nosso estudo. Assim sendo, um estudo efectuado por Maldonado et al. (2008) em que os investigadores estudaram a auto-estima e auto-eficácia nos adolescentes de uma área urbana do México, permitiu verificar a existência de uma correlação estatisticamente significativa entre o consumo de substâncias alcoólicas e a autoestima dos sujeitos de estudo, sendo que quando a autoestima aumentava o consumo de substâncias alcoólicas tendia a diminuir. Também um estudo de Pombo, Ismail e Cardoso (2008) em que os investigadores procuraram estudar a relação existente entre a existência de sintomatologia negativa e o consumo de álcool, permitiu-lhes verificar que quando os sujeitos de estudo vivenciavam mais afectos de natureza negativa, tais como a ansiedade, a depressão e a agressividade, tendiam a consumir álcool como forma de atenuar esses mesmos sentimentos de natureza negativa. Os resultados aqui encontrados também se relacionam com o nosso estudo, na medida em que a diminuição da sensação de bem-estar, nomeadamente a auto-estima dos sujeitos de estudo utilizados no nosso estudo, tendia ao aumento da sua necessidade de consumir álcool como forma de resposta negativa e não proactiva a essa mesma diminuição da sua auto-estima. Um outro estudo que nos parece pertinente e que confirma os resultados por nós encontrados refere-se à investigação efectuada por Araújo et al. (2004) em que os investigadores procuraram compreender a influência de imagens mentais no consumo de álcool, tendo verificado a existência de uma relação positiva entre a disponibilização dessas mesmas imagens e o aumento do desejo de consumir. Os investigadores verificaram também um aumento da pontuação na escala do craving na fase em que os sujeitos de estudo se encontravam a consumir, comparativamente à fase em que encontravam-se em abstinência, encontrando diferenças estatisticamente significativas entre elas. Nesta medida, os mesmos investigadores referem que existe a necessidade de desenvolver estratégias de promoção da abstinência do álcool nos sujeitos de estudo, sobretudo a nível de prevenção primária. Nesta medida, pensamos que a intervenção por nós delineada assume-se como particularmente importante, vindo na linha de pensamento


de Araújo et al. (2004) como uma estratégia proactiva na promoção da abstinência deste tipo de doentes, assim como na diminuição do craving, como os resultados estatísticos encontrados demonstram. Em função do tamanho e do tipo de amostra não podemos inferir que estes resultados sejam extensíveis a toda a população, sendo essa uma limitação do estudo no entanto evidenciado claramente ganhos em saúde sensíveis aos cuidados de Enfermagem, para os indivíduos pertencentes à amostra, relativamente ao controle do craving e ao aumento da auto-estima o que são elementos fundamentais para a manutenção da abstinência alcoólica, sendo assim sugere-se que este tipo de intervenção, junto dos utentes alcoólicos, seja mantida e possivelmente alargada É de salientar que este tipo de intervenção psicoterapeuta foi efectuada por um Enfermeiro Especialista em Saúde Mental com formação específica na área o que o torna elemento fundamental em todo o processo terapêutico e que se enquadra perfeitamente nas suas competências específicas decorrentes do Regulamento n.º 129/2011 publicado no Diário da República, 2º série de 18 de Fevereiro de 2011. Sendo que destas se destaca a prestação de cuidados de âmbito psicoterapêutico, socioterapêutico, psicoeducacional, à pessoa ao longo do ciclo de vida mobilizando o contexto e dinâmica individual, familiar de grupo ou comunitário, de forma a melhorar e recuperar a saúde. BIBLIOGRAFIA American Psychiatric Association (2004). DSM-IV-TR - Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais. André, C., & Lelord, F. (2000). A auto-estima: aprender a gostar de si para melhor viver com os outros. Lisboa: Editorial Presença.

Araújo, R., Oliveira, M. S., Nunes, M. L., Piccoloto, L. B., & Melo, W. V. (2004). A avaliação do craving em alcoolistas na síndrome de abstinência. Psico-USF, 9(1). Babor, Thomas (2009). Álcool: bem de consumo sui generis: resumo do relatório da OMS. Revista Toxicodependências, 15(1), 77-86. Castelo-Branco, M. (2001). A auto-estima, a satisfação com a imagem corporal e o bem-estar docente. Psicologia da educação e da cultura, 5 (2), 335-346. Decreto-Lei nº 9/2002. Diário da República I Série. A nº 20 (2002-01-24), 483-486. Fortin, Marie-Fabienne (1999). O processo de Investigação: Da concepção à realização. Loures: Lusociência. Hill, M. M., & Hill, A. (2002). Investigação por questionário. Lisboa: Edições Silabo. Maldonado, R., Pedrão, L. J., Castillo, M. M., García, K. S., & Rodríguez, N. N. (2008). Auto-estima, autoeficácia percebida, consumo de tabaco e álcool entre estudantes do ensino fundamental, das áreas urbana e rural, de Monterrey, Nuevo León, México. Revista Latino-Americana de Enfermagem. Mello, M. L., Barrias, J. C., & Breda, J. J. (2001). Álcool e Problemas Ligados ao Álcool em Portugal. Lisboa: Direcção-Geral da Saúde (DGS). Pombo, S., Ismail, F., & Cardoso, J.M. (2008). Cravers pelo álcool. Psicologia, Saúde & Doenças, 9(2), 349-365. Acedido em http://www.scielo.oces. mctes.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S164500862008000200012&lng=pt&nrm=iso Richardson, R. J. (1989). Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas. Seco, G. (1991). O auto-conceito escolar em educadores de infância: um estudo transversal. Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação. Tese de mestrado não publicada.

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DIAGNÓSTICOS E INTERVENÇÕES DE ENFERMAGEM CENTRADAS NO PROCESSO FAMILIAR DA PESSOA COM ESQUIZOFRENIA | José Carlos Carvalho1 |

RESUMO Considerando a evidência sobre os doentes com esquizofrenia que têm filhos, e a experiência acumulada pelo estudo de investigação sobre a esquizofrenia na família e repercussões nos filhos e cônjuges, do presente estudo emerge um conjunto de resultados potenciadores de informação útil para enfermeiros de saúde mental no que concerne a diagnóstico, critérios de resultado e intervenções, contribuindo para uma abordagem mais eficaz ao processo familiar, na atenção ao doente com esquizofrenia. PALAVRAS-CHAVE: Esquizofrenia; Família; Enfermagem; Processo Familiar. ABSTRACT Considering the evidence on patients with schizophrenia who have children, and the experience gathered by the research held on schizophrenia in the family and its impact on children and spouses, from the present study emerges a set of results enhancers of useful information for mental health nurses, regarding diagnosis, interventions and outcomes criteria, contributing to a more effective approach to the family process focusing on the patient with schizophrenia. KEYWORDS: Schizophrenia; Family; Nursing; Family Process É crescente a preocupação dos profissionais de saúde com a saúde mental. Os enfermeiros têm um papel fundamental na reabilitação das pessoas com perturbações psiquiátricas, sendo que, para tal, é necessária uma maior sensibilização nesta área, já defendida no Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 (Portugal, 2008). Este estudo aborda, de forma multidisciplinar, temáticas de saúde mental, ciências médicas, enfermagem e comportamento, contribuindo para uma compreensão mais global da questão do processo familiar e saúde mental e onde o mais importante não será delimitar áreas de intervenção de cada profissional de saúde mental, mas sim compreender e potenciar a sua complementaridade.

