Métodos de Planejamento Urbano: Projetos de Land Readjustment e Redesenvolvimento Urbano

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MÉTODOS DE PLANEJAMENTO URBANO projetos de land readjustment e redesenvolvimento urbano

Felipe Francisco de Souza

Primeira Edição

São Paulo, Brasil 2009


Primeira Edição 2009 Copyright © Felipe Francisco de Souza 2009 VENDA PROIBIDA e DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta publicação, protegida por copyright, pode ser reproduzida de qualquer forma ou por quaisquer meios sem a permissão por escrito e antecipada do detentor dos direitos autorais. A infração dos direitos mencionados configura-se apropriação indevida dos direitos intelectuais e patrimoniais do autor. Paulo’s Comunicação e Artes Gráficas Ltda. Rua São Joaquim 158, Liberdade – São Paulo – Brasil CEP 01508-000 - Tel.: (11) 3277-8214 http://www.graficapaulos.com.br/ Coordenação editorial: Mario Machado Vieira Filho Preparação e revisão: Del Candeias, Juliana Camachi e Viviane Teixeira Mendes Tradução japonês-português: Fumiko Yoneta Diagramação e projeto gráfico: Hell Entertainment Inc. Capa: Shinichi Sato (vista panorâmica da área central de Tóquio) Impressão: Paulo’s Comunicação e Artes Gráficas Ltda. Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) SOUZA, Felipe Francisco de, 1978 - . Métodos de Planejamento Urbano: Projetos de Land Readjustment e Redesenvolvimento Urbano/ Felipe Francisco de Souza. – 1ª edição – São Paulo: Paulo’s Comunicação, 2009. p.: il. 300 páginas; 200 x 340 mm, 200 x 170 mm(F). ISBN 978-85-88246-11-9 1. cidades. 2. planejamento urbano. 3. urbanização I. Título. 09-11587 CDD 711.4


Dedico esta publicação à memória de meu pai, que lia Vinicius de Moraes antes de eu dormir.


SUMÁRIO Prefácios Institucionais Katsuhiro Haga: Diretor Geral da Agência de Cooperação Internacional do Japão vi Miguel Luiz Bucalem: Secretário da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo vii Toshi-ichi Tachibana: Presidente da Associação de Bolsistas da JICA de São Paulo viii

Prefácio: Desenvolvimento Urbano enfocado em Land Readjustment André Sorensen: Universidade de Toronto Scarborough no Canadá

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Introdução: Métodos de Reserva Fundiária para o Desenvolvimento Urbano

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Capítulo 1: O Contexto da Cooperação Técnica Internacional Capítulo 2: O Que é Land Readjustment?

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Capítulo 3: O Que é Projeto de Redesenvolvimento Urbano?

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Capítulo 4: O Status do Land Readjustment no Mundo

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Capítulo 5: As Possibilidades de Aplicação do Land Readjustment no Brasil 219 Referências Bibliográficas Sobre os Especialistas Sobre o Autor Crédito das Imagens Agradecimentos Ficha Técnica

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CONTRIBUIÇÕES 131 140 146 152 156 161 166 172 178 184 190 194 200 205 229

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Land readjustment na Alemanha + projeto de land readjustment Frankfurter Bogen Hans Joachim Linke e Lisa Palomba: Universidade de Tecnologia de Darmstadt na Alemanha Rainer Müller-Jökel: Secretaria Municipal de Planejamento de Frankfurt na Alemanha Redesenvolvimento urbano na China + projeto de redesenvolvimento urbano Vila Yunong Ling-Hin Li e Xin Li: Universidade de Hong Kong na China Land readjustment na Colômbia + projeto de land readjustment Loma de los Bernal Juan Carlos Garcia Bocanegra: Universidade Nacional de Medellín na Colômbia Land readjustment na Finlândia Kauko Jussi Viitanen: Universidade de Tecnologia de Helsinque na Finlândia Land readjustment na Holanda + projeto de land readjustment Groningen Meerstad Adri Van Den Brink: Universidade de Wageningen na Holanda Redesenvolvimento urbano na Índia + projeto de redesenvolvimento urbano Sambhaji Nagar Vinit Mukhija: Universidade da Califórnia nos Estados Unidos da América Land readjustment na Indonésia + projeto de land readjustment Palangkaraya Tomohiko Yoshida e Sundung Sitorus: Universidade de Ritsumeikan no Japão Por que o land readjustment nas antigas colônias britânicas, mas não no Reino Unido? Robert Home: Universidade Anglia Ruskin na Inglaterra Land readjustment em Israel + projeto de land readjustment Schnin Rassem Khamaisi: Universidade de Haifa em Israel Land readjustment no Nepal + projeto de land readjustment Gongabu Sunil Babu Shrestha: Universidade Osaka Sangyo no Japão Kirti Kusum Joshi: Universidade Tokoku no Japão Land readjustment na Suécia + projeto de land readjustment Uddaberg Tommy Österberg: Agência Governamental Swedesurvey da Suécia Land readjustment em Taiwan + projeto de redesenvolvimento urbano Hsin-Yi Kuang-Hui Peng: Universidade Nacional de Tecnologia de Taipei em Taiwan Land readjustment na Tailândia + projeto de land readjustment Lampang Ittipong Tanmanee: Ministério de Interiores da Tailândia Land readjustment na Turquia + projeto de land readjustment Toklu-Besirli Tahsin Yomralioglu, Bayram Uzun e Recep Nisanci: Universidade de Karadeniz na Turquia Instrumentos urbanísticos prévios: contribuição de melhoria, requisição urbanística, consórcio imobiliário Domingos Theodoro de Azevedo Netto: Secretaria de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, Brasil Estudo de hipótese CDHU: Hortolândia A2 Sítio São João Renato Guimarães Pereira: Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano de São Paulo, Brasil


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PREFÁCIO INSTITUCIONAL É com satisfação que vejo publicado este livro, resultado do grande sucesso de seu antecessor “Land Readjustment e Operações Urbanas Consorciadas”, de autoria do senhor Felipe Francisco de Souza e coautoria do senhor Daniel Todtmann Montandon, ex-participantes do curso de treinamento “Urban development focused on Land Readjustment measures” no Japão. Esta publicação é resultado do projeto “follow-up” da JICA, por meio do qual ex-bolsistas que participaram de treinamento no Japão divulgam os conhecimentos adquiridos, adaptando-os à realidade de seus países. Nesse sentido, espero que este livro seja um exemplo de boas práticas para as futuras cooperações, em virtude do grande resultado obtido mundialmente quando do lançamento do primeiro livro. Espero que este livro que divulga o método do land readjustment e o método do redesenvolvimento urbano utilizado em diversos países, em especial no Japão, seja uma importante ferramenta para a formatação das políticas públicas e do aprimoramento do desenvolvimento urbano no Brasil e no mundo. Neste momento, em que comemoramos o Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, desejo que este livro seja um dos instrumentos para estreitar ainda mais os laços de amizade e fraternidade entre o Brasil e o Japão.

芳賀 克彦 Katsuhiro Haga Diretor Geral JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão


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PREFÁCIO INSTITUCIONAL Promover o mais intenso desenvolvimento urbano do Município de São Paulo tornou-se a inadiável conquista a ser perseguida, especialmente por parte do governo municipal, que tem a função precípua de induzir o florescimento e cuidar da ocupação territorial da quinta maior cidade do mundo. É preciso, neste momento, tirar as intenções do papel e promover aceleradamente a transformação de largos setores da cidade, ainda mantidos aquém da sua potencialidade. Para tanto, não basta que a Prefeitura exerça, tão somente, seu relevante poder regulador e fiscalizador: é fundamental que o poder público municipal lance mão dos mais adequados e avançados mecanismos indutores dessas transformações. Daí a importância de buscar subsídios na sólida experiência japonesa, examinando algumas de suas ferramentas – desde há muito empregadas em suas cidades – que resultaram em transformações positivas, como o land readjustment. Esses subsídios são importantes para ajustar os novos instrumentos que devem ser aplicados no desenho de nossa cidade, possibilitando rearranjar a ocupação territorial estabelecida em época passada e que hoje, por vezes, mostra-se inadequada para que se obtenha o maior aproveitamento possível de sua infraestrutura instalada. A presente publicação – a segunda na qual esta instituição se associa à JICA para difundir mais amplamente essas concepções de planejamento urbano e divulgar seus resultados – traz o depoimento de técnicos e estudiosos do assunto que, de diversas partes do mundo, relatam experiências no emprego do reajuste fundiário (como aqui denominamos o land readjustment), do qual o Japão é referência mundial. Assim pretendemos contribuir para que se realize o mais aprofundado debate em torno dos meios de promover o desenvolvimento desta cidade, enquanto providenciamos para que este processo se desencadeie com a celeridade que o momento requer.

ミグエル ルイズ ブカレン Miguel Luiz Bucalem Secretário de Desenvolvimento Urbano SMDU – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo


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PREFÁCIO INSTITUCIONAL No mundo em que vivemos tomado por grande recessão, as discussões sobre quais os métodos a serem estudados e quais as inovações a serem adaptadas tornaram-se fundamentais, sobretudo para conscientizar o poder público, a sociedade civil e demais entidades sobre a importância da renovação tecnológica no processo de desenvolvimento local. O método japonês de desenvolvimento urbano denominado land readjustment, tratado nesta publicação, traz elementos para essa discussão, cumprindo a função de disseminar o conhecimento aprendido no Japão, país propenso a desastres naturais e pioneiro em elaboração de técnicas e tecnologias de desenvolvimento urbano. Nos últimos anos, o debate sobre os problemas em grandes áreas urbanas aumentou significativamente. Esta publicação é exemplo disso, colaborando com críticas e sugestões que possam não apenas organizar o processo de transferência da tecnologia do land readjustment por meio da cooperação internacional com o governo japonês, mas também renovar a maneira como encaramos nossos problemas no Brasil. Por fim, a ABJICA-SP alcança mais uma vez seu objetivo de apoiar bolsistas da JICA, como o autor deste livro, e de apoiar avanços na renovação tecnológica dos métodos brasileiros, processo que a associação acompanha há bastante tempo. Fazemos votos de que as análises contidas neste livro possam ser absorvidas e de que o land readjustment possa ser traduzido, analisado, criticado e devidamente implementado no Brasil.

立花 俊一 Toshi-ichi Tachibana Presidente da Associação ABJICA-SP – Associação de Bolsistas da JICA em São Paulo


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PREFÁCIO: DESENVOLVIMENTO URBANO ENFOCADO EM LAND READJUSTMENT É um grande prazer escrever o prefácio para este novo volume editado pelo senhor Felipe Francisco de Souza sobre land readjustment, uma ferramenta de planejamento e desenvolvimento urbano e fundiário utilizada em diversos países ao redor do mundo, especialmente no Japão, mas ainda relativamente desconhecida em muitos países. Como esta publicação mostra de maneira eficaz, land readjustment precisa ser aprendido, criticamente examinado e adaptado a outros contextos. Neste momento da história mundial, depois de décadas de massiva urbanização, particularmente nos países em desenvolvimento, a população urbana é mais numerosa que a rural e estima-se que ultrapasse dois terços até 2030. Essa inundação de urbanização em grande parte está acontecendo nas cidades onde a capacidade do governo de regular o desenvolvimento, construir infraestrutura, assegurar espaços e instalações públicas adequadas, além de regular direitos sobre a propriedade fundiária, é fraca ou inexistente. Enormes áreas urbanas desenvolveram-se sem traços de planejamento urbano prévio: sem sistema viário com padrões estruturados, sem áreas verdes, sem quantidades mínimas de espaços públicos e sem a provisão de infraestrutura básica. A acumulação dessas disfunções comprometeu e reduziu a habitabilidade urbana, o convívio e a qualidade de vida nas regiões afetadas por esse processo. Depois que áreas urbanas foram subdivididas e povoadas, legal ou ilegalmente, é difícil reorganizar os limites dessas propriedades e custoso assegurar terras para propósitos coletivos, como ruas, calçadas, escolas, estacionamentos e outros usos públicos. As dificuldades surgem porque, entre outros fatores, qualquer intervenção requer deslocamento de usuários e porque o preço da terra aumenta com seu uso intensivo. Áreas urbanas ocupadas no passado, sobretudo nas cidades mais influenciadas pelo movimento de globalização, tendem atualmente a sofrer pressões para sua reconversão de uso e ocupação, e o antigo padrão de terrenos rurais, sistemas viários e divisões de propriedade será obstáculo importante para a emergente demanda por readequação ou reorganização de espaços urbanos. A mim parece certo que o século XXI verá um aumento de demanda para redesenhar e reorganizar áreas urbanas existentes, possuidoras de padrões obsoletos de propriedade e insuficientes de espaços públicos. Existem três principais formas de lidar com o conflito entre a evolução das necessidades e as limitações das divisões de propriedade existentes.


xii A primeira possibilidade é aquela pela qual alguns atores, sejam do Estado ou do setor privado, possam reunir várias propriedades urbanas em uma única propriedade, quer por aquisição voluntária ou obrigatória. Quando a terra pertence a um único proprietário, é possível desenvolvêla com padrões diferenciados e, se desejado, criar a diferença entre o limite das propriedades e dos espaços públicos. Essa abordagem normalmente requer grande investimento prévio provocando oposição o que significa que, na maioria das vezes, essa situação se concretiza com áreas relativamente pequenas em sua totalidade. A segunda possibilidade é aquela pela qual se promove e regula um processo de gradual mudança, em que as propriedades individuais são desenvolvidas e intensificadas, às vezes amalgamadas, e pela qual o Estado venha a adquirir terrenos para espaços públicos e infraestrutura urbana. Tal abordagem pode funcionar relativamente bem onde o modelo urbano atual não for muito problemático e o Estado tiver recursos financeiros adequados. Infelizmente, o valor dos terrenos urbanos é tão alto que se torna muito mais comum sua aquisição para estradas e certos projetos públicos emblemáticos, como novas prefeituras ou pontes, do que para outros espaços públicos irrestritos, como parques, calçadas e ciclovias, que tendem a não serem fornecidos. A terceira possibilidade é por meio de projetos de land readjustment, em que um padrão urbano inadequado ou obsoleto pode ser rearranjado, mantendo-se os direitos de propriedade existentes dos proprietários de terras, e ainda outros titulares de direitos, como inquilinos. Conforme o land readjustment, os valores dos direitos existentes são cuidadosamente avaliados e os limites das terras são reorganizados. Após o projeto, a porcentagem de direito de cada titular na área deverá, em princípio, ser a mesma que antes do projeto, mesmo que a área e a localização de sua propriedade sejam diferentes. É comum que a área posterior do terreno seja menor em virtude do aumento da quota para espaço dedicado à utilização pública, como estradas, parques e escolas, mas seu valor é superior em razão do valor agregado por essas instalações, bem como pela utilização mais intensa da terra. Esta última abordagem pode trazer duas vantagens significativas em comparação com as duas primeiras estratégias possíveis. Primeiro, a comunidade original pode ser preservada em vez de deslocada. Comunidades urbanas existentes no local rotineiramente geram valor econômico, social e capacidade de governança, comumente chamado de capital social, que está estreitamente ligado a uma localização física e às rotinas e interações da vida cotidiana desse lugar.


xiii Reformadores urbanos do século XX, defensores de remoção de favelas e outros visionários demasiadas vezes imaginaram o “apagamento” (higienização ou remoção) como o meio mais eficaz de lidar com os problemas urbanos, com iguais vezes catastróficas consequências sociais como tão eloquentemente argumentou Jane Jacobs (Jacobs 1961) e outros. Por envolver a comunidade existente em um processo de renovação e reabilitação, criando novos espaços públicos e infraestruturas, mantendo-a naquilo que se transformou o lugar após o projeto, é possível (embora não inevitável) para processos de land readjustment realmente melhorar e enriquecer o lugar com base no capital social, em vez de eliminá-lo. A segunda vantagem é não menos importante que a primeira, embora bastante diferente dela. Ao se exigir que todos os proprietários contribuam com uma parte do seu terreno para o espaço público e para a constituição de terrenos que serão vendidos para pagar a melhoria das infraestruturas, projetos de land readjustment podem obter melhores resultados na distribuição mais equitativa dos custos e benefícios da urbanização. Dessa maneira, funcionam como uma forma de trabalho conjunto para a melhoria do bem público, para o aumento do valor do terreno em razão do investimento na melhoria das infraestruturas públicas e como contribuição individual pelos proprietários de terras para os custos do projeto. Como é sabido, a urbanização normalmente gera enormes aumentos no valor da terra. Numa situação em que todos os custos das infraestruturas públicas (comprar terras para a construção de estradas e sistemas de esgoto, entre outros) são pagos pelo Estado pelos impostos, enquanto apenas uma pequena porcentagem da população detém terrenos, resulta-se uma grande desigualdade: o grande público está pagando pelas melhorias, mas apenas um pequeno número de proprietários de terra recebe os benefícios do aumento do valor da propriedade. Essa desigualdade estava tão clara para os pensadores urbanos no período anterior à Segunda Guerra Mundial, que determinado número de ações destinadas a recolher benefício fiscal foi iniciado. Dentre elas, talvez a mais famosa na Grã-Bretanha, foi o caso de uma taxa de 100% sobre este “incremento sem labor” do aumento dos valores dos terrenos, aplicada durante a década de 1940, mas posteriormente removida (Ratcliffe 1976; Cullingworth e Nadin 1994). Todas essas tentativas encontraram grandes problemas, mas não menos que os especialistas com dificuldade em medir com precisão consistente qual parte do aumento do valor da terra foi devido às ações públicas (como crescimento urbano ou infraestrutura pública) ou qual foi devido aos esforços privados (como capital de melhorias ou gestão eficaz).


xiv Atualmente a coleta de benefício fiscal também se revelou prática, mas politicamente difícil. Hoje existe muito menos aceitação da possibilidade da tributação sobre o “incremento sem labor” dos lucros da terra. Muitos países cobram de alguma forma um imposto sobre os ganhos do aumento dos valores desse capital, enquanto os impostos sobre a propriedade também são amplamente utilizados para pagar os custos da infraestrutura urbana. Uma grande vantagem do land readjustment é que se pode permitir uma contribuição significativa de proprietários de terras para os custos da urbanização no momento de desenvolvimento ou de reconversão, embora exista um incentivo para que proprietários participem porque os valores líquidos de suas terras aumentam. Além disso, a principal contribuição é na forma de terras para estradas, parques e outros espaços públicos, ao mesmo tempo que se ajuda a melhorar o domínio público e privado, contribuindo para a valorização da terra criando potencialmente parcerias vantajosas. Como adquirir terrenos para melhoria dos espaços públicos nas cidades pode ser proibitivamente caro, o uso do land readjustment pode viabilizar projetos que não seriam possíveis de outro modo. A importante contribuição na abordagem das Operações Urbanas Consorciadas e das Zonas Especiais de Interesse Social delineadas nos estudos de caso em São Paulo, incluída nesta publicação, consiste no fato de que, em áreas possíveis de adensamento, uma das principais condições para o aumento do valor da terra encontra-se no direito de se criar espaço adicional, geralmente na forma de altos edifícios. No Japão, essa condição nunca poderia ser criada porque o seu sistema de zoneamento é tão inflexível que se torna quase impossível “rezonear” áreas como incentivo aos projetos de land readjustment. Sem o “rezoneamento”, ou algum mecanismo semelhante para permitir maior intensidade do uso da terra, não é fácil obter aumento dos valores da terra que sirva para compensar proprietários por sua contribuição. No Japão, o que se conseguiu por meio do land readjustment foi a criação de novas e maiores parcelas de terrenos conectadas a ruas mais amplas, e somente assim a permissão para a construção de altos edifícios. No sistema de São Paulo, essa limitação é superada diretamente por meio do “rezoneamento” vinculado à realização do projeto. Também é digno de nota, penso eu que, na prática, projetos de land readjustment são bastante difíceis de executar, como demonstrado por vários dos estudos de caso apresentados nesta publicação. Os proprietários são compreensivelmente cautelosos e antirrisco, e embora o land readjustment prometa benefícios, tanto públicos como privados, os proprietários das terras


xv consideram o equilíbrio de riscos e benefícios, bem como o período de interrupção de uso de sua propriedade enquanto o projeto está em curso, além da possibilidade de que algo possa dar errado. A minha principal preocupação com algumas literaturas japonesas sobre o land readjustment, especialmente as publicadas em inglês, refere-se ao fato de que elas constantemente escondem as dificuldades de se concluir este tipo de projeto, bem como a vigorosa oposição aos projetos de land readjustment surgida no Japão (Sorensen 2000; Sorensen 2007). A apresentação de uma imagem idealizada do land readjustment é desafortunada, tanto porque torna mais difícil compreender a oposição encontrada em outros países, não como a exceção, mas provavelmente como a regra, quanto por esconder os enormes esforços dos urbanistas japoneses e das comunidades em ultrapassar os obstáculos para conseguir a realização de um grande número de projetos válidos. Não há dúvida de que o land readjustment pode produzir grandes benefícios públicos e privados, mas não parece ser útil fingir que seja fácil ou simples alcançar tal sucesso. O maior valor desta publicação está em reunir estudos de caso de um vasto leque de diferentes instrumentos referentes a muitos países que realizam as funções básicas do land readjustment (desde reordenar padrões de propriedade enquanto se recolhem contribuições dos residentes até manter as comunidades existentes no local), atingindo uma melhor compreensão das contribuições fundamentais do método aos sistemas de governança e de planejamento urbano no Brasil.

アンドレ ソレンセン André Sorensen Professor de Geografia Urbana Universidade de Toronto Scarborough no Canadá


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INTRODUÇÃO: MÉTODOS DE RESERVA FUNDIÁRIA PARA O D ­ ESENVOLVIMENTO URBANO Diálogo sobre cidades Esta publicação é o resultado de três anos de esforços iniciados com o curso “Urban development focused on Land Readjustment measures” realizado em 2005, combinados com a perícia e os recursos da JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão –, por meio da Prefeitura do Município de São Paulo, na tentativa de realizar mudanças estruturais significativas nos princípios locais do planejamento urbano brasileiro. O objetivo desta publicação não é apenas transcrever aquilo que foi ministrado no Japão e direcioná-lo a um público técnico e multidisciplinar relacionado ao tema “planejamento urbano”: mas criar condições para discutir uma nova sistemática quanto à reformulação de nossas cidades, buscando soluções adaptáveis a respeito especialmente de dois problemas que afetam as cidades brasileiras (e a tantas outras no mundo): o crescimento urbano desordenado e a disposição de reserva fundiária (de terreno) para o desenvolvimento urbano. A respeito do crescimento urbano desordenado, esse acontece quando as cidades, sobretudo nos países periféricos, absorvem enormes contingentes populacionais, acomodando-os em “estruturas de ambientes urbanos completamente diferentes, [...] difusos e desorganizados” (Sieverts 2003, p.3), resultado da “transformação estrutural e intensificação da interação de todos os pontos de um contínuo urbano e rural” (Guldin 2001, p.14). Viver sob condições urbanas difusas, desorganizadas e de precariedade urbanística, nos denominados “espaços urbanos obsoletos”, produz “uma vida diária insegura e arriscada, bloqueia o acesso a empregos, oportunidades educacionais e culturais” (Rolnik 2000, p.75), que estão concentrados e dispostos em outros pontos da cidade. Esses espaços urbanos obsoletos necessitam de intervenções não apenas porque são carentes de equipamentos urbanos adequados, mas também porque abrigam classes mais baixas, excluídas e em plena expansão (Davis 2006), que não conseguem ter acesso às possibilidades oferecidas pelas sociedades e economias, ou delas beneficiar-se. A respeito da disposição da reserva fundiária para o desenvolvimento urbano, quando o aumento dos níveis de urbanização gera aumento de demanda por serviços urbanos: ou terrenos


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introdução

públicos foram reservados ou o poder público terá de adquirir parcelas de terrenos privados para fornecer sistema viário, áreas verdes ou outras infraestruturas urbanas necessárias. Com a falta de recursos do poder público, uma constante nos países periféricos, algumas áreas são selecionadas para sua adequação às novas demandas, enquanto outras permanecerão desprivilegiadas, sem receber quaisquer melhorias estruturais por anos. Utilizando-se do princípio básico da economia, quando o suprimento é escasso numa situação de grande demanda o valor tende a subir, o que não foi diferente com o valor da terra urbana, gerando grande obstáculo ao desenvolvimento local: o aumento sem precedente dos valores de terrenos urbanizados. O valor da terra urbana nos países em desenvolvimento vem crescendo nas últimas décadas em níveis superiores às taxas de inflação ou do Produto Interno Bruto (PIB), conforme argumentado por Edwin Mills e Byung-Nak Song já na década de 1970, resultado das distorções causadas pela desigualdade entre as melhores e as piores terras servidas por infraestrutura (Mills e Song 1977). A parcela de terra, sobretudo a urbana, possui determinantes únicas que a transformam num agente de poder: a. Toda parcela de terra possui localização geográfica única, sendo impossível, por esse único motivo, produzir parcela de terra idêntica. Esse simples fator concede à parcela de terra níveis de monopólio especialmente para aqueles que a controlam em áreas onde o desenvolvimento econômico na cidade foi e continua sendo maior; b. Ainda que seja impossível produzir parcela de terra idêntica, é possível reproduzir determinadas características pelo fornecimento de infraestrutura e toda infraestrutura instalada gera valorização direta e proporcional à parcela de terra. Lembrando que parcelas de terra urbana requerem enorme variedade de infraestrutura, tais como água, luz, eletricidade, sistema viário, esgoto, drenagem, áreas verdes e outras instalações necessárias; c. Nem toda parcela de terra pode ser tratada como bem público, e isso implica a existência de transações de mercado, algo que não se pode extinguir. As transações de mercado acontecem por meio da comparação entre as terras menos produtivas (ou menos equipadas) e as melhores terras (ou mais equipadas), somada às suas externalidades econômicas e ambientais. Nas cidades que concentram qualidades em espaços exíguos, impedidos de sua partilha por todos e cercados por contingentes de espaços urbanos obsoletos, os melhores espaços equipados


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estão constantemente ameaçados pelas cobiças imobiliárias, por assaltos e por congestionamentos. Espaços urbanos segregados e excludentes são resultados de um conjunto de determinações sociais, dentre elas aquelas emanadas pelo poder público no exercício de suas atribuições em: “controlar a forma de construir o espaço urbano, estabelecendo normas; planejar o crescimento e o desenvolvimento nas cidades e metrópoles, definindo metas e políticas públicas; e investir em obras de infraestrutura urbana e equipamentos sociais, urbanificando o território” (Grostein 2001, p.31). Conceito de distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano O urbanismo contemporâneo está baseado em sistemas de ordenamento territorial por meio da delimitação entre o espaço urbano e o rural, pela lei de zoneamento (uso e ocupação do solo) e, quando presente, por meio de mecanismos de interferência específica sobre setores pré-qualificados e inseridos no próprio zoneamento. Portanto, a grande maioria dos estudos urbanísticos, incluindo os apresentados nesta publicação, refere-se ao ordenamento das relações possíveis dentro de uma cidade, sua gestão eficaz e desejadamente equilibrada. De maneira geral, os sistemas de ordenamento de cada país estão relacionados aos princípios nacionais (da Constituição), que dizem respeito aos direitos individuais e coletivos sobre a propriedade privada, assim como a relação com a propriedade pública. As nações criam leis de caráter urbanístico que identificam as escalas de atuação dos interesses público e privado, seus planos inerentes, os instrumentos incidentes e, sobretudo, os resultados esperados. A regulação dos interesses públicos e privados (proprietários, intermediários, compradores, vendedores e financiadores) é parte integrante do processo de construção de uma cidade: a tomada de decisão de todos gerará reflexos futuros nos âmbitos sociais, ambientais, culturais e, logicamente, urbanísticos. De abrangência complexa, essas decisões criam condições para que a economia gerada em virtude de suas ações seja justa e equilibrada, ou injusta e desequilibrada, dependendo do resultado dessas regulações. Antes mesmo de defender o equilíbrio necessário sobre as ações urbanas, fica mais evidente descrever o resultado oposto, relativo ao desequilíbrio destas ações. Alguns exemplos são: a.

A capacidade da rede de drenagem torna-se insuficiente ao longo do tempo em razão


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introdução do crescente processo de impermeabilização do solo, resultado da expansão irregular e do descumprimento da legislação, o que causa diversos problemas ambientais, como inundações anuais em estações chuvosas; b. Parte da população de baixa renda não faz uso dos recursos do mercado de construção formal, consequência da incapacidade do governo na produção de habitação de interesse social e equipamentos públicos para enfrentar a demanda; c. O alto nível de deslocamento populacional torna difícil, economicamente, viabilizar o sistema de transporte público de massa, tornando-o insuficiente e sobrecarregando o sistema viário, resultado do aumento significativo da frota de automóveis; d. O processo de dispersão e crescimento desordenado são impactantes sobre o meio ambiente, consequência das ocupações ilegais em área de mananciais, o que põe em risco a qualidade da água que abastece as cidades.

Além disso, nas nações capitalistas a cidade passou a ser uma grande operação imobiliária, na qual as ditas leis urbanísticas (incluindo as leis de planejamento urbano, os planos diretores e as leis de uso e ocupação do solo) criam as regras para controlar esse jogo imobiliário. Sem regras, a iniciativa privada, que nunca deixou de atuar segundo seus interesses, caracterizando-se, sobretudo pela obtenção do lucro, se apropriaria da cidade e criaria o que bem quisesse, seguindo esta sua premissa. O exame dessa perspectiva, por si só, cria vasta discussão; porém o que precisa ficar claro é que a cidade apenas como bem privado gera a desigualdade social, enquanto como bem coletivo consagra o espaço público, possibilita a cultura e viabiliza as interações, sendo o lucro apenas uma entre suas muitas funções. O arquiteto e teórico de urbanismo Rem Koolhaas, em sua análise sobre diversas cidades do mundo, chama a atenção para a cidade norte-americana de Houston, no Texas, antes símbolo da cultura regional, agora modelo e possível presságio para todas as cidades no mundo (Koolhaas 2001). Aparentemente uma cidade sem leis urbanísticas e zoneamento, Houston tem um Estado reduzido a fonte de subsídios para a iniciativa privada, sem qualquer função como ordenador. Isso torna o capital o único fator para o desenvolvimento urbano, criando distritos abandonados a cada novo vetor de desenvolvimento. Predatória, a cidade está à deriva dos anseios do mercado imobiliário, colecionando os piores índices de qualidade de vida e esgotando seus recursos naturais. No entanto, apresenta sinais de crescente e ampla expansão, sendo a terceira maior cidade dos Estados Unidos da América.


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Ou seja, o urbanismo contemporâneo reflete questões para se contrapor à realidade apresentada em contexto nacional e internacional: o setor privado executa com capital e investimentos privados obras pontuais aprovadas pela legislação, que regulamenta o uso e a ocupação do solo. Por outro lado, o poder público executa obras de infraestrutura utilizando exclusivamente recursos públicos (também subsídios nacionais ou internacionais) no espaço público ou privado (adquirido diretamente pela desapropriação compulsória), com o propósito de criar condições gerais de produção e consumo de bens públicos. Bens para os quais o setor privado controversamente contribui, mas dos quais se apropria e usufrui. Por isso o conceito de “distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano”, presente em muitas constituições no mundo, está em ampla discussão. Por si só, o conceito contém quatro definições: “distribuição (repartir, distribuir), equilibrada (imparcial, direita), dos custos (da urbanização, espaço público e infraestrutura), e benefícios (lucro imediato ou futuro, valorização)” (Carrillo 2002). Tais definições são importantes para o estudo das ações sobre o desenvolvimento urbano. Assim, a legislação urbanística que procura métodos e técnicas para fazer prevalecer a construção de infraestruturas autofinanciáveis, capturando os ganhos efetivos gerados em áreas mais valorizadas e distribuindo-as para criar outras áreas de valorização, de maneira que prevaleça o interesse público ou coletivo sobre o particular ou individual, de alguma forma incorpora esse conceito. Reforçando a relação entre o equilíbrio das ações do poder público e privado, temos o panorama de diversas cidades do chamado Primeiro Mundo que aplicam esse conceito com sucesso, obtendo resultados favoráveis, como os descritos a seguir: a. A transição entre o espaço urbano e o espaço rural foi e ainda é feita de maneira controlada; b. O desenvolvimento de centros e distritos urbanos foi e ainda é executado periodicamente; c. O sistema de financiamento do desenvolvimento urbano, no início escasso, foi e ainda é identificado por meio de iniciativas pioneiras e inovadoras; d. A parceria público-privado e a obtenção de recursos oriundos do próprio processo do desenvolvimento foram e ainda são utilizadas para originar fundos e recursos capazes de criar o efeito multiplicador em outras áreas. Atualmente, além desses resultados favoráveis, as cidades dos países desenvolvidos discutem soluções perante os novos desafios para equilibrar suas ações urbanas. Dentre esses novos desafios,


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introdução

o professor Konami Hirohide, da Universidade Tokyo Jogakkan, expôs as mudanças propostas para as cidades japonesas atualizando a ênfase do conceito: “controlar os projetos de desenvolvimento introduzindo o sistema de reciclagem de materiais, a política de consumo de pouca energia e os sistemas de energia limpa, como a solar e as estações de energia eólica” (Hirohide 2001, p.9). Diante desse quadro sobre o urbanismo contemporâneo, quais seriam as medidas mitigadoras possíveis para efetivamente interagirmos com o processo de construção das cidades, com o objetivo de reverter o desequilíbrio das ações urbanas presentes nos países em desenvolvimento e, assim, desenvolvê-las aplicando o conceito da “distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano”? Enquanto soluções e medidas mitigadoras são procuradas por especialistas em diferentes áreas de especialização, comprovou-se que “as medidas efetivas de interação são aquelas com as quais o plano para o uso do solo e o plano para a construção de melhorias urbanas devem realizar-se ao mesmo tempo que a interferência sobre a parcela de terra e das atividades privadas é controlada e guiada“ (argumento exposto no curso “Urban development focused on Land Readjustment measures” no Japão, em 2005). Métodos de reserva fundiária para o desenvolvimento urbano Diferentes capitais (financiamento, construção e promoção imobiliária), proprietários de terra ou imóveis e trabalhadores da construção civil estão entre os principais agentes que disputam lucros, juros, rendas e salários, mediados pelo papel do Estado, que regula o mercado, a terra, o financiamento e a força de trabalho. Cada forma de provisão da moradia implica diferentes formas de arranjo desses agentes: condomínio de casas unifamiliares, incorporação privada de apartamentos para a venda ou para a locação, promoção pública para a locação ou para a venda. Implica também diferentes formas de posse. Essas relações interferem na maneira como a terra é adquirida, organizada e reorganizada. Vamos primeiramente admitir que, “no que tange à iniciativa privada, detentora de terras ou imóveis ociosos, a disposição de investimentos desses agentes é dada pela taxa de juros” (Leirner 2006, p.2), o que significa que, primeiramente, manter a terra sem qualquer interferência é um ótimo negócio, e que qualquer ação sobre sua inércia é dada se o negócio superar uma sobrevalorização do capital em relação à taxa de oportunidade.


