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Sobre desenvolver um TFG
Diante do meu envolvimento com o tema, estava muito claro para mim que o meu trabalho final de graduação (TFG) abordaria construções de terra, eu só não sabia exatamente o quê. Desde o início, mesmo antes, quando eu apenas pensava sobre ele, não passava pela minha cabeça desenvolver um projeto que não seria materializado posteriormente. Com tantas demandas reais mundo afora, dedicar minha energia a algo que fosse imaginário sem atender à necessidade real de alguém ou de algum grupo não fazia sentido nenhum para mim.
Além disso, a busca por um trabalho prático, em que eu pudesse participar da materialização, foi um dos meus objetivos iniciais, visto que eu sabia o quão rico em aprendizado o processo construtivo pode ser. Nos dois semestres iniciais, maturando o TFG, busquei encontrar alguma demanda projetualconstrutiva para trabalhar. Me aproximei de várias possíveis situações de trabalho, tendo a disciplina de Práticas em tecnologias construtivas - ARQ142, ministrada pelo professor Daniel Marostegan como um suporte nesse processo. Vivenciei três semestres da disciplina como monitora, junto com outros estudantes, e me vi em vários momentos refletindo como ela poderia me ajudar no trabalho.
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Com a disciplina, atuamos na ocupação Manoel Faustino do MSTB em virtude das atividades previamente ali desenvolvidas pela Residência em Arquitetura (RAU+E). Junto com as moradoras e moradores, iniciamos a construção da cozinha comunitária das mulheres da ocupação e foi, inclusive, um possível objeto de trabalho a ser desenvolvido. Porém, diante dos fluxos, o desenvolvimento do TFG na ocupação não foi adiante.
Outro possível objeto de trabalho que comecei a desenvolver foi um protótipo de abrigo emergencial. Com os deslizamentos de terra ocorridos na Gamboa1no meio de 2019, e com a atuação no local da Residência (RAU+E), a possibilidade de disponibilizar, na faculdade, abrigos montáveis que pudessem socorrer às famílias em momentos como esse seria algo bastante valioso.
Fiz estudos de conexões pantográficas2 que permitissem a criação de estruturas retráteis de fácil montagem e desmontagem. Para a estrutura, pensei no bambu por ser um material leve, e que receberia, por cima, uma lona. Esse foi o único momento que me afastei da terra enquanto materialidade do TFG. Ainda assim, o bambu vem da terra. Maquetes e estudos foram realizados, mas não fui adiante com essa proposta.
Em outubro de 2019 entrei em contato com a proposta do Espaço Educativo de Permacultura Águas do Ipitanga (EEPAI), idealizado por duas educadoras. A proposta do EEPAI é de um espaço de permacultura em um bairro popular de Salvador, Cajazeiras. A preservação do Rio Ipitanga é o foco principal do Espaço Educativo, que tem como base a pedagogia freireana3 para a prática educativa comunitária. Foram meses de amadurecimento, diálogos, visitas à terrenos e escolas, leituras de textos e construção do imaginário espacial do EEPAI...
A proposta do EEPAI envolve muito do que eu buscava trabalhar: permacultura e bioconstrução em um contexto periférico urbano e de cunho educativo, atendendo a um grupo popular que se enquadra no perfil de assessoria técnica com base na lei nº 11.888.4 .
A despeito de meu interesse em trabalhar com o EEPAI, veio a pandemia e tudo mudou. Os trabalhos com o EEPAI tiveram que ser pausados pois, para o desenvolvimento do projeto que eu havia formulado, o envolvimento físico com a comunidade era fundamental. Eis que me vi numa situação em que eu precisava dar um novo rumo ao trabalho a fim de que eu pudesse desenvolvê-lo e, finalmente, me graduar.
A essa altura do campeonato, e entregue às constantes reflexões sobre algo que pudesse vir a se tornar meu trabalho, numa conversa pós-almoço, meus sogros me sugeriram fazer um trabalho relatando as experiências que eu já tive na bioconstrução. Num contexto de quarentena, sem poder sair de casa, eu percebi que esse realmente seria o melhor caminho: apesar de não ser exatamente o que eu buscava desde o início, o trabalho poderia estimular discussões interessantes no espaço acadêmico.
A FAUFBA ainda é uma escola que, predominantemente, tem no projetodesenho o objeto final esperado no TFG. Porém, por valorizar o processo e não o desenho como suposto objeto final, compartilho aqui minhas experiências e reflexões.