No entanto e apesar da complementaridade, na prática de enfermagem, revela-se cada vez mais importante o investimento numa área de conhecimentos próprios, que permita aos profissionais de enfermagem tomarem decisões autónomas (Carpenito-Moyet, 2009). A identificação dos focos de atenção, a definição dos diagnósticos de enfermagem e consequentes intervenções autónomas, são umas das ferramentas mais importantes para a enfermagem enquanto profissão. Assim, esta investigação visou o estudo do doente e da sua família, focalizou-se nos doentes com esquizofrenia que têm filhos e, de entre destes, aqueles que mantêm contacto com eles. Um dos nossos objetivos centrou-se na contribuição para o melhor conhecimento das características e necessidades destas famílias, podendo contribuir para a definição de possíveis estratégias de intervenção no doente/família. O conhecimento das características da família é fundamental, uma vez que cada uma tem as suas especificidades e singularidades, pelo que as abordagens devem ter em conta aspetos do desenvolvimento da família, do estado do doente, da doença, da idade dos filhos, entre outros. No tratamento da pessoa com esquizofrenia, é vital haver uma continuidade dos cuidados, para que seja possível uma gestão eficaz ao regime terapêutico e consequente reabilitação e integração do doente na sociedade, sendo fundamentais as redes de suporte em que a família pode ser um dos elos mais fortes. Sequeira (2006) defende que, associada à continuidade dos cuidados da equipa de enfermagem, existe uma revalorização das práticas dos enfermeiros, tendo como consequência a promoção da saúde mental, a redução da morbilidade, a diminuição dos custos associados, a maior satisfação por parte dos profissionais e, sobretudo, ganhos em saúde. Incorporamos as definições da CIPE®, no que se refere ao diagnóstico “rótulo atribuído por um enfermeiro à decisão sobre um fenómeno que constitui o foco das intervenções de enfermagem” e à intervenção “ação tomada em resposta a um diagnóstico de enfermagem de modo a produzir um resultado de enfermagem” (ICN, 2011, p. 16).

1 Professor Adjunto, Doutor em Ciências de Enfermagem, Escola Superior de Enfermagem do Porto, zecarlos@esenf.pt Submetido em: 30-06-2012 – Aceite em 20-10-2012 Citação: Carvalho, J. C. (2012). Diagnósticos e intervenções de enfermagem centradas no processo familiar, da pessoa com esquizofrenia. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 52-57 52 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


As intervenções de enfermagem não são apenas instrumentos ou táticas mas também, tudo o que o enfermeiro diz ou faz com as famílias, influenciadores do sistema familiar (Hanson, 2005). As intervenções derivam da aplicação das atividades de diagnóstico visando a identificação de problemas e têm um papel de extrema importância para a construção de um plano de cuidados para o doente/família. A identificação dos problemas mais relevantes revestese de particular dificuldade, uma vez que todos eles poderão concorrer para a melhoria dos sinais e sintomas e para a reabilitação do doente. Em função das manifestações clinicas da esquizofrenia, optamos por identificar focos relacionados com os sintomas positivos da doença (delírios, alucinações, agressividade, ansiedade), mais evidentes a terceiros; e focos relacionados com os sintomas negativos (isolamento, apatia, abolia) da doença, mais notórios no seu círculo mais fechado de relações, sendo, possivelmente a família a primeira a percecionar estas diferenças de comportamento. Consideramos pertinente esboçar um plano de intervenção, como se de um catálogo de intervenções se tratasse, para alguns diagnósticos/intervenções de enfermagem (Bulecheck et al., 2010; ICN, 2011; Johnson et al., 2009; Moorhead et al., 2010), que estão presentes nestes doentes/famílias, dentro da área de intervenção dos enfermeiros. Enumeramos alguns dos potenciais diagnósticos de enfermagem em função dos resultados obtidos com o presente trabalho e sobre os quais os enfermeiros devem ter especial atenção: • Agitação [Psicomotora] / Comportamento Agressivo / Risco de Comportamento Autodestrutivo / Hostilidade / Inquietação. Como podemos constatar pelos resultados do Inventário Neuro Psiquiátrico - Neuro Psychiatric Inventory (NPI) de Cummings et al. (1994), que nos permitiu avaliar em que medida a família teve contacto com alguma da sintomatologia psiquiátrica do doente, comportamentos que surgiram pela primeira vez desde o início da doença ou comportamentos que se mantiveram por algum período de tempo, 65,2% tiveram episódios de agitação psicomotora/irritabilidade, o que corrobora a importância destes focos no tratamento de doente com esquizofrenia. • Delírio / Risco de Delírio / Pensamento comprometido / Processo de pensamento comprometido / Processo de Pensamento Distorcido / Alucinação [Visual; Auditiva; Olfativa; Gustativa; Táctil] Estes focos estão na génese do diagnóstico da esquizofrenia e dos critérios da doença. Quando se fala na sintomatologia, os sintomas mais evidentes são, sem dúvida, a atividade alucinatória e delirante.

• Comunicação comprometida / Comunicação Familiar comprometida A comunicação é sempre um dos focos centrais quando se trata do doente com esquizofrenia. A relação com a família é sempre prejudicada em função das dificuldades que ocorrem ao nível da comunicação. O FACES IV - Family Adaptability and Cohesion Evaluation Scales (Olson, 2011), permite caraterizar as famílias quanto aos níveis de coesão e de flexibilidade/ adaptabilidade, assim como os níveis de satisfação e de comunicação familiar, uma das componentes que avalia é, justamente, o nível de comunicação familiar, podendo ser útil à prática da enfermagem no diagnóstico de problemas de comunicação. Sempre que se equaciona o tratamento do doente com esquizofrenia, um dos focos da atenção dos enfermeiros deverá ser as intervenções, no que se refere à melhoria dos aspetos comunicacionais do doente e da família. Na amostra estudada existiam razoáveis índices de comunicação familiar. • Estigma Conhecimento sobre a patologia, pelos cônjuges Segundo Carvalho (2012), os doentes e familiares, embora estivessem perante um enfermeiro especialista em Saúde Mental, mostravam alguma dificuldade em verbalizar o nome da patologia esquizofrenia. Na aceitação da participação no estudo, colocavam como condição, o facto de não ser mencionado o nome da doença aos filhos, pelo desconhecimento que estes têm da doença dos progenitores. No grupo de controlo, no primeiro contacto, sentimos alguma reação de desconfiança, uma vez que, na folha onde constava a informação para o consentimento informado, estava escrito o título do trabalho indicando o termo esquizofrenia. Porém, depois de explicado as finalidades do estudo, os participantes aceitaram participar sem reservas. Interpretamos tanto a atitude das famílias em que um dos progenitores tem esquizofrenia, como das famílias controlo, como um sinal do estigma social da doença mental. Os resultados do nosso trabalho poderão, em nosso entender, contribuir para a diminuição do estigma junto dos profissionais de saúde e da população em geral, relativamente ao convívio com a pessoa com esquizofrenia. Como se constata, apesar de estarem expostas a maiores fatores de vulnerabilidade, os filhos dos doentes com esquizofrenia não evidenciam diferenças significativas relativamente ao grupo de controlo. Uma das questões sempre importantes, no relacionamento com os doentes e com os familiares, prende-se com o conhecimento/informação que estes possuem da doença. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 53