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Desconsiderando o dado ociosidade, temos os métodos fundamentais de interferência na parcela de terra conhecidos como métodos de transações para aquisição fundiária, tanto para empreendimentos ou incorporações privadas quanto para desapropriações para fins públicos. O modelo de aquisição privado é o processo em que o agente privado (novo proprietário, incorporador ou investidor) adquire uma ou mais parcelas de terra para desenvolver individualmente seu empreendimento, com o intuito de capturar a valorização do resultado final. Nas ocupações informais, o “laissez-faire” urbano, originado pelo descumprimento das legislações de planejamento urbano em áreas pouco consolidadas ou rurais, acontece pela rápida ocupação desordenada e pelo processo de crescimento populacional. Essa ocupação não acontece necessariamente por meio de transações de mercado, porém, quando consolidada, a ocupação gera futuras transações pela transformação do território rural em urbano. Por isso, a interferência realizada pelo mercado financeiro presente, no limite da regularidade e da irregularidade, busca uma margem de operação que considera o custo mínimo da urbanização, a expectativa de regularização (fator que encarece a parcela de terra) e a geração de lucro para o loteador informal (Smolka e Furtado 2001). O resultado dessa interferência cria problemas futuros, pois dificilmente ocorre o desenvolvimento de áreas públicas e a conversão apropriada do uso do solo nesse processo. Nas ocupações formais, os empreendimentos variam de acordo com sua escala e investimento econômico. Para os de maior porte, que necessitam de aquisição de maior quantidade de pequenas parcelas de terra, o tempo de execução é longo. Durante o processo, proprietários que sejam entraves à incorporação são desconsiderados para acelerar o resultado final e a obtenção do lucro, fato que cria verdadeiros enclaves fundiários entre os novos conjuntos edificados. No período de espera para a aquisição das parcelas adjacentes, o agente privado cria artifícios, como vacância para estacionamentos, a fim de gerar economia enquanto aguarda o processo de incorporação chegar ao fim. O resultado dessas incorporações é geralmente desequilibrado do ponto de vista estrutural, por que não existe a transição de escala entre as parcelas de terra adjacentes e a nova parcela de terra. Estas incorporações corretamente respondem à nova demanda vocacional, mas são inadequadas se considerarmos sua relação com o suprimento de bens públicos, sobrecarregando as diversas redes de infraestrutura existentes. Para empreendimentos em que a parcela de terra possui grandes proporções, acontece o processo inverso ao da aquisição de pequenas parcelas de terra: o parcelamento ou a divisão


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fundiária. O parcelamento do solo torna-se um processo mais rápido quando o agente promotor detém o direito real ou equivalente ao do proprietário da parcela de terra. O resultado dessas divisões é geralmente desequilibrado do ponto de vista funcional, pois não há controle do uso do solo, prevalecendo a mono-funcionalidade de uso geralmente agregado ao inadequado suprimento de infraestrutura pública. Além disso, muitas vezes esse parcelamento está em desacordo com o entorno ou com as diretrizes públicas de crescimento para a região. Ainda que pouco conhecida, porém praticada em muitos lugares, existe a parceria entre agentes privados, denominada modelo de amalgamação. A amalgamação consiste na transferência de duas parcelas adjacentes e contíguas de terra de dois proprietários diferentes, a fim de tirar maior proveito da combinação de porções fragmentadas e inutilizadas de cada um, formando parcelas adequadas para o melhor uso. O resultado desse processo é vantajoso para ambos os proprietários, porém pode gerar conflitos, assumindo que um dos proprietários mantenha melhor localização e que esse ajuste possa gerar valorização maior para um do que para o outro. Caso esta postura seja assumida por um dos envolvidos, a negociação para a transferência de terras pode ser interrompida. O modelo de aquisição público é o processo pelo qual o poder público adquire voluntária ou compulsoriamente a parcela de terra para construir infraestrutura pública, como ruas, avenidas, rodovias e parques, por meio do instrumento conhecido como desapropriação. A desapropriação em projetos de desenvolvimento urbano é uma atividade bastante cara, e atualmente indesejada em casos de escassez de recursos ou problemas de endividamento do poder público. O resultado desse processo traz vantagens para o poder público porque é uma maneira de construir infraestrutura urbana em áreas consolidadas; porém, é sujeito a críticas em razão da exclusão da população local, e pelo fato de acarretar longos impasses com os proprietários pelo valor das indenizações oferecidas (valor de uso atual ou valor de uso futuro?). Além disso, esse modelo cria verdadeiros retalhos urbanos, quando instituições públicas desapropriam apenas parte do terreno, em vez de adquiri-lo na totalidade, para a execução da obra de infraestrutura. No que se refere às transações de mercado sem o uso da desapropriação, o poder público ainda pode controlar o preço da parcela de terra para diminuir sua especulação – a própria tributação reduz o valor do solo – (Smolka e Furtado 2001), pode exercer o direito de preempção (controle de aquisição em que o poder público tem preferência) ou pode tomá-la para si e então redistribuí-la em prol de determinadas classes ou usos. Todas são ações sujeitas a críticas e a forte oposição. Diante desse quadro, podemos entender que processos socioeconômicos interferem na


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forma como acontece a reorganização urbana, e que certos agentes têm se mostrado muito mais eficientes na ampliação do crescimento urbano do que instrumentos de intervenção urbana aplicados por políticas públicas têm se mostrado em controlar tal crescimento. Essa constatação foi identificada em outros contextos no âmbito internacional, em que muitos governos decidiram adotar outros meios de intervenção sobre a parcela de terra para efetivamente interagir com o processo de construção das cidades, revertendo o crescimento desordenado e obtendo reserva fundiária para o desenvolvimento urbano. Entre as ferramentas possíveis, temos o método de desenvolvimento urbano conhecido como land readjustment, que a rigor podemos traduzir como reajuste fundiário, reajuste de terras (ou terrenos) ou reajuste do solo (rural ou urbano). Como esse modelo ainda não foi incorporado ou adaptado à realidade brasileira (cuja realização é o foco desta publicação), manteremos a nomenclatura “land readjustment” sempre que nos referirmos ao modelo. O land readjustment é a conjugação e, em certa medida, um avanço nos métodos anteriormente descritos, e apresenta certas vantagens como: a. Permite corrigir os erros e as imperfeições do crescimento urbano desordenado; b. Permite responder à demanda de terrenos adequadamente urbanizados para novos empreendimentos; c. Permite novos parcelamentos de terra compatíveis com as diretrizes de crescimento propostas; d. Permite a transação e a gestão democrática entre todos os detentores de direitos sobre a terra, distribuindo de maneira justa os custos e os benefícios do desenvolvimento urbano; e. Permite a construção de novas infraestruturas públicas sem o caro instrumento da desapropriação, preservando os títulos de propriedade após a implementação do projeto; e f. Permite a utilização da própria terra para gerar recursos para pagar as obras, tornando o projeto quando não autofinanciável, viável do ponto de vista econômico. O land readjustment é um método de reserva fundiária que aplica o conceito de distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano. Efetivamente, é um método capaz de balancear o interesse público com o direito privado da propriedade. A ferramenta do land readjustment, como qualquer outra, possui vantagens e desvantagens, sendo ambas exploradas nesta publicação. O método é amplamente utilizado em diversos países no mundo, sobretudo


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Processo de crescimento desordenado Os proprietários A, B, C, D, E, F, G e H detêm direitos sobre as parcelas de terra sem infraestrutura básica necessária e sem facilidades públicas adequadas.

Processo de desenvolvimento privado individual, lote a lote Os proprietários A e F permanecem inertes a qualquer transformação fundiária; os proprietários B e E reparcelam seus lotes em outros menores; o proprietário C adquire a parcela de terra do proprietário D e reparcela em outros lotes menores; os Processo de desenvolvimento por meio de desapropriações proprietários G e H resolvem, em comum acordo, estabelecer a Os proprietários A e G são desapropriados; os proprietários B, transferência de parte de suas parcelas de terra adjacentes. D, E, e em maior proporção F, perdem parte de suas parcelas de terra por meio da desapropriação, porém beneficiam-se da Processo de desenvolvimento por meio do land readjustment infraestrutura e consequentemente obtêm a valorização da Todos os proprietários permanecem após a execução do projeto; parcela restante; os proprietário C e H permanecem intactos e as parcelas de terra agora possuem infraestrutura pública adequada mesmo não possuindo acesso direto, também se beneficiam e consequentemente obtêm maior valorização pelas modificações, da valorização pela proximidade à nova infraestrutura. mesmo que menores em tamanho após a execução do projeto.


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3Comparativo entre processos de intervenção fundiária.

Alemanha, Índia, Israel e em outros aos quais o Japão vem abrindo portas no âmbito da cooperação técnica internacional, como China, Nepal e Indonésia, para a aplicação e aprimoramento desta técnica de urbanismo em países com realidades distintas. Por que estudar o land readjustment no contexto do urbanismo japonês? O Japão é um arquipélago situado na costa leste da Ásia. Considerando suas mais de 4 mil ilhas, cerca de 70% da superfície do país é ocupada por florestas montanhosas. Sujeito a vulcões, furacões e terremotos, todos os anos acontecem cerca de mil abalos que podem ser sentidos quase semanalmente. O último terremoto de grandes proporções, o Hanshin-Awaji, ocorrido em janeiro de 1995, matou cerca de 4 mil pessoas, feriu mais de 14 mil e deixou outras 200 mil desabrigadas. “Não tem petróleo, nem ferro, nem carvão de boa qualidade, nem cobre, nem alumínio e outros minerais não ferrosos essenciais à atividade industrial. O Japão não tem solo arável suficiente para alimentar sua população” (Barros 1988, p.5). O Japão passou por grandes transformações, desde sua era feudal até o processo de recuperação do pós-guerra, seguidas por seu rápido crescimento econômico. O acelerado processo de urbanização gerou concentração de população em áreas industriais e descontrolada ocupação territorial, sendo que, anteriormente, comunidades agrícolas constituíam-se sem a provisão de infraestrutura básica e suporte para atividades da população. Sendo assim, como um país extremamente carente de riquezas naturais e minerais, incompleto e ineficiente em sua infraestrutura básica, alvo de diversos desastres naturais e devastado pela Segunda Guerra Mundial conseguiu alcançar o título de uma das maiores potências do mundo? O Japão não possui nada economicamente a seu favor a não ser 130 milhões de japoneses. Apesar de ter sido uma nação vencida e esgotada há menos de 50 anos, e embora há pouco mais de 100 anos ainda estivesse fechada, à beira do mundo, numa estrutura feudal, as últimas gerações transformaram-na em uma das maiores potências mundiais. A despeito das razões e análises históricas de todo o processo de crescimento do país e do denominado “fenômeno japonês”, sujeitas a laudos imediatistas, faz-se importante estudar o land readjustment no contexto do urbanismo japonês por uma única razão. O Japão foi o único país


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que, nas últimas décadas, conseguiu desenvolver inúmeras soluções aos problemas urbanos que todos os países em desenvolvimento enfrentam: migração das áreas rurais para os centros urbanos, expansão urbana e crescimento desordenado nas zonas periféricas, diminuição dos trabalhadores na indústria primária, inúmeros problemas ambientais, altos níveis de pobreza, e envelhecimento da sociedade. Além disso, o exemplo japonês e suas experiências foram amplamente incorporados por diversas cidades asiáticas, que lideram o processo de migração rural para o meio urbano (na China, estima-se que 200 milhões de pessoas passem pelo processo migratório até 2030) e também o processo de construção e renovação urbana no mundo (arranha-céus são erguidos um após o outro, mudando a paisagem urbana numa velocidade espantosa). Em Tóquio, a maior região metropolitana do mundo, com cerca de 35 milhões de habitantes, a reconstrução e seu processo de desenvolvimento após os bombardeios da Segunda Guerra Mundial contribuíram para estimular seu bem-sucedido processo de urbanização. Hoje ela apresenta condições que talvez apontem para o futuro desejável de todas as cidades no mundo: sistema eficiente de transporte, saneamento e fornecimento de água para todos e desenvolvimento urbano integrado constante. Breve panorama da publicação “Métodos de Planejamento Urbano: Projetos de Land Readjustment e Redesenvolvimento Urbano” localiza-se num quadro político de transição recente. Apesar dos passados vinte anos do término da ditadura militar e do processo de redemocratização no Brasil, esta publicação traz como enfoque a necessidade de mudança na formatação das políticas urbanas atuais, mais pautadas na forma do que em gestão ou em processos de implementação. A publicação admite por hipótese que a gestão urbana pode ser aprimorada mediante a atuação e a aplicação de instrumentos adequados pelo poder público, e que a falta de métodos apropriados para a prática do planejamento urbano e para a intervenção urbanística pode ser impedimento para uma administração satisfatória. A publicação considera também que nenhum instrumento constitui, isoladamente, elemento decisivo de indução ou de neutralização da exclusão social, mas pode ser um elemento gerador de agravamento ou mitigação dessa exclusão, a depender de sua conceituação e aplicação.


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Logicamente, esta publicação não pretende insinuar a cópia ou a incorporação integral de qualquer método ou metodologia, pois de antemão sabemos que isso seria impossível, mas entender, analisar comparativamente e promover um debate sobre as soluções adotadas no Japão e em outros países para temas que já conhecemos e temos tanta dificuldade em resolver. Nesse sentido, o capítulo 1 discute a dependência do capital fundiário intrínseco na cultura brasileira investigando seus laços históricos, até encontrar a atual oportunidade da reforma urbana no Brasil, liderada por movimentos sociais em busca da legitimação de diversos instrumentos de intervenção urbana. Apesar das inovadoras formulações de planejamento urbano, baseadas nos processos recentes, reconhece-se que os novos instrumentos técnicos não têm sido suficientes para a efetiva transformação do quadro urbanístico, configurando uma oportunidade para que organismos internacionais adquiram papel relevante ao influenciar a adoção de novos modelos de desenvolvimento. Nos capítulos 2 e 3 explicaremos os dois modelos de desenvolvimento, ferramentas alvo da cooperação técnica internacional: o land readjustment e o redesenvolvimento urbano, entendendo sua importância histórica no contexto japonês, a legislação em vigor que delineia os processos de desenvolvimento urbano no país, as metodologias atualmente empregadas e alguns estudos de caso de sucesso. No capítulo 4, assumindo, portanto, que a avaliação de experiências concretas mais significativas na aplicação dos modelos em outros contextos faz-se necessária, principalmente pela grande distância cultural e socioeconômica entre Brasil e Japão, solicitamos a diversos especialistas internacionais uma análise sobre a vigência desses instrumentos em seus países, sobretudo para delimitarmos a capacidade de exclusão e inclusão territorial, de renovação de espaços urbanos e de impacto nas condições de vida da população atingida onde as ferramentas foram aplicadas. No capítulo 5, a publicação orientará a análise das potencialidades do instrumento do land readjustment e do redesenvolvimento urbano no Brasil, primeiramente por meio do panorama dos instrumentos atualmente adotados no município de São Paulo e, após, por meio de dois estudos de hipótese de aplicação do instrumento. Essa análise acontece com o intuito de ampliar a discussão sobre o “reajuste fundiário”, novo instrumento que se encontra em discussão pelo Poder Legislativo, durante o processo de revisão do Plano Diretor Estratégico de São Paulo, oriundo da cooperação técnica internacional com o Japão.


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CAPÍTULO 1: O CONTEXTO DA COOPERAÇÃO TÉCNICA I­ NTERNACIONAL Legado histórico da questão fundiária nas políticas urbanas brasileiras Os problemas urbanos e o processo de urbanização no Brasil estão diretamente relacionados às terríveis condições de habitabilidade nas zonas rurais, onde coexistem estruturas fundiárias altamente concentradas, baixíssimos salários, falta de suporte aos pequenos agricultores e falta de conhecimento técnico especializado para desenvolver pequenas áreas. Estes fatores causaram a transferência da população rural para as grandes cidades, o que gerou um crescimento urbano descontrolado e sérios problemas sociais, como o desemprego e a existência de trabalhadores ilegais. Em virtude da baixa renda, a grande maioria desses habitantes não foi capaz de adquirir uma moradia adequada, ocupando espaços públicos como pontes, viadutos, ruas e praças, formando aquilo que conhecemos como assentamentos informais. Para a melhor compreensão desse contexto, sem nos limitarmos apenas ao resultado espacial da migração campo-cidade, faremos uma reflexão sobre a evolução dos problemas urbanos a partir da questão fundiária e do modo de produção do capital brasileiro, determinantes sobre o direito de propriedade no Brasil. A questão fundiária urbana no país, particularmente em suas grandes cidades, é uma das mais complicadas. O cenário é complexo porque o capitalismo brasileiro, sobretudo, bem diferente do capitalismo típico, desde a Lei de Terras de 1850 é altamente dependente da renda fundiária, especialmente a urbana, como substituta da chamada acumulação primitiva, ou originária, do capital. Esse modelo não gerou uma classe dominante como a burguesia europeia, e sim uma elite associada ao capital estrangeiro, impedindo o pleno desenvolvimento de suas forças produtivas em detrimento do desenvolvimento do capitalismo interno (Schiffer 1989). Conforme explicita Enio Moro Júnior sobre o desenvolvimento do capital brasileiro: Estas características da acumulação interna, comandada pela elite dominante no sentido de impedir o livre desenvolvimento das forças produtivas, é denominado de “acumulação entravada”, que restringe o mercado interno nacional às demandas de sua própria preservação assegurando a hegemonia da elite nacional atrelada às necessidades de reprodução do capitalismo internacional. Portanto, na acumulação entravada, uma parte do excedente não retorna à sociedade para impulsionar o desenvolvimento das forças produtivas internas.


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capítulo 1

Esta elite tem como sustentáculo de sua manutenção a imposição de mínimas condições para a reprodução de sua força de trabalho, impedindo a utilização de parte substancial do excedente na reprodução ampliada. (Moro Júnior 2007, p.36).

Do descobrimento do Brasil até 1850, ano da aprovação da Lei de Terras (decreto nº 601 de 1850), a ocupação do solo foi feita pela tomada de posse sem qualquer título prévio, conforme explicita Lígia Osório Silvia: Em meados do século XIX, o Estado imperial elaborou a primeira legislação agrária de longo alcance da nossa história, que ficou conhecida com a Lei de Terras de 1850. Essa intervenção do Estado na “questão da terra”, veio no bojo das grandes transformações que nesse período começaram a propelir a sociedade brasileira, ainda escravista e arcaica, nos rumos da modernidade. A Lei de Terras visava promover o ordenamento jurídico da propriedade da terra que a situação confusa herdada do período colonial tornava indispensável. Embora a relevância de uma lei que objetiva regularizar a situação jurídica dos proprietários de terras seja patente, no caso brasileiro seu significado assume ainda maior importância. Isso porque, em inúmeras análises sociológicas, aos proprietários de terras é atribuído um papel destacado na organização social e política do Estado imperial republicano. (Silva 1996, p.11).

Faz-se necessário destacar, porém, que o registro emitido à época não tinha por natureza a efetividade da propriedade, da forma como a conhecemos hoje; tinha apenas a natureza declaratória para diferenciar ao legislador o que era bem particular, e, por exclusão, o que era bem do Estado, classificado por terras de uso público e terras devolutas. Vale ressaltar que “terra devoluta” não significava o mesmo que “terra pública”. Neste caso, “terra devoluta” referia-se a terras que eram incultas, inexploradas, inaproveitadas, ou seja, as terras que acabariam voltando ao domínio público. Por meio desse legado histórico, a partir do momento de vigência da Lei de Terras de 1850 formou-se não apenas o direito de propriedade no Brasil, compreendendo os “proprietários” de terra (ou grupo social de grande poder econômico que buscava no novo cenário político a manutenção de seus interesses) como os agentes das transformações históricas que se processaram, mas também o direito de propriedade num contexto de exclusão. Por trás dessa lei, o Estado Imperial visava resolver dois problemas: regulamentar a questão agrária e subsidiar a imigração, trazendo europeus ao Brasil em substituição aos escravos nas fazendas. Ao regulamentar a questão agrária, o Estado Imperial pretendia apropriar-se das terras devolutas, que vinham passando de forma desordenada ao patrimônio particular, e também


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iniciar um processo de expropriação rural, na medida em que estabelecia que a aquisição de terras públicas somente seria feita por meios financeiros. Com isso, as terras públicas seriam vendidas a preços suficientemente altos, dificultando sua compra pelos imigrantes recém-chegados e tornando impossível seu acesso àqueles que até então usufruíam apenas de seu trabalho manual, ou seja, o negro e o caboclo. Como os produtores de café não estavam interessados em concorrer com novos potenciais produtores, a única maneira de afastar em curto prazo os colonos e em longo prazo os ex-escravos da propriedade da terra foi valorizando-a e tornando-os impossibilitados de possuí-las. Se primeiramente a Coroa decidia a quem doar posses, após a Lei de Terras de 1850 era a junta do Imperador que decidia a quem conceder, a quem vender e a que preço vender uma propriedade. O governo continuou a possuir o controle absoluto da movimentação da propriedade da terra no Brasil, e os grandes latifundiários possuíam seus representantes no governo os quais tomaram as rédeas da situação (Cirne 1954). Mesmo após a lei e os inúmeros esforços no sentido de regulamentação da questão fundiária, persistiu a passagem das terras devolutas para o domínio privado. E as legislações posteriores continuaram a regrar esse sistema de propriedade no Brasil, onde o direito de propriedade do particular era garantido em seu aspecto “principal” e, por que não dizê-lo, “natural”. Nas primeiras décadas do século XX, os Estados e as oligarquias agrárias ainda dominavam a política nacional e a questão fundiária, principalmente pelas limitações dispostas na Constituição de 1891 ao governo federal e pela inexistência de partidos políticos nacionais. Refletindo a reação contra a centralização do tempo do Império, enquanto ao governo federal cabia somente taxar as importações, aos estados cabia taxar as indústrias, a exportação de bens de consumo e, principalmente, as propriedades imobiliárias, podendo ainda manter suas próprias polícias e contrair empréstimos externos (Nunes 1997), perpetuando seu domínio sobre a questão fundiária. Com a crise mundial de 1929, que atingiu as lavouras de café e empurrou grandes contingentes populacionais para as cidades, os grupos oligárquicos foram enfraquecidos e uma forte elite estatal entrou em cena, ampliando a participação do Estado nas esferas econômica e social. A industrialização encontrou seu lugar nesse contexto, no qual a emergente burguesia industrial veio a predominar sobre a antiga oligarquia rural, e os centros urbanos brasileiros, notadamente São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, passaram a oferecer melhores condições à implementação de políticas de industrialização em substituição à exportação. Conforme explicita Júlio Roberto de


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Com a aceleração da atividade industrial durante a Segunda Guerra Mundial e a consequente hegemonia do setor fabril no período pós-guerra, as cidades brasileiras passaram a desempenhar dois novos papéis: absorver os cada vez maiores contingentes de desempregados, ora pela recessão econômica, ora pela crescente capitalização da atividade agrícola; e oferecer à indústria não apenas a infraestrutura física para sua expansão, mas também as condições necessárias à reprodução de sua força de trabalho, com destaque para a definição de um marco regulatório para as relações de trabalho. (Pinto 2008, p.3).

Em 1964 o Brasil sofre um golpe de Estado, e durante todo o período da ditadura militar a migração campo-cidade tornou-se ainda mais intensa, combinada com altas taxas de crescimento demográfico e com grandes investimentos na infraestrutura nacional, incluindo sistemas de energia, transporte e comunicação. Durante essa fase, o regime militar deixou claro, quanto à questão fundiária, que a propriedade privada seria garantida em seu aspecto “natural”, e que preferia conceder às empresas capitais subsidiados caso comprassem terrenos e fortalecessem a renda fundiária, perpetuando a aliança política entre o capital e a terra. Ainda durante o período da ditadura, apesar dos incríveis esforços no desenvolvimento industrial, pouco se fez no sentido de promulgar reformas urbanas, e com o controle cada vez maior dos setores dominantes na economia urbana, o aparelho estatal aplicou os recursos restantes em investimentos que beneficiaram pequena parcela da população, adotando normas e padrões urbanísticos que apenas favoreceriam o capital imobiliário. O planejamento urbano observado possuía “inúmeros planos e proposituras tecnicamente primorosos, mas inoperantes em ações para garantir sua plena implementação, contrapondo-se aos modelos europeus e norte-americanos, cujos processos e produtos de planejamento são viabilizados pelo Estado” (Moro Júnior 2007, p.42). A evolução da reforma urbana no Brasil: o Estatuto da Cidade Construiu-se, dessa maneira, em parte uma cidade legal, dotada de serviços e equipamentos urbanos similares aos dos países desenvolvidos, e uma outra cidade desconsiderando áreas marcadas pelo desemprego, pela ausência do poder público, pela falta de acesso a educação, Vista panorâmica da favela da Rocinha no Rio de Janeiro, Brasil. 4


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saúde, lazer, segurança e pela dificuldade de acesso à moradia. O planejar cidade no Brasil tornouse um exercício técnico da cidade legal para a cidade legal negando-se a cidade ilegal, ou seja, aquela em que não existe comprovação e controle da propriedade e do uso ou ocupação do solo, como as favelas (Maricato 2000). Com o fim do autoritarismo burocrático do regime, contrastando com a pouca importância dada pelo governo à questão urbana, emergiram movimentos sociais com a finalidade de lutar pela reforma urbana, reunindo as mais diversas áreas, entre profissionais, líderes comunitários, sindicalistas, ONGs, integrantes da igreja católica e servidores públicos (sendo que muitos, à época, atribuíam os problemas não a uma falta de planejamento e políticas urbanas, mas ao fato de que o planejamento e as políticas urbanas eram desenvolvidos no sentido de segregação social e negação à cidade ilegal). Essa reforma urbana tinha um pressuposto principal, e ainda atual, expressa por Haroldo Abreu como: “[...] reforma urbana implica uma nova concepção intelectual e moral da sociedade (e uma nova ética urbana) que condene a cidade como fonte de lucros para poucos e pauperização para muitos” (Abreu 1996, p.7). Na década de 1980 esse movimento ampliou-se, acompanhando a exigência da sociedade por liberdade nas políticas urbanas, que articulou no II Fórum Nacional de Reforma Urbana as seguintes premissas: a. A função social da propriedade e da cidade, entendida como uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do espaço urbano; b. O direito à cidadania, entendido em sua dimensão política de participação ampla dos habitantes das cidades na condução de seus destinos, assim como o direito de acesso às condições de vida urbana digna e ao usufruto de um espaço culturalmente rico e diversificado. (Bassul 2005, p.26).

Essas premissas fundamentaram a emenda popular (Emenda Popular da Reforma Urbana nº 63 de 1987), parcialmente aprovada na atual Constituição de 1988, que direcionou os constituintes a dedicar um capítulo específico à política urbana (os artigos 182 e 183, primeiros a historicamente cuidar da questão urbana no Brasil) na tentativa de implementar futuramente instrumentos e possibilidades de ordenamento das cidades, priorizando assim a propriedade da terra para sua finalidade social. Denotando a urgência e a importância social por soluções no contexto urbano, o texto constitucional de 1988 suscitou a apresentação de vários projetos de lei, oriundos de partidos e de iniciativa parlamentar. Entre os projetos apresentados, aquele que mais prosperou foi o Projeto de


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Lei nº 5.788 de 1990, apesar da forte oposição sofrida, a exemplo de outros similares e antecessores, conforme explicita José Roberto Bassul Campos: A reação dos setores conservadores da sociedade foi imediata. O empresariado urbano mais atrasado acusava o projeto de comunista, como, aliás, costumava acontecer naquele período com as iniciativas de índole democrática. A revista “Visão”, representativa do empresariado conservador, chegou a tratar o assunto em matéria de capa. Acusava o projeto de acabar com o direito de propriedade no Brasil. A reação sustou a tramitação da proposta, que se encontrava na Câmara dos Deputados. (Bassul 2005, p. 84).

E historicamente, diante de determinação de governos em cumprir sua tarefa de desapropriar áreas improdutivas ou em nome do desenvolvimento urbano, com base no interesse social previsto constitucionalmente, os proprietários procuram amparo no Poder Judiciário, no qual a maioria dos magistrados vem se posicionando a favor da propriedade da terra, até porque muitos juízes, promotores, desembargadores e advogados, assim como parlamentares, são grandes proprietários de terras. Após onze anos que permaneceu na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 5.788 de 1990, despojado de grande parte de sua carga conceitual, foi aprovado e devolvido ao Senado, que também o aprovou integralmente. Finalmente aprovado na esfera do Congresso Nacional, o projeto seguiu para a Presidência da República (sob o comando do então presidente Fernando Henrique Cardoso), que aprovou (entre poucos dispositivos vetados) a lei federal nº 10.257 de 2001 (que regulamenta os artigos 182 e 183 da Constituição Federal), denominada “Estatuto da Cidade”. Atualmente, por meio do Estatuto da Cidade, as operações de planejamento urbano no Brasil possuem suporte jurídico, visando à resolução dos graves problemas urbanos, estabelecendo normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol da segurança, do bem coletivo e do equilíbrio ambiental nas cidades. A partir dessa lei, o Plano Diretor, responsável pela política de desenvolvimento e expansão urbana, tornou-se obrigatório para as cidades com mais de 20 mil habitantes, e foram criados vários instrumentos para o cumprimento dessa função. Segundo Júlio Roberto de Souza Pinto, entre outros, o Estatuto da Cidade possui instrumentos de duas naturezas: “distributivo – relacionados à democratização de direitos e universalização de acesso a bens e serviços urbanos sob a responsabilidade direta, indireta ou compartilhada do poder público” (tais como o usucapião especial de imóvel urbano; a concessão especial para fins de moradia; o direito de superfície; a transferência do direito de construir; o estudo do impacto da vizinhança); e “redistributivo


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– passíveis de serem empregados na captura e redistribuição, com o objetivo de reduzir as desigualdades sociais de parcelas de mais-valias fundiárias urbanas que, produzidas em decorrência de investimentos públicos, tenham sido injustamente apropriadas por minorias privilegiadas” (tais como o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; o IPTU progressivo no tempo; a desapropriação mediante pagamento com títulos da dívida pública; o direito de preempção; a outorga onerosa do direito de construir e de alteração de uso; as operações urbanas consorciadas) (Pinto 2008, p.10). A despeito de uma subsequente avaliação de resultados e da importância da aplicação desses instrumentos, sobretudo após a aprovação do Estatuto da Cidade, o que temos de mais importante é o fato de que hoje o direito de propriedade no Brasil é substancialmente diferente: protegida desde a Carta Imperial de 1824, e condicionada ao cumprimento de sua função social desde a Constituição de 1934, com a Constituição de 1988 a garantia do direito de propriedade está condicionada à sua destinação. Nessa conjuntura “Constituição e Estatuto”, não foram poupados esforços no sentido de podar o uso absoluto do direito de propriedade, criando uma série de ônus para seu titular, desde restrições de exercício até a proibição de uso exclusivo, passando pela exigência de um aproveitamento racional e eficiente, com a adequada utilização de recursos naturais e preservação do meio ambiente (Calivion 2002). Transferência de instrumentos urbanísticos por meio de cooperação técnica internacional Contudo, no Brasil, segundo diversos autores (Rolnik et al.) os novos instrumentos técnicos aprovados na conjuntura “Constituição e Estatuto” não têm sido suficientes para a efetiva transformação do quadro urbanístico e “a renovação de discursos não é necessariamente acompanhada por uma renovação nas práticas e ainda menos por transformações na realidade territorial” (Cymbalista 2006, p.29). Tal quadro configura uma “janela de oportunidade” (Kingdon 1995) tanto para que movimentos sociais exerçam pressão sobre as políticas públicas vigentes quanto para que organismos internacionais adquiram papel relevante no financiamento de reformas, no intuito de influenciar os modelos que o Brasil possa vir a adotar para seu desenvolvimento urbano. A discussão sobre esses modelos sempre influenciou historicamente os urbanistas brasileiros, no sentido de olhar


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para os vizinhos a fim de aprender “o como desenvolver”. Segundo Chang: Os fatos históricos sobre as experiências de desenvolvimento dos países desenvolvidos deveriam ser mais amplamente divulgados. Isto não é só uma questão de fazer jus à história, mas também de permitir aos países em desenvolvimento que estejam melhor informados para escolher políticas e instituições que lhes sejam mais apropriadas. (Chang 2002, p.140).

Emergiu, assim, uma percepção de que eram necessárias a transferência e o financiamento de instrumentos de desenvolvimento urbano por meio de agências de cooperação técnica internacional, pela pertinência do enfrentamento das deficiências históricas no Brasil, sobretudo “no encargo do Estado [em] acelerar a industrialização, [...] na modernização da agricultura e no fornecimento da infraestrutura necessária à urbanização” (Evans 1993, p. 107). Além do aspecto financeiro, a introdução de ideias modernizadoras na administração pública é parte essencial dos modelos iniciados durante a reforma brasileira pós-regime militar. O enfrentamento das deficiências históricas brasileiras inclui a dificuldade que o Brasil tem experimentado na institucionalização de procedimentos de recrutamento meritocrático, consequência dos poderes de indicação política no corpo burocrático, conforme destaca Evans: As consequências negativas do apadrinhamento são exacerbadas pelo caráter dos padrões de carreira que tal sistema promove. Em vez de serem afinados com os ganhos de longo prazo via promoções baseadas em desempenho organizacional relevante, os burocratas brasileiros enfrentam carreiras em “staccato”, pontuadas pelos ritmos de mudança na liderança política e a gestão periódica de novas organizações. (Evans 1993, p.139140).

Mesmo no Brasil, que desfruta de estoques relativamente abundantes de mão de obra treinada e longa tradição de envolvimento do Estado na economia, dificilmente se encontram burocracias compreensíveis e coerentes: a capacidade do Estado de desempenhar funções administrativas e outras deve ser abordada como um bem escasso. A capacidade do Estado cresce de modo mais lento que a expansão das tarefas e o desempenho inadequado avilta sua legitimidade dificultando a reivindicação dos recursos necessários para aumentar sua capacidade. Nesse contexto, agências de cooperação internacional passam a desempenhar forte papel no sistema meritocrático do Brasil: elas recrutam, após um processo de postulação, projetos ou técnicos dos escalões superiores, em muitas organizações, para participar de financiamentos ou cursos de especialização. Após a execução desse treinamento, as agências abrem novas postulações para


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projetos de longo prazo, construindo um “ethos” e aumentando a perícia organizacional relevante. Dessa forma, as agências têm conjugado em sua agenda as ações de desenvolvimento local, da reforma do Estado e da descentralização político-administrativa nos países em que atuam. Muitas dessas reformas e treinamentos propostos em acordos de cooperação internacional, na incapacidade de transformar a burocracia como um todo, criam “bolsões de eficiência” no interior da burocracia, modernizando o aparelho do Estado “antes por acréscimo do que através de uma transformação mais ampla” (Evans 1993, p.140). As reformas resultantes vêm sendo caracterizadas, portanto, como “segmentadas, divididas ou fragmentadas”. Escalas consistentes de carreira que atam o indivíduo a metas corporativas e, ao mesmo tempo, permitem que adquira perícia e desempenho eficaz, ainda não estão institucionalizadas. As discussões sobre os bolsões de eficiência estão associadas a importantes mudanças sobre o papel do Estado e associadas principalmente a tendências de inovações nas funções do poder público. As mudanças são geralmente vinculadas a dificuldades de aprimoramento do Estado e a sua capacidade de superar crises, o que vem sendo identificado historicamente em alguns países, demonstrando não se tratar de eventos novos no governo e nos diversos setores da administração pública. O Estado, nesse sentido apresenta novos produtos de atividades do setor público, como programas e políticas públicas, e novo processos, ou seja, novas maneiras de desempenhar antigas funções (Farah 2006). No âmbito dos países centrais e periféricos, as respostas qualitativas vêm sendo notadamente pautadas por produções internas, em que as soluções estavam enraizadas na própria cultura local sem contato com interferências externas; ou ainda por produções externas, nas quais as soluções foram obtidas com interferências externas, sejam elas nacionais ou internacionais. Especialmente nos países periféricos, discutir essas interferências externas significa discutir conceitos adotados, sobretudo após a década de 1980, relacionados aos fenômenos de “globalização e fragmentação” (Lechner 1993) atrelados à crise econômica e à crise do próprio Estado, encontrados em diversas literaturas, sobre reformas via transferência, disseminação e difusão de inovações. Durante esses processos de reformas, estabeleceu-se o conceito de “best practices” (melhores práticas), advindo da literatura da administração e aplicado para se discutir a adoção de modelos estrangeiros, como um “modelo de peça única”, como a condensação prescritiva de um novo paradigma em uma arena política específica (Weyland 2004). Essa crítica ao modelo fechado foi eloquentemente elucidado pela autora Marta Farah durante o desenvolvimento do Programa


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Gestão Pública e Cidadania no Brasil, avançando para uma melhor compreensão do processo de reforma do Estado e transferência de modelos não como peças únicas e respostas acabadas, ou como a dependência do modelo por si só, mas como um conceito de “disseminação de inovações”. O termo “disseminação de inovações” expressa uma abordagem mais “horizontal”, incluindo a seleção ativa e a incorporação de ideias e práticas por outros; essa abordagem também sugere um papel mais ativo dos países e das localidades que buscam pela solução de seus problemas. São elementos comuns na utilização do termo, segundo estudos de Marta Farah (Farah 2006): a. Enfoque na influência de diferentes contextos na construção de cada solução e, ao mesmo tempo, a importância que o processo traz para a inovação como uma resposta a um desafio ou problema, da qual pode ser útil para outros como repertório de alternativas que possa ser considerado por aqueles com problemas similares; b. Enfoque contrário ao do modelo da “resposta fechada e completa” a ser transferida para outros países e localidades, mas em vez disso como algo em processo de transformação permanente; c. Enfoque na ideia de arranjo de elementos como algo particular, novo e bem-sucedido, uma condensação temporária de componentes, que podem ser potencialmente úteis a outros contextos e localidades, como uma solução a problemas específicos. Esta formação de institucionalizações e a disseminação de inovações nos países periféricos aptos à modernização está na agenda de muitos governos nos países centrais, entre eles o governo do Japão. A JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão – é uma instituição presente em diversos países e “implementada em prol da cooperação, destinando-se a auxiliar no desenvolvimento socioeconômico e elevação do bem-estar da sociedade com recursos, técnicos e financeiros, pagos por meio de impostos do contribuinte japonês” (JICA 2002, p.i). Como resultado desse empenho, o Japão tem-se figurado como o principal país doador para o Brasil durante anos. O Brasil ocupa o primeiro lugar na América Latina entre os países receptores de doação do Japão e desenvolve ativamente projetos de cooperação, especialmente nas áreas de Meio Ambiente, Indústria, Agricultura e Medidas para Redução da Pobreza (tais como a difusão básica da Saúde, Educação Básica, Assistência Social e Segurança). Mais da metade dos projetos de cooperação técnica executados no Brasil tem como parceiro o Japão, totalizando 51%, contra 18% dos recursos vindos da Alemanha, em segundo lugar (JICA 2002).


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Grande parte desse investimento (cerca de 90%) é realizada por meio de “projetos de fundo perdido”, ou seja, onde a instituição doadora não recebe de volta o montante gasto no projeto. Porém, a manutenção desses investimentos está baseada em métodos de avaliação apontados pela JICA. Dessa maneira, métodos de avaliação são importantes ferramentas para efetivar a cooperação indo além do escopo inicial apontado pelo projeto, buscando encontrar fatores de melhoria da meritocracia e de “accountability”. A avaliação da JICA está dividida em duas partes: a primeira no nível de atuação política, ou seja, avalia a execução e regeneração de ações políticas no processo de tomada de decisões, essenciais para a execução do projeto; e a segunda no nível da atuação técnica, ou seja, avalia a apresentação de programas, a execução de cada fase do projeto e seus respectivos resultados alcançados. Assim, em ambas as fases, analisa a capacidade dos receptores em gerir recursos e a capacidade de executar aquilo que fora acordado com a JICA. Resta, por fim, olharmos como foi feita a transferência de conhecimento entre os governos na área de políticas urbanas, utilizando o processo de cooperação técnica internacional oferecido pela JICA a urbanistas da SEMPLA – Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo (atual SMDU – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano) para treinamento no Japão, em 2005: O treinamento contou com 16 participantes de diversos países, e durante o desenvolvimento do treinamento foram adotadas duas modalidades: políticas públicas e a prática simulada na implementação de projetos urbanos. Ambos receberam treinamento sobre o método do land readjustment (método de desenvolvimento urbano japonês) por dois meses em Tóquio. Na última semana, ao final do curso, cada participante realizou uma apresentação final. Cada uma tinha por objetivo a aplicação do método aprendido em seus respectivos países, na tentativa de solucionar problemas específicos. (Montandon e Souza 2007, p.12).

