Dor Abdominal Aguda Não Traumática 153
O conceito de reação peritoneal, tradução clínica de inflamação ou infeção do peritoneu parietal, é um dos fundamentos da caracterização da DAA mais conotados com a atuação dos cirurgiões. Para determinar o diagnóstico de reação peritoneal, o doente e o observador têm que funcionar em “conjugação de intenções”, isto é, o doente não pode ser uma “barriga a palpar”, nem o observador pode ser uma “mão com pressa” de chamar alguém para decidir, antes de ter explicado ao doente que a sua observação será tanto mais correta quanto maior for a colaboração conseguida, e que desta afinação resulta a eficácia das decisões diagnósticas e da celeridade do tratamento. Os critérios para considerar a presença de reação peritoneal são os que apresentamos de seguida e são estes “detalhes” que devem ser procurados na observação de um doente com suspeita de abdómen agudo: Hipomobilidade abdominal. Aumento ou assimetria involuntária do tónus muscular (contratura → rigidez). Aumento da dor à descompressão, ou à percussão ou com a tosse. Ventre em tábua (contração involuntária dos músculos abdominais, não ultrapassável pela palpação). As implicações de considerar que um doente tem reação peritoneal, no contexto de abdómen agudo, são importantes para a ação do médico que faz este diagnóstico, pois este estado clínico traduz geralmente uma patologia com tratamento cirúrgico urgente, se forem excluídas as peritonites primárias (imunodeprimidos e outros). Não raramente os doentes são observados após um período prolongado de doença, tendo o organismo circunscrito o processo inflamatório/infecioso pela formação de um abcesso. Nestas circunstâncias a palpação abdominal revela um empastamento (plastron – por exemplo, pericolecistite aguda) ou mesmo uma massa dolorosa, geralmente não muito dura e de limites mal definidos (abcesso – por exemplo, periapendicular, pericólico nas diverticulites perfuradas). Pesquisa dos pontos herniários – os principais pontos fracos da parede abdominal (umbilical, inguinocrurais e eventrações) devem ser cuidadosamente observados para excluir a possibilidade de encarceramento/estrangulamento herniário. Toque retal/vaginal – a presença de preenchimento, dor nos fundos de saco de Douglas corrobora o diagnóstico de inflamação/infeção peritoneal e influencia a decisão terapêutica no sentido da cirurgia. No diagnóstico de doença inflamatória pélvica a dor à mobilização do útero e o preenchimento dos fundos de saco são elementos semiológicos discriminativos.
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técnicas
CONFIRMAÇÃO DIAGNÓSTICA Os procedimentos complementares para a confirmação da etiologia da DAA estão hoje relativamente padronizados, mas a conduta terapêutica, designadamente a necessidade e oportunidade de uma intervenção cirúrgica urgente, não depende exclusivamente dos valores laboratoriais ou das imagens, são uma decisão clínica, sustentada, ou não, por estes meios complementares. “Overreliance on laboratory tests and radiological evaluations will very often mislead the clinician, especially if the history and the physical examination are less than diligent and complete” in Silen, Cope's early diagnosis of the acute abdomen (2000). A sequência dos exames a realizar deve ter em consideração a localização/tipo de dor e os quadros clínicos mais frequentemente associados a eles.