Aquando da realização das entrevistas, um dos aspetos mais salientados pelo cônjuge foi a falta de informação e do acompanhamento pelos profissionais de saúde mental. Também o desconhecimento da sintomatologia, das reações esperadas em função do estadio da doença e de como agir, foram algumas das questões colocadas, associadas ao desconhecimento de instituições ou grupos de apoio/ajuda mútua, segundo os familiares dos doentes com esquizofrenia. Os serviços de Saúde Mental deveriam disponibilizar aos familiares do doente com esquizofrenia, um conjunto de informações sobre a doença e como lidar com ela, assim como esta informação/formação, deveria ser articulada com os diferentes profissionais de saúde. Esta informação pode ser muito relevante, para a melhoria da adesão ao regime terapêutico instituído. Cabe ao pessoal de enfermagem a responsabilidade de partilhar com os doentes e familiares as informações que considerarem relevantes em função de cada caso e de os dotar de competências para saberem lidar com as situações que se deparam no dia-a-dia. Esta preparação da família, na forma como lidam com o doente e com a doença, deverá merecer atenção privilegiada dos enfermeiros. • Socialização Comprometida / Isolamento social Como foi referenciado anteriormente, os sintomas negativos da doença compreendem a falta de vontade e por reação tendem para o isolamento. Os valores mais baixos nos índices de qualidade de vida do cônjuge (WHOQOL), situam-se nas dimensões das relações sociais e do meio ambiente. As dificuldades que as famílias sentem correspondem a esta socialização comprometida. Centram-se mais no seu núcleo familiar, com um alheamento de terceiros, fruto das dificuldades da doença e fruto também de não querer partilhar essas mesmas dificuldades tendo como resultado o isolamento social. Os diagnósticos de enfermagem relativos ao isolamento social estão intimamente ligados à problemática da esquizofrenia. • Processo familiar comprometido / Crise Familiar / Família Disfuncional Estes são claramente os diagnósticos de enfermagem de eleição na família do doente com esquizofrenia. O processo familiar pode definir-se como as “interações positivas ou negativas e os padrões de relacionamento entre os membros da família” (ICN, 2011, p. 70). Hanson (2005) considera-o um foco relevante para a prática da enfermagem, uma vez que integra áreas como: papéis, comunicação, poder, tomada de decisão, satisfação conjugal e as estratégias de coping. 54 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

Wright e Leahey (2009) reforçam a ideia de que é indicada uma intervenção, a nível da família, sempre que um membro da família apresenta um problema e que possa ter impacto nos outros membros. Avaliar a dinâmica familiar, as relações familiares, a família como um todo, deveria ser um dos aspetos a apostar pelos enfermeiros, uma vez que é assumida a sua importância no tratamento e na reabilitação do doente. Salientamos que a aplicação do FACES IV, como atividade diagnóstica, poderia ser uma mais-valia para compreender e avaliar a dinâmica/relações familiares. A noção do tipo de família (mais: coesa, flexível, rígida, caótica, …) poderia permitir uma intervenção mais direcionada e consequentemente mais eficaz. As famílias com características mais rígidas apresentam maior dificuldade em superar as dificuldades porque não permitem a ajuda externa. Existem outros focos da área da saúde mental que podem e devem ser alvo de atenção dos enfermeiros no contexto da esquizofrenia, mas que não foram alvo de análise neste trabalho - não adesão regime medicamentoso (Silva e Carvalho, 2011), coping, autocontrolo, autocuidado, assim como todos os diagnósticos no domínio das funções, que podem fazer sentido em função do sexo, idade, estado físico do doente, comorbilidade entre outros. No campo da saúde mental, atendendo à multiplicidade de variáveis associadas a um problema, entendemos que esta delimitação concreta nem sempre é fácil, pelo que para além das áreas de intervenção de cada disciplina do conhecimento é importante que os profissionais de saúde exerçam a sua atividade de forma complementar, de modo a contribuírem para os ganhos em saúde efetivos nas pessoas. Por isso, neste contexto, a multidisciplinaridade não é apenas uma questão de “retórica”, mas sim uma necessidade que emerge da complexidade dos problemas das pessoas. Iremos dar um exemplo, no que se reporta ao contributo que os enfermeiros podem dar em termos de intervenção, quer autónoma, quer integrados numa equipa multidisciplinar. Pois só existe multidisciplinaridade efetiva quando os diferentes intervenientes conhecem os trabalho se os integram na sua prática profissional, de modo a que o todo, seja mais eficiente que a soma das partes na resolução dos problemas das pessoas. Entendemos por processo de enfermagem o processo de raciocínio clínico dos enfermeiros (Paiva e Silva, 2011) e todas as ações que o enfermeiro necessita de realizar para obter os dados necessários à formulação de um diagnóstico de enfermagem, porque se circunscreve a um foco de atenção dos enfermeiros, tendo por base as designações adotadas pela CIPE, versão 2 (ICN, 2011), bem como as intervenções de enfermagem que o enfermeiro poderá implementar no sentido de contribuir para resolução/minimização do problema.


PROCESSO FAMILIAR Atividades de Diagnóstico Referimos às ações realizadas pelos enfermeiros com o objetivo de obter os dados necessários que lhe permitam emitir o juízo sobre a existência ou a probabilidade de ocorrer um determinado problema, ou seja, que possa ser traduzido num diagnóstico de enfermagem (real ou potencial): Avaliar comunicação da família • Avaliar satisfação familiar relativamente ao modo de expressão de sentimentos • Avaliar a clareza da comunicação familiar Avaliar coping familiar • Avaliar conhecimentos acerca da esquizofrenia • Avaliar os conhecimentos acerca do regime terapêutico • Avaliar os recursos de que a família dispõe para resolver os problemas • Avaliar a forma de resolução dos problemas • Avaliar conhecimentos sobre estratégias adaptativas para lidar com o familiar portador de esquizofrenia Avaliar interação de papéis • Avaliar satisfação com o papel desempenhado pelos membros da família (MF) • Avaliar o consenso de papel desempenhado pelos MF • Avaliar se houve alteração de papéis familiares • Avaliar saturação de papel desempenhado pelos MF Avaliar relação dinâmica • Avaliar o envolvimento familiar no processo terapêutico • Monitorizar coesão e adaptabilidade da família (FACES) Dados Relevantes para o Diagnóstico Associados à atividade diagnóstica, obtém-se um conjunto de dados que é necessário organizar, sistematizar e atribuir significado, ou seja, emitir um juízo. Esta é, de facto, uma área sensível onde é necessário valorizar os dados no seu todo. A ideia de consensualizar um conjunto de dados “major”, ou um resumo mínimo de dados (Pereira, 2007), visa reduzir algumas avaliações subjetivas e conferir uma maior uniformidade nas avaliações. No entanto, é importante que este conjunto de dados indispensáveis possa ser extraído da evidência empírica. É neste sentido que este trabalho pode ser uma mais-valia. Os diagnósticos devem ser mais sensíveis ao conjunto de dados que as pessoas manifestam e não à maior ou menor interpretação que a pessoa possa fazer dos mesmos

dados. É importante também referir que esta padronização deve ser efetuada sem qualquer fundamentalismo e integrando a singularidade da pessoa na sua apreciação. Processo familiar comprometido se: a) Comunicação comprometida b) Coping comprometido c) Interação de papéis comprometida d) Relação dinâmica comprometida a) Comunicação comprometida se: o Os MF não apresentam satisfação relativamente ao modo como expressam os sentimentos o Os MF não são claros e diretos no discurso b) Coping comprometido se: o Os MF não detêm conhecimentos acerca da esquizofrenia o Os MF não detêm conhecimentos acerca do regime terapêutico o Os MF não procuram resolver os problemas em conjunto o Os MF não dispõem de recursos para resolver os problemas o Os MF não identificam nem aplicam estratégias para lidar com o familiar portador de esquizofrenia c) Interação de papéis comprometida se: o Os MF não se encontram satisfeitos com os papéis desempenhados o Existe saturação de papel o Não existe consenso de papel o Existe alteração dos papéis familiares d) Relação dinâmica comprometida se: o Os MF não estão envolvidos no processo terapêutico Critérios de Resultado Os critérios de resultado apresentados são obtidos através dos enunciados descritos no NOC (Moorhead et al., 2010). Pretende-se, com estes critérios de resultados, sugerir formas de avaliação em termos de melhoria do estado de saúde das pessoas, neste caso com alteração do processo familiar. Ainda que alguns possam parecer muito específicos, são relevantes na medida em que nos permitem extrair “pequenos” ganhos em saúde que, no contexto da esquizofrenia, se podem traduzir em grandes ganhos em termos autonomia, adaptação e inserção social. A listagem não significa que eles possam ser avaliados em todos as pessoas, mas sim como possíveis formas de avaliação da eficácia das intervenções e da evolução do estado de saúde: Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 55