Firmou-se, em seguida, um acordo para a produção de publicação, patrocinada com recursos oriundos do “follow-up cooperation” da JICA, modalidade de financiamento de pequenos eventos e publicações pós-curso, e com a contrapartida da SEMPLA, por meio de recursos humanos. Os denominados projetos de “follow-up cooperation” são projetos nos quais ex-bolsistas que participaram de treinamento no Japão divulgam os conhecimentos adquiridos, adaptando-os à realidade de seus países. Podem ser feitos de diversas maneiras: por meio de envio de equipe técnica para levantamentos, monitoramento, avaliação, supervisão e gerenciamento de obras e aquisições; por meio de fornecimento de novos equipamentos ou reposição de peças; ou pela realização de seminários, workshops e a elaboração de material educativo. No caso mencionado,


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os recursos do “follow-up cooperation” foram utilizados no processo de disseminação do método de planejamento urbano do land readjustment e do redesenvolvimento urbano no Brasil. Conforme alertou Maricato e Ferreira, “o ideário do planejamento urbano no Brasil configura “ideias fora do lugar” (Schwarz 1981) [porque] uma parte da realidade urbana – ilegal, oculta, ignorada – não é objeto de teorias, leis, planos e gestão [...], ao passo que a outra – a cidade do mercado hegemônico, a cidade oficial, formal, legal – mimetiza o debate internacional” (Maricato e Ferreira 2002, p.3). Com o atual processo de tentativa de adoção e “tradução” do land readjustment pelo Poder Legislativo de São Paulo, vamos dar sequência ao aprofundamento sobre os métodos (ou modelos) do land readjustment e do redesenvolvimento urbano, analisando suas vantagens e desvantagens, para que não exista mais espaço para “ideias fora do lugar”.


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CAPÍTULO 2: O QUE É LAND READJUSTMENT? Ideias por trás do land readjustment Land readjustment é um método de desenvolvimento urbano de execução compartilhada, em que os proprietários e inquilinos contribuem para o financiamento e a realização do projeto, dividindo de maneira equilibrada os custos e os benefícios do desenvolvimento urbano. Essa prática é autorizada por meio de lei específica e sua execução fica a cargo de uma agência técnica multidisciplinar conhecida como agência de implementação, que é responsável pelo processo de transformação das diversas unidades fundiárias inseridas na delimitação do projeto. O principal mecanismo de execução do land readjustment é o instrumento conhecido como replotting (que pode ser traduzido para o português como “reloteamento”, “reparcelamento”, “redimensionamento” ou “reposicionamento”). Replotting é a mudança de localização, formato e área de diversas parcelas de terra, segundo processos de amalgamação, subdivisão, relocação e troca, com o objetivo de atingir o cenário estipulado pelo projeto. A partir de sua execução, antigas parcelas de terra são transformadas em novas com localização e formatos total ou parcialmente diferentes. Projetos de land readjustment possuem diversas etapas de execução. Para uma boa implementação, muitos proprietários precisam ser relocados provisoriamente, a fim de possibilitar a execução de diversas obras, tais como o nivelamento e a preparação do solo, para a viabilização das instalações públicas. Isso ocorre antes da execução final do novo parcelamento aprovado e segue um plano de “replotting provisório”. Em princípio, este e o “definitivo” devem ser executados após um acordo em comum entre todos os proprietários e inquilinos envolvidos, respeitando a preservação dos títulos de propriedade e garantindo a transferência do título original da propriedade antiga para a nova parcela de terra. Esse processo de transformação das propriedades envolvidas é feito após tentativas de “acordo e consenso” entre proprietários e inquilinos, perante diretrizes e condições preestabelecidas pelo poder público. A adesão deve ser superior a um determinado número total de propriedades e proprietários integrantes do projeto, o que pode levar uma enorme quantidade de tempo até ser realizada. Em situações nas quais ela não se efetiva, a agência de implementação pode ser forçada


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a paralisar, definitivamente ou temporariamente, a execução do projeto. Quando há adesão, a agência de implementação pode trabalhar com um leque de opções no sentido de solucionar os impasses restantes do projeto. Entre os meios disponíveis para sanar as dificuldades, se encontram: desapropriação, concessão de exclusão da propriedade do perímetro de transformação mediante pagamento de impostos adicionais e imposição de restrições ao desenvolvimento da propriedade privada enquanto o projeto de land readjustment não chegar ao fim. Na maioria dos casos, após o replotting, as áreas das parcelas de terra são reduzidas em função da ampliação de espaços públicos e da constituição de novas infraestruturas necessárias para a readequação de determinadas áreas da cidade. Com a conclusão das obras, as propriedades podem ser valorizadas em função das novas ou otimizadas infraestruturas ou da melhoria em qualidade ambiental e acessibilidade. A absorção dos benefícios do desenvolvimento é feita por parte do poder público por meio da constituição de novas áreas públicas, e por parte da iniciativa privada, pela sobrevalorização urbana, ambiental e fundiária após a execução do projeto. A diferença em área de propriedade privada entre antes e depois do replotting medida em porcentagem é denominada de taxa de contribuição. Seu valor corresponde ao decréscimo que a propriedade sofre com a execução do projeto. Corresponde também à quantidade de benefícios que determinada área requer compartilhado entre todos os detentores de direitos. A contribuição pode ser em parcelas de terra ou dinheiro (quando proprietários precisam permanecer com a mesma área de terreno, porque ela está no limite do tamanho mínimo permitido pela legislação vigente). Assim, o replotting (reparcelamento) e a taxa de contribuição (doação de parte da terra privada para torná-la pública) servem a dois propósitos complementares: adequar o perímetro de intervenção às demandas necessárias de urbanização e criar condições de financiar parcial ou integralmente a execução das obras de infraestrutura. De que maneira pode-se financiar a execução de obras de infraestrutura? Em alguns países, o propósito do land readjustment é constituir, além do espaço público, terrenos-reserva oriundos da contribuição fundiária de cada proprietário. Os terrenos-reserva são parcelas de terra a serem comercializadas para o financiamento dos custos do próprio projeto e sua execução. Por isso, seu posicionamento, suas quantidades e suas dimensões são adequados e estabelecidos segundo critérios que levam em consideração: o fator econômico, ou seja, sua capacidade de retorno financeiro para viabilizar as novas instalações públicas propostas; e o fator de equidade, ou seja, sua capacidade de balancear a valorização gerada pelo próprio projeto.


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Apesar da venda de terrenos-reserva ser destinada ao pagamento do projeto e à execução das futuras infraestruturas, em diversos casos, o governo local ou nacional fornece subsídios para a implementação de vias estruturais ou outras infraestruturas de grande porte. O principal discurso sobre a participação de proprietários em projetos de land readjustment baseia-se na disposição das propriedades privadas para a constituição de espaços públicos mediante uma valorização da parcela de terra resultante em relação ao valor da propriedade anterior. “A priori”, o valor dos terrenos reparcelados deve ser maior do que o de antes do projeto, por causa da melhoria efetiva de sua utilização e da proximidade em relação às novas instalações urbanas, como áreas verdes, amplas vias de acesso e transporte público. Essa sobrevalorização é estabelecida pelo acréscimo ao valor do uso do solo entre o lote pré-desenvolvido e o pós-desenvolvido. A gestão do processo de transformação das diversas unidades fundiárias é realizada exclusivamente pelas agências de implementação. Trata-se de organização administrativa do setor público (governo local, estadual, nacional, corporações públicas etc.), do setor privado (cooperativa de proprietários, agente de promoção individual etc.) ou de combinação entre os dois setores (autarquia pública, corporações de capital misto etc.). Além de capitanear os processos de “acordo e consenso” entre proprietários e inquilinos durante a realização do projeto, agências de implementação também exercem papel fundamental ao coordenar a interlocução com as construtoras, empreiteiras e outras prestadoras de serviços para o planejamento e execução das obras. As agências também são responsáveis por estabelecer as regulações incidentes sobre o método e fornecer subsídios para o início da execução do projeto. Além disso, atuam como agentes de promoção, disponibilizando, na grande maioria dos casos, corpo técnico especializado para acompanhar ou guiar a população local. O land readjustment, portanto, é um método de planejamento urbano, entre outros disponíveis, para a gestão territorial urbana, utilizado em países com realidades distintas, para a reorganização de áreas rurais ou urbanas. Ele é realizado de maneira voluntária ou compulsória, com o objetivo de melhorar produtividade, eficiência e economia de parcelas de terra, dotandoas da infraestrutura devida. Também é amplo em escopo e finalidades, podendo ser dividido em cinco grandes categorias: a. Tipo 01 (desenvolvimento de zonas rurais): o land readjustment rural pode ser implementado para melhorar os antigos padrões das propriedades rurais em busca de melhoria de produtividade, de recursos hídricos, de acessibilidade para escoamento da produção e para


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capítulo 2 o fortalecimento da comunidade rural local; b. Tipo 02 (desenvolvimento de novas cidades): esta modalidade de land readjustment urbano pode ser implementada com o propósito de provisão de terrenos urbanizados em zonas periféricas, ou em zonas de transição entre o rural e o urbano, prevenindo o crescimento desordenado e implementando áreas residenciais com comércios e serviços; c. Tipo 03 (renovação urbana): tem o propósito de reorganizar áreas previamente adensadas, constituídas de infraestrutura básica, mas carentes de renovação de suas funções urbanas, de alteração de usos, de promoção de zonas comerciais ou de melhorias nas infraestruturas; d. Tipo 04 (desenvolvimento de novos centros e infraestruturas urbanas): este tipo de land readjustment urbano pode ser implementado com o objetivo de desenvolver infraestrutura urbana de maior complexidade em zonas intensamente urbanizadas ou em antigas áreas industriais ou destinadas ao uso ferroviário; e. Tipo 05 (reconstrução urbana): possui a finalidade de recuperar e adaptar áreas destruídas por acidentes naturais, principalmente os terremotos, colaborando com a prevenção contra novos desastres e suas consequências (tais como deslizamento de terras, incêndios, inundações e enchentes).

Por fim, deve ficar claro que cada projeto de land readjustment necessita de refinamento de técnicas e execução de acordo com seu escopo e finalidade, e que depende de um forte apoio econômico para que seu desenvolvimento seja viável e exequível. Esses aspectos serão discutidos mais profundamente a seguir. A metodologia para projetos de land readjustment A aplicação de projetos de land readjustment está relacionada à metodologia e aos processos estabelecidos em lei. A legislação sobre eles dispõe basicamente sobre os direitos e deveres legais dos proprietários e inquilinos, das agências de implementação, de terceiros envolvidos e inclui os direitos e deveres legais dos opositores ao projeto. Dispõe ainda sobre a preparação do projeto de replotting, dos modos de financiamento, como, por exemplo, por meio de terrenos-reserva, e dispõe sobre o sistema de registro fundiário após e durante a execução do replotting. De acordo com uma série de legislações estudadas (ver capítulo 4), podemos definir (passo a passo) a metodologia do land readjustment da seguinte maneira:


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1. Aprovação do método do land readjustment em lei específica. 2. Proposição de aplicação do método: localização, justificativa e plano financeiro preliminar. 3. Análise do land readjustment: plano de implementação. a. Regulação em acordo com a legislação específica: i. Aprovação do método em perímetros no sistema de planejamento urbano vigente (ex.: delimitação em plano diretor); ii. Regulação integrada entre órgãos de planejamento e setores de regularização fundiária (ex.: departamento de terras); iii. Estruturação da agência de implementação (ex.: escritório de land readjustment designado para determinada área); iv. Sistematização do processo de construção de consenso e oposição (ex.: portaria deliberando acordos e desapropriação dos opositores); v. Provisão de incentivos (ex.: isenção de impostos). b. Viabilidade econômica: i. Avaliação dos detentores de direitos e sistema de informação (ex.: avaliação fundiária e títulos de propriedade); ii. Sistematização da taxa de contribuição e plano de replotting (ex.: provisório e definitivo); iii. Aprovação de subsídios governamentais (ex.: governo central e governo local); iv. Atração de outras formas de financiamento (ex.: fundos imobiliários e hipotecas); v. Aprovação da divisão dos custos e benefícios entre os envolvidos (ex.: doação em terreno, valorização do espaço privado, custeio de corpo técnico e criação de espaços públicos). 4. Execução do land readjustment: demolições, relocações, obras e titulação. a. Processo de demolições (ex.: estruturas intermediárias – cercas, muros; ou definitivas – casas, antigas pontes); b. Obras e execução de infraestrutura (ex.: provisão de lotes urbanizados: pavimentação de ruas e provisão de sistemas de água e esgoto); c. Processo de relocações (ex.: deslocamento de estruturas – postes, construções); d. Emissão dos novos títulos de concessão; pagamentos de equidade e distribuição dos novos títulos de propriedade; dissolução da agência de implementação; e. Evento de encerramento do projeto de land readjustment.


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capítulo 2

Mecanismo do método do land readjustment. 5

6 Terreno-reserva após a execução do projeto de land readjustment.


Tipo 01 desenvolvimento de zonas rurais: área de Tokoyama, estado de Aichi no Japão. 5 6 Tipo 02 desenvolvimento de novas cidades: área de Kayata, estado de Chiba no Japão.

6 Tipo 02 prevenção de crescimento desordenado: área de Obu-Hantsuki, estado de Aichi no Japão.


5 Tipo 03 renovação urbana: área de Dambara, estado de Hiroshima no Japão. Tipo 04 desenvolvimento de infraestruturas: área de Nijo, estado de Kyoto no Japão. 6

Tipo 05 reconstrução urbana: área de Rokkomichi, estado de Kobe no Japão. 6


Espaços públicos provenientes de projetos de land readjustment, estado de Aichi no Japão. 5



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Estabelecido este cronograma metodológico resumido, e a sequência de imagens para melhor elucidação, descreveremos o processo de implementação de um projeto de land readjustment do tipo 04 (desenvolvimento de novos centros e infraestruturas urbanas), utilizando como estudo de caso o projeto denominado “Misato Chuo”, conforme sua execução no Japão. A área destinada ao projeto Misato Chuo estava afetada por políticas estratégicas nacionais de desenvolvimento. O governo japonês disponibilizou recursos nacionais para a construção de uma nova linha de transporte público de massa, conhecida como linha de comutação TX. Sua principal característica era a grande capacidade de transportar passageiros, conectando diretamente a região metropolitana de Tóquio, sobretudo a parte central, com a cidade de Tsukuba, a 50 quilômetros em direção nordeste da capital. Prevendo os impactos que a nova linha causaria sobre as áreas afetadas pela construção, considerando principalmente as alterações de valor do solo no entorno imediato às estações propostas, o governo decidiu realizar diversos projetos de land readjustment ao longo da TX. Com isso, além de conseguir vacância para a construção das estações sem o instrumento maciço da desapropriação, propôs a readequação dessas áreas, muitas delas agrícolas, em novas zonas residenciais em frente e ao longo das estações. A estação de Misato Chuo foi uma delas. Visando a provisão e o suprimento de lotes urbanizados, esse modelo de land readjustment foi aprovado pelo plano diretor com a delimitação da área de intervenção, e continha a proposta de mudança de usos anteriores e posteriores à execução do projeto. No mapa do plano diretor de Misato Chuo podemos ver as delimitações entre as áreas de promoção da urbanização (coloridas, com os usos existentes e/ou propostos), com indicações das áreas que devem ser urbanizadas num prazo de 5 a 10 anos; e as áreas de controle da urbanização (não coloridas), que não devem ser intensificadas, indicando a preservação do meio ambiente natural e agrícola. No mapa também constam as infraestruturas existentes, as propostas e as em fase de execução, para serem levadas em consideração para futuras possibilidades de intervenção. Nesse caso, além de rede de esgoto, drenagem, áreas verdes e programa de ocupação residencial e comercial, a execução de Misato Chuo resultará na vacância de terras necessária para a construção da estação, agregada a um novo parque urbano. Ressalta-se ainda a construção de outra infraestrutura de importância nacional: parte de um rodoanel metropolitano para Tóquio. 3 Plano diretor de Misato Chuo, com a delimitação do projeto de land readjustment no centro do mapa.


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Com a designação do plano de diretrizes específicas para o desenvolvimento da área, os urbanistas japoneses despenderam enormes esforços no processo de organização dos detentores de direitos e da anuência de dois terços do total dos envolvidos. Embora o direito de exercer a condução da realização do projeto tenha sido entregue a uma agência de implementação, mesmo antes do início do projeto e da constituição dessa agência, foram realizadas plenárias com todos os envolvidos com a finalidade de explicar o projeto, suas características e dificuldades de implementação (neste âmbito também foram reconhecidos alguns opositores e outros opositores em potencial). Pelo próprio estabelecimento da área como estratégica para a construção de infraestrutura, o poder público organizou-se em prol da execução do projeto de land readjustment. Imbuído desse novo objetivo, ele designou a Agência de Renascença Urbana (uma organização federal japonesa responsável por grandes projetos de desenvolvimento urbano) para estruturar a construção de um escritório específico com o objetivo de regular a conexão com outros agentes fundamentais para a construção do projeto (como empreiteiras, construtoras, companhias de água e esgoto etc.) e para viabilizar a regularização fundiária após a realização do projeto (com o departamento de terras, cartório de registros etc.). Essa agência de implementação foi responsável pelo levantamento fundiário e identificação dos detentores de direitos (incluindo os levantamentos de registro de titularidade fundiária, de herança de bens imóveis, de antecedentes criminais e de contratos de aluguel) – no caso de Misato Chuo foram contabilizados 3.290 parcelas de terra, com 925 proprietários e 5 inquilinos. Os detentores de direitos, por sua vez, elegeram um conselho de land readjustment responsável pelo diálogo com essa agência de implementação e com outros atores que viessem a realizar ações durante a execução do projeto. A sistematização do processo de construção de consenso ou oposição foi feita por meio de plenárias de explicação do projeto com todos os detentores de direitos. Cada um deles recebeu material promocional feito pelo governo e todos tiveram acesso à documentação oficial do projeto. Dúvidas, sugestões e oposições eram enviadas via carta e a cada uma delas era aberto um processo administrativo para serem respondidas, deferindo ou indeferindo tais solicitações. Os opositores que não quiseram vender ou aceitar as condições do projeto foram desapropriados pelo poder público. Setores obsoletos com padrões de ocupação difusos estão situados geralmente onde o status


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de hierarquia e liderança é composto por proprietários que detêm maiores proporções em área ou em quantidade de terra. No caso de Misato Chuo, as famílias que possuíam maior quantidade de terra também possuíam maior influência e poder na comunidade. Por isso, durante a organização do projeto, os urbanistas primeiro abordaram e convenceram os maiores proprietários. Uma vez persuadidos, estes auxiliaram a convencer os menores. Antes da execução do projeto, a agência de implementação comprou parcelas de terra que já estavam à venda e também comprou terrenos de proprietários interessados em vendê-las para não participar do processo de execução. Proprietários de comércio, alvos de relocações mais drásticas, foram indenizados em função do período estimado de paralisação de suas atividades. Por fim, com a anuência da maioria, em 1997 foi aprovada uma portaria que deliberou os acordos e as ações processuais do projeto, resultando num plano de execução estimado a terminar em 2011. Descritas as etapas de 1 a 3 (aprovação do método, proposição de aplicação do método e análise da implementação), vamos enfocar as etapas seguintes, procurando entender como foi elaborado o estudo de viabilidade econômica do projeto Misato Chuo. TABELA 01: DESPESAS E RECEITAS (milhões de ienes) (Projeto de Land Readjustment de Misato Chuo) DESPESAS ( milhões ¥ ) Custos da Construção (C1) Custos da Relocação (C2) Custos de Pesquisa e Projetos (C3) Custos Diversos do Projeto (C4) Custos Indiretos (C5) Custos aos Interessados (C6) TOTAL (T)

23.477 21.218 6.798 2.638 5.413 10.844 70.388

RECEITAS ( milhões ¥ ) Subsídios (S) 19.628 Distribuição de Gastos com a 3.520 Agência de Implementação (Ss) Receita por meio da Venda 47.240 dos Terrenos Reserva (R x e) Outras Receitas (So) TOTAL (T) 70.388

A primeira condição para analisar a viabilidade econômica foi estabelecer um orçamento prévio do projeto de land readjustment aprovado pelo poder público, considerando as diversas despesas de execução e as receitas estimadas. Por despesa se entende todos os custos pertinentes: de construção civil, de relocação, de pesquisa e estudos projetuais e custos diretos e indiretos de acordo com as especificidades do projeto. Por receita entende-se toda a fonte de recursos para o desenvolvimento do projeto: subsídios governamentais, subsídios locais, ganhos após a


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comercialização de terrenos-reserva e outros investimentos da iniciativa privada. A tabela anterior mostra o plano orçamentário do projeto de land readjustment Misato Chuo, com despesas (33% dos custos são provenientes da construção civil e 30% da relocação) e receitas (27% da receita são originados do governo central e 67% dos terrenos-reserva). As infraestruturas de caráter regional, como, por exemplo, a linha de trem TX e a estação de Misato Chuo, não foram contabilizadas. A segunda condição foi estabelecer um sistema de avaliação de todos os detentores de direitos. Em muitos casos é difícil determinar o valor do metro quadrado de cada lote antes da execução do projeto, mesmo porque, com o anúncio do projeto, naturalmente se inicia um processo de especulação. Por isso, além do sistema convencional baseado no valor da terra, o land readjustment japonês utiliza um sistema de avaliação baseado no sistema viário existente, considerando as dimensões e a classificação das vias, e atribuindo valores que serão indicadores do valor da terra. Dessa forma, esse sistema de avaliação, conhecido como avaliação por cálculo de coeficiente viário, se afasta dos moldes do estipulado pelo mercado, sujeito a iniquidades e distorções especulativas. Como muitos projetos de land readjustment dizem respeito a alterações de uso e ocupação do solo, esse tipo de avaliação tornou-se ferramenta valiosa para o cálculo dos terrenos-reserva e para compensação por danos sofridos, para deliberar equidade no processo do replotting, e principalmente, para a apropriação da sobrevalorização dos terrenos após o projeto. A avaliação por cálculo de coeficiente viário é mais utilizada do que a avaliação por valor de mercado e foi introduzida pelo Ministério da Construção (atual MLIT – Ministério de Terras, Infraestrutura e Transportes do Japão) em 1950 pela portaria denominada Padronização para Cálculos de Avaliação Fundiária. Essa portaria já foi revisada inúmeras vezes, com alterações de índices que refletiam mudanças dos tempos e da economia japonesa. Sua última versão, de 1978, possui as bases utilizadas até os dias de hoje. Neste sistema de avaliação, o valor de cada parcela de terra é correspondente à sua relação com o sistema viário antes da execução do projeto, considerando sua forma e relação com outras infraestruturas existentes. Os lotes são avaliados baseados em coeficientes viários, ou seja, pontuações que são dadas ao sistema viário antes da execução do projeto que influenciam diretamente na avaliação e na pontuação de cada terreno depois da execução do projeto. Esse sistema tem os seguintes pontos positivos: grande quantidade de lotes pode ser avaliada num curto período de tempo; possíveis desvios durante a avaliação não são significativos; por ser um método científico e baseado em regras claras, o entendimento com os proprietários não se torna difícil; e


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possibilita o cálculo do valor monetário da terra antes e depois do projeto de land readjustment, com menor interferência do processo especulativo (Yanase 2005). Após a devida avaliação dos detentores de direitos, foi necessário estabelecer a taxa de contribuição global (減歩 ou “gembu” em japonês) do projeto de land readjustment. Primeiramente definiu-se a classificação de usos para estabelecer a quantidade de área pública necessária para a execução do projeto. No caso de Misato Chuo, dentro do perímetro de intervenção com 114,8 hectares, após a execução do projeto de land readjustment, estipulou-se, segundo o cenário proposto para a implementação do projeto, um aumento de área pública de 14,0% (M) para 32,5% (N) (acréscimo de 18,5%), proporcional em relação à diminuição de área privada de 86,0% para 67,5% (decréscimo de 18,5%). Dos 67,5% destinados à área privada, 13,9% foram destinados à construção de terrenos-reserva, capazes de gerar 47.240 milhões de ienes, no intuito de viabilizar economicamente o projeto. TABELA 02: CLASSIFICAÇÃO DO USO DO SOLO ANTES E DEPOIS DO PROJETO DE LAND READJUSTMENT (Projeto de Land Readjustment de Misato Chuo) CATEGORIA ÁREAS PÚBLICAS Sistema viário Parques e áreas verdes Córregos, rios e corpos d´água Subtotal ÁREAS PRIVADAS Propriedades privadas Terrenos-reserva Subtotal TOTAL ( M + A ) / ( N + E + R )

ANTES DO PROJETO Área ( m² ) (%)

DEPOIS DO PROJETO Área ( m² ) (%)

82.285 12.329 65.752 160.367 (M)

7,2% 1,1% 5,7% 14,0%

267.461 40.812 65.294 373.567 (N)

23,3% 3,6% 5,7% 32,5%

987.667 (A) 987.667 1.148.033

86,0% 0,0% 86,0% 100,0%

614.329 (E) 160.137 (R) 774.466 1.148.033

53,5% 13,9% 67,5% 100,0%

Como os proprietários precisam doar parcelas de seu terreno para a constituição de áreas públicas, com o objetivo de melhorar o meio ambiente urbano e estabelecer terrenos-reserva para o financiamento dos custos do projeto, no cálculo da taxa de contribuição temos: a taxa de


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contribuição é a relação entre a terra para a constituição de áreas públicas (P=N-M), somada a contribuição para o estabelecimento do terreno-reserva (R), dividida pela área total anterior à implementação do projeto (A), multiplicada por 100. A seguir, apresentamos o cálculo da taxa de contribuição do projeto Misato Chuo, que obteve valor em torno de 37,8%. Essa taxa é uma média de contribuição global, que não considera a avaliação por cálculo de coeficiente viário, que pode aumentar ou diminuir esse valor em função da relação da propriedade com o sistema viário e outras infraestruturas anteriores à execução do projeto. TABELA 03: CÁLCULO PARA TAXA DE CONTRIBUIÇÃO (Projeto de Land Readjustment de Misato Chuo) PROPRIEDADES PRIVADAS

CONTRIBUIÇÃO

Antes do Projeto

Depois do Projeto

Áreas Públicas

(A)

D – R, sendo D = A - P

987.677 m²

614.329 m²

TAXA DE CONTRIBUIÇÃO Total

Áreas Públicas

Terrenosreserva

Total

P=N-M

Terrenosreserva (R)

P+R

p=P/A

r=R/A

(P+R)/A

213.201m²

160.137 m²

373.338 m²

21,6%

16,2%

37,8%

Mesmo com cada proprietário perdendo quase 38,0% de sua propriedade em prol da execução do projeto, ele tornou-se viável, porque a valorização resultante, ou o valor líquido global das propriedades, tornou-se maior após a execução do projeto. Para se saber quanto, calculou-se a taxa de promoção das parcelas de terra, definido como a comparação entre os valores anterior e posterior da execução do projeto, estabelecendo dessa maneira a valorização das propriedades no âmbito global. De acordo com André Sorensen, a cada 33,0% de taxa de contribuição, requeremse 50,0% de aumento no valor do metro quadrado para manter uma equidade de valores. Portanto, qualquer valorização inferior a 50,0%, considerando um terço de doação em terreno, torna (pretensamente) inviável a execução de projetos de land readjustment (Sorensen 2007). No caso de Misato Chuo, ao dividirmos o valor do metro quadrado antes (a) pelo valor estimado após o projeto (e), temos a taxa de promoção, ou seja, de US$ 1.500 por metro quadrado, antes da execução do projeto, estimou-se que o valor passaria para US$ 2.950 por metro quadrado, um acréscimo de 95,4% nesse valor. Se dividirmos o valor total depois do projeto (V’) (área de terrenos privados e terrenos-reserva multiplicada pelo valor do metro quadrado estimado) pelo valor total de


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antes do projeto (V) (áreas privadas multiplicadas pelo valor do metro quadrado antes da execução do projeto) teremos uma valorização global dentro da área do projeto em torno de 53,2%, ou valor adicional a ser desfrutado pelos detentores de direitos e pela agência de implementação após a execução do projeto. A tabela a seguir ilustra essas informações. TABELA 04: CÁLCULO PARA TAXA DE PROMOÇÃO (Projeto de Land Readjustment de Misato Chuo) Propriedades Privadas Antes do Projeto A ( m² ) 987.677 m²

Preço por m² Antes do Projeto a ( ¥ / m² )

Antes do Projeto

Propriedades Privadas Depois do Projeto

V=Axa(¥)

E ( m² )

Preço por m² Depois do Projeto e ( ¥ / m² )

774.466 m²

295.000 ien/m²

Valor Total

151.000 ien/m² 149.139.227.000 ien

Valor Total

Taxa de

depois do Projeto

Promoção

V’ = E x e ( ¥ )

y=e/a

228.467.470.000 ien

1,954

Dos 53,2%, parte será transferida às propriedades reajustadas e parte transferida aos terrenosreserva. Tomemos como exemplo uma parcela de terra com 100 metros quadrados, avaliada em US$ 1.500 por metro quadrado. Mesmo com a devolução de 62 metros quadrados a US$ 2.950 por metro quadrado, o valor líquido da propriedade passaria de US$ 150.000 para US$ 182.900. Tratase de uma valorização de 21,9%; nesse caso específico apropriado pelo proprietário. Essa diferença no percentual da valorização pode ser melhor compreendida por meio de um cálculo denominado avaliação do terreno-reserva. Faz-se a subtração do valor total da área anterior ao projeto (V) pelo da área posterior (V’), o que resulta no acréscimo total posterior (ΔV). Ao se dividir essa valorização (ΔV) pelo preço do metro quadrado após a execução do projeto (e), tem-se a área do terreno-reserva proporcional à valorização criada pelo projeto (R max). Por fim, ao se dividir a área real da contribuição (R) por esse valor proporcional à valorização (R max), chega-se à avaliação do terreno-reserva (R / R max). Essa porcentagem de avaliação do terreno-reserva corresponde à distribuição dos custos e benefícios do projeto. Se ela apresentar valor de R / R max = 100%, significa que proprietários e inquilinos financiaram todos os benefícios do projeto. Se apresentar valor de R / R max = 0%, significa que os proprietários e inquilinos receberam todos os benefícios do projeto. Um valor de R / R max = 50% indica que ocorreu a distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano. O valor de R / R max neste estudo de caso foi de 59,5%, ou seja,


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proprietários e inquilinos estão financiando o projeto em quantidade um pouco maior em comparação ao recebimento dos benefícios. Esse adicional representa uma margem de segurança contra possíveis acasos e danos não previstos, uma margem necessária para a execução do projeto. A tabela a seguir contém as informações discutidas. TABELA 05: AVALIAÇÃO DO TERRENO-RESERVA (Projeto de Land Readjustment de Misato Chuo) Valor Total

Valor Total

Acréscimo do

Preço por m²

Antes do Projeto

Depois do Projeto

Valor Total

Depois do Projeto

V=Axa(¥)

V’ = E x e ( ¥ )

ΔV = V' - V ( ¥ )

e ( ¥ / m² )

79.328.243.000 ien

295.000 ien/m²

149.139.227.000 ien 228.467.470.000 ien

Terreno-Reserva Área Área real da proporcional contribuição R max = ΔV/ e R ( m² ) 268.914 m²

160.137 m²

6 Imagem aérea e levantamento cadastral da região de Misato Chuo antes da execução do projeto.

Taxa de Avaliação R / R max 59,5%


Novos equipamentos públicos executados pelo projeto de land readjustment Misato Chuo. 5 Avaliação das edificações na área de intervenção e projeto de land readjustment Misato Chuo em execução. 6


5Projeto de land readjustment Misato Chuo, incluindo a localização das infraestruturas propostas. Imagem aérea da região de Misato Chuo, durante a execução do projeto de land readjustment em 2005.4



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Nesse processo de compreensão da metodologia de projetos de land readjustment, após as explicações sobre os cálculos de taxa de contribuição e avaliação dos terrenos-reserva, chegou a hora de entendermos melhor o plano de replotting. Para preparar o plano de replotting é necessário primeiramente: confirmar o uso do solo existente e proposto para a área, checar todos os direitos incidentes na área de projeto e possuir a avaliação fundiária adotada previamente. O plano de replotting consiste basicamente em “transferir” os antigos perímetros das propriedades, inserindo-os em novas quadras propostas. De acordo com a lei japonesa do land readjustment, no plano de replotting, toda parcela de terra transformada deverá manter características correspondentes à sua parcela de terra original “em termos de localização, área, solo, suprimento de água, uso do solo, meio ambiente e outras condições”. Esse trecho da lei também é conhecido como “lei de correspondência” (Yanase 2005). Essa correspondência precisa estar expressa no redesenho dos lotes, considerando a taxa de contribuição e possíveis acréscimos e deduções em área, segundo as pontuações indicadas na avaliação por cálculo de coeficiente viário. Após a finalização do plano de replotting é realizada sua revisão com a participação de todos os detentores de direitos. Cada um deles recebe explicações individuais sobre as relações entre as novas e as antigas localizações fundiárias, as novas formas dos lotes e as distintas taxas de contribuição. Caso existam objeções, a agência de implementação poderá realizar novos estudos de rearranjo até obter o consenso entre envolvidos. Após inúmeras revisões, acontece a preparação do projeto final, que é transformado em lei. Com a lei aprovada, são enviados os subsídios governamentais e assinadas outras formas de financiamento, baseadas nas garantias dispostas em lei e necessárias para a viabilização desses recursos. Os detentores de direitos recebem orientação para saberem o que devem fazer antes, durante e após a execução do projeto. A agência de implementação coloca em prática, a partir de então, um novo processo, desta vez, de organização de contratação de empresas, construtoras e empreiteiras para o planejamento e início das obras. Entre as atividades preliminares está conferir os levantamentos fundiários previamente realizados, executar as demolições necessárias, construir um reservatório provisório contra enchentes e providenciar ruas provisórias de acesso. Após essa prévia, na primeira fase de construção, as obras possuem enfoque na melhoria de solos de qualidade ruim, nos deslocamentos de terra e na terraplanagem. São construídos os sistemas básicos de infraestrutura, tais como água, esgoto e drenagem. Com o término da execução


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dos lotes devidamente urbanizados, inicia-se a fase de relocação de casas, postes, cabeamentos e outras estruturas. Essas relocações podem ser feitas de forma individual ou em grupo (utilizandose do mesmo caminhão de transporte). As empresas recebem notificações públicas para liberação de funcionários para dias estratégicos de relocação. Na fase seguinte, privilegia-se a construção de infraestruturas avançadas, tais como muros de contenção, pontes e canalização de córregos. A pavimentação das ruas e avenidas e a construção de parques e espaços públicos também se iniciam nessa fase. Inspeções públicas acontecem durante toda a execução do projeto de land readjustment. Com o término das obras, a agência de implementação realiza junto ao cartório de registros todas as transferências de direitos, distribuindo aos detentores seus novos títulos de propriedade. Possíveis desvalorizações, diferenças de valorizações, iniquidades de distribuição de terras e indenizações diversas são pagas com o fim da execução do projeto após avaliação e comprovação de caso. Terminadas todas as distribuições de titularidades, quitações de dívidas e resolução de pendências, emitem-se os certificados de conclusão do projeto e dissolve-se a agência de implementação do projeto. Legislação do land readjustment: processo formal do land readjustment no Japão No Japão, o land readjustment é regulamentado pela Lei do Land Readjustment (LRL) nº 119, aprovada em 20 de maio de 1954 e alterada em 31 de março de 1999. A tradução do japonês para o inglês foi feita pela Associação Japonesa de Peritos em Land Readjustment (JSLRE 1999) e nos guiará para a compreensão dos artigos elucidados a seguir. A lei está dividida em sete capítulos, dos quais o segundo apresenta cinco seções e o terceiro, nove: Capítulo 1. Disposições Gerais (artigos 1 ao 3,5); Capítulo 2. Agência de Implementação; Seção 1. Agência de Implementação Individual (artigos 4 ao 13); Seção 2. Associação de Land Readjustment: 1. Estabelecimento (artigos 14 ao 24); Seção 2. Associação de Land Readjustment: 2. Administração (artigos 25 ao 44); Seção 2. Associação de Land Readjustment: 3. Dissolução e Amalgamação (artigos 45 ao 51); Seção 3. Governos Municipais e Estaduais (artigos 52 ao 65);


