Efêmero Revisitado: Conversas sobre teatro e cultura digital

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os atores. “Era possível agora fazer uma família se sentar à mesa para uma refeição, por exemplo, com móveis verdadeiros em cena, e com a possibilidade de as marcas aproveitarem toda a extensão do palco”, escreve Heliodora17. A dramaturgia também se diferencia; retrata mais situações cotidianas e menos questões épicas. “Como o novo público burguês não tinha muita paciência para grandes problemas trágicos, o casamento, o adultério, o divórcio, tudo visto pelo prisma do dinheiro, passaram a ser os temas favoritos do teatro realista”, afirma Heliodora, que completa: “Aparece, então, a peça bem feita, que, na verdade, tem como sua principal característica apresentar problemas não muito profundos, com soluções calculadas para deixar a plateia satisfeita, muitas vezes contente por se sentir mais sensata ou boa do que os personagens da trama18”. Era o nascimento de um tipo de teatro que, hoje, predomina nas salas de espetáculo no Brasil (e mundo) afora. Na virada do século XIX para o XX, dois nomes ligados ao simbolismo merecem destaque na complexificação do uso da luz elétrica no teatro e na sua integração com a cenografia: Adolphe Appia e Edward Gordon Craig. O suíço Appia, nascido em Genebra em 1862 e falecido na França em 1928, é um dos primeiros a pensar a luz como instrumento de linguagem, não mera função na peça. Cenógrafo e iluminador, ele propõe a subversão do cenário realista, que tenta mostrar a realidade tal como é, por aquele que sugere mais do que representa; a troca do bidimensional da época por um tridimensional, mais afeito ao modo como os atores se colocam em cena. Para isso, constrói cenários com planos inclinados, blocos pesados, cubos, telas e escadas que “dão ponto de apoio aos atores e, ao mesmo tempo, são obstáculos contra os quais estes devem lutar19”. Nesse jogo de sugestões entre os atores e o cenário, a luz ganhava destaque; passava a ter a função de esculpir e modular as formas e os volumes da cena, provocando o aparecimento e o desaparecimento dos atores e da

17  Ibid., p.90. 18  Ibid., p.87. 19  Em TELLO, Nerio; RAVASSI, Alejandro. Historia del teatro para principiantes. Buenos Aires; Era Nasciente, 2006; p. 117. Tradução livre do espanhol.

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