• A comunicação é eficaz • Cuida dos membros dependentes da família • Regula os comportamentos dos membros • Distribui responsabilidades entre os MF • Adapta-se as crises inesperadas • Obtém recursos adequados para atender às necessidades dos MF • Criação de ambiente em que os membros se possam expressar livremente • Aceita a diversidade entre os MF • Envolve os MF na resolução de problemas/ conflitos • MF apoiam-se e ajudam-se mutuamente • MF sentem-se satisfeitos com os papéis desempenhados • MF adaptam-se à alteração de papéis • MF expressam lealdade à família • MF passam tempo uns com os outros • MF apresentam conhecimentos acerca da patologia e do regime terapêutico • MF sentem-se envolvidos no processo terapêutico: questionam, procuram informação e recursos para lidar com a situação, solicitam auxílio quando não conseguem lidar com a situação Intervenções de enfermagem (atividades que as concretizam) Entende-se por intervenção de enfermagem uma ação realizada por um enfermeiro em resposta a um diagnóstico de enfermagem e que tem potencial para facilitar os processos de transição que a pessoa vivencia numa situação de saúde/doença, quer seja pela via da redução dos sinais/sintomas, quer pela via da capacitação da pessoa para lidar com a situação. As intervenções de enfermagem, sugeridas neste contexto, têm por base dois aspetos fundamentais: • tem por alvo o conjunto de dados que habitualmente estão presentes quando uma pessoa tem esquizofrenia e desse contexto resulta uma alteração do processo familiar. • tem como matriz para a sua seleção, as intervenções propostas na Classificação das Intervenções de Enfermagem – NIC (Bulechek et al., 2010). Apesar das especificidades socioculturais da população portuguesa, parece-nos que em termos gerais, estas intervenções podem ser implementadas neste contexto. Se comunicação comprometida 1. Promover a comunicação familiar  Facilitar a comunicação familiar  Encorajar a manutenção do contacto com os MF  Manter a flexibilidade dos horários das visitas de acordo com as necessidades e a disponibilidade dos MF 56 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

 Providenciar mecanismos para que os membros da

família mantenham contacto uns com os outros  Encorajar a expressão de sentimentos e expectativas dos MF  Facilitar a congruência entre as expectativas do doente e dos MF

Se coping comprometido 2. Educar sobre esquizofrenia  Fornecer informação adequada à família

 Fornecer apoio familiar na busca de informação, se apropriado  Informar que a esquizofrenia se caracteriza por alterações processo de pensamento, insónia, anedonia entre outras

3. Ensinar estratégias adaptativas 4. Ensinar sobre regime terapêutico  Educar sobre vigilância dos efeitos terapêuticos

 Educar sobre vigilância das reações adversas  Educar sobre horário e dose dos fármacos

5. Informar sobre recursos externos  Informar sobre os mecanismos de apoio existentes  Auxiliar a família a aceder a mecanismos de apoio social quando necessário

Se interação de papéis comprometida 6. Negociar os papéis familiares 7. Promover o suporte da família  Facilitar a comunicação de preocupações/sentimentos entre o doente e a família ou entre os MF  Promover o contacto do doente com a família  Encorajar a focalização da família em qualquer aspeto positivo da situação clínica do doente  Estabelecer metas realísticas com o doente e família

8. Promover a comunicação familiar Se relação dinâmica comprometida 9. Promover o envolvimento da família 10. Promover a comunicação familiar 11. Otimizar padrão de ligação dos membros da família No final de todo este processo, o enfermeiro deve proceder à avaliação das suas intervenções, que se designam por atividades de avaliação, sendo: • Avaliar comunicação familiar • Avaliar coping familiar • Avaliar interação de papéis • Avaliar relação dinâmica funcional Este exercício académico que resulta do nosso trabalho de investigação (Carvalho, 2012) leva-nos a sugerir que esta é uma área que carece de investigação centrada nas possibilidades de resposta que os enfermeiros podem acrescentar aos processos de recuperação e participação das pessoas com esquizofrenia.


É escassa a literatura disponível em Portugal sobre catálogos específicos que guiem os enfermeiros, por padrões de qualidade suportados na evidência científica, no que se reporta às intervenções de enfermagem à pessoa com esquizofrenia e aos seus familiares. As intervenções são inferidas a partir de outros contextos e da produção científica de outros investigadores. Existe a evidência sobre os programas de psicoeducação (Guedes, 2008, Gonçalves-Pereira, 2010), quer em termos de estrutura, quer em termos de conteúdo, mas globalmente sobre as alterações do processo familiares e os fatores que lhe estão associados, a produção científica é quase inexistente. Assim, esperamos que este trabalho possa ser um contributo para sensibilizar os enfermeiros para a problemática da esquizofrenia e das suas implicações individuais, familiares e sociais. BIBLIOGRAFIA Bulechek, G., Butcher, H., & Dochterman, J. (2010). Classificação das intervenções de enfermagem (NIC) (4ª ed.). Rio Janeiro: Mosby Elsevier. Carpenito-Moyet, L. (2009). Diagnósticos de Enfermagem: aplicação à prática clínica (11ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Carvalho, J.C. (2012). Esquizofrenia e família: repercussões nos filhos e cônjuges. Tese de Doutoramento, Instituto Ciências Biomédicas Abel Salazar, Universidade do Porto. Gonçalves-Pereira, M. (2010). Famílias de pessoas com síndromes psicóticas. Análise dimensional e avaliação da efectividade de uma intervenção em grupos de familiares. Tese de Doutoramento, Universidade Nova de Lisboa.

Wright, L., & Leahey, M. (2009). Enfermeiras e Famílias - Um guia para avaliação e intervenção na família. (4ª ed.). São Paulo: Roca. Moorhead, S., Johnson, M., Maas, M., & Swanson, E. (2010). Classificação dos resultados de enfermagem (NOC). (4ª ed.). Rio Janeiro: Mosby Elsevier. Olson, D. (2011). FACES IV and the Circumflex Model: Validation study. Journal of marital & family Therapy, 3(1), 64-80. Paiva e Silva, A. (2011). Intenções dominantes nas concepções de enfermagem, estudo a partir de uma amostra de estudantes finalistas. Tese de Doutoramento, Universidade Católica Portuguesa. Pereira, F. (2007). Informação e Qualidade do exercício profissional dos enfermeiros: Estudo empírico sobre um Resumo Mínimo de Dados de Enfermagem. Tese de Doutoramento, Universidade do Porto. Portugal, Ministério da Saúde, Alto Comissariado da Saúde, Coordenação Nacional para a Saúde Mental (2008). Plano Nacional de Saúde Mental 2007-2016 Resumo Executivo. Lisboa: Coordenação Nacional para a Saúde Mental. Sequeira, C. (2006). Introdução à prática clínica: do diagnóstico à intervenção em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica. Porto: Quarteto. Silva, M., & Carvalho, J.C. (2011). Adesão ao regime terapêutico do doente esquizofrénico: Diagnóstico e intervenção de Enfermagem. Sinais Vitais, (95), 41-45.