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Seção 4. Ministro, Governadores e Prefeitos (artigos 66 ao 71); Seção 5. Corporação Pública de Habitação (artigos 71,2 ao 71,6); Capítulo 3. Projeto de Land Readjustment; Seção 1. Regras Gerais (artigos 72 ao 85,3); Seção 2. Plano de Replotting (artigos 86 ao 97); Seção 3. Designações de Terrenos Provisoriamente Alterados (artigos 98 ao 102); Seção 4. Aplicação do Replotting (artigos 103 ao 108); Seção 5. Compensação por Perdas no Valor da Terra (artigo 109); Seção 6. Encargos e Custos para Equidade (artigos 110 ao 112); Seção 7. Coordenação dos Direitos Envolvidos (artigos 113 ao 117,1); Seção 8. Construção de Habitações em Distritos Prioritários para Habitações (artigo 117,2); Seção 9. Certificação de Peritos pelo Ministério (artigos 117,3 ao 117,19); Capítulo 4. Alocação das Despesas do Projeto (artigos 118 ao 121); Capítulo 5. Supervisão (artigos 122 ao 127,2); Capítulo 6. Disposições Diversas (artigos 128 ao 136,2); Capítulo 7. Regulamentos Penais (artigos 137 ao 148). De acordo com a lei, “projeto de land readjustment significa alterar a forma e as condições fundiárias dos lotes e instalar ou melhorar equipamentos públicos, em acordo com áreas de planejamento urbano, a fim de prestar melhores serviços públicos e ampliar o uso de cada terreno” (LRL § 2, 1). Seu propósito é “construir áreas urbanizadas e encorajar o benefício público por meio de medidas necessárias de implementação e alocação de despesas” (LRL § 1) e “construir, gerenciar e remover estruturas, além de outros estabelecimentos necessários, ou ocupar o território, de maneira a assistir tais projetos” (LRL § 2, 2). A lei permite que todo aquele que possuir direitos sobre parcela de terra (propriedade) ou contrato de cessão de uso (aluguel, servidão etc.), ou aquele que tiver obtido acordo entre proprietários e inquilinos, está qualificado a implementar projetos de land readjustment com a abrangência dos direitos envolvidos e das facilidades públicas relacionados a eles (LRL § 3). Ainda permite ao Ministro (do Ministério de Terras, Infraestrutura e Transporte), governadores e prefeitos implementar projetos de land readjustment em áreas previstas ou urgentes para a recuperação de desastres ou outras razões de interesse nacional (LRL § 3, 4). Dessa forma a implementação é


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voluntária, se realizada entre proprietários e inquilinos, e compulsória (caso não obtenha a adesão completa dos detentores de direitos), se realizada por autoridades públicas. As agências de implementação possíveis estão divididas em sete categorias (LRL § 3 ao 3,4), e cada uma possui regulamentações específicas para sua implementação. São elas: individual ou consorciado; associação ou cooperativa; governo municipal; governo estadual (provincial); Ministério de Terras, Infraestrutura e Transportes; Corporação de Habitação e Desenvolvimento Urbano; Corporação de Desenvolvimento Regional; e Corporação Pública Local de Habitação. No caso da implementação individual (ou consorciada) ou no caso da agência de implementação por associação ou cooperativa, o projeto e sua implementação precisam obter a aprovação prévia do governador em acordo com a tramitação estipulada por portaria ministerial (LRL § 4 e LRL § 14). Além dos padrões de acordo e consenso entre proprietários e inquilinos (posições, cotas, termos, deveres e obrigações), junto ao processo de aprovação do projeto (arquitetônico e urbanístico), os organizadores devem enviar também ao poder público informações adicionais, como métodos de realização dos anúncios públicos envolvendo decisões e outras solicitações feitas pelo gabinete (LRL § 5 e LRL § 15). Para aprovação, o poder público examina primeiramente se “o plano das facilidades públicas e os terrenos urbanizados estão formulados, considerando a melhoria do meio ambiente, assegurando a segurança no trânsito, a prevenção de desastres e a criação de áreas urbanas sólidas” (LRL § 6,6). Em segundo lugar, se sua aplicação não viola qualquer lei vigente ou portaria ministerial, se as áreas de incidência do projeto estão aptas à urbanização em acordo com a lei de planejamento urbano local ou regional e se o estudo possui viabilidade econômica para que seja implementado adequadamente (LRL § 9 e LRL § 21). Com relação às agências de implementação, a lei permite que uma associação ou cooperativa altere seus status para individual, caso, após processos de sucessões e transferência de direitos, uma única pessoa torne-se o promotor do projeto, desde que as exigências previstas anteriormente sejam respeitadas (LRL § 11,5). Ela ainda possibilita que associações ou cooperativas unam-se num processo de amalgamação, formando assim uma única entidade, por meio de aprovação em plenária extraordinária, para propósitos da implementação de projeto com ampliação do perímetro de sua atuação (LRL § 50 até LRL § 50,8). No caso específico da agência de implementação por associação ou cooperativa, é preciso obter o consentimento de no mínimo dois terços de todos os proprietários e inquilinos, no interior


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da área de projeto. Além disso, a soma das áreas das parcelas de terra dos proprietários e inquilinos que consentiram com o processo deve totalizar no mínimo dois terços da área total dos terrenos privados (LRL § 18). E todos aqueles que consentiram devem prescrever e assinar com antecipação documento a ser anunciado publicamente (LRL § 19). Aqueles que possuírem ilegalmente propriedades ou outros direitos de cessão de uso não registrados devem submeter documento que comprove qualquer direito sobre a parcela de terra para avaliação pública até um mês a partir do anúncio público da execução do projeto (LRL § 19,3). Após o anúncio, o poder público examinará dentro do prazo de duas semanas a área do projeto de land readjustment (LRL § 20). Todos aqueles que possuem direitos dentro da área de projeto podem ainda submeter objeções por escrito, substancialmente documentadas, para o governador no mesmo período das inspeções públicas (LRL § 20,2). Após isso o gabinete do governador emite os seguintes pareceres: deferido, onde considerar que modificações são necessárias para atender à demanda do detentor de direito; ou indeferido, nos casos onde as objeções forem inconsistentes ou inválidas (LRL § 20,3). Diante da aprovação do projeto, o governador faz anúncio público com o nome da associação, os termos da implementação, sua área (e suas respectivas subáreas quando houver) e outros itens prescritos pela portaria ministerial (LRL § 21,3). A agência de implementação anunciada “deve ser uma pessoa jurídica” e “deve arcar com os custos para se estabelecer” (LRL § 22). A agência de implementação por associação ou cooperativa de land readjustment precisa ser administrada e composta por quatro agentes: os executivos, os auditores, o presidente e os representantes da associação. Todos os detentores de direitos dentro da área de projeto devem ser membros da associação (LRL § 25) e o poder público pode designar, caso a associação faça o requerimento, peritos para ocupar o posto de um dos agentes necessários para a boa execução do projeto (LRL § 25,2). Os executivos da associação e os auditores são escolhidos por eleição direta, na proporção de cinco ou mais para os executivos e dois ou mais para os auditores (LRL § 27,2). Os executivos devem representar a associação de acordo com os artigos elaborados para a implementação do projeto, com ações determinadas pelo consentimento da maioria; enquanto os auditores devem inspecionar as obras, os serviços e as condições financeiras da associação, com a responsabilidade de detectar qualquer evidência de desonestidade e relatar em plenária geral (LRL § 28,2 ao LRL§22,4). Um executivo não pode ser um auditor, um auditor não pode ser nem um executivo e


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nem pertencer ao corpo técnico da associação (LRL § 28,7). As plenárias gerais para a discussão dos assuntos relacionados ao projeto devem acontecer no mínimo uma vez ao ano, convocadas pelos executivos a qualquer momento que acharem necessário (LRL § 32) ou dentro do prazo de 20 dias após o recebimento de notificação, objeção ou proposta de alteração elaborada por qualquer um dos indivíduos envolvidos no processo (LRL§32,3). Os seguintes assuntos, em especial, devem ser resolvidos durante as plenárias gerais: alteração do regulamento da associação; alterações no projeto e na sua política de implementação; montante de empréstimo a ser solicitado, taxa de juros e métodos de pagamento; orçamento e método de arrecadação; plano provisório e definitivo do replotting; disposição dos terrenos-reserva; resolução de desacordo entre proprietários; e outros assuntos relacionados no regulamento da associação (LRL § 31). Os membros da associação devem ser todos informados da data, local e agenda da plenária com no mínimo cinco dias (dois, em casos de emergência) de antecedência ao evento (LRL § 32,8). O presidente da associação também é eleito de forma direta (LRL § 33) e deve presidir a plenária geral (LRL § 33,3), sem a permissão ao direito de voto sobre os assuntos descritos anteriormente (LRL § 33,4); cabendo a ele a possibilidade de voto apenas em casos de dissolução ou amalgamação da associação (LRL § 34,2). Durante a votação, o quorum mínimo de representantes não pode ser inferior a um décimo do número total de membros da associação, porém 50 representantes em associações com 500 membros ou mais são o suficiente para que aconteçam as votações na plenária geral (LRL § 36,2). Qualquer membro da associação que perder (vender, ceder ou alugar) qualquer direito referente à propriedade inserida no projeto perde automaticamente sua filiação e, consequentemente, qualquer posição dentro dela (LRL § 37,2). Todo membro da associação tem direito a um único voto (LRL § 38), e o que tiver na área de projeto tanto direito de proprietário como de inquilino pode votar duas vezes, uma como proprietário e outra como inquilino (LRL § 38,2). Se a associação possui débitos com credor, o mesmo precisa deliberar positivamente sobre qualquer proposta votada para que a votação tenha efeito (LRL § 93,3). As alterações aprovadas devem ser enviadas ao governador, que fará anúncio público (em caso de anuência sobre as votações), descrevendo todas as alterações aprovadas (LRL § 39,4). A associação poderá ser dissolvida nas seguintes circunstâncias: revogação de sua criação; votação e resolução na plenária geral; ocorrências de assuntos prescritos como razões para a


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dissolução no regulamento da associação; conclusão do projeto ou impossibilidade de concluí-lo; amalgamação; e transferência da implementação do projeto para outra modalidade de agência de implementação (LRL § 45). Para a dissolução ocorrer, ainda é necessário o consentimento do governador (LRL § 45,2) e do credor, se a associação possuir débitos em seu nome (LRL § 45,4). Nos casos seguintes, de implementação de projetos de land readjustment realizada por autoridades públicas ou autarquias públicas (corporações de capital misto – público e privado), o poder público deve formular a portaria para validar o projeto e seu método de implementação (LRL § 52, LRL § 66 e LRL § 71,2), em alguns casos, sujeito à aprovação do Ministério de Terras, Infraestrutura e Transporte. Além das informações gerais, como título, nome da área e endereço do escritório do projeto, a portaria deve conter informações tais como a alocação de despesas, o método para a disposição dos terrenos-reserva e quais as regras para a formação do conselho e de seus membros (LRL § 53,2). Em caso de objeções quanto à execução do projeto segundo os pressupostos do poder público, todo detentor de direito e todo órgão público superior (Ministério ou governo estadual) pode entrar com pedido de mudanças ou cancelamento da proposta (LRL§54,2), que serão analisados pelo Conselho Local de Planejamento Urbano do município em questão e seus resultados serão anunciados publicamente (LRL § 52,9). As apelações contra as decisões do poder público prescrevem sob as determinações da Lei Japonesa de Investigação sobre Reclamações Administrativas (lei nº 160 de 1962), devendo se aplicar sobre quaisquer das análises das objeções escritas enviadas (LRL § 52,5). Cada projeto de land readjustment implementado pelo poder público fica sob a tutela de um conselho criado pelo governo estadual ou municipal, alocado dentro dos respectivos governos (LRL § 56). O conselho é a autoridade maior sobre assuntos relacionado à Lei do Land Readjustment, tais como o plano de replotting (provisório ou definitivo) e compensação por danos no valor da parcela de terra (LRL § 56,3). Deve ser dissolvido após o término de seus deveres e obrigações (LRL § 56,4). Os membros do conselho são eleitos pelos proprietários e inquilinos da área de projeto, selecionando corpo técnico enviado pelo poder público (LRL § 58), num total entre 10 a 59 membros estipulados em acordo com a portaria que validou o projeto (LRL § 57). Detentores de direitos podem solicitar uma nova eleição de membros do conselho por meio de carta enviada para o poder público com a anuência de pelo menos um terço do total do número de proprietários e inquilinos (LRL § 58,7). O poder público também pode alterar os membros e suas decisões, caso as metas estabelecidas para a execução do projeto não tenham sido cumpridas


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(LRL § 64). Todo conselho deve escolher um presidente em eleição direta (LRL § 61,2) que deve representá-lo e presidir todos os procedimentos de execução do projeto (LRL § 61,3) não tendo direito de voto sobre os assuntos descritos anteriormente, entre outros (LRL § 61,4). Os detentores de direito podem votar uma única vez sobre assuntos do conselho e também possuem direito à candidatura como membro do conselho (LRL § 63), excluindo menores de idade, pessoas julgadas incompetentes ou pessoas com antecedentes criminais durante o cumprimento de sentença (LRL§63,4). O ministro, governador, prefeito, diretor da corporação ou presidente do conselho ou associação deve selecionar três ou mais consultores em avaliação imobiliária, com o consentimento do conselho, com expediente de meio período, para realizar todas as avaliações dos direitos adquiridos pelos seus detentores, sendo responsáveis pelos assuntos envolvendo os terrenos-reserva e a equidade da distribuição das valorizações ou compensação por danos sofridos dentro da área de projeto (LRL § 65 até LRL § 65,3). Esses consultores, ou outro técnico designado, mediante autorização prévia, têm o direito de “adentrar às terras dentro dos limites da necessidade” (LRL§72), para realizar qualquer levantamento e investigação, incluindo propriedades privadas ocupadas, em se tratando este de um ato “absolutamente necessário” (LRL § 72) para a implementação do projeto. Aqueles que fazem a vistoria devem informar os ocupantes das propriedades três dias antes de realizar o procedimento (LRL § 72,2), e nos contatos considerados difíceis de estabelecer, o anúncio pode ser feito de maneira pública (LRL § 72,3). É vedada a entrada para a vistoria antes do sol nascer e após o sol se pôr, exceto mediante aprovação do ocupante (LRL § 72,4). Nenhum ocupante pode rejeitar a vistoria sem razão justificada (LRL § 72,5), ficando a cargo do agente vistor remover plantas, cercas, grades e outros impedimentos responsáveis por dificultar o processo de levantamento e pesquisa (LRL § 72,6). Qualquer dano realizado durante a vistoria, mediante avaliação e comprovação, será compensado pelo poder público de acordo com o dano sofrido (LRL § 73); e caso não exista um acordo entre a comprovação do dano e o valor a ser compensado, será aberto um processo a ser julgado dentro da Lei Japonesa de Aquisição Compulsória de Terras (lei nº 219 de 1951) (LRL § 73,3). Durante o período que vai do anúncio público do início projeto até a data de anúncio público de seu término, fica restrita qualquer mudança nas condições físicas das parcelas de terra, construções ou reconstruções, expansão de edificações ou outras estruturas, que possam atrasar


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ou dificultar a implementação das obras, a não ser alterações ou estruturas que sejam de fácil remoção, todas sujeitas à aprovação prévia pela agência de implementação do projeto (LRL§76). Caso seja verificado qualquer indício de alteração, a agência de implementação deve ordenar ao violador que devolva a parcela de terra, edificações ou outras estruturas ao seu estado original (LRL § 76,4) ou ainda contratar alguém que o faça (LRL § 76,5). A agência de implementação tem a permissão de transferir e remover construções, plantas, solo, pedras, grades e outras estruturas no processo de execução do replotting, inclusive o replotting provisório, suspendendo o uso das parcelas de terra originais e de equipamentos públicos (LRL§77). A transferência ou remoção de edificações é paga pelo proprietário “e outros” (LRL § 78,2). A agência de implementação precisa informar proprietários e inquilinos sobre a remoção ou a transferência, expondo com antecedência as intenções envolvidas e como acontecerá o processo (LRL § 77,2). A transferência ou remoção pode ser feita sem qualquer aviso prévio no caso de a agência de implementação não identificar ou encontrar o proprietário ou ocupante do imóvel, devendo esse procedimento ser devidamente documentado (LRL § 77,4). Qualquer dano causado a outras pessoas pela agência de implementação durante o processo de transferência ou remoção, mediante avaliação e comprovação, será compensado pelo poder público de acordo com o dano sofrido (LRL § 78). Parcelas de terra podem ser desapropriadas, em acordo com a Lei Japonesa de Expropriação de Terras (lei nº 219 de 1951), fora ou próximo à área do projeto, com o propósito de construção temporária para acomodar os moradores das edificações em processo de transferência ou remoção, e também com a finalidade de construir equipamentos para estocagem de material de construção das obras públicas durante a execução do projeto (LRL § 79). Com a aprovação do projeto por maioria de dois terços do total, a agência de implementação pode conduzir qualquer processo de remoção, transferência e construção de obras públicas sem o consentimento específico daquele proprietário ou inquilino alvo do processo (LRL § 80). Nenhuma pessoa pode remover, manchar ou danificar placas ou sinalização relacionadas e implantadas pela agência durante a execução do projeto (LRL § 81,2), o que está sujeito à pena de 200 mil ienes (US$ 2.000,00) (LRL § 142). Fica a cargo da agência de implementação particionar e combinar parcelas de terra para fins da execução do projeto (LRL § 82), sendo necessária a prévia documentação destas ações no cartório de registros (LRL § 83). A agência de implementação é responsável pela manutenção e documentação de todo o processo de implementação do projeto, estando sujeito seus documentos


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a inspeções públicas (LRL § 84). Durante o processo de replotting, proprietários podem protocolar direitos adquiridos, além do direito de propriedade, para análise e confirmação da agência de implementação. Em caso de confirmação, os direitos adquiridos devem ser levados em conta durante o processo equitativo de distribuição das novas parcelas de terra (LRL § 85). Proprietários e inquilinos ainda podem protocolar pedido para construção de novas edificações, mesmo antes do fim do projeto, em lotes reparcelados ou em via de reurbanização que já tenham alcançado o status de replotting final para fins de moradia (LRL § 85,2). A agência de implementação pode ainda designar parcelas de terra relevantes para postulação ao processo de construção antes do término da execução do projeto (LRL § 85,2,5). A agência de implementação tem toda a responsabilidade sobre a formulação e aprovação do plano de replotting (reparcelamento), e também é responsável por sua implementação em acordo com as normas e leis sobre edificações (LRL § 86). O plano de replotting deve ser formulado em acordo com as normas e leis vigentes, e é composto: do projeto de replotting provisório e definitivo; da especificação de cada parcela de terra a ser reparcelada; da especificação de todos os direitos inerentes a cada parcela de terra; de como será feita a distribuição equitativa após a execução do projeto; e da maneira como serão dispostos os terrenos-reserva, parcelas de terras em condições especiais e as áreas públicas (LRL § 87). O plano do replotting é aprovado pelo gabinete do governador, a não ser que sua formulação contenha violação de leis e portarias em vigência, ou que o plano seja contraditório ao projeto de land readjustment apresentado (LRL § 86,3). Qualquer alteração do plano de replotting, seja por meio de solicitação dos detentores de direitos ou por meio de solicitação do próprio poder público, está sujeita a aprovação prévia do conselho de land readjustment do município em questão e sujeita a novo anúncio público contendo as deliberações (LRL § 88,5 e LRL § 88,6). Em casos onde houver terrenos agrícolas, a agência de implementação deve solicitar aprovação prévia do projeto de replotting ao conselho de agricultura do município em questão (LRL § 86,7). De acordo com a lei, no plano de replotting (換地 ou “kanchi” em japonês), toda parcela de terra transformada deve manter características correspondentes à sua parcela de terra original “em termos de localização, área, solo, suprimento de água, uso do solo, meio ambiente e outras condições” (LRL § 89). Em casos onde não houver essa possibilidade ou houver restrições, parte das parcelas de terra precisa manter características correspondentes (LRL § 89,2). O plano do


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replotting deve evitar parcelas de terras excessivamente pequenas, sempre considerando tamanhos apropriados para a prevenção de desastres e melhoria das condições sanitárias (LRL § 91). Quando as parcelas forem excessivamente pequenas, a agência de implementação está autorizada a unilas em “terrenos comuns” com direitos de propriedade sobrepostos e consorciados (LRL § 91,3). Ainda existe a possibilidade de consorciar a superfície de edificações já construídas, mantidas ou removidas, em casos de lotes muito pequenos, para acomodar um ou mais detentores de direitos (LRL § 93). Caso não exista acordo entre dois ou mais detentores de direitos aptos a serem relocados em “terrenos comuns”, a agência de implementação pode relocá-los em outros “terrenos comuns” ou ainda em edificações dentro da área de projeto (LRL § 93,4). Novas edificações construídas em “terrenos comuns” devem ser distribuídas, em parte ou totalmente, aos possuidores de parcelas de terras muito pequenas e aos inquilinos que participaram do processo (LRL § 93,5). Eventuais desequilíbrios financeiros relacionados ao plano de replotting, tais como valorização, desvalorização, ganhos, perdas ou danos devem ser corrigidos mediante pagamento equitativo (LRL § 109) que deve ser calculado e estabelecido em termos financeiros, levando em consideração “localização, área, solo, suprimento de água, uso do solo, meio ambiente e outras condições” entre a parcela de terra anterior e a reparcelada com os devidos direitos anexados (LRL § 94). O plano de replotting deve considerar, especialmente, a localização de determinadas áreas e equipamentos públicos, entre eles: ferrovias, avenidas, escolas, aeroportos, cemitérios, equipamentos médicos, equipamentos de assistência social e infraestruturas de distribuição de energia elétrica e gás (LRL § 95). Além disso, parcelas de terra com equipamentos tombados pelo patrimônio histórico (templos, monumentos naturais etc.), em acordo com a Lei Japonesa de Proteção à Propriedade Cultural (lei nº 214 de 1950), devem ser acomodadas dentro do plano sem qualquer alteração, remoção ou transferência (LRL § 95,4). A lei estabelece que para o financiamento do projeto, durante a constituição do plano de replotting, “certa extensão de terra deve ser deixada de fora do processo para ser designada como terreno-reserva, que apropriadamente gerará recursos por meio de sua venda para pagar os custos do projeto de land readjustment” (LRL § 96). O valor equivalente dessa certa extensão de terra não deve exceder porcentagem estipulada sobre o aumento do valor total das parcelas de terra privadas após o desenvolvimento (LRL § 96,2). O plano de replotting pode ser provisório, caso sejam necessárias etapas para o desenvolvimento do projeto até alcançar o plano de replotting definitivo (LRL § 98). Durante o processo de


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transferência, aqueles que forem alvo do plano provisório devem gozar dos mesmos direitos e características na terra provisória que possuem na parcela original (LRL § 99). Os detentores de direitos que são alvos do processo de replotting provisório ou definitivo recebem uma convocação para suspender o uso da parcela de terra original por certo período de tempo necessário para a execução das obras (LRL § 100). A agência de implementação é responsável por todas as parcelas de terras com direitos transferidos e sem possuidores de direitos durante a fase de remoção ou transferência das edificações (LRL § 100,2). Caso sejam comprovados danos e perdas pela paralisação do uso da parcela de terra, a agência de implementação deve ressarcir os proprietários (LRL § 101). A finalização do plano do replotting deve ser feita assim que todas as parcelas de terras forem transferidas e as obras de execução completadas (LRL § 103,2), notificando a todos os detentores de direitos que o processo chegou ao fim (LRL § 103), por meio de anúncio público (LRL § 103,4) e apresentação e aprovação de todos os relatórios referentes ao projeto de land readjustment (LRL § 103,3). Após o anúncio público, são extintos quaisquer direitos e configurações fundiárias anteriores, passando a valer a nova configuração fundiária com seus respectivos direitos atrelados a cada parcela de terra (LRL § 104). Aqueles que após a execução do plano passarem a residir em edificações comuns (geralmente em andares diferentes) ou a conviver em parcelas de terras comuns, tornam-se co-proprietário de “terreno-comum” (LRL § 104,7) nas mesmas condições de correspondência de direitos que possuíam antes do projeto, mas agora transferidas a um único lote. Os terrenos-reserva passam a ser parcelas de terra pertencentes à agência de implementação (LRL § 104,11), que serão vendidos a novos proprietários para devolver ao poder público os recursos gastos com a execução do projeto. Todo e qualquer terreno sem direito de propriedade, inquilinato ou servidão atrelado, consequentemente relacionado a novas infraestruturas e equipamentos públicos, passa a ser terra pertencente ao Estado (LRL § 105). Após o anúncio público de fim do projeto, a agência de implementação registra imediatamente todos os novos direitos e configuração fundiária no cartório de registros (LRL § 107). A agência pode coletar de certos detentores de direitos e pagar, em dinheiro, a outros um valor correspondente ao equilíbrio dos custos e os benefícios do projeto (LRL § 110). Inclusive pode cobrar por despesas com correio e telefonia durante o processo de coleta da equidade (LRL§110,4). Ainda, se o direito de preempção, serventia ou hipoteca estiver anexado a quaisquer propriedades no interior da área do projeto, a agência de implementação pode compensar aos detentores de


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direitos por eventuais danos e perdas no valor das propriedades (LRL § 112). Após o anúncio do fim do projeto, devido à coordenação dos direitos relativos e independente dos termos do contrato de locação, as partes (inquilinos e proprietários) podem solicitar o aumento ou a diminuição dos valores de aluguel, resultado do impedimento de uso ou graças à valorização do imóvel decorrente da execução do projeto de land readjustment (LRL § 116). Na impossibilidade das partes alcançarem um acordo, o inquilino pode dissolver o contrato (LRL§116,3) e ainda solicitar à agência de implementação a dissolução do contrato por danos sofridos (LRL § 116,4). Após dois meses do anúncio do fim do projeto nenhuma solicitação referente ao aumento ou diminuição sobre o valor do aluguel pode ser feita (LRL § 117). A lei confere ao Ministério de Terras, Infraestrutura e Transportes a obrigação de manter elevado o nível técnico em projetos de land readjustment, no intuito de produzir melhores processos de configuração e implementação de projetos (LRL § 117,3). Para tanto, o Ministério concede certificações de expertise a profissionais, associações e organizações de acordo com critérios e normas preestabelecidos (LRL § 117,5 e LRL § 117,5,2). As certificações são validadas em anúncio público, explicitando o nome, o endereço do escritório e a data das designações dos especialistas (LRL § 117,6). Os peritos certificados têm o dever de manter em sigilo todas as informações confidenciais do processo seletivo de certificação (LRL § 117,9). As organizações certificadas precisam enviar, anualmente, o plano de trabalho e o plano orçamentário, mediante aprovação do Ministério (LRL § 117,11). Todas as despesas relativas à execução de projetos de land readjustment devem ser custeadas pela agência de implementação (LRL § 118), incluindo a certificação de expertise dada pelo Ministério (LRL § 117,18). Em casos de obras específicas que irão beneficiar mais amplamente o município, a agência pode solicitar ao poder público (municipalidade ou estado) que arque com parte dos custos da obra (LRL § 119,2). Em caso de obras específicas com propósito de reabilitar setores urbanos de desastres naturais, o poder público pode arcar com 50% do custo de infraestruturas consideradas essenciais (LRL § 121), porém existem casos em que o valor do subsídio pode chegar a 90% como, por exemplo, em Okinawa (JSLRE 1999). A qualquer momento, mediante investigação prévia ou a pedido de um décimo do total de membros da associação, caso qualquer violação seja feita, seja financeira, administrativa ou projetual, o Ministro ou o governador pode solicitar a paralisação e o cancelamento de qualquer projeto de land readjustment (LRL § 125 a LRL § 127,3). A lei ainda trata de disposições gerais, tais


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como: a restrição sobre a sobreposição de projetos de land readjustment (LRL § 128); o tratamento de superfícies cobertas por águas (lagos, rios) (LRL § 131); e a necessidade de consultas adicionais sobre assuntos específicos aos conselhos regionais de agricultura (LRL § 136). A lei estabelece ainda as regulações penais impostas a projetos de land readjustment. Qualquer membro de agência de implementação que aceitar, demandar ou prometer suborno pode ser sentenciado a até três anos de prisão. Caso faça algo considerado desonesto ou incoerente com seus deveres e obrigações, pode ser condenado a até sete anos (LRL § 137). Caso ordene a uma terceira pessoa aceitar, demandar ou receber propina, pode receber pena de até três anos de prisão (LRL§137,3). Todo suborno e propina será confiscado e, caso isso não ocorra, será cobrado e coletado daquele que a recebeu (LRL § 137,4). Aqueles detentores de direitos que violarem as solicitações da agência de implementação, bem como os membros da agência que descumprirem com suas obrigações, como, por exemplo, dando falsa documentação de registros e laudos técnicos, estão sujeitos a sanções penais e pagamentos de multas (LRL § 138 até LRL § 148). Efeitos do land readjustment no Japão O Japão passou por grandes transformações desde sua era feudal até o processo de recuperação do pós-guerra, seguido pelo seu rápido crescimento econômico. O acelerado processo de urbanização gerou concentração de população em áreas industriais e descontrolada ocupação territorial, onde, anteriormente, comunidades agrícolas constituíam-se sem a provisão de infraestrutura básica e suporte para as atividades de sua população. As ruas não eram construídas para o tráfego de automóveis, mas sim para o trânsito de animais e dos trabalhadores rurais. Os projetos de land readjustment (区画整理 ou “kukaku seiri”, em japonês) fizeram-se necessários num primeiro momento, quando se iniciou a migração das zonas rurais para urbanas. Num segundo momento os projetos foram implementados nas cidades que tiveram de ser reconstruídas por conta de acidentes naturais, como terremotos e tufões, ou da destruição em massa causada pela Segunda Guerra Mundial. Dentre as diversas modalidades, o land readjustment desempenhou importante papel como instrumento de descentralização de atividades econômicas em áreas urbanizadas, de regulação da expansão desordenada das atividades humanas e de problemas ambientais e, consequentemente, de readequação de setores urbanos, adaptando-os ao processo atual de envelhecimento da


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sociedade. Extensamente aplicado por todo o território, o land readjustment ficou conhecido como a “mãe do planejamento urbano no Japão” (都市計画の母 ou “toshikeikaku no haha” em japonês). Muitas modalidades de projeto foram aperfeiçoadas ao longo de quase um século de sua aplicação, transformando 11.709 áreas, ou 393 mil hectares, até 2004 no Japão (MLIT 2004), o que representa cerca de 12% de todo o território do país. Esses números incluem os projetos concluídos antes da Lei do Land Readjustment aprovada em 1954 (ou mais precisamente, 1.183 projetos num total de 49 mil hectares antes dessa data). A origem do land readjustment no Japão remete a meados da década de 1870, quando o método começou a ser esboçado para a consolidação das unidades agrícolas, da mesma forma que na Alemanha. Sua primeira legislação formal foi aprovada em 1919 na Lei de Planejamento Urbano do Japão, porque até então os projetos eram adaptados do mecanismo rural aprovado pela Lei de Consolidação de Terras Agrícolas de 1899. Ou seja, a lei de 1919 estendeu o sistema aplicado pela lei de 1899 até áreas urbanas, e a eficácia de sua aplicação foi legitimada na aprovação da Lei Especial de Planejamento Urbano de 1923. Essa lei foi aprovada como resposta ao grande terremoto de Kanto, que destruiu Tóquio no mesmo ano. Em 1946, após a destruição das principais cidades do Japão durante a Segunda Guerra Mundial, foi aprovada outra Lei Especial de Planejamento Urbano, dessa vez com enfoque na urgente necessidade de reconstrução do país. Após a Segunda Guerra Mundial e um enorme acúmulo de experiências, o land readjustment tornou-se alvo de lei federal, a Lei do Land Readjustment de 1954. Na década de 1960, durante o forte processo de migração populacional e de indústrias para as áreas urbanas, relacionado ao início do crescimento econômico do Japão, o land readjustment foi aplicado como instrumento de prevenção, controle e correção da expansão urbana, provendo infraestrutura nas regiões periféricas das áreas urbanizadas. Decorrentes do grande crescimento econômico e do rápido processo de urbanização, problemas urbanos e ambientais de diversas naturezas começaram a ocorrer nas principais cidades japonesas. Em 1968, foi aprovada a Lei de Planejamento Urbano nº 100, designando o método do land readjustment como instrumento obrigatório em todos os planos de desenvolvimento urbano local. Em 1980 a Lei de Planejamento Urbano foi alterada e instaurou-se a obrigatoriedade da delimitação dos Planos Distritais e a inserção dos projetos de land readjustment relacionados a esses distritos. A planície de Tonami, estado de Toyama, passou pelo processo de land readjustment rural há quase um século. 4


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Segundo informações do Ministério de Terras, Infraestrutura e Transporte do Japão, estima-se que os resultados econômicos do land readjustment são cinco vezes maiores do que o total dos custos com seu projeto e execução; e vinte e seis vezes maiores do que os subsídios fornecidos pelo governo nacional. Conforme o estudo realizado pelo Ministério que estabelece as relações do antes e do depois da execução do projeto, levando em consideração o subsídio inicial do governo central, o capital gerado pelos terrenos-reserva e os investimentos privados introduzidos pela indução das melhorias, temos: o custo total do projeto retorna em duas vezes a sua receita após a comercialização dos terrenos-reserva e triplica o capital do financiamento inicial, totalizando um montante final cinco vezes maior do que o investimento inicial; a construção de novos empreendimentos e suas atividades gera retorno por meio da cobrança de impostos e taxas oito vezes maior que o subsídio inicial aplicado; os efeitos finais do desenvolvimento urbano, com a criação de novas oportunidades de emprego e a melhoria da economia local e regional, produzem vinte e seis vezes o valor inicial investido pelo governo central (MLIT 2003). Numa situação onde a história do país está atrelada ao método, podemos dividir a do land readjustment no Japão em quatro fases, três delas marcadas por grandes desastres: a. Fase 1 Grande Kanto: período compreendido até antes da Segunda Guerra Mundial, no qual o método foi utilizado para o desenvolvimento de unidades agrícolas e aperfeiçoado durante a reconstrução de Tóquio após o Grande Terremoto de Kanto, em 1923. Aproximadamente 45% da área de Tóquio foi destruída pelo fogo, ocasionando 100 mil vítimas fatais, afetando quase 80% de todas as zonas residenciais. O método do land readjustment desenvolveu 22 mil hectares baseado em projetos de reconstrução (MLIT 2003). b. Fase 2 Segunda Guerra Mundial: período compreendido após a Segunda Guerra Mundial, no qual o método foi utilizado para o desenvolvimento das cidades destruídas pelos ataques norte-americanos e pela bomba atômica, atirada nas cidades de Hiroshima e Nagasaki. Três milhões de japoneses faleceram nesta época e quase 10 milhões tiveram suas moradias incendiadas. A política de reconstrução do pós-guerra utilizou extensivamente o método do land readjustment. Cidades como Nagoya aplicaram o método em aproximadamente 77% de seu território habitável (MLIT 2003). c. Fase 3 Grande Hanshin: período compreendido pelo processo de urbanização resultante do rápido crescimento econômico do Japão até o Terremoto de Awaji em 1995. O método foi amplamente utilizado na prevenção de crescimento urbano desordenado e na readequação de


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áreas que mantinham as mesmas características do Japão feudal (casas construídas em madeira e ruas estreitas). O Terremoto de Awaji destruiu Kobe e diversas cidades vizinhas, totalizando 4.500 mortes, 14 mil feridos e 110 mil edificações destruídas ou danificadas (Kobe 2000). Diversos projetos de land readjustment foram aplicados e a Lei de Medidas Especiais n°111 Prevenção de Desastres por Terremotos foi promulgada como principal medida mitigadora a esse tipo de acidente (MLIT 2003). d. Fase 4 Grande Tokai: compreende a fase atual, com projetos de grande complexidade estrutural e medidas preventivas a um possível terremoto na região de Tokai (estados de Aichi, Mie, Gifu e Shizuoka). Sem a pressão do rápido processo de urbanização presente nas fases anteriores, esta fase é marcada pela adequação de novos e mais modernos empreendimentos nas regiões metropolitanas, com grande concentração de infraestrutura e maiores densidades construídas. E qual seria a razão de tamanho sucesso para a utilização desse método de planejamento urbano no Japão? Talvez o primeiro aspecto relevante seja a restrição espacial de áreas sujeitas à urbanização, somado a alta densidade populacional, falta de recursos e pressão por áreas para o cultivo apropriado de alimentos, exigindo organização do governo perante o desafio de intensificar e melhorar o aproveitamento do solo. Um segundo aspecto é o contexto histórico de grandes desastres naturais e guerras, seguidos por grandes eventos de destruição, que instaurou uma responsabilidade institucional por meio da qual o país sacrificaria o que fosse necessário para se restabelecer perante o mundo. Um terceiro aspecto apontado é mais objetivo: o land readjustment foi intensamente aplicado no Japão pela falta de conhecimento de outros mecanismos de planejamento urbano (Sorensen 2007). O sistema extremamente centralizado da lei de planejamento urbano e a falta de uma autoridade local que fosse capaz de estabelecer um modelo de controle do uso do solo eficiente resultaram no land readjustment como a única saída dos governos locais para o desenvolvimento (Ishida 2000). Outro fator encontrado geralmente na literatura japonesa sobre a razão de tamanho sucesso está na habilidade de criar consenso para designar, projetar e implementar projetos de land readjustment com complexidades diversas. Segundo trechos da literatura japonesa encontrados pelo autor André Sorensen (Sorensen 2007):


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capítulo 2 O planejamento urbano ocidental consiste no controle do uso do solo pelo governo e pode ser chamado de “planejamento urbano pelas autoridades públicas” enquanto que o land readjustment é um projeto colaborativo pelos proprietários que contribuem com terreno e pode ser chamado de “planejamento urbano através de cooperação”. (Nishiyama 1992, p.4). Vizinhos iniciam o processo de construção de consenso e trabalham em direção do benefício comum, e o custo do projeto é financiado pelas porções de terra doadas pelos proprietários e recursos públicos. Esta é a fundação de projetos de land readjustment. (Nishiyama 1995, p.1). A essência do land readjustment é deixar a população e o governo unirem as mãos para lidar com as provações da rápida urbanização. (Nagamine 1986, p.58).