Guedes, A. S. (2008). Avaliação do Impacto da Perturbação Mental na Família e Implementação de um Programa Psicoeducacional. Dissertação de Mestrado, Universidade do Porto. Hanson, S. (2005). Enfermagem de Cuidados de Saúde à Família: Teoria, Prática e Investigação (2ª ed.). Loures: Lusociência. ICN (2011). CIPE® 2 Classificação internacional para a prática de enfermagem. Lisboa: Ordem dos Enfermeiros. Johnson, M., Bulecheck, G., Butcher, H., Dochterman, J., Mass, M., Moorhead, S., & Swanson, E. (2009). Ligações entre NANDA, NOC e NIC: diagnósticos, resultados e intervenções de Enfermagem. (2ª ed.). Porto Alegre: Artmed. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 57


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CUIDADOS CONTINUADOS EM SAÚDE MENTAL: REFLEXÃO SOBRE RESPOSTAS PARA PESSOAS | Miguel Ângelo Narigão1|

RESUMO A consciencialização da importância da pessoa e dos seus direitos, que ocorreu durante o séc. XX com maior evidência na segunda metade do século, transformou a nossa perspetiva em relação à característica das respostas dos serviços para pessoas com doença mental. Passamos a valorizar uma intervenção abrangente e integradora mais centrada na saúde mental e menos na intervenção psiquiátrica. Esta mudança traduziu-se na reforma dos grandes centros psiquiátricos e na disponibilização de respostas na comunidade adaptadas às necessidades da pessoa com doença mental. Esta tendência encontra-se igualmente contemplada no nosso Plano Nacional de Saúde Mental e no projeto de Cuidados Continuados Integrados para a Saúde Mental (CCISM), que se inspirou em experiências internacionais relevantes onde existem pontos de contacto com a nossa realidade sociológica. As experiências ocorridas em vários países e regiões que puseram em prática reformas de saúde mental, mostram que as opções escolhidas foram influenciadas pelos contextos sociais e políticos determinando diferenças nos modelos. Apesar disto, podemos encontrar princípios orientadores comuns que sustentaram e possibilitaram a construção de alternativas reabilitativas para pessoas com doença mental grave. PALAVRAS-CHAVE: Desinstitucionalização; Saúde Mental; Reabilitação Psicossocial ABSTRACT The awareness of the importance of the individual and his rights that occurred during the century XX prominently in the second half of the century has transformed our perspective in relation to the responses of services for people with mental illness. We come to value a more integrative and comprehensive intervention focused on mental health and less on psychiatric intervention. This change resulted in the reform of large psychiatric centres and the availability of community responses tailored to the needs of people with mental illness.

This trend is also included in our National Mental Health Plan (Plano Nacional de Saúde Mental) and in design programmes and services for the psychosocial rehabilitation of people with severe mental illness (Cuidados Continuados Integrados para a Saúde Mental), which was inspired by relevant international experiences where there are points of contact with our sociological reality. The mental health reforms that have taken place in several countries and regions show that the options taken were influenced by social and political contexts determining differences in the models. Despite this, we can find common guiding principles that underpinned and enabled the construction of rehabilitative alternatives for people with severe mental illness. KEYWORDS: Deinstitutionalization; Mental Health, Psychosocial Rehabilitation. A evolução dos modelos de cuidados continuados para a saúde mental, reflete a multiplicidade de variáveis que influenciaram estes projetos e as características das respostas surgidas em cada contexto. As condicionantes resultam da história e cultura de cada região e das motivações que desencadearam os processos, na maior parte das situações tendo como primeiro objetivo o encerramento das instituições psiquiátricas em resposta a uma maior consciencialização e defesa dos direitos humanos das pessoas em desvantagem social. Mas igualmente outros aspetos essenciais da organização dos serviços de saúde e sociais, como, o económico numa lógica de melhor custo–beneficio dos serviços prestados, a disponibilidade e formação dos técnicos, a conceção sobre o papel dos cuidados continuados na continuidade de cuidados, contribuíram para a mudança de perspetiva em relação aos serviços a disponibilizar para as pessoas com doença mental grave (DMG) e suas famílias. Deste modo não se pode falar de uma história de cuidados continuados para a saúde mental, mas de várias histórias que se revelam diferentes de país para país e em alguns países, de região para região.

1 Enfermeiro Especialista em Saúde Mental, Mestre em Saúde Mental, Direção-Geral da Saúde: PNPCT, miguelnarigao@dgs.pt Submetido em: 25-09-2012 – Aceite em 28-11-2012 Citação: Narigão, M. (2012). Cuidados continuados em saúde mental: reflexão sobre respostas para pessoas. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, (8), 58-62 58 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


Por outro lado, podemos afirmar que a evolução de respostas em cuidados continuados de saúde mental acompanhou a evolução do pensamento técnicocientífico em relação à conceção da pessoa com DMG. Da referência ancestral ao louco, transitou-se para uma conceção de doente, e finalmente para a do cidadão com doença psiquiátrica ou mental, a quem se reconhece o direito pleno de exercício da cidadania. Para esta transição contribuíram muito os processos de desinstitucionalização que ocorreram em vários países europeus, largamente influenciados pelas perspetivas “revolucionárias” de Basaglia em Trieste (Itália). As primeiras respostas nesta área foram criadas essencialmente para promover a desinstitucionalização, numa perspetiva de transição das estruturas asilares para a comunidade, onde por via das características desta população, existia uma componente terapêutica acentuada. As respostas residenciais com o seu ambiente doméstico, ainda que nesta fase inicial se destinassem predominantemente a pessoas com internamentos hospitalares muito prolongados e suposto menor potencial de reabilitação, foram referidas como promotoras da melhoria da qualidade de vida e aumento da satisfação dos residentes (Girolamo et al., 2007; Thornicroft, Bebbington, & Leff, 2005). Progressivamente foi-se assistindo a uma maior autonomização destas estruturas de reabilitação em saúde mental, relativamente aos serviços de saúde, procurando adaptar-se as respostas a diferentes necessidades. As primeiras unidades residenciais comunitárias surgem com o objetivo de estimular a autonomia e capacidade de decisão dos residentes, aumentar o potencial de adaptação da pessoa com DMG a diferentes contextos e facilitar a sua integração social. Mas foi ocupando maior destaque o apoio residencial, como alternativa eficaz na promoção da autonomia, iniciativa e integração social das pessoas em processo reabilitativo. Convém salientar, que a desinstitucionalização obriga a cuidadosa ponderação quanto ao seu impacto nas pessoas que têm de transitar para outro ambiente e estrutura. Não obstante a sua intenção beneficente, estes processos têm custos psicológicos para a pessoa envolvida, o que significa que devem ser cuidadosamente preparados para minimizar as dificuldades e sofrimento que podem resultar nesta transição (Farhall, Trauer, Newton, & Cheung, 2003; Friedrich, Hellingsworth, Hradek, Friedrich, & Culp, 1999). As primeiras residências de cuidados continuados respondiam a uma necessidade de encerramento dos hospitais psiquiátricos, e respetiva desinstitucionalização das pessoas aí internadas, dirigindo-se a pessoas com necessidades relativamente homogéneas para quem a

simples mudança de condições representava um avanço considerável. Gradativamente, assistiu-se a uma mudança na população atendida (mais jovem), com necessidades heterogéneas e maior capacidade reivindicativa, que em vários países culminou na organização de grupos de utentes e familiares com maior poder de exigência no acesso à habitação e emprego apoiados. A tendência atual na organização de cuidados continuados em saúde mental traduz-se num modelo misto, que inclui as dimensões saúde e social, procurando responder a diferentes exigências de cuidados, organizados em rede e promotores de aquisição de competências para a vida na comunidade. Neste âmbito, alguns aspetos comuns às diferentes experiências internacionais têm sido frequentemente referidos: • Consenso quanto à importância das intervenções na comunidade para uma evolução mais favorável da pessoa com DMG (Sylvestre, Nelson, Sabloff, & Peddle, 2007); • Programas com ênfase na funcionalidade pessoal e social sustentada numa rede de serviços de apoio (Maria e Sousa, 2000; Nelson, Hall, & Walsh-Bowers, 1998; Nelson, & Peddle, 2005; Sylvestre et al., 2007); • Cuidados baseados numa perspetiva de evolução gradual para a maior autonomia possível; • Respostas que pressupõem transição progressiva para residências com maior autonomia (continuum residencial) ou outras mudanças semelhantes são desestabilizadoras e não se traduzem em ganhos de competências ou satisfação dos utilizadores (Marcelino et al., 2004; Maria e Sousa, 2000; Nelson, Aubry, & Hutchinson, 2010); • Residências de grande lotação assim como ambientes restritivos ou demasiado protegidos diminuem a iniciativa, promovem a dependência e autonomia e diminuem a satisfação dos residentes (Macpherson, Shepherd, & Edwards, 2011; Maria e Sousa, 2000; Mcinerney, Finnerty, Avalos, & Walsh, 2010; Nelson, & Peddle, 2005; Nelson et al., 2010; Piat, Wallace, Wohl, Minc, & Hatton, 2002; Sylvestre et al., 2007). • Preferência dos utilizadores por alojamentos com maior autonomia e maior privacidade (Macpherson et al., 2011; Nelson, & Peddle, 2005; Nelson et al., 2010; Sylvestre et al., 2007). As dificuldades surgem em relação a: • Características e número de profissionais em cada dispositivo residencial, muito diversificado e dependendo da origem das respostas (sectores da saúde ou social, público ou privado, lucrativo ou não lucrativo…); Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 59


• Diferentes metodologias e seleção de variáveis utilizadas na avaliação do impacto dos programas nos utentes, que não permite uma comparação dos modelos de reabilitação e respostas utilizados ainda que todos os resultados sejam animadores: o Melhor adesão aos tratamentos; o Estabilização da sintomatologia positiva e melhoria da negativa; o Assunção do papel nas atividades de vida diária; o Maior iniciativa social e autonomia; o Melhoria nas relações interpessoais; As avaliações salientam sempre o maior risco das respostas residenciais, o risco de transinstitucionalização. Ou seja, o risco de repetição de práticas e ambientes não promotores de um processo de reabilitação e integração da pessoa, representando apenas uma mudança de uma “instituição” para outra “instituição”. Este risco pode ser combatido através de medidas organizacionais e de controlo de qualidade, nomeadamente com o enquadramento claro em princípios que orientem os envolvidos nestas respostas, na definição dos serviços prestados, na seleção de profissionais, acompanhamento, formação e valorização dos mesmos, na participação efetiva dos utentes na tomada de decisão e na criação de oportunidades para a sua integração na comunidade, numa avaliação periódica dos resultados obtidos. Uma discussão habitual, interessante, que influencia as características das respostas em cuidados continuados na saúde mental, tem sido a ausência de consenso em torno da operacionalização do próprio conceito subjacente. As residências para a reabilitação da pessoa com DMG devem ser locais de tratamento, ou locais de habitação de onde se parte para programas de reabilitação e para os cuidados de saúde em geral (Marcelino et al., 2004; Santone et al., 2005). A experiência pessoal, profissional dos técnicos de saúde condiciona o posicionamento em relação ao que pensam ser a melhor solução para os seus utentes, mas o erro básico residirá exatamente nesta suposição baseada na experiência se não lhe for acrescentado o desejo e aspiração das pessoas a quem se destinam estas respostas. Alguns Exemplos A reforma psiquiátrica Italiana, modelo relevante neste âmbito e que decorre desde 1978, tem ela própria sido heterogénea. Surgiram variadas estruturas residenciais, com diferenças consideráveis na composição das equipas e mesmo na conceptualização dos processos de intervenção. As avaliações realizadas em 2005 (Girolamo et al., 2005, Santone et al., 2005) tornaram evidente entre outros aspetos, que residências com programas e funcionamento muito restritivo não satisfaziam os residentes, 60 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)

e que algumas atividades como reuniões periódicas onde participavam profissionais e utentes eram sentidas como muito positivas, melhorando a sensação de participação na decisão e as relações interpessoais. Como noutros contextos, a transição entre residências não é vista como positiva, por não ser fácil a transição de capacidades/competências adquiridas, para outro contexto. Uma das dificuldades apontadas no projeto Italiano (Girolamo et al., 2005, Santone et al., 2005) relaciona-se com a ausência de caracterização da população atendida, em relação às suas necessidades e autonomia, e na seleção da residência que melhor se adequaria ao perfil da pessoa. A heterogeneidade de necessidades dos grupos presentes em cada residência tem dificultado a implementação de atividades comuns e mesmo a seleção dos profissionais com o perfil mais indicado para cada local. A maior parte das residências em Itália têm capacidade até 10 residentes e 75% têm equipas em funções 24h, com predominância de enfermeiros e monitores/ auxiliares. Em Inglaterra a exemplo de outros países com processos posteriores, os residentes manifestaram satisfação pelo aumento da autonomia, e 40%, ao fim de 1 ano Thornicroft et al., 2005), sentiam mudanças positivas desde que tinham deixado o hospital. Durante este período não existiram grandes alterações psicopatológicas, exceto na tendência para um comportamento social menos propenso a agir com base em ideias bizarras. Na avaliação desenvolvida cinco anos após a desinstitucionalização (Mcinerney et al., 2010), os resultados mostraram melhoria significativa no nível de interesse, de atividade e competências na comunidade. No entanto, apesar da expectativa de que melhores condições de vida na comunidade pudessem resultar em melhoria evidente nas pessoas, tal não foi muito evidente neste estudo. Os longos períodos de internamento com processos de reabilitação, conjugado com o facto de algumas destas respostas residenciais se terem transformado em novas “instituições” na comunidade sem programas adequados de reabilitação, contribuíram para esses resultados. O nível de interesse que tinha subido durante o primeiro ano, para descer nos cinco anos seguintes, parece poder dever-se a um investimento inicial da equipa, que não teve continuidade. Tornou-se evidente a necessidade de formação contínua e do reforço da motivação do pessoal envolvido nos projetos, para que uma verdadeira mudança ocorra nas pessoas em processo de reabilitação. A experiência Andaluza tem igualmente sido relevante na compreensão dos ganhos em saúde e em reabilitação psicossocial, decorrentes da desinstitucionalização de


pessoas com DMG (Marcelino et al., 2004; Lopez, Laviana, Lopez, & Tirado, 2007; Marcelino, 2009). Os esforços empreendidos pela Fundación Andaluza para la Integración Social del Enfermo Mental (FAISEM) tomam como objetivo primordial, favorecer a permanência e participação ativa na vida social das pessoas com DMG, tendo as estruturas comunitárias criado resposta para um conjunto de necessidades básicas da vida quotidiana dos seus utentes, como a habitação, manutenção de cuidados básicos da vida diária (higiene, medicação, organização da vida diária, etc.) e relações interpessoais significativas. Segundo a FAISEM, estes objetivos cumprem-se através da garantia aos utentes de alojamentos estáveis, com sistemas de apoio flexíveis, mas sem excluir a necessidade de intervenções complementares da Saúde, responsável pelos projetos de reabilitação psicossocial. As estruturas residenciais são asseguradas predominantemente por monitores, sem formação profissional específica e com o estatuto de “tarefeiros”, que dão suporte e desenvolvem com os residentes um plano de reabilitação individual, Programa Individualizado de Atención Residencial (PIAR), elaborado em estreita colaboração com os serviços de saúde mental. As respostas residenciais da FAISEM dão continuidade a um Plan Individualizado de Tratamiento (PIT), para o qual contribuem múltiplos parceiros (família, utente, serviços de saúde) e que inclui além do programa residencial, um programa ocupacional e laboral e outros de âmbito social relevantes para a reabilitação da pessoa. Os programas têm por princípios orientadores basilares o respeito pelos direitos de cidadania, a autonomia e participação, a ocupação e o emprego. No Canadá, a experiência de desinstitucionalização ocorre desde os anos 60. Atualmente, em Ontario, a tendência de criação de residências tem sido no sentido de estruturas de apoio, que mantenham os princípios de cidadania e autonomia dos residentes, percebendo esta resposta como um meio de inserção na comunidade, onde estratégias como o case management ou o assertive community tratement são apontados como metodologias eficazes para atingir aquele objetivo (George et al., 2005; Nelson, & Peddle, 2005; Sylvestre et al., 2007). Em Montreal foi desenvolvida uma experiência semelhante à da Andaluzia, de cariz eminentemente residencial, para pessoas com DMG, que não tinham sido capazes de viver noutras soluções residenciais. Mas neste caso os profissionais tiveram formação específica ou tinham experiência profissional prévia para a função que exerciam. Esta experiência apresentou resultados preliminares animadores (Piat et al., 2002).