O próprio autor André Sorensen desempenhou papel fundamental ao desassociar muitas dessas definições correntes, que por muito tempo foram responsáveis por explicar de maneira conclusiva o sucesso do land readjustment japonês. Os próximos parágrafos serão dedicados aos resultados de seus estudos, que não apenas situaram o método com outro enfoque, mas também ampliaram o escopo para sua aplicação a outras realidades. A habilidade de criar consenso sempre foi considerada a palavra-chave para alcançar o sucesso em projetos de land readjustment. O professor Sorensen, em seu texto “Consensus, Persuasion, and Opposition” debate o mito e a realidade sobre o consenso japonês: Uma das explicações mais comuns dadas pelos especialistas japoneses pelo uso bem-sucedido do land readjustment tem sido a longa tradição japonesa de colaboração, tomada de decisões consensuais e mobilização em grupo. De acordo com esta interpretação, o uso extensivo do land readjustment tem sido possível porque os japoneses são menos individualistas e mais cooperativos do que os cidadãos dos países ocidentais. (Sorensen 2007, p.90).

Isso pode levar a duas avaliações imediatistas. A primeira seria de que países, principalmente os ocidentais, seriam incapazes de realizar projetos de land readjustment, porque sua sociedade não possui as mesmas características do povo japonês. A segunda seria de que o povo japonês realiza projetos de land readjustment com maior facilidade, porque alcança consenso e deixa de lado os próprios interesses em nome do bem comunitário e da boa realização do projeto. Nem a primeira, nem a segunda afirmação é verdadeira. A primeira afirmação será extensamente discutida no capítulo 4, O Status do Land Readjustment no Mundo, no qual diversos especialistas contam não apenas como o método chegou e começou a ser implementado, mas também como cada sociedade reage em particular


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aos seus conceitos e como se adapta ao seu processo. Portanto, países orientais e ocidentais, em sociedades com maior ou menor capacidade de organização, são capazes de alcançar resultados com o land readjustment. A segunda afirmação será interpretada segundo os estudos do próprio Sorensen (2007). Em primeiro lugar, porque a palavra “consenso” tem um significado especial no Japão, e, como ficou claro, em muitos dos autores japoneses estudados pelo autor, a noção de consenso e harmonia serviram para mascarar muito das relações de poder existentes no país até hoje. Conforme a definição de Sugimoto, “quem define o conteúdo do consenso, acerca dos interesses de quem o consenso é formado?” (Sugimoto 1986, p.66). Em segundo, porque, principalmente após as décadas de 1960 e 1970, quando surgiu uma forte atividade ambientalista e oposicionista às políticas vigentes, as fortes atividades de oposição de grupos organizados da sociedade civil também chegaram a projetos de land readjustment: “cooperação e consenso nunca estiveram associados com noções de igualitarismo ou direitos individuais, mas sim com a deferência a autoridade e as obrigações coletivas, seja para com a família, a comunidade, a companhia, ou a nação” (Sorensen 2007, p.93). Um ótimo exemplo da falta de consenso e intensa oposição a projetos urbanos aconteceu durante o período de reconstrução do Grande Terremoto de Kanto em 1923. Os movimentos de oposição obtiveram um sucesso inicial no sentido de postergar as iniciativas públicas, buscando assim anular suas iniciativas. Porém, dois anos depois o Parlamento japonês aprovou por unanimidade o Plano de Reconstrução de 1925 com pequenas mudanças para acalmar os movimentos de oposição que gradualmente foram extintos (Sorensen 2007). Em 1940, no período pós-Segunda Guerra Mundial, e em 1960, no período de rápido crescimento industrial, as organizações de oposição a projetos urbanos, principalmente os via land readjustment, também foram formadas. Uma delas, de caráter nacional e de oposição a projetos de land readjustment, construía campanhas e providenciava informação e análise sobre como vencer o governo para não realizar projetos pré-aprovados (Sorensen 2007). Na literatura japonesa sobre o land readjustment, esses intensos movimentos de oposição da sociedade civil e as ações governamentais para transpô-los dificilmente são mencionados. A importância de Sorensen esteve em estudar e contribuir para clarear essa lacuna, pois os movimentos de vigorosa oposição sempre existiram, desde os primórdios da utilização do método. Os esforços do governo japonês nos últimos cem anos foram enormes para alcançar a maior


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quantidade de projetos de land readjustment no mundo, totalizando mais de 11 mil projetos. Porém, mesmo sem existirem estatísticas nacionais, a quantidade em número de projetos não executados ou abandonados pode ser igualmente enorme (Sorensen 2007). A partir do estudo de Sorensen, uma série de conclusões podem ser feitas, sobretudo no que diz respeito ao período estudado entre as décadas de 1980 e 1990: a. Projetos de land readjustment são designados, organizados, planejados e implementados pelos governos locais e são ativamente contrariados pelos detentores de direitos. Mesmo no Japão, onde esse método já era conhecido e praticado, os governos gastam muito tempo, energia e grande quantidade de técnicos dos departamentos de planejamento na organização de projetos de land readjustment, a fim de torná-los suficientemente atraentes para esses proprietários e inquilinos. b. Projetos de land readjustment bem-sucedidos (aprovados e executados até o final) requerem fortes incentivos e/ou restrições para coagir os detentores de direitos a aceitá-los. Os altos índices de insucesso ou desistência da execução, mesmo nos estados onde o governo desenvolve significativos incentivos para a cooperação, demonstram que o conceito de distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano não é visto como favorável pela maioria dos detentores de direitos. c. Projetos de land readjustment não são resultado do instinto japonês de formação de consenso ou relações comunitárias harmoniosas. Os altos índices de insucesso ou desistência da execução revelam a forte objeção e a relutância de chegar a qualquer consenso. Eles são resultado da falta de outros mecanismo para prover infraestrutura após o crescimento desordenado, restando ao poder público investir tempo e recursos na busca de soluções. Outros estudos com dados e descrições que nos permitem refletir melhor sobre o land readjustment estão nos textos sobre o terremoto de Hanshin-Awaji em Kobe. Esse terremoto, com magnitude de 7.2 na escala Richter, atingiu a província de Hyogo no dia 17 de janeiro de 1995, às 5h46 da manhã. Edificações e construções foram severamente danificadas e mais de 200.000 pessoas ficaram desabrigadas. Edifícios públicos, como escritórios, escolas e hospitais foram destruídos, o que causou a paralisação de várias de suas funções por dias. Parte da cidade ficou sem luz, energia, telefonia celular, água e gás, porque a infraestrutura relacionada a esses serviços também ficaram seriamente danificadas. Mais de 800.000 metros quadrados de áreas incendiadas


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resultaram na destruição de 7.000 edificações devido aos incêndios pós-terremoto (Nakagawa e Shaw 2004). Antes da destruição de Kobe, a região central da cidade, que já passava por um processo de degradação e perdas significativas de população, teve esse processo acelerado com o terremoto. Após o desastre, as vítimas também foram obrigadas a mudar-se para os subúrbios, onde habitações temporárias foram providenciadas pelo governo. De certa forma, isso enfraqueceu a manutenção e o desenvolvimento da comunidade local para medidas de reconstrução pós-desastre. As principais vítimas, incluindo idosos e imigrantes, sobretudo vietnamitas empregados nas indústrias químicas japonesas, tinham recursos financeiros limitados para financiar qualquer reconstrução. As políticas nacionais e as condições de recessão anteriores haviam limitado a cobertura das seguradoras, portanto, as companhias de seguro financiaram menos de 10% de todas as perdas causadas pelo terremoto (Johnson 2000). A falta de recursos privados obrigou o poder público a liderar o processo de reconstrução. O governo nacional instaurou uma moratória de dois meses sobre a reconstrução, reforçando as ações de planejamento e desenvolvimento de políticas para sustentar as intervenções políticas durante o processo. A prioridade foi dada a projetos para estabilizar a economia e atrair novos negócios: o governo começou, primeiramente, a financiar a reconstrução de equipamentos públicos e a reabilitação de grandes infraestruturas, depois concedeu financiamento para a reconstrução das áreas residenciais e comerciais. As políticas governamentais para a reconstrução privada favoreciam a reconstrução total, limitando a quantidade de recursos para os reparos de edificações danificadas, incentivando demolições e reconstruções em maior escala (Johnson 2000). As áreas afetadas pelo terremoto e designadas para projetos de land readjustment e redesenvolvimento urbano foram chamadas pelos detentores de direitos de “zonas pretas”, e as outras áreas afetadas sem designações para projetos foram denominadas “zonas brancas” (Nakagawa 2003). Nas “zonas pretas” os proprietários teriam de sacrificar-se para a execução dos projetos, porém, o governo providenciaria a reabilitação física, tais como a construção de ruas amplas e espaços públicos, melhorando o meio ambiente e criando condições preventivas em caso de desastres futuros. Organizações “machizukuri” (“comunidade urbana”, traduzido do japonês para o português) foram instauradas com a participação de moradores, agentes privados e outros interessados na restauração dessas áreas. Essas organizações forneceram oportunidades para membros da comunidade discutirem o planejamento do processo de reconstrução, e


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também realizaram a interface com o governo e consultores contratados para a implementação do projeto de land readjustment. Nas “zonas brancas” as ruas continuariam estreitas e construções ilegais passaram a ser erguidas durante o confuso período, tornando ainda piores as condições ambientais. Nessas áreas, a instauração das machizukuri não era compulsória, porém muitas foram criadas, mesmo não sendo reconhecidas oficialmente pelo governo. Em ambas as zonas, cada machizukuri enfrentou diversas dificuldades no processo de reconstrução e houve diferenças na velocidade e no grau de envolvimento da comunidade (Nakagawa e Shaw 2004). No estudo de caso sobre um dos bairros destruídos pelo terremoto realizado por Tanaka e Kimura no distrito de Misuga, eles descreveram o processo de um projeto de land readjustment 6Projeto de land readjustment no distrito de Misuga no Japão, antes e depois do processo da reconstrução.


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com grandes dificuldades de implementação. Nesse bairro, urbanistas nas décadas de 1970 e 1980 já haviam despendido esforços educando os moradores sobre os riscos de morte que eles corriam vivendo em zonas densamente habitadas, em casas de madeira e ruas estreitas, e que projetos deveriam ser executados para melhorar as condições da região. Tais tentativas foram frustradas (Tanaka e Kimura 2003). Um mês após o terremoto, enquanto moradores de Misuga ainda estavam evacuando a área, o governo local anunciou o plano de reconstrução, por meio de projeto de land readjustment, proibindo qualquer nova construção nas áreas atingidas pelo incêndio. As vítimas ficaram furiosas com a designação do land readjustment, mas como o líder da comunidade local, beirando setenta anos, e outros líderes tinham sido afetados pelo desastre, uma machizukuri foi formada. Nesse caso, os envolvidos não eram apenas moradores e inquilinos, mas também presidentes ou donos de indústrias que possuíam forte ligação com a comunidade local (Tanaka e Kimura 2003). Quando o processo de consenso iniciou-se e os urbanistas explicaram sobre a proposta e a implementação do land readjustment, aqueles que tiveram chance preferiram comprar ou alugar propriedade em outro lugar para não serem perturbados pelos planos de reconstrução. As indústrias também fecharam as portas e mudaram para outra região. Com a falta de público consumidor, os donos de comércio tiveram de fechar as portas e buscar outras formas de sustento. Em duas quadras estudadas, de 735 pessoas residentes em 1990, após e por causa do terremoto, restaram apenas 134 em 1995 (Kobe 1991, 1997). Aqueles que não tiveram alternativa, além de ficar na área, tiveram de suportar o processo de reconstrução de seu bairro. Os proprietários teriam de doar em torno de 10% de suas parcelas de terra para o projeto e proprietários de pequenos lotes (30 a 40 m²) foram convidados a se unir em “terrenos-comum” com outros proprietários de mesmas características. Para muitos isso era intolerável, e, em favor da solução do conflito, poder público e moradores decidiram contratar um especialista para ajudar na elaboração do projeto e para deliberar sobre os diversos impasses. Depois de composta, a machizukuri decidiu organizar festivais e eventos em memória das vítimas fatais para atrair de volta os antigos moradores, na tentativa de devolver o senso de comunidade. Isso também ajudou a aliviar a tensão entre os moradores que saíram do bairro e aqueles que tiveram que passar pelo processo de reconstrução (Tanaka e Kimura 2003). Este estudo de caso pode nos mostrar uma outra face do land readjustment: se por um lado a teoria do consenso referente ao sucesso desses projetos foi descartada, por outro, uma nova


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faceta ficou evidente: a manutenção ou produção do chamado “capital social” nos bairros que são alvos desse tipo de projeto é uma constante, mesmo que, em alguns casos, haja altos índices de abandono ou venda das áreas de intervenção. Ainda que esse termo, “capital social”, seja definido de várias maneiras, aqui se define como função de confiança, normas sociais, participação e network, sendo importante ator no processo de renovação (Nakagawa e Shaw 2004). Exemplos como o do terremoto de Kobe demonstram a importância de soluções de engenharia e definições técnicas tanto quanto a importância de soluções sociais. Portanto, projetos de land readjustment requerem uma abordagem multidisciplinar. Sobre o futuro do land readjustment no Japão, dados mostram que algumas regiões apresentam declínio nos índices de aprovação e quantidade de áreas em execução. No estado de Aichi, por exemplo, aquele que mais realizou projetos no Japão (das 11 mil áreas no país, mais de mil foram reajustadas somente em Aichi), o fenômeno de declínio das atividades do land readjustment vem sendo observado desde 1993, ano que teve um dos maiores índices de execução de projetos em sua história, perdendo apenas para 1973. Comparando: em 1993, foram 23 projetos executados (3 pelo poder público e 20 por cooperativas) contra apenas 2 pelo poder público, em 2007. Em termos de tamanho de projetos temos: em média, 60 hectares por ano de 1955 até 1975 (com picos de 100 a 120 hectares), chegando a uma média de 20 até 2000 e a uma média de 5 em 2001 (Ito 2007). Esse declínio pode ter algumas razões. No caso de Aichi, com cidades como Nagakute, Kasugai e Nagoya, que chegou a picos de 70 a 80% de território reajustado, o próprio processo de execução extensivo gerou diminuição por uma simples razão: não existem mais tantas áreas com necessidade urgente de renovação. Além disso, o Japão também iniciará em dez anos o processo de ápice e declínio de sua população devido a baixa taxa de natalidade e melhores condições de envelhecimento de seus habitantes. Dessa maneira, o próprio processo de declínio do crescimento populacional resultará numa diminuição das funções urbanas, o que pode resultar na redução das atividades do land readjustment no país. Existe também grupos e organizações ativistas que realizam atualmente uma forte oposição aos projetos de land readjustment no Japão (Sorensen 2000; Sorensen 2007), criando dificuldades para o poder público durante sua implementação. A seguir dois projetos selecionados para consulta e exemplificação. O primeiro será contemplado com maior nível de detalhes em todo o processo de desenvolvimento e implementação. O segundo será apresentado a partir de informações mais gerais, tais como a taxa de contribuição e os custos e benefícios distribuídos entre os detentores de direitos.


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Projeto de land readjustment Nagoya Kaminokura, Nagoya, Japão (名古屋市 神ノ倉東部土地区画整理事業) Local: bairros de Midori e Tempaku, distrito leste do município de Nagoya, no Japão. Agente de implementação: cooperativa de land readjustment Kaminokura e poder público (departamento de land readjustment de Nagoya). Área do projeto: 46,39 hectares. Proprietários e inquilinos: 481 proprietários. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com 25,17% para áreas públicas e 14,67% para terrenos-reserva, num total de 39,84% de contribuição. Com a contribuição foi disponibilizado um total de 6,46 hectares de terrenos-reserva.

Levantamento fundiário do projeto de land readjustment Kaminokura antes da execução do projeto em 1978. 5


5Região sudeste de Nagoya, durante a execução do projeto de land readjustment Kaminokura em 2000. 6Região sudeste de Nagoya, após a execução do projeto de land readjustment Kaminokura em 2004.


Proposta fundiária do projeto de land readjustment Kaminokura após a execução do projeto.5

Período para desenvolvimento do projeto: de 1972 até 1986. 1972 jan.: Nagoya aprova seu plano de desenvolvimento urbano; 1972 fev.: coleta dos documentos de acordos provisórios para o início do projeto; 1978 set.: instaurada a comissão para avaliação dos detentores de direitos e para a averiguação dos diversos requerimentos para estabelecer uma cooperativa de land readjustment; 1979 mar.: exposição do projeto de land readjustment para os proprietários, inquilinos e envolvidos; 1979 nov.: debate público sobre a criação de parque urbano de Kumano e seus limites; 1981 jul.: pesquisa sobre as condições ambientais e levantamento de preservação da área, em especial na área envoltória ao lago Kamizawa, situado no interior do projeto de Kaminokura; 1982 nov.: anunciado oficialmente o projeto de land readjustment; 1983 fev.: envio de relatório sobre o andamento do projeto para todos os detentores de direitos junto com o desenho do projeto; 1983 jun.: reunião com os detentores de direitos no ginásio de esportes da escola pública primária de Hirabi Minami (dos 481 proprietários, 255 compareceram); 1983 jul.: envio do relatório sobre o andamento da coleta de declarações e acordos (houve solicitação de 200 pessoas para uma nova reunião explanatória); 1983 set.: início do planejamento de execução das obras; 1984 jun.: novo debate público para reforçar a coleta de declarações e acordos, com a presença de


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especialistas do departamento de land readjustment de Nagoya (até o momento havia a adesão de 72,0% dos proprietários, donos de 84,0% da área total do projeto); 1985 fev.: entregue ao poder público o requerimento para aprovação do estabelecimento da cooperativa de land readjustment, composta por seus proprietários (declaração e anuência total de mais de 85,0% dos proprietários); 1985 fev.: requerimento de aprovação do estabelecimento da cooperativa aberto ao público para livre apreciação na prefeitura de Nagoya; 1985 mar.: declaração pública de aprovação da cooperativa de land readjustment Kaminokura; 1985 abr.: realização da primeira assembleia geral constituinte da cooperativa; 1985 jun.: eleição de 50 delegados pela assembleia. Período para implementação do projeto: de 1986 a 2004. 1986 jul.: aquisição de todas as autorizações e certificações necessárias para o início da obra de preparação dos terrenos; 1987 jan.: início das obras de preparação de terrenos em 18,2 hectares do projeto; 1987 fev.: aprovada a regulamentação sobre os terrenos-reserva, estabelecendo critérios de avaliação após a execução do projeto; 1987 out.: aprovada a indicação do plano de replotting provisório e do local de construção dos terrenos-reserva (1ª assembleia dos delegados); 1987 dez.: início das obras de preparação de terrenos em 28,19 hectares do projeto; 1990 fev.: decidida a prorrogação do prazo de realização das obras até 1995 (2ª assembleia); 1985 jun.: segunda eleição de 50 delegados pela assembleia; 1993 mar.: início das obras de infraestruturas básicas em todos os loteamentos residenciais; 1994 out.: início das obras de jardinagem e paisagismo nas áreas verdes e preservadas; 1995 jun.: terceira eleição de 50 delegados pela assembleia; 1997 mai.: decidida a prorrogação do prazo de realização das obras até 2001 (3ª assembleia); 1999 jun.: decidida a prorrogação do prazo de realização das obras até 2003 (4ª assembleia); 2000 jun.: quarta eleição de 50 delegados pela assembleia; 2001 fev.: transferência de jurisdição dos novos parques para o poder público; 2002 mar.: transferência de jurisdição do novo sistema viário para o poder público; 2002 mar.: deliberação de denominação de ruas e divisas do novo bairro; 2004 out.: certificado de conclusão do projeto e dissolução da cooperativa.


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Projeto de land readjustment Nagoya Shidami Science Town, Nagoya, Japão (志段味地区特定土地区画整理事業) Local: distrito nordeste do município de Nagoya, no Japão. Agente de implementação: cooperativa especial de land readjustment Nagoya Shidami e poder público (departamento de land readjustment de Nagoya). Área do projeto: 761 hectares (subáreas: Kikko, 213,5 hectares; Shimoshidami, 160,2 hectares; Nakashidami, 192,0 hectares e Kamishidami, 194,9 hectares). Proprietários e inquilinos: 5.950 proprietários (subáreas: Kikko, 1.230 proprietários; Shimoshidami, 1.080 proprietários; Nakashidami, 2.240 proprietários e Kamishidami, 1.400 proprietários). Sobre o projeto: Shidami é uma área inserida em Moriyama, um dos 26 distritos do município de Nagoya, estado de Aichi, no Japão. Localizado na região nordeste, esse é o distrito que possui atualmente o maior projeto de land readjustment do Japão, com 761 hectares para o desenvolvimento urbano. Aproveitando seus amplos recursos naturais, dentro do processo de reconversão de terrenos agrícolas e outras áreas de preservação, e adequando-as ao processo de crescimento urbano, o projeto de desenvolvimento distrital resultou no “Shidami Human Science Town”, ou o Distrito de Ciências Humanas de Shidami. Esse distrito foi projetado como local onde a habitação e a recreação pudessem conviver em harmonia com pesquisas, desenvolvimento tecnológico e manufaturas. Para obter o resultado esperado, o projeto de land readjustment foi dividido em 4 projetos, compostos por distintas cooperativas de proprietários: o Kikko (213,5 hectares), o Shimoshidami (160,2 hectares), o Nakashidami (192,0 hectares) e o Kamishidami (194,9 hectares). A área de Shidami possui condição favorável de meio ambiente, com paisagens formadas por morros, pequenas florestas e linhas fluviais. Sua relação com a região central de Nagoya também é favorável: a estação Tikusa fica a 15 minutos de distância a pé de Shimoshidami; e a 15 quilômetros da estação central de Nagoya. Integrando o projeto de land readjustment ao sistema de transporte público, foi prevista a construção de uma linha de ônibus em pista elevada e isolada, que também conduzirá à região central de Nagoya. Ainda foram projetados instituições de ensino, hospitais e áreas de lazer, capazes de se adequar à mudança de densidade estimada: atualmente são 11 mil moradores diante dos 60 mil esperados após a execução do projeto. As ruas e avenidas foram todas planejadas com passeio para pedestres mais amplos, ciclovias e plena acessibilidade para deficientes e idosos.


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As discussões sobre as transformações dessa antiga zona rural em urbana se iniciaram a partir da década de 1980. A primeira cooperativa especial de land readjustment Kikko foi aprovada em 1984. Porém, somente na década de 1990, após intensas discussões sobre o plano de execução das propostas, foram aprovadas as cooperativas de Shimoshidami em 1992, de Kamishidami em 1993 e de Nakashidami em 1995. Alguns proprietários opuseram-se à transformação de seus terrenos agrícolas em urbanos, porque a agricultura era sua única forma de subsídio. Levando em consideração tais preocupações, o projeto manteve 23,5 hectares em terrenos agrícolas integrados a um amplo programa de recuperação de córregos, rios e de tratamento de esgoto. Além disso, houve elevada taxa de remoção das edificações existentes nesse projeto, somando um total de 1.553 casas e outras estruturas. 6Subárea de Kikko antes da execução do projeto de land readjustment em 1978.


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Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com taxas diferenciadas, de acordo com cada uma das cooperativas criadas: Kikko, 36,4%; Shimoshidami, 39,3%; Nakashidami, 35,2% e Kamishidami, 39,8%. Com a contribuição foi disponibilizado um total de 107,1 hectares de terrenos-reserva. Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o valor do terreno passou de US$ 650,00/m², antes da execução do projeto, para US$ 1.200,00/m². Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada a alteração dos terrenos agrícolas para terrenos devidamente urbanizados, absorvendo e distribuindo os benefícios do desenvolvimento equilibradamente entre os envolvidos. Subárea de Kikko após a execução do projeto de land readjustment em 2003. 6


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CAPÍTULO 3: O QUE É PROJETO DE REDESENVOLVIMENTO URBANO? Ideias por trás do redesenvolvimento urbano O land readjustment demonstrou-se amplamente eficaz para o planejamento e o desenvolvimento de áreas urbanas ou rurais, desocupadas ou ocupadas, e para reverter processos de crescimento desordenado. No entanto, a aplicação do método atinge outro grau de complexidade em áreas consolidadas, com variados índices de densidade construída, enorme diversidade de usos e grande contingente populacional. Nesses casos, o projeto pode tornar-se inviável financeiramente, considerando apenas a contribuição de parcela dos terrenos e a venda dos terrenos-reserva. Porque, devido às restrições espaciais e dado o volume de área construída, essas ferramentas serão dificilmente capazes de viabilizar vacância de terra necessária para áreas públicas e viabilizar recursos necessários para determinadas infraestruturas, como abertura de avenidas ou instalação de novos parques urbanos. Mesmo que a agência de implementação contabilize altas taxas de contribuição nessas áreas, não haveria contribuição de terras privadas suficiente para viabilizar a transformação perante as demandas urbanas necessárias. Qual seria uma solução possível nesses casos? Uma delas seria a adoção de projetos de redesenvolvimento urbano baseados no direito de conversão. Com o uso desse instrumento de transferência fundiária, as parcelas de terra são redistribuídas, porém, em vez de isso ocorrer no próprio terreno, os direitos são transferidos para andares de uma nova edificação. Portanto, o direito de conversão consiste em transferir direitos da parcela de terra para o “solo criado” nos andares de novas edificações. Após a transferência, a agência de implementação consegue viabilizar vacância de terras suficiente para a implementação de novas áreas para equipamentos públicos. Uma das ideias importantes relacionadas ao redesenvolvimento urbano é utilizar a “multiplicação da terra” em favor da constituição de espaços públicos. Com a multiplicação por meio de andares nas novas edificações, os andares vagos que não forem entregues aos antigos proprietários dos terrenos, em contrapartida por sua participação, serão vendidos e seus recursos utilizados para pagar os custos da execução do projeto. Assim, serão criados, em lugar de terrenosreserva, “pisos-reserva” ou “andares-reserva”, a serem comercializados para desonerar em longo


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prazo os cofres públicos, que podem ser ressarcidos parcial/integralmente do investimento realizado em infraestrutura pública. Os projetos de redesenvolvimento urbano têm amparo teórico nas linhas propostas pelo arquiteto franco-suíço Charles-Edouard Jeanneret-Gris, mais conhecido pelo pseudônimo de Le Corbusier (1887-1965). A teoria proposta pelo mestre do modernismo sugeria que é mais racional construir altos edifícios com amplos espaços verdes à sua volta, do que superpovoar setores urbanos com edificações baixas (Le Corbusier 1971). Porém, projetos de redesenvolvimento urbano possuem um avanço importante: em vez de setores monofuncionais propostos durante o movimento do modernismo, que estipulava que as cidades deveriam ter espaços segregados para viver, trabalhar e se divertir, os projetos de redesenvolvimento urbano combinam diversas funções, como as de escritórios, residências, áreas comerciais e espaços de lazer num mesmo conjunto edificado. Seguindo na tentativa de viabilizar os pressupostos do mestre do modernismo, especialmente quanto à idealização do modelo de “altas edificações cercadas por amplos espaços verdes”, muitas foram as dificuldades encontradas quando setores públicos e privados se dispuseram a tentar transformar a utopia em realidade. Entre elas, a crescente atração e demanda que a parcela de terra exerce como fonte de investimento seguro e rentável, intensificando o sistema comercial dos mercados, segregando entornos construídos e espraiando a ocupação urbana, o que cria entraves para o acesso de parte da população a esse mercado. Dessa maneira, tornou-se difícil condicionar vida, trabalho e diversão, mesmo que numa única edificação, já que o poder público, sobretudo nos países periféricos, possui poucos recursos para estimular usos apropriados perante a força do mercado imobiliário. E diversos instrumentos de intervenção urbana, como a desapropriação ou o controle das atividades urbanas, obtiveram resultados bastante limitados nas últimas décadas, sobretudo no sentido de assegurar “os amplos espaços verdes” em zonas urbanas. Nesse sentido, projetos de redesenvolvimento podem criar condições de acesso à terra, porque utilizam a seu favor a capacidade de ampliar o estoque de unidades habitacionais e comerciais, mesmo em áreas degradadas, incluindo aquelas previamente não incorporadas pelo sistema de planejamento urbano vigente, como trechos fragmentados em áreas ao longo de linhas ferroviárias ou em ladeiras íngremes. Aumentando o número de suprimento de unidades, de maneira consorciada, após transformações e adaptações estipuladas por projeto urbanístico, setores públicos e privados podem criar condições para atender à demanda. Dependendo da escala de


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Mecanismo do método do redesenvolvimento urbano. 5

atuação, essa demanda pode ser atendida com espaços públicos e transporte urbano em áreas de difícil condições para ocupação. Há outro aspecto importante que envolve projetos de redesenvolvimento urbano: as funções a serem exercidas pelo poder público e pelos setores privados. Frequentemente se supõe que o poder público deve compensar a falha do mercado de habitação privado e fornecer diretamente a moradia para os menos favorecidos. Com a crescente escassez de recursos perante a crescente


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demanda, os menos favorecidos parecem ficar sem opções, conforme ressaltou Geoffrey Payne: Atuando como “developers” (promotores), as agências do poder público invariavelmente falharam em alcançar os objetivos de fornecer terrenos urbanizados ou habitações para mais do que uma pequena porcentagem do necessário. [...] Tal abordagem falhou por causa da falta de suporte de atores urbanos fundamentais e de recursos humanos e financeiros necessários por parte do Estado. (Payne 1998, p.2).

O trabalho do autor pressupõe uma enorme distância entre o poder público e setores privados, em muitos países, sobretudo nos países periféricos. Se por um lado, apesar de todas as suas limitações, agentes do poder público consideram-se protetores dos oprimidos, excluídos das agressivas atividades do mercado imobiliário; por outro, agentes do setor privado consideram o poder público incompetente, ausente e corrupto (Payne 1998). A partir dessa discussão, temos um impasse claro: enquanto os setores privados dificilmente são capazes de atingir demandas sociais, mesmo porque suas ações se baseiam em rentabilidade, respaldadas por procedimentos de qualidade, os setores públicos possuem dificuldade em acelerar processos de aprovação, regulação e permissão, aumentando custos e diminuindo o desempenho próprio e daqueles que dependem de suas ações. O resultado dessa discussão, portanto, pode nos levar a concluir que nem setores públicos, nem setores privados por si só são capazes de resolver problemas urbanos de maneira isolada, incluindo o do aumento de demanda por unidades habitacionais e comerciais, e espaços públicos de qualidade em áreas com crescente densidade demográfica. Por isso, projetos de redesenvolvimento urbano trazem em sua essência as parcerias entre público e privado, que possuem determinantes amplamente reconhecidas, entre elas as destacadas por Geoffrey Payne (Payne 1998): a. A comprovada ineficiência dos governos na grande maioria dos países do mundo em suprir terras urbanizadas e habitações de acordo com a escala da demanda; b. O processo crescente de globalização da economia mundial, que reduz as opções do poder público, tornando, de certa forma, a parceria a única opção viável para influenciar o mercado imobiliário; c. A comprovada eficiência do setor privado em relação ao poder público em alcançar certas demandas necessárias, em parte supondo que a competição dentro do setor filtrará fornecedores ineficientes. Conforme o documento elaborado pelas Nações Unidas em 1993, parcerias significam mais


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do que um simples link ou interação entre dois ou mais atores no processo, porque estabelecem uma relação de complementaridade, na qual as forças e fraquezas relativas de cada parceiro são deslocadas umas contra as outras, para produzir o desenvolvimento necessário, combinando os melhores atributos de cada um (UN 1993). O documento ainda destaca diferentes direitos e deveres dos parceiros, não havendo necessidade de que as atribuições sejam iguais em termos de esforços e investimentos. Ele considera que cada um dispõe de contribuições diferentes e busca resultados diversos, mesmo quando os objetivos são comuns (por exemplo, o morador quer viver em melhores condições, o poder público quer novas áreas públicas e os setores privados visam o lucro; todas exigências possíveis de se alcançarem num mesmo projeto). Dessa forma, parcerias entre público e privado em projetos de redesenvolvimento urbano servem para estabelecer as necessidades primárias de todos os agentes envolvidos, especialmente dos beneficiários potenciais (detentores de direitos), e formular critérios que servirão para avaliar os custos e os benefícios do desenvolvimento urbano. Em situações em que setores urbanos precisam de infraestrutura, ou de reconstrução após desastres naturais, ou de prevenção para futuros danos causados por desastres naturais, entre outras demandas, projetos de redesenvolvimento urbano desempenham importante papel no processo de modernização de diversas cidades, como nas metrópoles japonesas e outras capitais asiáticas. Distribuídos em quatro tipos de demanda, eles são utilizados mais comumente em setores urbanos para: (I) construção de instalações anexas a estações de metrô, abertura de novas vias e avenidas, conversão de usos em zonas industriais; (II) construção de habitações, revitalização de centros financeiros; (III) adaptação de edificações contra incêndios e (IV) reconstrução de setores urbanos após grandes desastres. Antes de investigarmos como o projeto de redesenvolvimento urbano é realizado no Japão e como se estabelecem as relações de parceria entre público e privado no país, é importante salientar ao leitor que o termo “redesenvolvimento” é pouco utilizado no português. Por isso ele exige um pouco de reflexão. A expressão “projeto de redesenvolvimento urbano” advém da tradução literal do inglês “urban redevelopment project”. O dicionário Michaelis (© 1998-2007 Editora Melhoramentos Ltda.) indica “redevelopment” como “ato de desenvolver novamente ou renovação de área deteriorada”; o Babylon (© 1997-2007 Babylon.com Ltda.) traduz como “renovar o desenvolvimento ou restaurar” e o Longman (© 2009 Person Education www.ldoceonline.com) refere como “ato de desenvolver


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uma área, especialmente a urbana”; e a própria palavra “desenvolvimento” no idioma português, conforme consulta ao dicionário Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (© 1999 Editora Nova Fronteira S.A.), possui significado semelhante: “de.sen.vol.vi.men.to sm (desenvolver+mento) 1-Ato ou efeito de desenvolver. 2-Crescimento ou expansão gradual. 3-Passagem gradual de um estágio inferior a um estágio mais aperfeiçoado. 4-Adiantamento, progresso”. O termo “redesenvolvimento” provém, conforme nosso entendimento, do conceito de que o desenvolvimento urbano ocorre em todos os espaços urbanos a todo o tempo. Ele é fruto de reformas e melhorias na escala das propriedades isoladas, realizado por seus moradores e desassociado de investimentos em transformações que incidem sobre os espaços públicos, por exemplo, na escala de bairro. Nesse sentido, essa palavra refere o ato de desenvolver novamente, em maior escala, áreas que já vêm sendo desenvolvidas em menor escala, lote a lote. Se imaginarmos que, a cada cinco ou dez anos, significativas transformações ocorrem em diferentes áreas da cidade, em propriedades próximas ou vizinhas, concluiríamos que seriam necessários significativos investimentos, maiores do que os valores de propriedades isoladas, para que bairros obsoletos sofram adaptações e incrementos suficientes para redesenvolverem-se. O redesenvolvimento urbano no Japão O Japão passou por um momento importante em sua história durante a década de 1960: após anos de cortes com gastos públicos e diversas tentativas de implementação de planos de reconstrução do pós-guerra (muitos deles, principalmente na região metropolitana de Tóquio, abortados ou abandonados), sua economia começou a apontar para uma significativa melhora que o levaria à uma fase de prosperidade econômica. A resultante aceleração econômica e a necessidade de construção de infraestruturas para os Jogos Olímpicos de 1964 mudaram a paisagem da capital: vias elevadas sobre espaços públicos, e outras infraestruturas necessárias para a implementação dos jogos foram construídas. Porém, após a realização dos jogos, muitas dessas infraestruturas foram consideradas supérfluas e pouco representaram efetivamente numa melhora na qualidade do meio ambiente urbano da região metropolitana. Com tantas experiências em desenvolvimento urbano, desde a implementação dos planos de reconstrução, passando por projetos de land readjustment até o planejamento e a construção de infraestruturas para os Jogos Olímpicos, o Japão aprovou, na Lei de Planejamento Urbano nº 100


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de 1968, a aplicação de projetos de redesenvolvimento urbano em áreas estipuladas pelo plano diretor e carentes de reconversão de suas funções estruturais. A legislação possui como principal enfoque a gradual reconversão de terras degradadas e densamente construídas, que se tornaram subutilizadas no contexto moderno (demandas viárias, espaços públicos), em áreas reorganizadas e apropriadas ao desenvolvimento. Entre as justificativas apontadas pelo sistema de planejamento japonês para a adoção dessa modalidade de projetos estão: o excessivo fracionamento das propriedades, herança do período feudal; a crescente demanda para produção de habitações, resultado das elevadas taxas de crescimento populacional; e a falta de recursos por parte do poder público para construir todas as infraestruturas urbanas necessárias. Desde 1969, os projetos de redesenvolvimento urbano (市街地再開発事業 ou “shigaichi saikaihatsu jigyo”, em japonês), e principalmente o direito de conversão (権利変換 ou “kenri henkan”, em japonês) são regulamentados pela Lei de Renovação Urbana nº 38. A lei delibera sobre: regras de aplicação do direito de conversão em áreas onde se promove urbanização; restrições incidentes à construção de novas edificações ou estruturas que venham a obstruir a execução do projeto; e a possibilidade de transferência compulsória de direitos de alguns opositores ao projeto por meio do cumprimento de procedimentos legais (JICA e MLIT 2007a). Além disso, ela dispõe sobre medidas especiais de taxação e pagamento de impostos durante o processo de transferência de direitos e sobre medidas especiais de financiamento com recursos públicos ( tais como custos de pesquisa, estruturação da proposta, planejamento de novas infraestruturas públicas e demolições de edificações existentes). Sua aplicação é dividida em duas modalidades de projetos de redesenvolvimento urbano. O tipo I é baseado no direito de conversão, transferindo os direitos dos proprietários para parte do novo edifício construído. Nesse caso, os recursos para pagar o financiamento do projeto são adquiridos na venda da área construída adicional. Cerca de 660 projetos foram executados no Japão, totalizando 796 hectares de áreas desenvolvidas por agências de implementação pública e privada até 2003 (MLIT 2003). O tipo II é baseado na declaração, feita por governos locais ou agência de implementação, de áreas compulsórias para o “redesenvolvimento”. Nesse caso, os direitos dos proprietários são transferidos compulsoriamente ao Estado ou à agências de implementação e, após a execução do projeto, retransferidos aos antigos detentores de direitos. O tipo II pode ser aplicado apenas em casos urgentes de prevenção ou reconstrução, de desastres naturais ou de construção de infraestruturas públicas de importância regional ou nacional. Cerca


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de 30 projetos foram executados no Japão, totalizando 270 hectares de áreas redesenvolvidas por empresas privadas contratadas pelo poder público até 2003 (MLIT 2003).