Quanto às instalações, vários estudos assinalam a limpeza, conforto e mobiliário como os aspetos mais relevantes indicados pelos residentes, que interferem com o seu bem-estar (Nelson, & Peddle, 2005). A privacidade é das principais preocupações dos utentes, o que determina maior satisfação com residências com menor número de residentes. No entanto, é referida a sensação de solidão e isolamento pelos que habitam sozinhos, o que levou os utilizadores a sugerirem a existência de apartamentos com espaços comuns (Nelson, & Peddle, 2005). As residências com menos residentes estão associadas a menor ansiedade, menor passividade, menor distanciamento dos outros, a uma maior consideração positiva do envolvimento social e a maior autonomia (Nelson, & Peddle, 2005). CONCLUSÃO A reforma da saúde mental em Portugal responde essencialmente a uma exigência de saúde pública, mas representa igualmente um passo civilizacional na valorização do respeito pelos direitos humanos. Numa época em que os problemas económicos acentuam a visibilidade dos problemas de saúde mental e a dificuldade de resposta dos serviços a este fenómeno, tornase indispensável caminhar para modelos integrados e adaptados a novas exigências clinicas, transformadas por força das representações socioculturais contemporâneas. Representações que impõem à pessoa com doença mental, como a outra qualquer pessoa, a necessidade e o desejo de exercício da cidadania que provam a sua participação e existência na comunidade. Os projetos de cuidados continuados devem responder a estas necessidades, desviando o foco de atenção do doente para a pessoa, valorizando a sua autonomia e integração na comunidade. O não investimento neste tipo de alternativa representa um retrocesso na reforma da saúde mental, condena-nos a um futuro de maior desigualdade e à manutenção do estigma e descriminação, de ausência de oportunidade e de menor capacidade de resposta dos serviços de saúde às pessoas com doença mental grave. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Farhall, J., Trauer, T., Newton, R., & Cheung, P. (2003). Minimizing adverse effects on patients of involuntary reclocation from long-stay wards to community residences. Psychiatric Services, 54(7), 1022-1027. Friedrich, R., Hellingsworth, B., Hradek, E., Friedrich, H., & Culp, K. (1999). Family and client perspectives on alternative residential settings for persons with severe mental illness. Psychiatric Services, 50(4), 509-514. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 61


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NORMAS PARA A SUBMISSÃO DE ARTIGOS À REVISTA DA SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL Obs. Consultar novas orientações descritas no site sobre a submissão de trabalhos escritos, em www.aspesm.org A “Revista da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental” (RSPESM) publica artigos originais de assuntos que se enquadrem na área de Saúde Mental. A submissão é feita através do envio do artigo em formato Word, acompanhado de uma declaração de cedência dos direitos de autor à SPESM, de acordo com o modelo em anexo. As propostas de submissão podem enquadrar-se nas seguintes tipologias: Estudos empíricos (investigação qualitativa, quantitativa, meta-análise, revisão sistemática da literatura e outros); artigos de revisão bibliográfica; artigos descritivos de boas práticas de Enfermagem e artigos de opinião. As propostas de submissão serão sempre apresentadas por e-mail para: dir.spesm@gmail.com A SPESM ficará detentora dos direitos de autor de todos os artigos publicados mas não se responsabiliza pelo conteúdo, cuja responsabilidade será sempre dos proponentes. FORMATO DA PROPOSTA DE SUBMISSÃO DO ARTIGO Primeira página com: Título: Primeiro autor (Sit. Prof., local de trabalho e e-mail) Segundo autor (Sit. Prof., local de trabalho e e-mail) Terceiro autor (Sit. Prof., local de trabalho e e-mail) Páginas seguintes com: Resumo em português e inglês: Entre 250 a 500 palavras. Palavras-Chave em português e inglês: Até ao máximo de quatro palavras-chave, separadas por ponto e virgula. INTRODUÇÃO METODOLOGIA Participantes Instrumentos Procedimentos ANÁLISE DOS RESULTADOS DISCUSSÃO DOS RESULTADOS CONCLUSÕES REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Nota: Não inclua nestas páginas informação que possa identificar os autores. Envie em separado a declaração de cedência dos direitos de autor. Após a sua assinatura deverá digitalizá-la e enviar por e-mail. ORIENTAÇÕES PARA A REDACÇÃO Letra: Arial 11 Espaçamento: 1,5 espaços entre parágrafos Citações: Todos os nomes de autores citados devem ser seguidos da data de publicação e ordenados alfabeticamente no último tópico do artigo (referências bibliográficas). Citações literais devem conter o número da página da obra do qual foi retirada, apresentada entre aspas, com recuo à margem esquerda, quando citações longas. Atenção: não utilizar os termos apud, op. cit., id. ibidem, e outros; pois estes não são aceitos pela APA. http://www.apastyle.org/ Exemplos de referências bibliográficas: Artigo científico: Sá, L., & Fleming, M. (2008). Bullying, Burnout, and Mental Health Amongst Portuguese Nurses. Issues in Mental Health Nursing, 29(4), 411 - 426. 64 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


Monografia/Tese: Pinho, J. (2002). Necessidades das Familias dos Doentes internados na Unidade de Cuidados Intensivos. Porto:Universidade do Porto,Faculdade de Medicina do Porto. Livro: Sequeira, C. (2010). Cuidar de Idosos com Dependência Fisica e Mental. Lisboa:Lidel, Edições técnicas Ldª. Capítulo de livro: Carvalho, J. C. (2006). Transplantação de progenitores hematopoiéticos: Qualidade de Vida e Coping In: Marques, P.; Carvalho, J.C.; Sousa, P.; Borges, E. & Cruz, S. - Rumo ao Conhecimento em Enfermagem. Porto: Esenf.SJ, pp. 113178. Estilo do artigo: A linguagem utilizada no texto deve ser clara e apropriada ao modelo científico e a ortografia, a gramática e a pontuação deverão ser correctamente empregues. Poupe nas vírgulas e gaste nos pontos finais. A fundamentação teórica das ideias desenvolvidas, a adequação da metodologia utilizada para a exploração do conteúdo proposto e a revisão bibliográfica utilizada no texto deverão ser condizentes com o tema. A actualidade das obras e artigos citados também será considerada, bem como a articulação entre os diferentes autores. Os dados deverão ser interpretados adequadamente e as conclusões apresentadas no texto têm que responder aos objectivos do artigo. Deve haver articulação entre os aspectos teóricos e metodológicos abordados. Nº de páginas: O artigo completo deve ter no máximo até 15 páginas. Não incluir anexos. Gráficos, tabelas e figuras: Devem ser convertidos em figuras (jpeg ou gif) e introduzidas ao longo do texto. Todos têm que estar devidamente identificados e referenciados. Para tabelas e quadros o tamanho da letra pode ser reduzido a 9 e sem espaçamentos. Exemplo de tabelas/imagens/gráficos:

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Sociedade Portuguesa de Enfermagem em Saúde Mental (SPESM)

IV Congresso da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2013: Padrões de Qualidade

Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – Polo B 10 e 11 de Out. de 2013

Programa Científico Comemoração do Dia Mundial da Saúde Mental 10 de Outubro de 2013 9.00h 9.30h-13.00h 9.30h-10.15h 10.15h-11.00h

Abertura do Secretariado Discussão de casos clínicos Depressão: tentativa de suicídio e para suicídio Esquizofrenia: delírios, alucinações, agressividade,..

11.00h-11.30h 11.30h-12.15h 12.15h-13.00h 13.00h-14.30h 14.30h-15.15h 15.15h-16.00h 16.00h-16.30h 16.30h 17.00h 18.00h

Intervalo para café Demência: Alteração da função cognitiva (défice cognitivo e memória) Stress do prestador de cuidados; sobrecarga…. Intervalo – Almoço Delirium, Confusão aguda, crónica e Orientação Uso de álcool e drogas, dependência do álcool e drogas Intervalo Café Sessão de Abertura Conferência inaugural Debate – Padrões de Qualidade e direitos dos utentes em saúde mental

11 de Outubro de 2013

9.00h Guidelines de boas práticas – modelos orientadores: Comunicação; comunicação terapêutica e Entrevista clinica Relação de ajuda formal ou profissional 11.00h Intervalo para Café 11.30h Guidelines de boas práticas – modelos orientadores: Técnica de modificação de comportamento Reestruturação Cognitiva 13.00h Intervalo para Almoço 14.30h Guidelines de boas práticas – modelos orientadores: Estimulação Cognitiva Intervenção breve e entrevista motivacional 16.00h Intervalo para Café 16.30h Relaxamento 17.30h Conferência de Encerramento 66 | Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012)


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IV Congresso da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2013: Padrões de Qualidade

Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – Polo B 10 e 11 de Out. de 2013 ORGANIZAÇÃO SOCIEDADE PORTUGUESA DE ENFERMAGEM DE SAÚDE MENTAL PRESIDENTE DO CONGRESSO Carlos Sequeira (ESE – Porto) COMISSÃO CIENTÍFICA Carlos Sequeira (ESE - Porto) Luís Octávio de Sá (UCP – ICS) José Carlos Carvalho (ESE - Porto) José Carlos Santos (ESE – Coimbra) Aida Mendes (ESE – Coimbra) Teresa Barroso (ESE – Coimbra) Bruno Santos (Irmãs Hospitaleiras – Braga/ ESSVA–CESPU) Graça Farelo (HPH – Matosinhos) António Carlos Amaral (CH Tondela/ Viseu) Francisco Sampaio (HB – Braga) Paula Pinho (USP – Brasil) José Carlos Gomes (ESS – Leiria) COMISSÃO ORGANIZADORA José António Pinho (HCP - Porto) Leonilde Pereira (HML – Porto) Lucília Vale (CH – Porto) Luís Silva (HML – Porto) Maria do Carmo (CH Tondela/Viseu) Rita Gonçalves (Irmãs Hospitaleiras - Braga) Pedro Silva (USF Infesta – Porto) Amadeu Gonçalves (ESS - VISEU)

JÚRI DOS PÓSTERES

Coordenação: Francisco Sampaio (HB – Braga)

JÚRI DAS COMUNICAÇÕES LIVRES

Coordenação: Bruno Santos (Irmãs Hospitaleiras - Braga/ ESSVA-CESPU)

Jurados: Jurados:

APOIOS Escola Superior de Enfermagem de Coimbra Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 67


Ficha de Inscrição IV Congresso da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2013: Padrões de Qualidade

Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – Polo B 10 e 11 de Out. de 2013

Nome: ______________________________________________________________ Morada: ____________________________________________________________ E-mail: _____________________________________________________________ Telefone: _________________ Contribuinte: _______________________________ Instituição ____________________________Serviço_________________________ Categoria Profissional _________________________________________________ Modalidades de inscrição: A – Sócio __ B – Não sócio __ Modalidade Congresso Alunos Curso de Licenciatura Almoços de trabalho Jantar convívio

D – Estudante __

Sócios Não sócios 30 Euros 50 Euros 20 Euros 5 Euros 15 Euros

NOTA: INSCRIÇÂO inclui: Participação; Coffee Break; Certificado presença; Certificado de comunicação/artigo, E-book, Revista e Livro da SPESM.

Formas de Pagamento: Valor total a pagar:___________ 1) Cheque emitido à ordem Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2) Vale Postal emitido à ordem Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 3) Transferência bancária para: Caixa Geral Depósitos Banco Santander Totta

NIB 003503740000230893025 – IBAN: PT50003503740000230893025 NIB 001800031829823202082 – IBAN: PT50001800031829823202082

Nota: Anexar comprovativo de pagamento à ficha de inscrição. Enviar a inscrição Para: Prof. Carlos Sequeira - Presidente da SPESM Escola Superior de Enfermagem do Porto - Rua Dr. António Bernardino de Almeida, S/n - 4200-072 Porto – Portugal

URL: www.aspesm.org Mail: dir.spesm@gmail.com

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NORMAS - SUBMISSÃO DE RESUMOS COMUNICAÇÕES/POSTERS IV Congresso da Sociedade Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental 2013: Padrões de Qualidade

Escola Superior de Enfermagem de Coimbra – Polo B 10 e 11 de Out. de 2013

1. O resumo deve ser escrito em português. 2. A data limite para o envio de resumos: 10 de Julho de 2013. 3. Todos os autores serão informados da sua aceitação/recusa até 20 de Julho de 2013. 4. O resumo deve incluir: uma introdução e justificação do tema, os objetivos do estudo, a metodologia, as fontes, os resultados e as conclusões. 5. Os autores devem colocar os nomes por extenso, com indicação do autor, que apresentará o trabalho e respetiva forma de contacto. Cada proposta não deve incluir mais de 4 autores. 6. A SPESM reserva-se ao direito de publicar e distribuir qualquer resumo ou comunicação aceite para apresentação. 7. Os resumos não devem exceder as 500 palavras. 8. Os resumos devem ser enviados para: dir.spesm@gmail.com ou através do site: www.aspesm.org 9. Uma vez aceite o resumo, o (s) autor (es) deverá (ão) inscrever-se no congresso e pagar a inscrição até 31 de Julho de 2013. Se até esta data não for feita e paga a inscrição os resumos serão eliminados do programa. 10. Os resumos podem ser apresentados nas seguintes categorias:

a. Comunicações Livres, para apresentação oral com a duração máxima 10’.

b. Posters, com apresentação em horário a definir.

11. Características a atender na elaboração/apresentação dos Posters

a. O conteúdo deverá ser legível a 1,5 metros de distância;

b. Não deve ultrapassar as dimensões de 110x80 cm;

c. A apresentação pelo autor do Poster selecionado não poderá exceder os 3’.

12. Dos resumos aceites, os autores poderão propor um artigo para publicação no E-book. Ver regulamento em www.aspesm.org. O texto integral das Comunicações Livres e Posters, deve ser enviado até 15 de Setembro de 2013 para integrar o livro de atas que será oferecido a todos os participantes do congresso. Opcional – caso tenha interesse na sua publicação no e-book.

Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, 8 (DEZ.,2012) | 69


MODELO DE ESTRUTURA DE PROPOSTA DE COMUNICAÇÃO TIPO DE COMUNICAÇÃO (ELIMINE A alínea QUE NÃO SE APLIQUE): 1) Comunicação livre (10’) 2) Póster

TÍTULO: IDENTIFICAÇÃO DOS AUTORES

(Dados obrigatórios: Nome; Local de trabalho (Instituição/Serviço); Contactos (Tel. e Email)

PROBLEMA OU INTRODUÇÃO

(Identificação da situação | Formulação da questão)

OBJECTIVO (S) METODOLOGIA

(amostra; Recolha da informação; Instrumentos; Tratamento de dados/análise)

PRINCIPAIS RESULTADOS CONCLUSÕES

Ref. Bibliográficas relacionadas com o assunto (APA) Nota: Resumo não pode ter mais de 500 palavras (Letra Arial 11, espaço 1,5).

Brevemente submissão online ou enviar para: dir.spesm@gmail.com

ASPESM

Mais informações sobre a SPESM em:

www.aspesm.org


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