5Mapa do município de Nagoya indicando as duas modalidades de projetos de redesenvolvimento urbano.


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De acordo com a Lei de Renovação Urbana nº 38, projetos de redesenvolvimento urbano estão disponíveis para aplicação em apenas três áreas delimitadas pelo plano diretor: nos distritos para utilização efetiva do solo, nos distritos para a promoção do redesenvolvimento e nos distritos especiais para a renascença urbana. Além dessas três delimitações, ainda existem condições especiais para sua aplicação: áreas na qual a porcentagem de edificações em madeira for alta, prejudicando a saúde e a segurança pública, e áreas na qual a densidade construída for muito baixa, prejudicando a potencial utilização da área (JICA e MLIT 2007 b). Com relação aos distritos para a utilização efetiva do solo (高度利用地区 ou “koudo riyou chiku”, em japonês), esses são perímetros apontados no plano diretor, indicando áreas para a promoção da intensificação do uso do solo e respectivos incentivos em áreas com baixa densidade construída. São áreas com predominância de estruturas em madeira próximos a pontos nodais de transporte de massa ou centros comerciais. Essas condições físicas justificam as transformações, visando condições de maior segurança pública e uso eficiente do solo. Entre os incentivos fornecidos pelo poder público para projetos de redesenvolvimento, temos as alterações nos parâmetros urbanísticos para as edificações inseridas no projeto urbanístico, permitindo construir acima do coeficiente de aproveitamento estabelecidos na lei de zoneamento. Com relação aos distritos para a promoção do redesenvolvimento (再開発等促進区 ou “saikaihatsu tou sokushinku”, em japonês), anteriormente conhecidos como plano distrital especial para o redesenvolvimento (再開発地区計画 ou “saikaihatsu chiku keikaku”, em japonês), esses são unidades especiais de planejamento que indicam áreas de conversão drástica do uso do solo. Trata-se de perímetros com grandes proporções, geralmente antigos terrenos industriais ou pátios de manobra de transporte ferroviário. Essas condições físicas justificam a transformação em áreas com maior densidade construída e ampla mistura de usos. Os distritos possuem um sistema de zoneamento condicional, ou seja, como geralmente apresentam baixos coeficientes de aproveitamento, só serão permitidos maiores coeficientes se o projeto de redesenvolvimento urbano atender a todas as especificações de construção de áreas públicas (JICA e MLIT 2007 b). A justificativa para o sistema de zoneamento condicional se baseia no fato de que infraestruturas públicas bem planejadas, em processos de reconversão urbana, são fundamentais como fator de atração para um maior número de pessoas na região. Ou seja, alterações na lei de zoneamento em vigor não serão permitidas em projetos de redesenvolvimento urbano, a menos que a agência de implementação arque com todas as infraestruturas públicas especificadas pelo governo.


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Esse sistema foi introduzido por meio de uma política nacional de flexibilização das regulações para estimular o investimento privado na década de 1980, marcada pela conversão de uma série de atividades industriais pesadas para outras, como telecomunicações e tecnologia da informação. No processo de transformação, muitos terrenos se esvaziaram por conta do declínio daquelas atividades, o que criou oportunidade de mudanças estruturais significativas por dois motivos: a vacância ocorreu em terrenos nas baías metropolitanas japonesas, com possibilidade de produção de lugares atrativos para novos investimentos; e as antigas indústrias pesadas eram detentoras de grande capital de investimentos e muitas delas diversificaram seu campo de atuação, incluindo o mercado imobiliário. Com relação aos distritos especiais para a renascença urbana, esses foram introduzidos mais recentemente e resultam do período de estagnação que o Japão viveu durante a década de 1990. Uma década antes, o país desfrutava de prosperidade econômica, a chamada “Bolha Econômica”, que provocou um forte encarecimento no valor das parcelas de terra, seguido de forte queda, quando a “suposta bolha estourou”. Grande parte dos empréstimos realizados durante a prosperidade econômica era assegurada sobre os valores do mercado imobiliário e sua queda (penhores e hipotecas), entre outros fatores, foi responsável por altas dívidas e crise econômica. Assim, durante a década de 1990, conhecida como “década perdida”, o Japão não apenas passou por estagnação econômica e financeira, mas também presenciou um forte declínio de suas funções urbanas. Com o forte processo de deterioração urbana provocado pelo colapso econômico japonês, o governo decidiu contornar a situação tomando uma série de medidas, entre elas, a modernização estrutural da Corporação de Desenvolvimento Urbano (Urban Development Corporation – UDC), uma autarquia federal de capital misto, estabelecida em 1955, transformando-a na Agência de Renascença Urbana (Urban Renaissance Agency – URA). Criada em maio de 2001, a nova agência tem o principal objetivo de “regenerar cidades até recuperar sua vitalidade econômica” (Kobata 2004) por meio de políticas urbanas bem-sucedidas, e refletia a crença do então primeiro ministro Junichiro Koizumi (2001 - 2006) de que o governo deveria responsabilizar-se por atividades apropriadas do setor público, deixando a cargo do setor privado atividades que este melhor dominasse. Baseando-se nessa filosofia, o governo aprovou a Lei de Medidas Especiais para a Renascença Urbana nº 22 de 2002, responsável por inovações na política de parceria pública com o setor


Distrito para utilização efetiva do solo: área de Hijie, estado de Aichi no Japão. 5


5Distrito para promoção do redesenvolvimento: área de Shinonome, baía de Tóquio no Japão.


Distrito especial para a renascenรงa urbana: รกrea de Rokkomichi, estado de Kobe no Japรฃo. 5


5Projeto de redesenvolvimento urbano de Obata Ekimae (1994-2002), estado de Aichi no Jap達o. 6Projeto de redesenvolvimento urbano de Hibino (1993-2012), estado de Aichi no Jap達o.

6Projeto de redesenvolvimento urbano de Arimatsu Ekimae (1997-2006), estado de Aichi no Jap達o.


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privado, abrindo portas a uma nova etapa para projetos de redesenvolvimento urbano no Japão. A lei apresenta cinco objetivos principais: a. Coordenação das cidades coexistindo com o meio ambiente de maneira sustentável; b. Adaptação das cidades conferindo habilidades globais e manutenção de características locais; c. Criação de cidades com paisagens atrativas e valorização da cultura regional; d. Produção de setores urbanos seguros e confortáveis; e. Administração e planejamento das cidades por meio da cooperação entre público e privado. A principal perspectiva dessa nova legislação foi diminuir os gastos públicos com infraestrutura urbana, por meio do poderio do setor privado, dentro de uma nova ordem econômica, possibilitando assim ao governo japonês utilizar seus recursos em outros setores, tais como desenvolvimento tecnológico, descobertas científicas e segurança. Dessa maneira, a Agência de Renascença Urbana se tornou uma instituição administrativa independente, com capacidade de organizar projetos e coordenar o setor privado nos processos de regeneração urbana. Projetos aprovados conforme essa nova regulação contam com a flexibilização dos coeficientes de aproveitamento aprovados pela lei de zoneamento, procedimentos processuais mais simplificados (uma solicitação constante do setor privado japonês), linhas de suporte financeiros e incentivos fiscais especiais. Após a aprovação dessa lei, a quantidade de projetos aprovados e em processo de execução pela Agência de Renascença Urbana aumentou consideravelmente, indicando que a nova legislação vem conseguindo viabilizar relativamente novas infraestruturas públicas e ampliar a parceria com setores privados. Atualmente, muitos desses projetos suportam injeção de capital de fundos privados por tempo estipulado pelo poder público, mostrando-se mais rentáveis do que outros fundos do mercado japonês. O Japão vem buscando novamente meios de vanguarda para revitalizar seus setores urbanos. Processo formal do redesenvolvimento urbano no Japão O redesenvolvimento urbano no Japão é regulamentado pela Lei de Renovação Urbana nº 38, aprovada em 1969, que delibera sobre sua requisição feita pelo poder público ou pela iniciativa


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privada, via programas de renovação urbana. De acordo com a lei, projetos de redesenvolvimento urbano poderão ser executados de duas diferentes maneiras: a. Por iniciativa pública, por meio de autarquias federais (como, por exemplo, a Agência de Renascença Urbana) ou outras instituições, em parceria com setores privados que fornecerão consultoria e arranjos para a implementação das obras, e em parceria com os proprietários que participarão com suas propriedades para a execução do projeto; b. Por iniciativa privada, por meio de corporações de investimentos em mercado imobiliário (como, por exemplo, a Mitsubishi Estate Company) em parceria com o poder público, mediante prévia aprovação do empreendimento e sua inserção no plano diretor, e em parceria com os proprietários que participarão com suas propriedades para a execução do projeto. Ainda segundo a lei, projetos de redesenvolvimento urbano devem ser integrados aos planos diretores por meio de programas de renovação urbana e aplicados nas cidades mais populosas do Japão, indicando perímetros urbanos para suas ações. Depois de indicados, deverão ser definidas estratégias específicas nesses perímetros, também chamados de “pontos de ação” (JICA e MLIT 2007b), com a descrição da forma com que os projetos serão intensivamente promovidos, incluindo a possibilidade de execução pública compulsória. Nos projetos de redesenvolvimento urbano realizados no Japão são determinados perímetros para o completo desenvolvimento por meio da intensificação de seu uso. As antigas parcelas de terra, divididas em pequenas unidades, são agrupadas em uma única. Os direitos de propriedade sobre essa nova parcela são partilhados entre todos os antigos proprietários, doravante denominados co-proprietários, portanto proprietários de um terreno-comum. Os direitos sobre o solo criado na nova edificação serão distribuídos entre todos os envolvidos: proprietários, que terão direito a uma ou mais unidades construídas; inquilinos, com novos contratos de locação nas novas unidades; e compradores de novos direitos (propriedade ou aluguel) sobre os pisos-reserva. Os detentores de direito sobre imóveis comerciais terão seus negócios transferidos para a nova edificação e eventuais paralisações sobre suas atividades serão compensadas pela agência de implementação do projeto. A contribuição dos proprietários em projetos de redesenvolvimento urbano, nesse caso, não é feita por meio de área de terreno, como nos projetos de land readjustment, mas a partir do valor do imóvel avaliado antes da execução do projeto, considerando sua futura equivalência no novo conjunto edificado. Portanto, para tornar a participação possível, o valor da metragem quadrada de


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uma edificação horizontal residencial deverá, se possível, equivaler ao de uma unidade residencial de um prédio. Apesar de custos específicos nesse tipo de obra vertical (para a construção de áreas comuns e elevadores, por exemplo), é possível diluí-los com uma intensificação do uso do solo e um número maior de unidades. Medidas como essa, somadas à expectativa de valorização das unidades a serem vendidas para pagamento do projeto, são responsáveis por criar condições de equivalência para que os antigos moradores equilibrem a avaliação de suas propriedades no novo conjunto edificado. Além disso, os detentores de direitos podem optar por adquirir um imóvel de valor superior ao seu, pagando a diferença com recursos próprios ou por meio de linhas de crédito e financiamento disponibilizadas pelo poder público. Nas situações em que os detentores de direitos são locatários, o procedimento do direito de conversão é diferenciado: o inquilino recebe uma notificação sobre sua participação no processo de aprovação do projeto e o proprietário também é notificado para se estabelecer um processo de diálogo entre ambos. Após um acordo, há anuência quanto ao plano de execução do projeto por ambas as partes, bem como a aprovação do estudo de viabilidade e dos termos do processo de conversão da propriedade (Kashiwagi 2006). Apesar de essas etapas serem cuidadosamente explicadas aos envolvidos, muitas vezes a dificuldade em contatar proprietários que vivem em locais distantes, ou por outras razões, pode atrasar o processo. Atualmente existem esforços para simplificar esse procedimento, como, por exemplo, a inserção no processo de um representante capaz de intervir entre os detentores de direitos, responsabilizando-se pelo acordo entre as partes e a agência de implementação, durante a aprovação do projeto (Kashiwagi 2006). A agência de implementação, durante e após a aprovação do projeto, é a principal gestora e responsável pela articulação de todas as etapas, como concepção do empreendimento, identificação das fontes de investimentos e estruturação da equipe preliminar de trabalho, que deve fornecer apurado diagnóstico sobre o empreendimento, principalmente quanto às possibilidades de retorno financeiro e aos obstáculos para a sua execução. Na grande maioria dos casos, os subsídios para o início dos projetos de redesenvolvimento urbano vêm do poder público, porém, como o processo inclui necessariamente os proprietários e a iniciativa privada, os projetos são capazes de absorver variadas linhas de crédito, fundos de investimento ou outras fontes de renda para a sua execução. As opções de investimento se estruturam sobretudo em um conjunto de operações que garantem o desenvolvimento das obras


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e sua efetiva ocupação pelos antigos e novos usuários. Os subsídios são garantidos pelo poder público e as fontes primárias de recursos pelo construtor ou financiamento bancário de curto prazo, geralmente vinculado ao prazo de construção. Os juros cobrados não ultrapassam 1% ao ano. Com a conclusão das obras, a entidade financiadora transfere o crédito para os agentes promotores ou agências de implementação, que oferecem o empreendimento como garantia. Assim, o crédito hipotecário é a principal forma de financiamento. O financiamento total do empreendimento se constitui em uma carteira composta pelo de curto prazo (o financiamento bancário, com prazo relativo à duração da obra) e sua transferência para a hipoteca. A operação completa garante que o promotor ou agência de implementação do projeto tenha até 20 anos para pagar ou até que todos os pisos-reserva sejam vendidos, considerando que a parcela inicial pode variar de zero a 20% do valor total do empréstimo. Caso a agência de implementação não consiga pagar o financiamento, a empresa seguradora retoma as unidades, que podem ser novamente postas à venda por meio de um leilão público. O novo usuário pode refinanciar essa dívida a partir de valores já amortizados. O empreendimento é entendido como a estruturação de uma empresa comercial que deve gerar lucros. Os investimentos necessários para alteração de zoneamento ou investimentos em outros tipos de contrapartida não devem superar 20% dos investimentos totais. Além do ganho privado em projetos de redesenvolvimento urbano, existem dois ganhos públicos ou coletivos. Primeiro, os proprietários (pagadores de impostos) não sofrem com a especulação imobiliária da urbanização, o que ocorreria se a ela fosse decorrente apenas de exceções na legislação de zoneamento, atingindo assim níveis monetários muito superiores aos da iniciativa do promotor privado. Segundo, o poder público que pretende transformar, mas não possui recursos de investimento em infraestrutura ou, embora os possua, não é capaz de colocar em prática meios adequados de desapropriação, dispõe de mecanismos para retornar o investimento realizado aos cofres públicos. Dentre os problemas apontados em projetos de redesenvolvimento no Japão, talvez o maior seja a necessidade de executá-los em áreas onde o preço da terra seja invariavelmente alto o bastante para oferecer retornos atrativos. Conforme estudo de Gao e Yasushi, uma importante questão sobre projetos de redesenvolvimento urbano nos quais residentes contribuam com imóveis em parcela de terra com tamanho pequeno, formato irregular e pouco valor de mercado, é o fato de se


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tornar difícil transferir seus direitos ao novo conjunto edificado de forma a compensar o sacrifício da sua propriedade, porque o valor anterior não chega a alcançar o das novas unidades (Gao e Yasushi 2007). As análises mostraram que os benefícios dos projetos estavam significativamente influenciados pelo tamanho e pela forma do lote. Para benefícios adequados, para compensar a terra e os custos adicionais dos projetos, as parcelas envolvidas deveriam ser maiores do que certo limite e deveriam satisfazer certos requisitos de formato. As análises também revelaram que, por causa da influência do tamanho e da forma da parcela de terra, flexibilizando os coeficientes de aproveitamentos na área (CA), os projetos não criavam incentivos necessariamente satisfatórios tanto para os promotores privados quanto para os residentes. Os resultados dos projetos de redesenvolvimento não são sempre positivos e para lotes menores do que o limite estipulado pelo estudo (por exemplo: terrenos com frente de 3 metros e área inferior à 75,0 m²; e terrenos com frente de 12 metros e área inferior à 152,6 m²) os benefícios são negativos (Gao e Yasushi 2007). Em comparação com os projetos de land readjustment, projetos de redesenvolvimento urbano possuem execução mais rápida (Kashiwagi 2006). Processos de replotting, por meio de projetos de land readjustment, são demorados, porque normalmente as substituições temporárias e o processo de registros precisam ser feitos diversas vezes ao longo dos anos, enquanto o direito de conversão é exercido uma única vez após a demolição das residências e a transferência dos direitos ao novo conjunto edificado. Além disso, para regiões densamente povoadas, projetos de redesenvolvimento urbano são mais eficientes do que os de land readjustment, porque o número de unidades construídas excede o total de detentores de direitos, permitindo um uso mais intensivo do solo e a adequação da capacidade de suporte que a verticalização demanda com novas infraestruturas instaladas. Selecionamos dois projetos para consulta e exemplificação. O primeiro contempla uma área densamente povoada, mantenedora de estrutura viária e fundiária do Japão feudal, altamente suscetível a desastres por sua frágil conformação, alvo de um projeto conjunto de land readjustment e redesenvolvimento urbano. O segundo compreende uma região de reconversão de uso industrial em zona de uso misto, com áreas residenciais, comerciais e espaços públicos ampliados e coerentes à demanda estabelecida pelo crescimento urbano.


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Projeto de redesenvolvimento urbano Arimatsu Ekimae, Nagoya, Japão (有松駅前第一種市街地再開発事業) Local: distrito sudeste do município de Nagoya, no Japão. Agente de implementação: poder público (departamento de land readjustment de Nagoya). Área do projeto: 3,2 hectares. Proprietários e inquilinos: 55 proprietários antes da execução do projeto. Período para desenvolvimento do projeto: de 1993 a 1996. 1993 - 1996: desenvolvimento do plano legalmente compulsório e negociação com os possuidores de direitos; inspeção das condições geográficas; aprovação do plano financeiro. Período para implementação do projeto: de 1997 a 2006. 1997: desenvolvimento do plano de conversão; 1998: início da execução do plano de obras; 2001: suspensão temporária das obras por determinação judiciária; 2003: reinício da execução do plano de obras; 2004: inauguração do centro comercial e dos equipamentos públicos; 2006: emissão dos novos títulos de propriedade; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: Arimatsu foi um assentamento que alcançou status de vila durante o período do Japão feudal em 1608. Localizado na antiga província de Owari (atual estado de Aichi), Arimatsu possuía poucas terras cultiváveis devido a sua expansão populacional e sua principal atividade econômica eram as casas de chá, voltadas para os viajantes que passavam pela Via Tokaido (estrada histórica que conectava as cidades de Tóquio e Kyoto ao longo do rio Tekoshi). Esse comércio fornecia uma quantidade de renda limitada e muitos aldeões começaram a desenvolver artesanatos, cuja matéria-prima era o pano tingido, para complementar suas rendas. O “shibori” de Arimatsu, ou artesanato, ficou famoso e a economia regional começou a prosperar. Em 1784, porém, um incêndio destruiu a maior parte das casas da vila (construídas em madeira com coberturas de palha), tornando necessário reconstruí-las com medidas anti-incêndio: paredes espessas de gesso e coberturas de telha. O primeiro projeto de desenvolvimento urbano de Arimatsu tomava formato. Até hoje essas casas são preservadas como patrimônio histórico. Com essa característica bastante peculiar, o poder público de Nagoya aprovou, em seu plano diretor, a região de Arimatsu como distrito para planejamento integrado, envolvendo três projetos específicos: de land readjustment de Arimatsu, de redesenvolvimento urbano de Arimatsu Ekimae e de preservação da rua histórica de Tokaido. O poder público estipulou, portanto, a conservação das ruas e do patrimônio histórico,


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em consonância com a demanda atual da ampliação da avenida Arimatsu e da abertura das avenidas Touryou e Taishogane, propostas pelo plano diretor. Considerando cada um dos três projetos separadamente, podemos concluir que: o projeto de land readjustment foi responsável pela abertura de novo sistema viário e pela criação de áreas verdes; o de redesenvolvimento urbano, pela ampliação da avenida e pela transferência de moradores que viviam em áreas de risco para modernos edifícios; e o de preservação, pelo restauro dos imóveis ao longo da rua histórica, ampliando as oportunidades de comércio e turismo. Mais especificamente sobre o projeto de redesenvolvimento urbano, o poder público previu a construção de duas torres para unidades residenciais: uma delas com 14 andares e 55 unidades para a transferência dos detentores de direitos antes da execução do projeto; e a outra com 11 andares e 34 unidades para locação. Com a vacância adquirida após o processo de conversão, o poder público construiu outro conjunto edificado com 6 andares para usos comerciais, estacionamento (850 vagas) e áreas de lazer. No total, foram construídos, sobre uma área de 16 mil m², 69 mil m² distribuídos em duas torres e um conjunto edificado. Os parâmetros urbanísticos aprovados para a execução da proposta foram taxa de ocupação de 85% e coeficiente de aproveitamento CA = 3,45. Com a construção do edifício comercial, o poder público conseguiu atender à demanda da região por criação de empregos e outros serviços de apoio à atividade turística ligada ao patrimônio cultural. Com a construção das infraestruturas, o poder público também conseguiu adaptar o bairro a demandas mais atuais por qualidade de vida, por meio de parques e áreas verdes, melhores condições de trânsito e de acesso ao transporte público de massa. Benefícios para os proprietários: melhoria das condições de moradia, prevenção de grandes acidentes em caso de terremotos e deslizamento de terra e produção de nova zona comercial no bairro. Ainda houve uma valorização das propriedades em torno de 100,0%. Benefícios para o poder público: prevenção de desastres (terremotos, deslizamento de terras e incêndios) por meio da substituição das ruas muito estreitas por novo sistema viário proposto pelo plano diretor e conservação do sítio histórico e seu cenário, mesmo com as transformações elaboradas pelos projetos de land readjustment e redesenvolvimento urbano. Eventuais conflitos do projeto: alguns proprietários se recusaram a participar deste projeto e moveram uma ação judiciária contra o poder público, que culminou na paralisação temporária em 2001. Após o veredicto, favorável ao poder público, alguns opositores foram desapropriados, outros aderiram à execução do projeto e outros decidiram vender suas propriedades.


5Delimitação de projeto de land readjustment, de redesenvolvimento urbano e proposta de novo sistema viário. 6Mapa do projeto de land readjustment de Arimatsu (1995-2009) sobre o parcelamento do solo anterior à intervenção.


Imagem área antes da execução do projeto de land readjustment de Arimatsu em 1995. 5 Projeto de land readjustment e redesenvolvimento urbano durante sua execução em 2004. 6


5Etapas do desenvolvimento do projeto de redesenvolvimento urbano de Arimatsu Ekimae (1996-2006). Edifícios residenciais e novos equipamentos públicos executados pelo projeto de redesenvolvimento urbano.4 6Projeto de redesenvolvimento urbano de Arimatsu Ekimae após a sua execução em 2006.



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Projeto de redesenvolvimento urbano Harumi Island Triton Square, Tokyo, Japão (晴海トリトンスケエア(晴海一丁目再開発地区)) Local: distrito sudeste da região metropolitana de Tokyo, Baía de Tóquio, Japão. Agente de implementação: parceria entre o poder público (Agência de Renascença Urbana) e setores privados (Cooperativa de Renovação Urbana Harumi - 1 Chome). Área do projeto: 4,8 hectares para o poder público e 5,2 hectares para os setores privados. Proprietários e inquilinos: 1.400 proprietários e 1.500 inquilinos antes da execução do projeto. Período para desenvolvimento do projeto: de 1982 a 1997. 1982 - 1997: desenvolvimento do plano legalmente compulsório e negociação com os detentores de direitos; inspeção das condições geográficas; aprovação do plano financeiro. Período para implementação do projeto: de 1992 a 2001. 1992: desenvolvimento do plano de obras; 1992 - 1999: execução e término da primeira etapa; 1999 - 2001: execução e término da segunda e da terceira etapa; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o plano diretor para o bairro de Chuo delimitou um distrito para a promoção do redesenvolvimento chamado Harumi 1 - Chome. O distrito era caracterizado por duas áreas, a leste, com prédios residenciais de 10 andares (alguns de propriedade privada e outros de propriedade estatal para locação); e a oeste, com antigas porções de terreno de propriedade industrial (alguns transformados em estacionamento). O distrito leste foi entregue para a Agência de Renascença Urbana, que ficou responsável por transferir todos os detentores de direitos para outras três edificações de melhor padrão. O distrito oeste foi submetido a uma cooperativa privada, responsável pela construção dos edifícios com predominância de uso comercial e de áreas de lazer. O novo bairro foi planejado com cerca de 10 hectares e acesso a novas infraestruturas públicas, como áreas de lazer e serviços sociais. O projeto foi dividido em três áreas, por causa de seu porte: a área 1 foi entregue em 1999, com residências multifamiliares e praça pública, e as áreas 2 e 3 foram entregues em 2001, totalizando uma área construída de 160 mil m² para usos residenciais, 360 mil m² para serviços, 65 mil m² para usos comerciais e 24 mil m² para espaços públicos. O empreendimento foi pensando de acordo com os preceitos de unidade de vizinhança. Ou seja, a maior proximidade e interação entre as funções viver, trabalhar e divertir. Os 10 hectares de projeto contêm: três torres (a “Triple Tower”), com escritórios, residências e um grande anfiteatro; uma


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torre para comércio, residências e diversas atividades de lazer; e cinco torres residenciais – todas as torres totalizam 1.790 unidades habitacionais. Desse montante, cerca de 50% foram transferidos aos detentores de direitos antes mesmo da execução do projeto. O restante foi comercializado para pagar o financiamento prévio de execução. Atualmente, o poder público incentiva festivais na área do projeto para ampliar o convívio social e o sentido de manutenção da comunidade local. Adiante, há duas tabelas referentes à setorização do projeto e às infraestruturas públicas construídas. TABELA 06: SETORIZAÇÃO DO PROJETO (Projeto de Redesenvolvimento Urbano Harumi Island Triton Square) Setores do Projeto Área de Terreno Área de Ocupação Área Construída Total Taxa de Ocupação Coeficiente de Aproveitamento Uso Residencial (Número de Unidades) Uso Serviços Uso Comercial Espaço Público Estacionamentos

Área 1 Aprox. 61.060 m² Aprox. 47.600 m² Aprox. 467.500 m² 80% 7,7 Aprox. 46.200 m² (504 unidades) Aprox. 361.400 m² Aprox. 47.500 m² Aprox. 12.400 m² 1.100 vagas

Área 2 Aprox. 15.170 m² Aprox. 12.000 m² Aprox. 105.000 m² 80% 5,8 Aprox. 82.500 m² (849 unidades) _ Aprox. 17.500 m² Aprox. 5.000 m² 609 vagas

Área 3 Aprox. 8.500 m² Aprox. 6.700 m² Aprox. 39.200 m² 80% 4,0 Aprox. 32.400 m² (436 unidades) _ _ Aprox. 6.800 m² 240 vagas

Total Aprox. 84.800 m² Aprox. 66.300 m² Aprox. 611.700 m² 80% 7,0 (média) Aprox. 161.100 m² (1.789 unidades) Aprox. 361.400 m² Aprox. 65.000 m² Aprox. 24.200 m² 1.949 vagas

TABELA 07: INFRAESTRUTURAS PÚBLICAS INSTALADAS (Projeto de Redesenvolvimento Urbano Harumi Island Triton Square) Classificação Sistema Viário Espaços Públicos

Tipo Nome Via Arterial Residencial n. 34 Rua principal Via de acesso n.01 Via de Acesso Via de acesso n.02 Via de acesso n.03 Via de acesso n.04 Praça n. 01 Praça n. 02 Praça n. 03 Área para escola e outros

Largura da Via _ 20 m 15 m 13,5 m 10 m 8m _ _ _ _

Comprimento _ Aprox. 220 m Aprox. 140 m Aprox. 80 m Aprox. 300m Aprox. 250 m _ _ _ _

Área Aprox. 191 m² Aprox. 4.319 m² Aprox. 2.096 m² Aprox. 1.046 m² Aprox. 2.969 m² Aprox. 2.083 m² Aprox. 1.200 m² Aprox. 1.200 m² Aprox. 3.800 m² Aprox. 100 m²

Observações Nova construção Expansão da largura Viário existente Expansão da largura Nova construção Nova construção Nova construção Nova construção Nova construção Nova construção


5Vista panorâmica da ilha artificial Harumi em 1985, antes da execução do projeto de redesenvolvimento urbano. 6Plano de implementação do projeto de redesenvolvimento urbano Harumi Island Triton Square (1992-2001).


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Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o valor da propriedade passou de US$ 420,00/m² para US$ 770,00/m² após a execução do projeto. Benefícios para o poder público: este plano permitiu executar de maneira controlada a transformação da ilha artificial de Harumi, com projeto mais moderno e instalação de usos adequados a demandas atuais. Eventuais conflitos do projeto: alguns proprietários se recusaram a participar deste projeto por causa do tempo em que ficariam fora de seus imóveis, seja em unidades alugadas em outras áreas da cidade, seja em casa de parentes. Projeto de redesenvolvimento urbano Harumi Island Triton Square. 6


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3 Segunda fase do projeto de redesenvolvimento urbano: edifícios comerciais.

Vista panorâmica da ilha artificial Harumi em 2005, após a execução do projeto de redesenvolvimento urbano. 5 3 Primeira fase do projeto de redesenvolvimento urbano: edifícios residenciais. 3 Terceira fase do projeto de redesenvolvimento urbano: espaços públicos de lazer.


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CAPÍTULO 4: O STATUS DO LAND READJUSTMENT NO MUNDO Breve histórico do land readjustment Origens Independentemente dos termos ou das nomenclaturas utilizadas, a origem deste instrumento de política de desenvolvimento urbano ainda encontra impasses quanto à sua autoria. Estudos apontam que seu conceito retro data entre o século XVIII e meados do XIX, em três realidades distintas. A primeira ocorreu nos Estados Unidos da América em 1791, onde empreendedores da cidade de Washington, no Distrito de Columbia, encontraram como solução um mecanismo muito semelhante ao land readjustment para resolver impasses no desenvolvimento de uma área rural com grandes proporções e restrições orçamentárias (Doebele 1982; UNESCAP 1995). O mecanismo foi criado na tentativa de pagar os custos de instalação de infraestrutura e serviços públicos, por meio da recuperação da valorização resultante dos esforços socialmente gastos durante o processo de desenvolvimento da cidade. A segunda ocorreu na Espanha, durante a elaboração e a implantação do projeto “Eixample de Barcelona”, em 1861, de autoria de Ildefonso Cerda. Para sua execução, um mecanismo foi criado como dispositivo capaz de financiar suas ações urbanizadoras, pois seu criador não considerava justo utilizar os sistemas de desapropriação, imposição de impostos adicionais ou empréstimos públicos para tornar mais ricos aqueles que se beneficiariam do projeto (García-Bellido 1995, 2002). O mecanismo de land readjustment idealizado por Cerda baseava-se em um sistema de compensação em que os custos teriam de ser pagos pelos que usufruíssem das vantagens da obra. O mecanismo foi incluído em um projeto de lei que regulava a “técnica de distribuição de responsabilidades entre os envolvidos”, mas foi vetado pelo governo no mesmo ano. A terceira realidade ocorreu no Japão, no ano de 1870, quando documentos indicavam que, na cidade de Kobe, agricultores desenvolveram um mecanismo para melhorar a produtividade de suas terras. Seu grande propósito era rever os limites irregulares e readequá-los de modo a abolir pequenas passagens e caminhos entre as propriedades (Nishiyama 1992). Como resultado, os agricultores começaram a perceber que estas readequações aumentavam de fato a produtividade


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capítulo 4

das lavouras, tornando-se uma ação popular nas regiões mais próximas. Essas iniciativas anteciparam a formulação e a aprovação da primeira legislação desse tipo de mecanismo na Alemanha. O conceito do land readjustment alemão foi transferido para Frankfurt por meio do Condado de Zurique, na Suíça, que utilizava mecanismo similar para consolidar terrenos agrícolas na tentativa de resolver problemas resultantes do rápido crescimento da cidadela. De qualquer maneira, é atribuído à lei aprovada em 1902, denominada Lex Adickes Frankfort-am-Main, o marco legal do sistema moderno de land readjustment no mundo. Franz Adickes (1846-1915), prefeito da cidade de Frankfurt, iniciou os primeiros contratos voluntários em 1891 para reordenar a estrutura fundiária das propriedades urbanas. Em 1902, após a aprovação da Lei Relativa à Transferência de Terras em Frankfurt, iniciou um processo compulsório de reordenamento fundiário, dificultado pela herança de antigas legislações que criaram terrenos longos e estreitos, de difícil uso para o desenvolvimento. A ideia fundamental do processo era realizar a troca de terrenos entre o poder público e o privado, não sendo necessário desapropriá-los (Müller-Jökel 2004). Ao longo dos primeiros dez anos, 14 áreas foram reagrupadas e redistribuídas com o consentimento dos proprietários, somando um total de 643 lotes em 375 hectares, com a redução de 25 a 40 por cento dessas propriedades para a construção de um novo sistema viário (Dawson 1916). Após o processo, inevitáveis diferenças de valorização foram liquidadas em dinheiro. Dessa maneira, Adickes conseguiu modernizar a antiga e inadequada estrutura da cidade de Frankfurt, preparando-a para as novas exigências da economia, do trânsito motorizado e, consequentemente, de seus moradores. Após os resultados desse sistema legal na Alemanha, iniciou-se a difusão internacional, isto é, sua transferência para outros países. O Japão traduziu a lei de Adickes e a adaptou para a aprovação em 1919 de sua Lei Federal de Planejamento Urbano (Ishida 1986). Até essa aprovação, muitos projetos de land readjustment eram implementados no país baseados na Lei de Consolidação Fundiária Agrícola de 1899, mesmo quando seu objetivo era o de conter o crescimento desordenado em áreas urbanas. Em 1923, após o grande terremoto de Kanto, que destruiu completamente áreas densamente povoadas nas regiões de Tóquio e Yokohama, o método e a legislação foram aprimorados para reconstruir principalmente as zonas residenciais atingidas (Sorensen 2000). Outros países, a exemplo do Japão, começaram a estudar o mecanismo alemão para desenvolver sua legislação e aplicar o land readjustment em áreas previamente destruídas por desastres naturais.


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A Turquia, que possuía uma versão simplificada do mecanismo, adaptou-o para tornar mais ágil o processo de reconstrução de áreas afetadas por terremotos, incêndios, inundações e também em áreas previamente concebidas para projetos de desenvolvimento urbano (Turk 2005). Colônias e territórios ocupados O Reino Unido, no mesmo período, iniciou um processo pioneiro de debate sobre o planejamento de suas cidades, prevalecendo o conhecimento acerca de diversos instrumentos de desenvolvimento, inclusive o land readjustment alemão. Devido à forte cultura britânica de propriedade privada e de concentração de bens de direito, o land readjustment não foi incorporado e muitas vezes foi rejeitado durante a produção de leis de planejamento urbano no país. Porém, os urbanistas britânicos desempenharam importante papel difundindo as ideias alemãs em suas colônias e territórios ocupados. Em 1915, o mecanismo foi incorporado na Índia Britânica durante a aprovação da Lei de Planejamento Urbano de Bombai, propagando-se pelos Estados de Maharastra e Gujarat (Home 1997a). Em 1921, a administração do Mandato Britânico na Palestina incluiu, em seu Decreto de Planejamento Urbano, diversas cláusulas sobre o mecanismo, dando permissão construtiva apenas para projetos com requisição prévia para desenvolvimento via land readjustment (Home 2007a). Em 1928, a Austrália Ocidental autorizou um sistema de consórcio em sua Lei de Desenvolvimento e Planejamento Urbano, por meio da qual os proprietários poderiam transferir suas terras para as autoridades locais que, após a execução do projeto, retransferiam os lotes reordenados aos proprietários originais. O Japão, seguindo esse processo de transferência internacional, introduziu o land readjustment em Taiwan (República da China), em 1930, por meio da Lei de Terras e na Coréia do Sul em 1934, por meio da Lei de Planejamento Urbano Colonial (Lee 2002). Para muitos urbanistas japoneses, o uso do método nas colonias foi importante porque serviu para testar alguns conceitos e técnicas, apesar de muitos projetos terem tido início sem qualquer consulta pública ou compensação aos proprietários (Hein 2003). Em 1937, colheram-se os primeiros resultados dessa lei em Seoul com a execução do primeiro projeto e o início de quatro outros, totalizando uma área de 1.023 hectares (Hayashi 2007). Na época, Coréia do Sul e Taiwan eram colônias japonesas, o que tornou possível o processo de difusão do mecanismo. Segunda Guerra Mundial Muitos países europeus, antes da Segunda Guerra Mundial, desenvolveram marcos legais para


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consolidar o direito de propriedade, principalmente de terrenos agrícolas, onde o parcelamento do solo era irregular ou a titularidade duvidosa, seguindo o mesmo processo pelo qual o Reino Unido passara quase um século antes. Tais ações não chegaram a grandes avanços, porque os proprietários podiam facilmente apelar contra as decisões de consolidação fundiária, impedindo a execução do processo. Após a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), ao contrário do que já havia ocorrido, o mecanismo ganha maior importância, devido à demanda por subsistência e consequente necessidade de intensificar a produtividade agrícola no processo de reconstrução de diversos países. Países como a Holanda, a França, a Bélgica, a Áustria, a Finlândia e a Noruega (afetados pela guerra) iniciaram um processo de land readjustment rural segundo distintos procedimentos, influenciados por suas culturas, tradições e legislações. Na Alemanha, a Portaria sobre Reajuste do Reich Alemão, de 1937, aprovou o mecanismo para uso rural, mas ele foi utilizado em âmbito nacional durante a reconstrução de algumas cidades em 1940. Após isso, foi a Lei da Reconstrução dos Estados Federais (1948-1952) que efetivamente consolidou o uso do mecanismo em áreas urbanas para a reconstrução do país, destruído pelas forças Aliadas dos Estados Unidos da América (Hayashi 2007). No Japão, a Lei de Caráter Especial de Planejamento Urbano aprovada em 1946 foi responsável por instituir o instrumento para a reconstrução do pós-guerra. A maioria das cidades japonesas foi destruída por ataques aéreos e mais de 100 delas utilizaram o land readjustment como forma de reorganizar o processo de reconstrução e readaptação do país. Em 1954, foi aprovada a Lei Federal do Land Readjustment vigente até os dias de hoje (JSLRE 1999). Anos 1950-1960 Nas décadas de 1950 e 1960, países como a Alemanha, a Coréia do Sul, a Espanha, Taiwan e Israel readaptaram o mecanismo, segundo sua realidade e necessidades à época. Na Alemanha, o land readjustment foi um dos instrumentos fundamentais no desenvolvimento e na aprovação da Lei Federal de Edificações, que previa projetos para amplas zonas residenciais e para o redesenvolvimento de centros urbanos (Müller-Jökel 2004). Na Coréia do Sul, após a guerra civil encerrada em 1953, o mecanismo foi utilizado para prover infraestrutura básica, como estradas e loteamentos residenciais. Durante o processo de rápida urbanização do pós-guerra, projetos de grande abrangência, entre 300 a 400 hectares, foram implementados nas periferias dos centros urbanos (Hayashi 2007).


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Na Espanha, o método instituído pela Lei do Solo de 1956, tornou obrigatório o cumprimento dos princípios de cooperação e compensação entre todos os proprietários em projetos urbanos. A partir disso, todo metro quadrado transformado equilibraria seus custos com seus benefícios, de acordo com os pressupostos desenhados por Ildefonso Cerda (García-Belido 1995, 2002). Em Taiwan, o land readjustment agrário foi aplicado como programa experimental em 1958 e aprovado após quatro anos como um programa de projeção nacional. No distrito de Kaohsiung, ainda sem a lei a fim de que se instituísse oficialmente o mecanismo, aproximadamente 60 por cento das terras foram reordenadas por meio do land readjustment (Hayashi 2007). No Estado de Israel, que sucedeu o Mandato Britânico em grande parte da Palestina, novas cláusulas foram incorporadas na Lei de Planejamento e Edificação de 1965. De acordo com a nova lei, o mecanismo poderia ser utilizado para unir ou repartir terrenos inseridos em projetos consorciados, com ou sem o consentimento dos proprietários (Home 2007a). Anos 1970: método fica em evidência com Banco Mundial e Japão A partir da década de 1970, o Banco Mundial declarou como prioritários os programas para a redução da pobreza nos países em desenvolvimento por meio da melhoria das condições de habitação e da provisão de serviços básicos de infraestrutura. As principais dificuldades em solucionar estes problemas encontravam-se no rápido processo de migração do campo para a cidade, na disposição fragmentada dos terrenos rurais e urbanos capazes de desenvolver infraestruturas e na falta de recursos financeiros (para realizar intervenções relacionadas à titularidade) e de mecanismos para capturar a sobrevalorização criada por investimentos públicos. Em 1974, o economista Orville Grimes e o professor William Doebele foram designados para investigar mecanismos que pudessem contribuir para a solução dos problemas apontados pelo banco. Seus estudos identificaram três alternativas adotadas em países com realidades distintas, conforme será explicado: O primeiro foi o sistema de banco de terras que produziu crescimento urbano com alta qualidade na Suécia a um custo relativamente baixo para o poder público. O segundo foi a instituição conhecida como “valorizaciones”, uma forma sofisticada de avaliação e taxação especial que transformou especialmente o sistema viário principal de Bogotá, na Colômbia, com modestos gastos públicos. O terceiro foi o sistema de land readjustment que teve grande sucesso na reconstrução urbana do Japão, depois dos volumosos bombardeios aéreos da Segunda Guerra Mundial, e na recuperação da Coréia do Sul, após a devastação da Guerra Civil Coreana. (Hong e Needham 2007, p.ix).


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O professor William Doebele, da Universidade Harvard e então consultor do Banco Mundial, visitou a Coréia do Sul e verificou o inusitado sucesso do método após a destruição do país. A iniciativa do docente foi responsável por atrair a atenção para o desconhecido e pouco estudado naquela época land readjustment. A possibilidade de executar projetos, incluindo o desenvolvimento de terras desarticuladas e a construção de habitações que pudessem ser autofinanciáveis ou que de alguma maneira desonerassem os cofres públicos, pareceu o método mais efetivo para aplicação nos países de terceiro mundo. O interesse do Bando Mundial resultou em uma conferência que mudaria a situação de pouca visibilidade sobre o método definitivamente. O termo em inglês, “land readjustment”, foi definido na primeira Conferência Internacional sobre Consolidação Fundiária, sediada em Taiwan, em 1979. A conferência foi patrocinada pelo Instituto Lincoln de Políticas da Terra (Massachusetts, Estados Unidos da América) e pelo Centro de Treinamento de Reformas Fundiárias (Taoyuan, Taiwan), dentro dos auspícios do Banco Mundial (Hayashi 2007). No princípio, o nome da técnica era consolidação fundiária (“land consolidation”), mas durante a apresentação da grande variedade de projetos, pareceu aos especialistas presentes que a terminologia land readjustment era a mais adequada, por se ajustar mais a um processo de reajuste, reorganização e reordenamento das terras do que apenas a um processo de consolidação dos títulos de propriedade. Após a conferência, entretanto, o Banco Mundial perdeu o interesse pelo mecanismo, por entender que os procedimentos eram muito complicados, envolvendo transformações no âmbito da legislação, no estado da prática de planejamento da época e nas condições iniciais de financiamento em países que já possuíam uma série de outras complicações. O Japão ganha importância, exatamente após essa conferência, no processo de disseminação do land readjustment. Em 1982, na cidade de Nagoya, os japoneses organizaram o Seminário Internacional sobre Políticas de Desenvolvimento Urbano e Land Readjustment em comemoração ao maior projeto de land readjustment conhecido no mundo. A cidade de Nagoya e o Centro para Desenvolvimento Regional das Nações Unidas se empenharam em conjunto para organizar um evento a fim de divulgar o término do projeto de 3.450 hectares iniciado após a destruição de quase toda a cidade durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Em 1985, o extinto Ministério da Construção do Japão (atual MLIT – Ministério de Terras, Infraestrutura e Transportes) organizou um novo Seminário Internacional sobre Kukaku Seiri (land readjustment, em japonês), com enfoque em sua aplicação nos países asiáticos, o que daria importantes frutos nos anos seguintes.


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Anos 1980 Na década de 1980, a Alemanha, a Austrália e a Turquia iniciaram um processo de aprimoramento de seus marcos legais e o Canadá e os Estados Unidos deram início à luta pela introdução do método com pouco sucesso. Na Alemanha, durante a revisão do sistema de planejamento urbano no país, a Lei do Código de Obras de 1986 estabeleceu que os projetos de land readjustment, os quais anteriormente poderiam ser executados de maneira desassociada, passariam, obrigatoriamente, a ser aprovados por meio de um plano detalhado de intervenção, denominado Plano B. Na Austrália, houve a atualização do mecanismo na Lei de Desenvolvimento e Planejamento Urbano da Austrália Ocidental em 1984, estabelecendo dois diferentes planos de execução: o Plano de Desenvolvimento da Reassunção (RDS) e o Plano de Desenvolvimento Guiado (GDS) (Archer 1998). No caso do RDS, o projeto é implementado fundamentalmente pelo governo local e os proprietários participam oferecendo sua propriedade em troca de retorno financeiro, inexistindo o sistema de contribuição. A conversão do título de propriedade é realizada por meio da compra e da venda das novas e reordenadas propriedades. No GDS, o projeto é implementado individualmente em regiões nas quais particulares possuem enormes porções de terra. Esse plano coordena de maneira diferenciada o tempo de execução, os custos com infraestrutura e a conversão de titularidade porque resulta da amalgamação, devolvendo as novas e reordenadas porções de terra ao único proprietário após a execução do projeto. Na Turquia, houve a aprovação do artigo número 18 na Lei de Zoneamento de 1985, atualizando as legislações anteriores que referenciavam o mecanismo, como a Lei Municipal de Desapropriação de 1934 e a Lei de Anistia de 1983 (Turk 2005). O artigo concedeu ao governo local o direito de aplicar a lei de zoneamento com setores específicos para o land readjustment, sem o consentimento prévio dos proprietários. No Canadá, diversas províncias adicionaram em sua legislação propostas de readequações fundiárias instituídas pela Lei do Governo Local em 1983. A legislação fundamenta-se na parceria entre o campo público e o privado, na qual os proprietários se tornam o agente promotor e o poder público estipula as regras a serem respeitadas para o desenvolvimento do empreendimento. Províncias como Alberta, que possuem muitas minas e campos de óleo e gás, incorporaram a legislação para o gerenciamento e o melhor aproveitamento das áreas de jazidas. Cidades como Edmonton aprovaram planos para permitir a instalação de novos distritos industriais, por exemplo,


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na zona industrial de Kennedale, que possuía uma estrutura fundiária inviável para a sua ampliação (Edmonton 2006). Nos Estados Unidos da América, estados como a Califórnia, o Havaí e a Flórida tentaram iniciar um processo para a introdução do land readjustment. A Casa de Representação da Califórnia conseguiu levar ao Supremo Conselho de Legislação a primeira lei de land readjustment do país, a S.B. 442. Porém, devido à forte oposição dos setores privados e o temor em conceder mais poder ao forte instrumento de desapropriação norte-americano (conhecido por “eminent domain”), o processo de aprovação da lei foi abandonado (LCIR 2003). No Havaí, a antiga estrutura urbana de Honolulu precisava de uma drástica intervenção e o land readjustment começou a ser intensamente estudado como forma de desenvolver a cidade. Contudo, o projeto não foi executado e sua lei não foi aprovada, restando apenas a documentação do processo projetual (Minerbi 2002). Na Flórida, a introdução do mecanismo passou por desentendimentos e temores semelhantes ao ocorrido na Califórnia, resultando em similares barreiras legais (Hong e Needham 2007). Possivelmente, o único exemplo bem-sucedido no país, um processo curioso sem qualquer embasamento legal, tenha ocorrido em Dallas, no estado do Texas. Lá, 80,0 hectares ao redor do centro da cidade foram alvo daquilo que podemos chamar do land readjustment norte-americano (Hayashi 2007). Alguns proprietários dessa área criaram uma empresa e, com a anuência de todos, iniciaram um processo de formação de banco de terras que, após seu reordenamento, foram partilhadas de acordo com condicionantes estipuladas em contrato. Anos 1990 Na década de 1990, foi a vez da Espanha aprimorar novamente seu sistema legal, da Suécia e da Finlândia converterem o mecanismo para a utilização em setores urbanos e, do Japão, começar a ter resultados da cooperação técnica internacional em países asiáticos, como Indonésia, Malásia, Nepal, Filipinas, Tailândia, e na Colômbia na América Latina. Na Espanha, em 1998 se aprovou a nova Lei de Regime do Solo, simplificando regulações urbanísticas anteriores, com a finalidade de oferecer maior autonomia aos estados e aos municípios para a execução de projetos de land readjustment (García-Belido 1995, 2002). Na Suécia, a Lei de Desenvolvimento Consorciado do Solo, aprovada em 1987, começou a ser utilizada a partir de 1990. No caso sueco, agências de implementação foram criadas com a participação voluntária dos proprietários, estipulando-se, quando necessário, que as terras dos opositores fossem desapropriadas para a execução do projeto (Kalbro 2002).


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Na Finlândia, a nova Lei de Formação da Propriedade Real de 1997 redefiniu os procedimentos do land readjustment e introduziu sua aplicação para setores urbanos, atualizando a antiga legislação aprovada há 36 anos que nunca fora colocada em prática. Assim, a nova legislação criou suporte e base legal para as leis de uso e ocupação do solo, código de obras, proteção ambiental e desapropriações (Viitanen 2000a). Japão e aplicações em outros países O Japão, por meio das atividades iniciais do Banco Mundial, do extinto Ministério da Construção e atualmente da JICA (Agência de Cooperação Internacional do Japão), em 30 anos de cooperação técnica internacional, foi responsável pelo aprimoramento do mecanismo e pela difusão de sua metodologia com a criação de cursos de treinamento para técnicos e financiamento de programas de desenvolvimento em mais de 60 países. Apesar das dificuldades, após tentativas e desistências, muitos países começaram a apresentar resultados significativos no processo de compreensão e adaptação do land readjustment. É importante notar que o intercâmbio de conhecimento gerou demanda, razão do crescente interesse do governo japonês em transferir esta tecnologia e, principalmente, das empresas japonesas por venderem suas consultorias. Na Indonésia, o mecanismo foi instituído por meio de uma política nacional de distribuição de terrenos agrícolas, dentro da Lei Agrária Básica número 5 em 1960. Após a cooperação técnica, foi atualizado para terrenos urbanos dentro da Lei de Consolidação de Terras em 1991 e pela Lei Federal de Registro Fundiário em 1997. O primeiro projeto começou na década de 1990, em Denpasar, província de Bali, e desde sua aplicação, diversos outros foram executados (274 áreas, em 27 províncias) ou encontram-se em processo de execução (Yoshida 2003). O principal problema enfrentado pelo país está na dificuldade de prover infraestrutura e a limitação dos cofres públicos impediu a compensação por meio de pagamento com recursos financeiros. Nos últimos anos, um novo tipo de sistema financeiro foi utilizado e os benefícios do desenvolvimento foram transferidos ao projeto por meio da comercialização de terrenos-reserva (Sitorus 2005). Na Malásia, o governo uniu esforços durante os últimos anos para aprovar o marco legal do land readjustment, em 1999. O sistema, conhecido como “renúncia e alienação” e definido pela Lei Nacional de Terras, permitiu o desenvolvimento dentro de parcelas com múltiplas titularidades, unindo-as coletivamente e redistribuindo as propriedades pela prévia renúncia e consequente alienação da porção de terra que não foi destinada para fins públicos. O primeiro projeto piloto chamado Puchong Malay foi desenvolvido e aguarda a aprovação do Comitê


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Diretor do Governador do Estado para o início das obras (Hayashi 2007). No Nepal, o mecanismo foi introduzido em 1976 pela Lei de Aquisição de Terras e promulgado em 1988 pela Lei de Desenvolvimento Urbano, com o objetivo de fornecer a infraestrutura urbana básica em áreas extremamente pobres da cidade através da contribuição e participação dos proprietários (Karki 2004). A participação do poder público em projetos estratégicos para a cidade era a principal razão para a aplicação do mecanismo a fim de despender poucos recursos financeiros. Os terrenos-reserva lá denominados “terrenos de serviço” foram vendidos para o financiamento do projeto e os lotes reparcelados foram devolvidos aos seus proprietários, respectivamente beneficiados pelas melhorias públicas. Nas Filipinas, diversos estudos de caso foram elaborados nas cidades de Quezon e Paranaque na capital Metro Manila. Durante o processo de implementação, instaurou-se forte instabilidade política, que tornou impraticável o land readjustment no país (Hayashi 2007). Na Tailândia, o mecanismo foi introduzido em 1987 por meio do envio de técnicos japoneses para a aplicação da nova tecnologia nos projetos de planejamento urbano. Em 1991, em Bangkok, realizou-se o 6º Seminário Internacional de Desenvolvimento Urbano e Land Readjustment, em que se apresentaram nacionalmente os conceitos, tornando pública a discussão sobre a introdução do mecanismo no país. Em 1992, um comitê de avaliação foi criado e, em 1993, o primeiro projeto piloto, Rama 9, foi executado. Desde então, diversos projetos estão em andamento e, em 2005, foi aprovada a Lei de Land Readjustment BE 2547 no país (Phooprasert e Ittipong 2005). Na Colômbia, a aplicação do mecanismo contrastou com a maneira tradicional de urbanização do solo, utilizada ao longo das últimas décadas, na qual a responsabilidade pela provisão de infraestrutura cabia exclusivamente ao poder público. A Lei da Reforma Urbana de 1989 e a Lei do Desenvolvimento Territorial de 1997 instituíram o conceito do land readjustment japonês e o conceito da contribuição por melhorias, a “plusvalía” espanhola (Carrillo 2002). Não existe ainda um decreto regulamentador para estabelecer as regras de operação do “reajuste de tierras” colombiano. Devido a problemas como imprecisão de informação cadastral e ilegalidade de ocupação do território, o mecanismo ainda encontra-se em formulação e seus primeiros projetos já apresentaram resultados positivos. Anos 2000 A partir de 2000, o processo de difusão do land readjustment começou a percorrer caminhos inusitados em realidades distintas, passando por países onde a propriedade privada sobre a terra


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inexiste como o Vietnam e a China, e por países com altos índices de corrupção como o Líbano e o Brasil (segundo os dados do Índice de Percepção de Corrupção de 2007 e 2008). Na China, depois de 14 anos de impasses para tornar possível a garantia à propriedade privada, o Congresso Nacional transformou em lei medidas que possibilitarão a realização do land readjustment no país. Ainda que sem uma legislação específica, a partir de 2001 processos de redesenvolvimento urbano começaram a ser executados e podem se tornar tendência por causa do rápido crescimento econômico estimado para os anos seguintes (Li e Li 2007). No Vietnam, país onde existem concessões ao uso da terra por determinado período de tempo, um projeto de parceria entre o poder público e o setor privado, realizado na cidade de Ho Chi Min no distrito de Tan Phu, foi responsável pela construção de 6 mil habitações (Hayashi 2007). Para construir um novo sistema viário, pavimentação e sistema de drenagem, o poder público contribuiu com terras e o setor privado executou as obras, para em seguida, dividir os lucros com os antigos concessionários, provenientes das novas concessões após a execução do projeto. No Líbano, algumas experiências ficaram em evidência, provavelmente por um processo de disseminação que ocorreu por meio da França, para projetos de land readjustment em diversas cidades. Projetos, como o realizado na região costeira da cidade de Trípoli, com cerca de 230 hectares, apresentaram diversos problemas durante sua execução, considerando as divergências de direito de propriedade entre palestinos e israelenses (Hayashi 2007). No Brasil, o processo de disseminação iniciou-se via cooperação técnica com o Japão em 2005, por meio da publicação do livro “Land Readjustment e Operações Urbanas Consorciadas” (Montandon e Souza 2007) que contribuiu para a definição do mecanismo em projetos de desenvolvimento urbano no município de São Paulo. Como primeiro resultado da cooperação, durante o processo de revisão do Plano Diretor Estratégico 2002-2012, foram incorporados artigos na emenda de lei na tentativa de introduzir o mecanismo do land readjustment. O projeto de lei da revisão do plano, com aprovação prevista para 2006, teve sua aprovação adiada para 2007, em seguida para 2008, e ainda está em fase de discussão por técnicos e pela sociedade civil, sendo passível de alterações, o que não garante a aprovação de todo o seu conteúdo. Todavia, existe grande disposição dos responsáveis pelo planejamento urbano em São Paulo em explorar os conceitos relativos ao land readjustment como forma de viabilizar intervenções urbanas estratégicas no município e, possivelmente, caso a iniciativa dê resultados, chegar a uma aplicação em âmbito nacional, já que conceitos aplicados na metrópole se tornam modelos para outras cidades do país.




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capítulo 4 TABELA 08: EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL DO LAND READJUSTMENT URBANO

PAÍS JAPÃO ALEMANHA ÍNDIA PALESTINA ISRAEL

1 2 3 4 AUSTRÁLIA 5 (Ocidental) 6 TURQUIA CORÉIA 7 DO SUL TAIWAN 8 ESPANHA 9 INDONÉSIA 10 NEPAL 11

ORIGENS LEGAIS E LEGISLAÇÃO RELACIONADA Introduzido pela Lei de Consolidação do Terreno Agrícola, adaptado na Lei Federal de Planejamento Urbano e promulgado na Lei Federal de Land Readjustment Introduzido pela Lex Adickes - Lei de Transferência de Terras, referenciado e promulgado na Lei Federal de Edificações e na Lei de Ajuste Agrário Introduzido pela Lei de Planejamento Urbano de Bombai, promulgado pela Lei de Planejamento Urbano de Maharashtra e pela Lei de Planejamento Urbano de Gujarat Introduzido pelo Decreto de Planejamento Urbano e promulgado pela Lei de Planejamento e Edificações

(ANO DE ORIGEM) ORIGENS LEGAIS (1870) 1899 1919 1954 (1891) 1902 1960, 1986, 1998, 2004 1990 1915, 1954 1966 1976 1921 1965

Introduzido pelo Regulamento de Estradas e Edificações, promulgado pela Lei 1663 de Ankara e pelo artigo 18 da Lei de Zoneamento Introduzido pela Lei de Planejamento Urbano Colonial e promulgado pela Lei de Land Readjustment e pela Lei de Promoção ao Desenvolvimento Residencial Introduzido pela Lei de Terras, promulgado pela Lei de Equalização dos Direitos da Terra e pela Lei do Land Readjustment Urbano Introduzido pela Lei de Uso do Solo e promulgado pela Lei de Regime do Solo

1928, 1984 (1864) 1930 1985 1934 1966 1972 1930 1954 1979 (1861) 1956 1998

Introduzido pela Lei Agrária Básica nº 5, promulgado pela Lei de Consolidação de Terras e pela Lei Federal de Registro Fundiário Introduzido pela Lei de Aquisição de Terras e promulgado pela Lei de Desenvolvimento Urbano

1960 1991 1997 1976 1988

Introduzido e promulgado pela Lei de Desenvolvimento e Planejamento Urbano da Austrália Ocidental

TERMO ou TÉCNICA APLICADA 区画整理 ou Kukaku Seiri Land Readjustment (Reajuste de Terras) Baulandumlegung Land Reallocation (Realocação de Terras) Town Planning Scheme (Sistema de Planejamento Urbano) Halukah Hadasha / Repartzellazia (Reparcelamento) Land Pooling (Consórcio de Terras) Arsa Arazi Duzenlemesi Land Readjustment (Reajuste de Terras) 토지 구획 정리 Land Readjustment (Reajuste de Terras) 土地重劃 Land Consolidation (Consolidação de Terras) Reparcelación (Reparcelamento) Konsolidasi Pertanahan Land Consolidation (Consolidação de Terras) Jagga Ekikaran Land Plotting (Adequação de Terras)


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12 13 14 15 16 17

CORÉIA DO NORTE CANADÁ SUÉCIA COLÔMBIA FINLÂNDIA MALÁSIA

18

TAILÂNDIA ESTADOS 19 UNIDOS DA AMÉRICA 20 LÍBANO 21 FILIPINAS 22 VIETNÃ 23 CHINA 24 BHUTAN 25 MONGOLIA 26 27 28

GRÉCIA SRI LANKA BRASIL

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Introduzido pelas Cinco Linhas da Remodelagem Ambiental e promulgado pela Lei da Agricultura através da Política de Reconstrução Ambiental da Coréia do Norte Introduzido pela Lei do Governo Local Introduzido pela Lei de Desenvolvimento Consorciado do Solo Introduzido pela Lei da Reforma Urbana e promulgado pela Lei do Desenvolvimento Territorial

1976 1990 1983 1989 1997

(Reajuste de Terras)

Introduzido pela Lei da Formação da Propriedade Real Introduzido pela Lei Nacional de Terras

1997 1999

Rakennusmaan Järjestely (Reajuste de Terras)

Introduzido através da Lei de Land Readjustment BE 2547

(1985) 2004 (1791)

Introdução e Implementação em Consideração (projetos de lei)

(1960) (1980) (2000) (2001) (2001) (2001)

Repartzellazia Land Readjustment Land Readjustment 土地整理 Land Readjustment Land Readjustment

(2004)

Land Readjustment

(2004) (2005)

Land Readjustment Reajuste Fundiário

1987

토지 구획 정리 Land Realignment (Realinhamento de Terras) Replotting Schemes (Propostas de Readequação) Exploateringssamverkan

Reajuste de Tierras (Reajuste de Terras)

Land Readjustment (Reajuste de Terras) Klong-garn nam-rong Jad-rupe-tee-din (Reajuste de Terras) Land Assembly

35Obs. A tabela não considera países que utilizam exclusivamente o land readjustment agrário ou rural para consolidação fundiária. Portanto, esta tabela não considera entre outros países: Holanda (Ruilverkaveling), Suíça, França (Remembrement), Bélgica, Áustria, Noruega, Polônia e Estônia (Maakorraldusseadus).


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capítulo 4

Estudos de caso: a aplicação do instrumento segundo especialistas internacionais Nas páginas seguintes, teremos o estudo de caso de 14 experiências internacionais segundo especialistas na área de land readjustment em seus respectivos países. Cada um dos especialistas que trabalham ou estudam a aplicação do mecanismo selecionou um projeto para exemplificar as dificuldades que envolvem a execução do land readjustment. Durante três meses, foram contatados mais de 30 países onde se encontraram evidências da implementação ou do processo de implementação do mecanismo. O contato foi feito por meio de e-mails ou telefonemas via embaixada desses países, no intuito de encontrar especialistas que pudessem responder a um questionário previamente elaborado ou enviar um documento que explicasse desde a história da implementação do método, sua origem legal, seu objetivo, finalidades, seu processo de organização, seus resultados, até conflitos e impasses para sua execução. Mais de 30 especialistas responderam ao contato inicial, alguns indicando sua indisponibilidade em ajudar por falta de tempo disponível ou pela própria inexistência do método no país, outros desenvolvendo o material solicitado e respondendo a dúvidas posteriores, em um grande apoio a esta iniciativa de reunir as experiências internacionais sobre land readjustment nesta publicação. O material recebido foi selecionado, editado conforme a necessidade da publicação e organizado de maneira que o leitor pudesse entender pontos em comum ou específicos da aplicação do mecanismo. Este capítulo jamais seria possível sem a ajuda, a paciência e os esforços de cada um dos especialistas que gentilmente cederam seu tempo para desenvolver o conteúdo. A ideia que embasa estes estudos de caso surgiu após as apresentações que o autor realizou nas mais diversas instituições de planejamento, ou órgãos municipais, em alguns estados do Brasil e países ao redor do mundo. É natural que, quando se prepara uma apresentação sobre o land readjustment com foco no contexto japonês, seja comum existir uma primeira atitude de negar o mecanismo pela grande distância entre a realidade do Japão e a do Brasil (ou outros países). Este capítulo é uma resposta aos inúmeros questionamentos e dúvidas sobre a aplicação do land readjustment em realidades distintas e, principalmente, uma afirmação de que existe um caminho para o Brasil neste contexto.


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Land readjustment na Alemanha (Baulandumlegung in Deutschland) Hans Joachim Linke e Lisa Palomba / Rainer Müller-Jökel (projeto) Para o desenvolvimento urbano sustentável, as municipalidades na Alemanha preparam planos de uso do solo tão logo eles são exigidos. A função desses planos consiste em controlar o uso do território para construções e outras atividades. Para realizar este objetivo, existem diversos instrumentos que podem ser utilizados dentro da legislação alemã, incluindo o land readjustment (“Baulandumlegung”, em alemão). Os procedimentos para o planejamento do uso do solo na Alemanha estão definidos no Código Federal de Edificações (“BauGB – Baugesetzbuch”), conforme promulgado em 23 de setembro de 2004, com a última emenda aprovada em 2006. A explicação a seguir do processo do land readjustment na Alemanha está totalmente baseada nesse código. Primeiramente, a maior parte das áreas agrícolas ou terrenos urbanizados em uso não são apropriadas para projetos de desenvolvimento, devido ao tamanho e ao formato requerido dos lotes para este fim. O propósito do land readjustment é reorganizar tanto terrenos subdesenvolvidos para a melhoria da infraestrutura pública local quanto para a abertura de novos espaços para criar terrenos com formato ou tamanho capazes de receber novas edificações ou novos usos (BauGB § 45). As municipalidades ordenam e executam este tipo de instrumento por sua própria responsabilidade, quando e como acharem necessário, por razões de desenvolvimento urbano pretendido e por meio do plano legalmente compulsório (BauGB § 46). No caso do reajuste realizado em áreas cobertas pelo plano legalmente compulsório, o plano não precisa estar pronto na data de resolução do reajuste, mas é necessário ser aprovado para a preparação do plano subsequente de relocação (BauGB § 66). De qualquer modo, o reajuste também pode ser realizado dentro de áreas edificadas e consolidadas (BauGB § 34), se critérios suficientes para a reorganização dos terrenos puderem ser deduzidos das propriedades imediatas (BauGB § 30). Durante o preparo do plano de uso do solo, é dada a devida atenção aos propósitos do reajuste, considerando os custos deste processo para os proprietários envolvidos e a apropriação de seus terrenos para a infraestrutura pública (BauGB § 47). A decisão adotada pelo departamento de relocação é pré-condição e base para o início das ações, vinculando os proprietários dentro da área de projeto. Portanto, os proprietários serão ouvidos antes mesmo da adoção da resolução.


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Essa decisão designará a área de projeto, seu nome, limites de atuação e a listagem completa dos terrenos inseridos no contexto. A área selecionada para o projeto (BauGB § 52) deve considerar espaços não contíguos e terrenos individuais que não prejudiquem o processo de relocação, podendo estes serem excluídos em parte ou em sua totalidade, caso isso aconteça (BauGB § 52, 2). O anúncio público sobre o projeto deve incluir um chamamento para registros de qualquer natureza não evidente no registro de terras, no período de um mês no departamento executor, (designando os detentores de direitos para participar dos procedimentos de relocação) e incluir as consequências sobre o prazo de vencimento; em particular, os possuidores de direitos devem participar das negociações e acatar designações anteriores determinadas pelo departamento executor. Junto com a decisão sobre a relocação, entram em vigor as disposições sobre a suspensão temporária do desenvolvimento, informada em anúncio público. De acordo com as medidas, qualquer mudança ou subdivisão de terreno, bem como qualquer construção de estrutura física, ainda que seus custos representem aumento de valor, todas estão sujeitas às condicionantes de permissão pelo poder público (BauGB § 51). A permissão será recusada em casos nos quais haja um procedimento que possa prejudicar a implementação da relocação (BauGB § 51,3). Além disso, a municipalidade poderá exercer o direito de preempção sobre determinados terrenos (controle de venda e compra de terrenos onde o poder público tem preferência) (BauGB § 24,1). É padrão montar um mapa de diagnóstico e um inventário dos terrenos afetados em evidência pública, na municipalidade, pelo período mínimo de um mês, o que traz a compreensão das aplicações reais e relacionamentos legais, base do processo de land readjustment. O mapa conterá no mínimo a posição atual, a proposta dos terrenos e identificará os possuidores de direitos. O inventário conterá os possuidores de direitos registrados, os custos e as restrições dos registros de terras e a descrição dos registros de terras quanto ao uso, ao tamanho e aos limites das propriedades, indicando o nome das ruas e o número das casas (BauGB § 53). Para cada terreno a ser relocado, haverá o armazenamento destas informações no registro de terras. Quando o proprietário envolvido não puder representar-se, a corte do município deverá, a pedido do departamento de relocação, autorizar um representante versado em aspectos jurídicos e tecnicamente competente (BauGB § 207). Para tornar mais ágil o procedimento, os detentores de direitos afetados poderão autorizar o departamento executor a regulamentar as relações entre proprietários, propriedades e outros direitos antes da decisão final sobre o plano de relocação


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(BauGB § 66-70). Terrenos dentro da área de projeto são adicionados à “massa de relocação”. Durante o processo, são excluídos da massa e entregues à municipalidade, ou a outra autoridade encarregada, os espaços para benfeitorias públicas, como estradas, e os espaços para servir aos requisitos da população local, como parques e áreas verdes, provisões de proteção ambiental e provisões para a purificação das bacias ou para a captação de águas pluviais. A massa remanescente constituirá a “massa de redistribuição”. O cálculo da divisão da massa de redistribuição pertencente a cada possuidor de direito envolvido pode estar baseado tanto no valor relativo (BauGB §57) como no tamanho relativo (BauGB § 58) anterior ao processo de relocação. O critério apropriado para aplicação será decidido unanimemente pelo departamento de relocação após a avaliação e a consideração dos interesses das partes envolvidas (BauGB § 56). Veja: a. Na redistribuição por meio de valores, o departamento executor tomará por base os valores atuais de mercado dos terrenos da época antes da relocação. Serão avaliadas as diferenças entre as mudanças de valor antes e após a execução do projeto e qualquer diferença será ajustada por meio de restituição financeira. b. Na redistribuição por meio de tamanho, o departamento executor deduzirá de cada terreno incluído na massa de redistribuição parte de sua área para compensar os ganhos resultantes do processo de relocação. A área deduzida não excederá 30 por cento da área total do terreno em distritos que não possuem serviços de infraestrutura pública local previamente construída, e não excederá 10 por cento em qualquer outro distrito. Para repor tal dedução, o departamento executor deve arrecadar, em parte ou em totalidade, reservas financeiras apropriadas. Nos casos em que as vantagens excederem a área deduzida, a compensação será feita por restituição financeira. De acordo com os propósitos da relocação, os possuidores de direitos deverão, o quanto for possível, ser relocados de maneira comparada ou equivalente com bastante semelhança à localização do terreno com que contribuíram e inseriram na massa de redistribuição (BauGB§ 59). Dentro da estruturação do plano legalmente compulsório, ou qualquer outra regulação sobre edificações, a alocação de mais ou menos parcelas de terreno serão permitidas se houver compensação adequada em dinheiro. Os possuidores de direitos podem receber compensação


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financeira ou receber terrenos fora da área de projeto, se não houver condições de oferecer terrenos desenvolvidos dentro da área de projeto, ou quando se julgar necessária essa alocação para melhor aproveitamento do plano legalmente compulsório de uso do solo (BauGB § 59). Qualquer um que recusar a oferta de receber terrenos fora da área de projeto pode aceitar a oferta de restituição financeira como contraproposta, ou aceitar a oferta de inserir-se em outro projeto consorciado, com a garantia de direitos similares aos adquiridos no projeto de relocação anterior ao consorciado. Com relação aos direitos dos antigos terrenos e suas relações legais afetadas pelos terrenos adjacentes, os referentes aos novos terrenos relocados sobrepõem-se aos antigos (BauGB§63). O departamento executor poderá aplicar ordens judiciais referentes a novas edificações (BauGB§176), a novos plantios e áreas verdes (BauGB§178) e a modernização de antigas estruturas (BauGB§177). Os deveres dos proprietários e inquilinos dentro das condições relativas ao arrendamento são julgados como contribuições e obrigações sobre os novos terrenos ou sobre os arrendamentos (BauGB § 64,3). A nova situação legal entra em vigor após a emissão de anúncio público (BauGB § 72). Os custos do processo e com materiais não estão cobertos pelas contribuições e são custeados pela municipalidade (BauGB § 78). Processos de relocações em distritos não servidos previamente com infraestrutura pública duram em média de um a três anos. Em distritos onde exista infraestrutura pública, construções residenciais ou de uso comercial a serem demolidas, o processo demorará mais tempo. Se houver ações de interpelação ou apelações, o tempo será ainda maior. Empiricamente, as áreas para novas edificações são construídas com maior rapidez quando os detentores de direitos e o departamento executor trabalham em conjunto ou, em alguns casos, quando se decide pelo direito de preempção (BauGB § 76). O processo de realocação gera efeitos econômicos nas áreas afetadas, por causa da necessidade de espaços para novas ruas ou espaços de uso comunitário, alterando o uso do solo por iniciativa do poder público, desde quando é anunciado. A municipalidade não gasta recursos para adquirir terrenos ou para criar interesse econômico nessas áreas. A recompensa para ambos os lados (municipalidade e detentores de direitos) encontra-se na construção de novos terrenos servidos por infraestrutura pública de alta qualidade. Para os empreendedores e construtoras, áreas de relocação são atrativos campos de atividades, porque contam com a eficiência do processo do poder público, devido à transparência no processo, ao cálculo prévio e às parcerias, pelas quais os investidores podem prever os retornos financeiros de seus investimentos.


3Processo de execução do land readjustment alemão.


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capítulo 4

Projeto de land readjustment Frankfurter Bogen, Alemanha (Frankfurt Preungesheim Frankfurter Bogen, Deutschland) Local: distrito norte do município de Frankfurt, na Alemanha. Agente de implementação: poder público (departamento de land readjustment da secretaria de planejamento de Frankfurt). Área do projeto: 72,4 hectares. Proprietários e inquilinos: 400 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1982 a 1997. 1982 - 1997: desenvolvimento do plano legalmente compulsório e negociação com os possuidores de direitos; inspeção das condições geográficas; aprovação do plano financeiro. Período para a implementação do projeto: de 1992 a 2010. 1992: desenvolvimento do plano de obras; 1992 - 1999: execução e término da primeira área; 1999 - 2001: execução e término da segunda área; 2001 - 2004: execução e término da terceira área; 2005 - 2010: execução e término da quarta área, incluindo equipamentos esportivos e áreas verdes; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto Frankfurter Bogen está localizado na parte norte da cidade de Frankfurt, divisa do bairro residencial de Preungesheim com a zona rural. Com a demanda por habitações, o poder público designou esta área para a conversão de terrenos agrícolas para urbano, planejando novo bairro para cerca de 3.500 pessoas distribuídas em 72,4 hectares, com acesso a novas infraestruturas públicas como escolas, centros de compra e serviços sociais. O projeto foi dividido em quatro áreas por causa de seu tamanho: a área 1 foi entregue em 1999 com residências multifamiliares, escola e parque público; a área 2 foi entregue em 2001, com a maioria dos lotes urbanizados, escola, jardim de infância e um shopping center com construção prevista em breve; a área 3 foi entregue em 2004, mas seus lotes urbanizados ainda estão recebendo construções e o jardim de infância será construído em breve; a área 4 está sendo desenvolvida e as obras previstas para término em 2010 incluem a construção de equipamentos esportivos e parque público. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com 45,0% em área para a constituição de novos espaços públicos. Não houve contribuição para a constituição de terrenos-reserva, porque o projeto baseou-se em compensação pela valorização dos terrenos após as novas infraestruturas. A quantidade total de área disponibilizada para contribuição no projeto foi de 325.500,00 m².


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Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o valor do terreno passou de €220,00/m² antes da execução do projeto para €470,00/m² após a execução do projeto. Benefícios para o poder público: este plano permitiu executar de maneira controlada a alteração dos terrenos agrícolas para locais devidamente urbanizados, absorvendo e distribuindo os benefícios do desenvolvimento equilibradamente entre os envolvidos, por meio de restituição financeira ou em terrenos. Eventuais conflitos do projeto: os proprietários se recusavam a participar do projeto por causa do uso compartilhado que seria dado aos jardins das propriedades. Projeto de land readjustment Frankfurter Bogen, Alemanha. 6


5Mapa do parcelamento do solo antes da execução do projeto e imagem aérea durante a execução do projeto. Imagem aérea do projeto de land readjustment Frankfurter Bogen durante sua execução em 2007.4 6Mapa do parcelamento do solo após a execução do projeto de land readjustment e mapa das ocupações propostas.



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Redesenvolvimento urbano na China (土地整理中华人民共和国) Ling-Hin Li e Xin Li Desde a reforma econômica da China e o processo de abertura de suas fronteiras para o mundo, a urbanização do país atingiu velocidade superior ao dobro da média mundial no mesmo período. O último censo do Instituto de Pesquisa de Ciência Social Chinês apresentou, até o fim de 2006, um total de 577 milhões de pessoas vivendo em 661 cidades. Isto significa uma tendência no crescimento de urbanização de 43,9% nos últimos anos. Apesar de essa não ser uma tendência encontrada em todas as regiões do país, cidades como Shangai, Beijing e Tianjin cresceram a impressionantes taxas acima de 80,0%. Com essa incrível taxa de urbanização, racionalizar o uso do solo e o processo de ocupação fundiária não é uma tarefa simples. Acompanhado desse processo, o país ainda passa por crises causadas pela alta taxa de desemprego, pela população flutuante, pela instabilidade social e pelos desastres naturais. Apesar destas dificuldades e de sua implementação neste contexto, projetos de renovação urbana se tornam uma das tarefas mais urgentes dentro dos escritórios das municipalidades e do governo central. Além disso, o contexto chinês apresenta diferença notável: o domínio contínuo do governo é ainda aspecto proeminente do desenvolvimento na China. Apesar de seu antigo sistema se manter e ainda existirem fortes tentativas de manter tudo sob controle, o país está aprendendo rapidamente sobre ações colaborativas entre a autoridade local e seus habitantes. O papel dos governos locais “autorizados” na China é diferente daqueles “eleitos” nos Estados capitalistas, que sempre procuram o crescimento no contexto das coalizões políticas que operam em sociedades pluralistas com forte poder de mobilidade social. Os governos locais chineses fazem simultaneamente o papel de reguladores e consumidores do mercado, possuindo objetivos finais mais complicados do que apenas procurar pelo crescimento. A forma física do meio ambiente construído permite realizações a serem facilmente visualizadas no lugar do “intangível” desenvolvimento social. Não obstante, o governo chinês não desenvolveu uma legislação própria para regulamentar processos de regeneração urbana até 2001, dadas as grandes proporções territoriais do país e as variações de necessidades de acordo com as distintas regiões. A Primeira Medida do Estado de Compensação para Recolocação de Habitações e Reassentamentos em Áreas Urbanas foi


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aprovada em 2001, permitindo a administração compulsória de projetos de renovação urbana. Devido ao sistema de propriedade na China, porém, especialmente quando existe a dualidade entre titulares em terrenos urbanos ou rurais, problemas relacionados a reassentamentos continuam a existir. Em 2007, o país passou por um processo difícil e controverso em que o Congresso Nacional do Povo transformou em lei a garantia à propriedade privada. Antes da lei, o usuário de um imóvel urbano conseguia do governo uma concessão e um direito ao seu uso por um período de 40 a 70 anos. Após este período, o direito ao uso poderia ser renovado. No meio urbano, a nova lei atende à demanda da classe média urbana por segurança em relação aos bens e à propriedade privada. No meio rural, entretanto, onde o bem fundamental é o solo agrário, nada muda e a propriedade privada continua a não existir mesmo com a nova legislação. As tentativas de implementar o land readjustment (土地整理, em chinês) para a renovação urbana é relativamente nova. Afinal, mesmo antes da aprovação da medida de 2001 e da garantia à propriedade privada de 2007, Shangai foi a primeira cidade do país a desenvolver o land readjustment, em 1996; e, em 1997, a cidade de Hangzhou iniciou o processo de criação de agência para compra e venda de terras. Em 2000, diversas agências de implementação de projetos foram criadas e a bem-sucedida experiência em projetos como Yunong, entre tantos outros, fez as autoridades locais entenderem que existem melhores maneiras que as medidas administrativas compulsórias para realizar projetos necessários para a renovação urbana, e muito menos custosos, financeira e politicamente. Por envolver os empreendedores e, mais importante, a população local, o land readjustment apresentou sucesso em projetos de renovação urbana em vilas no município de Shenzhen. Isso tornou a negociação para futuros projetos mais fácil. Porém, mesmo tratando-se de parceria entre os setores público e privado, no caso chinês, o governo local ocupa posição dominante nas transações, diferente da opinião geral de que o setor privado é que detém os privilégios, como normalmente visto na literatura ocidental. O ponto interessante, que será constatado no estudo de caso chinês a seguir, consiste na capacidade de minimizar custos financeiros, tanto quanto sociais e políticos no processo de redesenvolvimento urbano. A aplicação do instrumento reduz conflitos entre autoridades e proprietários para efetuar o projeto. Em comunidades suburbanas, o desejo dos moradores em continuar a viver no mesmo bairro excede até mesmo o valor das indenizações pagas. Em um mercado como da China, onde a proteção aos direitos de propriedade e sua delineação


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estão longe do adequado, o land readjustment fornece um mecanismo para que as autoridades locais coletem todos os direitos inconsistentes sobre as propriedades e os redelineiem de maneira equilibrada, com registros corretos. Consequentemente, após o projeto, todas as propriedades, incluindo aquelas selecionadas pelo poder público para venda, irão obter titularidade regularizada. Dessa maneira, o método ajudará o desenvolvimento do mercado imobiliário chinês. Dentro das situações do meio ambiente construído em que apenas terrenos urbanos estão envolvidos, o governo local tende a substituir o mercado por seus poderes políticos e administrativos, que não estão disponíveis a outros atores de mercado. Quando a realidade torna-se mais complicada, por envolver outros atores, como uma cooperativa de agricultores, esses poderes tornam-se menos efetivos. A partir de então, o governo precisa mudar de atitude para alcançar a parceria baseada nos princípios de mercado para alcançar os resultados do desenvolvimento. Evidente no caso da China, a sabedoria política das autoridades locais contribui para a materialização e o sucesso dos projetos de land readjustment. As experiências do Japão, Hong Kong e Cingapura demonstram que o intervalo de tempo necessário para a execução de um projeto de redesenvolvimento urbano é de 20 anos. Sendo assim, a China terá bastante trabalho em empreender quase 40 bilhões de metros quadrados de área construída, dispersos em edifícios com mais de 20 anos de construção. Isso significa que a China entrará em uma fase de grandes transformações. Além disso, devido à grande diversidade de problemas, o governo não encontrou ou desenvolveu solução única, permitindo que as diferentes cidades formulem políticas específicas e decidam a melhor maneira de solucionar seus problemas.


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Projeto de redesenvolvimento urbano Vila Yunong, China (豫农村的市区重建项目 中国) Local: vila Yunong, distrito de Futian, município de Shenzhen, província Guangdong, na China. Agente de implementação: iniciativa privada (corporação de investimentos imobiliários Gemdale Shenzhen). Área do projeto: 3,43 hectares. Proprietários e inquilinos: 200 concessionários e 8.600 inquilinos. Período para o desenvolvimento do projeto: de 2003 a 2004. 2003 - 2004: processo de negociação entre o governo do distrito de Futian, os concessionários e a Corporação de Investimentos Imobiliários Gemdale Shenzhen; levantamento e inspeção das condições geográficas; término do plano financeiro e plano de execução do projeto. Período para a implementação do projeto: de 2004 a 2007. 2004: execução do plano de obras; 2005: início do processo de construções informais; 2005: início das demolições das construções informais e retomada da execução do plano de obras; 2006 - 2007: emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: a vila Yunong está próxima a uma das três alfândegas entre Hong Kong e o rio Shenzhen e sua localização privilegiada tornou o local alvo para investidores. Esse projeto de renovação urbana foi o primeiro a ser realizado dentro do distrito de Futian com o apoio de quase a totalidade dos concessionários e com a permissão do governo. Essa antiga vila de pescadores Imagem panorâmica da vila Yunong antes do projeto de redesenvolvimento urbano. 6


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desenvolveu-se após a transição dos trabalhos de pesca para os empregos nas grandes fábricas chinesas. Após viverem por séculos nesta área, os pescadores construíam apartamentos para aluguel aproveitando o processo de crescimento urbano e a população flutuante que passava pela região atrás de novas oportunidades. O governo local proclamou as terras para si após a transição do uso rural para urbano entre 1988 e 1993. Devido aos problemas de dupla titularidade, as autoridades locais nunca conseguiram um acordo legal com as famílias dos antigos pescadores antes do projeto de renovação urbana. Taxa de contribuição: não houve contribuição em terreno porque os concessionários e inquilinos não são os proprietários na China. A contribuição foi em termos de compensação em um processo de troca habitação-por-habitação entre as antigas unidades e as novas e desenvolvidas unidades; e em termos de vacância para áreas públicas na ordem de 80 mil m². Benefícios para os concessionários: as famílias dos antigos pescadores receberam unidades nos novos edifícios como forma de compensação pela utilização de suas antigas concessões. 6Perspectiva artística do projeto de redesenvolvimento urbano de Vila Yunong.


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Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada o desenvolvimento urbano, permitindo o incremento de área construída modernizada para mais pessoas, somando quase 9 hectares em espaços públicos. Custos e subsídio: o empreendimento foi todo custeado pela iniciativa privada e sabe-se que o poder público concedeu uma isenção sobre o preço da terra (orçada em US$ 20 milhões), um subsídio para início das obras (US$ 25 milhões) e a isenção de 50,0% sobre taxas e impostos. Eventuais conflitos do projeto: Após o início do projeto, os inquilinos começaram a resistir ao processo, construindo estruturas ilegais no intuito de participar ou aumentar seu poder de barganha em termos de compensação. Com uma velocidade espantosa, após a demolição das antigas unidades, os inquilinos se uniram e construíram 37 novos edifícios nesta mesma área. Após vários impasses entre governo e ocupantes, algumas vezes com resultados bastante violentos, o governo do distrito de Futian, os concessionários, os inquilinos e a corporação imobiliária Gemdale assinaram um acordo para demolir as estruturas ilegais e executar o projeto. Imagem aérea de vila Yunong durante a execução do projeto de redesenvolvimento urbano em 2004. 6


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Land readjustment na Colômbia (Reajuste de Tierras en Colombia) Juan Carlos Garcia Bocanegra Antecedentes práticos referentes à aplicação do método land readjustment foram encontrados em algumas cidades da Colômbia na primeira metade do século XX. Porém, o método foi introduzido como figura legal no final dos anos 1980 e início dos 1990, após quase 10 anos de um processo de reformulação urbana que considerou a legislação urbanística da Espanha, o land readjustment do Japão e o modelo de planejamento urbano dos Estados Unidos. Hoje não se pode afirmar que existe verdadeiramente uma regulamentação detalhada, apenas uma menção muito geral na legislação colombiana do land readjustment (“reajuste de tierras”, em espanhol) na Lei nº 9 de 1989 da Reforma Urbana; e, após sua reforma, de acordo com os postulados da Constituição Política de 1991, na Lei n º 388 de 1997 do Desenvolvimento Territorial. O reajuste de terras colombiano foi conceituado da seguinte maneira: Os municípios, o distrito federal de Bogotá e a prefeitura de San Andrés e Providencia, ou suas entidades descentralizadas, poderão associar-se com outras entidades públicas e com particulares, por iniciativa de qualquer um destes, para desenvolver áreas não melhoradas pelo plano de desenvolvimento, mediante o sistema de reajuste de terras, que consiste em englobar diversos lotes de terreno para logo subdividi-los de forma mais adequada e dotá-los de obras de infraestrutura urbana básica, tais como vias, parques, redes adutoras, energia e telefonia. (Lei n º 388 de 1997, Capítulo VII: De los Bancos de Tierras y de la Integración y Reajuste de Tierras. Artículo 77).

O procedimento do reajuste de terras colombiano esboçado possui, na prática, problemas não apenas por sua generalidade, mas também pela falta de articulação com o processo de planejamento e gestão. Durante o processo de reformulação da legislação urbanística, pela primeira vez na história do país incorporou-se um conceito para definitivamente romper-se com o processo de desenvolvimento urbano feito no âmbito do “prédio-a-prédio” e, sobretudo, para promover a prevalência do interesse público sobre o particular. Este conceito, o princípio da “distribuição justa de custos e benefícios”, para ampla aplicação em tudo que afeta os proprietários de terra, foi explicado da seguinte maneira na Lei nº 388 de 1997: Em respeito ao princípio de igualdade entre todos os cidadãos perante as leis, os planos de ordenamento


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territorial e as normas urbanísticas que os regulam, deverão estabelecer mecanismos que garantam a divisão equitativa das cargas e dos benefícios derivados do ordenamento urbano entre os respectivos afetados. (Lei n º 388 de 1997, Capítulo V: Actuación Urbanística. Artículo 38: Reparto Equitativo de Cargas y Beneficios).

Para entender onde este princípio está inserido, é necessário esclarecer que o sistema de planejamento urbano na Colômbia divide-se basicamente em três escalas de atuação: o POT (Plano de Ordenamento Territorial), que é um instrumento de nível superior de planejamento, responsável pelos cenários gerais e pelo cumprimento do mandato constitucional sobre o direito, a forma e a função da propriedade; os Planos Parciais, cujo principal objetivo é fixar novos modelos urbanísticos para cada setor da cidade; e as UAU (Unidades de Atuação Urbanística), responsáveis por efetivamente executar o reajuste de terras, a integração imobiliária e a cooperação entre todos os agentes envolvidos. Nas áreas destinadas ao reajuste, parte dos terrenos, que, de acordo com o projeto urbanístico, deverá se destinar ao sistema viário e aos equipamentos coletivos, será aportada por todos os proprietários inseridos no perímetro do Plano Parcial (reparto equitativo de custos) e o aproveitamento urbanístico (coeficiente de aproveitamento) correspondente às propriedades reajustadas será utilizado a fim de obter o benefício do desenvolvimento (reparto equitativo de benefícios). Os Planos Parciais, tanto em seu processo de formulação quanto em sua gestão, podem ser públicos ou privados e este fator será predominante para definir seu plano de implementação, utilizando qualquer figura legal que reúna os proprietários e os gestores, como se menciona na lei uma “entidade gestora” que pode ser, inclusive, uma empresa de economia mista. Não está estabelecido na regulamentação nem existe um método nacionalmente adotado para a taxa de contribuição ao projeto. O que existem são diferentes experiências locais em que o montante dos custos foi pactuado de diversas maneiras, caso a caso, desde que as cargas não impeçam a recuperação dos benefícios. Também é bastante escasso encontrar corpo técnico para o desenvolvimento de projetos dessa natureza, bem como uma análise dos resultados obtidos. Houve municípios que avançaram mais que outros no processo de execução (Medellín e Pereira, especificamente), criando metodologias locais, ou seja, normas com diversas aplicações possíveis para cada projeto, embora na mesma cidade. Em Medellín, por exemplo, a regulamentação local obriga reuniões conciliatórias entre


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a comunidade e os formuladores do projeto, antes mesmo do envio oficial da proposta à municipalidade. Nesse sentido, sua aprovação final acontece somente após uma nova reunião conciliatória, pois se entende que cada proprietário possui direitos e deveres sobre o reajuste de cada unidade. Os inquilinos (locatários) não possuem direitos no processo de reajuste. Em alguns projetos, adotou-se um método de avaliação simplificado de pontos (resultado da cooperação técnica estabelecida com a JICA), assim como outros métodos de valoração para estabelecer os custos totais aplicáveis em cada plano, os aproveitamentos resultantes para cada entidade gestora e o equilíbrio entre os custos e os benefícios, medidos em porcentagem de solo urbanizado aproveitável e preço final de venda. Tem sido comum integrar todas as edificações a serem reajustadas em um projeto gerenciado por meio de um consórcio imobiliário, no qual não existe compensação em terra. Existe a compensação em dinheiro, produto da venda dos imóveis, seja dos lotes ou das construções, de acordo com a valorização inicial, seguida por uma avaliação municipal, até se obter a determinada compensação. Por essa razão, aplicar o procedimento típico japonês, que, a princípio, busca entregar lotes urbanizados aos participantes iniciais é muito complicado. Na prática, para a gestão colombiana, é mais ágil apelar à distribuição das cargas financeiras que à distribuição em lotes urbanizados. Os títulos de propriedade resultantes do reajuste (terra e/ou empreendimento) não são transferidos aos proprietários originais, e sim, o direito de venda dos mesmos que, depois disso, são transferidos aos compradores dos projetos imobiliários. Diferentemente do que ocorre no Japão, na Colômbia não existem incentivos nem programas especiais de financiamento para o desenvolvimento de projetos consorciados por meio do reajuste de terras. Por fim, a regulamentação do mecanismo ainda está incompleta e requer um esforço adicional de complementação e precisão, já que falta regulamentar mecanismos para promover a lei e controlar a especulação e o incremento do valor do solo a cada operação urbanística, tais como simples anúncios do projeto ou a transferência do direito de construir. Ainda existe desconfiança acerca da segurança jurídica e econômica dos procedimentos que compreendem o processo de reajuste de terras. O reparto equitativo de custos e benefícios e a necessidade de gerar aportes financeiros positivos (lucro) em cada Plano Parcial desestimulam o desenvolvimento de habitação de interesse social e o cumprimento dos padrões urbanísticos de espaço público e mobilidade.


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Projeto de land readjustment Loma de los Bernal, Colômbia (Plan Parcial Loma de los Bernal en Medellín, Colombia) Local: município de Medellín na Colômbia. Agente de implementação: iniciativa privada (corporação de investimentos imobiliários Siempre Verde). Área do projeto: 13,3 hectares. Proprietários e inquilinos: 12 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 2001 a 2003. 2001 - 2003: levantamento e inspeção das condições geográficas; desenvolvimento do plano diretor; plano do replotting fundiário (reposicionamento e redimensionamento); término do plano financeiro de execução do projeto; plenárias e reuniões de acordo entre os proprietários. Período para a implementação do projeto: de 2003 a 2015. 2003 - 2015: execução do plano de obras de cada uma das cinco unidades do empreendimento; 2015: emissão dos novos títulos de propriedade; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: a principal especificidade deste projeto encontra-se na iniciativa privada em realizar pela primeira vez um projeto de land readjustment por sua própria motivação. A área alvo da intervenção é um vazio urbano existente na região periférica do município de Medellín, uma cidade com pouco solo disponível, executando um projeto de acordo com as mais novas técnicas de urbanização presentes no país. Existe uma aplicação de princípios muito particulares neste projeto, que executa o reajuste em determinados lotes ou unidades quando necessário; em outros, o reajuste não se aplica, mantendo sua forma original e não se integrando às demais unidades. Na prática, esta é uma das razões pelas quais projetos de land readjustment vêm tendo relativo êxito em cidades como Medellín e Pereira, pois esses ajustes facilitam seu processo de execução. Ressalta-se que mesmo os lotes com melhores formas e que não necessitam de transformação contribuem e participam da mesma maneira no financiamento do Plano Parcial. Neste projeto, apenas as unidades 3 e 4 foram reajustadas, enquanto as unidades 1, 2 e 5 foram mantidas conforme o loteamento original. Taxa de contribuição: terrenos privados contribuíram em 40,0% em área para a constituição de espaços públicos. Não houve contribuição para a constituição de terrenos-reserva.


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Benefícios para os proprietários: haverá uma valorização prevista em 30% do valor do m² decorrente da execução do projeto. Os investidores privados terão uma valorização de 10% dos imóveis após a construção do empreendimento, ou valor superior. Benefícios para o poder público: esse plano permite executar de maneira controlada a transição do espaço rural para o espaço urbano, respeitando a legislação de proteção ambiental, que confere parâmetros urbanísticos respeitados no projeto. O município de Medellín vai receber quase 4 hectares em espaços públicos, incluindo um centro cívico e cultural em cada uma das cinco unidades do empreendimento. 6Mapa do parcelamento do solo antes da execução do projeto de land readjustment Loma de Los Bernal.


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Custos e subsídio: o empreendimento foi custeado totalmente pela iniciativa privada e o valor total para a implementação do projeto ficou orçado em US$ 50.000.000,00. Vale lembrar que, após a execução do projeto, a mesma iniciativa privada espera receber 30% de lucro pelo empreendimento ao mesmo tempo em que desenvolve espaços públicos de qualidade. Eventuais conflitos do projeto: este foi o primeiro Plano Parcial da iniciativa privada da história da cidade em que os proprietários tiveram que assimilar uma nova forma de urbanizar e aceitar a necessidade de associar o planejamento urbano com o compartilhamento de custos e benefícios concentrados, bem como aceitar integrar seus lotes com o de outros no processo de reajuste. Projeto de land readjustment Loma de Los Bernal. 6


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Land readjustment na Finlândia (Suomen Rakennusmaan Järjestely) Kauko Jussi Viitanen Em 1997, a nova Lei de Formação da Propriedade Real entrou em vigor na Finlândia, redefinindo o instrumento do land readjustment (“rakennusmaan järjestely”, em finlandês). Essa lei revogou o antigo procedimento de land readjustment (“kaavauusjako”) que vigorou por 36 anos, mas que raramente foi praticada (Viitanen 2000b). Similarmente, o novo procedimento de land readjustment permanece inutilizado. Quais são as razões e o que aprender com isso? O land readjustment está diretamente relacionado ao planejamento local detalhado e ao planejamento de uso do solo. Na Finlândia, o desenvolvimento urbano se baseia em planos democraticamente aprovados, e dessa maneira dizemos que nossas municipalidades detêm o monopólio do planejamento. As municipalidades finlandesas possuem métodos efetivos e poderosos para influenciar o desenvolvimento quando necessário, tais como a desapropriação e os acordos de desenvolvimento. Isso significa que o land readjustment é apenas um dos muitos instrumentos da caixa-de-ferramentas à disposição para a implementação de projetos e produções fundiárias (Viitanen, Palmu, Kasso, Hakkarainen e Falkenbach 2003). Pela lei de 1997, a aplicação do instrumento precisa ser feita antes do plano do uso do solo aprovado pelas municipalidades tornar-se legalmente compulsório. O procedimento se inicia quando a solicitação dos proprietários ou do poder público chega até o Departamento Nacional de Agrimensura. Após a aprovação do procedimento, um agrimensor cadastral e dois representantes do comitê de land readjustment determinam se o procedimento está de acordo com as disposições legais e definem oficialmente o perímetro do projeto. A decisão torna-se pública e aqueles que se opuserem podem apelar à Corte de Terras. Após a validação da decisão, o comitê confirma primeiramente as bases do que será partilhado, em acordo com os valores de mercado existentes antes da aprovação do plano local detalhado, e antes também dos procedimentos de execução da proposta. Áreas públicas serão adquiridas por meio do sistema de contribuição e partilha, e transferidas para a municipalidade, que compensará os envolvidos pela contribuição quando esta exceder o obrigatório estipulado anteriormente. A sequência de custos e as compensações do land readjustment finlandês são: a.

A compensação é avaliada e decidida pelo comitê;


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b. As áreas remanescentes são partilhadas entre os participantes; c. Quaisquer diferenças são indenizadas; d. Os envolvidos têm o direito de concordar sobre as formas de compensação; e. Os custos do projeto são pagos ambos pela municipalidade e pelos proprietários; f. As apelações contra as decisões finais poderão ser direcionadas à Corte de Terras; g. Após a validação, o reajuste é registrado no departamento de registros imobiliários e as compensações são pagas; h. O projeto é concluído e não inclui a construção de infraestrutura. Existem diferentes maneiras de construir projetos de land readjustment e conectá-los com o planejamento de uso do solo. Na mais simples, o poder público apenas implementa o plano existente, sem qualquer ponto em comum com outros processos de planejamento, ou, de modo integrado, obtém benefícios sinérgicos por meio da ampla participação dos proprietários, economizando tempo, gastos e prejuízos na execução do projeto. O land readjustment finlandês pode ser classificado principalmente como um plano cuja implementação e lucros serão compartilhados entre os proprietários. O antigo procedimento de land readjustment finlandês (“kaavauusjako”) compreendia apenas a troca de terras sem compartilhar os gastos e os lucros gerados por ela. A potencialidade do land readjustment finlandês se baseia em sua estrutura e sua organização muito bem definidas, mas também possui fraquezas. Embora o objetivo do instrumento seja alcançar o melhor resultado de produção dos planos de uso do solo, os planejadores urbanos não sabem se na prática o instrumento pode ser aplicado, devido às extensas cláusulas de sua lei. Realmente, existem evidências de que nos primeiros dez anos em que a Lei de Formação de Propriedade Real esteve em vigor, sequer um projeto de land readjustment teve início. Isso aconteceu provavelmente porque, além do instrumento não ter sido incorporado na Lei de Planejamento do Uso do Solo e Edificações, os planejadores urbanos têm pouquíssima experiência sobre seu real potencial e benefícios. Parece, portanto, que a legislação atual é ineficaz perante a demanda e que precisa de melhorias com urgência. Pela lei, o projeto de land readjustment possui dois objetivos: compartilhar direitos construtivos e adaptar os limites das propriedades para melhor aproveitamento designado pelo plano detalhado. Ambos precisam ser implementados sem que os benefícios sejam excedidos pelos custos, senão o


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procedimento nunca será utilizado. Os procedimentos formais, que dispõem sobre a decisão de executar projetos de land readjustment, também necessitam de maior aprofundamento, em particular a base utilizada para o processo de partilha, a transferência de parcelas de terrenos e a determinação da compensação e dos custos. Dentro da lei existente, proprietários de imóveis construídos recebem parcela maior da distribuição em comparação àqueles que possuem terrenos sem construções com expectativa de valorização. Isso acontece porque a base da partilha é dependente do valor dos imóveis e porque é dado também certo peso às construções já existentes. Ainda que, na prática, isto leve à injustiça em alguns casos, a lei não permite que a questão seja resolvida de outra maneira, mesmo com o acordo mútuo entre os participantes. Além disso, quando o valor da participação da propriedade é negativo, por exemplo, devido à contaminação do solo, o princípio da partilha por valores não pode ser aplicado logicamente. Os princípios da partilha e as cláusulas de inclusão das propriedades com construções prévias devem ser reconsiderados. Uma alternativa apropriada seria mudar o princípio da partilha por valores para redistribuição por área com, se necessário, um coeficiente de valores sobre o potencial de desenvolvimento da propriedade. Imóveis desenvolvidos em acordo com o plano detalhado devem receber a designação do direito de construir apenas se trouxerem para o projeto terrenos urbanizados, como no caso do land readjustment na Suécia (ou “exploateringssamverkan”, em sueco). O princípio da partilha não deve ser visto como solução absoluta. Deve ser visto como método para restaurar o equilíbrio e conceder flexibilidade para limitar os custos da execução do projeto. O proprietário de pequenos terrenos está em posição favorável na Finlândia: parece que todo proprietário está disposto a fornecer terreno urbanizado assim como o número de terrenos parece equiparar a demanda. Embora tal situação pareça favorecer a estrutura social de uma área, diminuirá a vontade dos profissionais e de proprietários de extensos terrenos em participar do projeto, reduzindo sua eficácia. Parece também oportuno criar emendas na lei que concedam direitos individuais durante a partilha e reduzam a contribuição para limites prévios (por exemplo, 20,0%) com exceções a situações em que a contribuição for insuficiente para desenvolver o projeto. Ainda, as parcelas adjacentes podem ser desapropriadas, conforme acontece atualmente em processos de consolidação fundiária ou desapropriação de bens privados, com o intuito de adquirir as partes que faltam para completar o plano detalhado.


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A regulamentação relacionada às construções e aos equipamentos parece ambígua quanto à compensação, especialmente quando o poder público for responsável de pagar por estas indenizações. As cláusulas precisam ficar mais claras, não importa como a área será transferida ao poder público, a lei de compensação para construções e equipamentos é atualmente neutra comparada a outros procedimentos. Mudando a forma de compensação, podemos alcançar melhor fluxo de caixa se os pagamentos forem feitos aos participantes, para arcar com os custos durante o processo de implementação do projeto, e não após a sua execução. O fato isolado mais importante da legislação atual relacionado ao land readjustment é o fato de que não existem regulamentações ou ferramentas pelas quais os proprietários possam realizar um acordo sobre planejamento com a municipalidade. Desde a aprovação em 2003 da emenda da Lei de Planejamento do Uso do Solo e Edificações, os acordos de planejamento entre proprietários, empreendedores e municipalidades tornaram-se a ferramenta mais importante de execução de projetos na Finlândia. Por meio destes acordos, os proprietários pagarão o custo da infraestrutura para o desenvolvimento da área de projeto. O valor máximo para o pagamento da infraestrutura é de 60% sobre a valorização do seu terreno, de acordo com o plano detalhado ou com a mudança de uso do solo previsto. O land readjustment na Finlândia deveria, como sugestão, ser composto dos seguintes elementos, e o primeiro será a base para desenvolver os seguintes: a. b. c. d. e. f. g.

Detalhamento das características básicas para desenvolver projeto de land readjustment; Adaptação da estrutura imobiliária junto aos planos detalhados; Divisão dos direitos de construção e dos custos de execução do projeto; Procedimentos de compensação e desapropriações para a implementação do projeto; Procedimentos para a implementação de equipamentos compartilhados; Estabelecimento de organizações de proprietários para projetos de land readjustment; Estabelecimento de acordos compulsórios entre essas organizações e as municipalidades.

Alterando-se por meio de emendas a lei atual e seus procedimentos, é possível tornar prático o instrumento do land readjustment na Finlândia, principalmente em áreas onde a estrutura urbana apresentar propriedades com titularidade fragmentada.


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Land readjustment na Holanda (Ruilverkaveling in Nederland) Adri Van Den Brink Na Holanda, não existe um sistema legal de land readjustment para propósitos de urbanização. Porém, há uma possibilidade que se encontra em discussão. Apesar de existirem diversas razões, o motivo principal decorre de as municipalidades procurarem por uma alternativa para reativar o desenvolvimento urbano por meio de novas políticas públicas. Originalmente, o land readjustment (ou “ruilverkaveling”, em holandês) era o instrumento utilizado para melhorar as deficiências estruturais dos terrenos agrícolas (realocação de direitos de uso do solo e propriedades). Após a introdução de seu marco legal em 1924 (Lei de Consolidação Fundiária), mais de um milhão de hectares foram consolidados com este propósito no século XX. O instrumento foi gradativamente utilizado para outros fins, como melhorar a administração dos recursos hídricos e da infraestrutura e para disponibilizar espaço para o desenvolvimento de outros usos, além do agrícola. Durante os anos de consolidação fundiária rural, foram executados planos envolvendo cerca de 1,4 milhões de hectares, divididos em aproximadamente 480 projetos. Esta superfície representa cerca de três quartos de toda a área de produção agrícola do país e, nos últimos anos, uma área de 800 mil hectares está em fase de consolidação e outros 360 mil hectares estão em fase de projeto para a nova consolidação. Atualmente, o instrumento é aplicado com base voluntária, em menor escala e para o planejamento integrado na mudança gradual do rural para o urbano. Existem exemplos interessantes deste processo atual, baseados na parceria entre público e privado, em que a política pública fundiária é muito importante e o land readjustment é um de seus instrumentos de transformação. O crescente interesse em usos não agrícolas é reflexo das rápidas mudanças físicas pelas quais o país vem passando nos últimos anos. A paisagem tradicional do entorno das cidades, de pastos e campos, está assumindo características metropolitanas, apresentando em particular a integração entre zonas densamente urbanizadas e zonas de espaços abertos e agrícolas, com dimensões e formatos divergentes. O uso e as necessidades dessas zonas rurais estão indissoluvelmente ligados com as necessidades dos centros urbanos. Juntos, zonas rurais e centros urbanos precisam ser tratados de maneira integrada, formando o conjunto conhecido por paisagem metropolitana. Porém, a consolidação fundiária tradicional, com suas raízes nas melhorias das estruturas agrícolas, não está mais apta a solucionar as dinâmicas da paisagem metropolitana.


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Assim, as empresas privadas ganham importância no desenvolvimento de projetos para essa finalidade. Como resultado, maior ênfase é dada nas áreas previamente selecionadas para o desenvolvimento, integrando atores potenciais para futuras mudanças estruturais (proprietários de terra, empreendedores, poder público). Geralmente este processo dura maior tempo, desde seu início (plano das ideias) até sua execução (realização) por envolver a combinação das funções urbanas e rurais. Devido a essas características, tornou-se comum considerar as relações urbanas e rurais de maneira integrada, ao invés de fazê-lo de maneira separada, como no passado. As relações de parceria entre público e privado criam o alinhamento entre as funções de usos do solo, amenizam o conflito de interesses e disciplinam os arranjos financeiros. Em outras palavras, há a coprodução do espaço urbano entre agentes público e privados, organizações interessadas, consultores, designers e usuários. Por fim, existe uma “prontidão para a batalha” e, por meio de nivelamento administrativo e zoneamento setorial, existe a necessidade de performance e resultados. Comunicação permanente, debate e diálogo resultam em partes importantes do processo. O exemplo a seguir, em Groningen, demonstra o novo enfoque do land readjustment na Holanda, e os resultados esperados poderão dar novo rumo à aplicação deste instrumento no país. Imagem aérea da zona leste em Groningen, antes da execução do projeto de land readjustment em 2004. 6


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Projeto de land readjustment Groningen Meerstad, Holanda (Meerstad Groningen Project, Nederland) Local: zona leste da cidade de Groningen ao norte da Holanda. Agente de implementação: poder público (de Groningen e Slochteren e o Ministério da Agricultura) e quatro empresas privadas, resultando na agência de desenvolvimento Meerstad. Área do projeto: 7.000 hectares. Proprietários e inquilinos: 780 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 2003 a 2005. 2003 - 2005: processo de desenvolvimento do plano legalmente compulsório e negociação entre o poder público, empreendedores e os possuidores de direitos; término do estudo de viabilidade. Período para a implementação do projeto: de 2006 a 2025. 2006: início da execução do plano de obras; 2009: execução e término da primeira etapa: entrega das primeiras unidades habitacionais e das primeiras áreas alagadiças para o lago e provisão de infraestrutura; 2012: execução e término da segunda etapa: entrega de unidades nas zonas comerciais, ampliação das áreas alagadiças e construção dos primeiros equipamentos sociais; 6Mapa do parcelamento do solo antes da execução do projeto de land readjustment e suas respectivas fases de intervenção (2006 - 2009 - 2012).


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2016: execução e término da terceira etapa: ampliação das áreas residenciais e zonas comerciais e construção de infraestrutura para transporte público e ruas de pedestres; 2020: execução e término da quarta etapa: ampliação das áreas residenciais e zonas comerciais, término da construção do lago e da infraestrutura restante; 2025: término da quinta etapa; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto Groningen Cidade Lago está localizado na parte leste da cidade de Groningen, setor selecionado para a expansão urbana e responsável por atender à crescente demanda habitacional existente. Nesse projeto, o setor público combinou forças com a iniciativa privada para resolver os problemas de especulação, tornando as áreas verdes nas franjas da expansão urbana em saldo positivo na conta do poder público, agregando a valorização futura. Após dois anos de acordo, o plano diretor de desenvolvimento desta área será executado nos próximos 25 anos, tornando-se um dos projetos mais importantes do país. Taxa de contribuição: não houve contribuição para a constituição de terrenos-reserva porque o projeto esteve baseado na aquisição de todos os terrenos pela agência Meerstad. A agência será responsável por preparar os terrenos para a urbanização e os proprietários serão compensados pela valorização dos terrenos após a construção das novas infraestruturas. Mapa do parcelamento do solo durante a execução do projeto de land readjustment e suas respectivas fases de intervenção (2016 - 2020 - 2025). 6


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Benefícios para os proprietários: os proprietários tiveram o benefício do desenvolvimento de seus terrenos pelo poder público. Os terrenos terão tamanho mínimo de 450 m², quase o dobro das dimensões existentes aos arredores de Groningen. Além da valorização, que dobrou, do metro quadrado resultante do processo de urbanização, o plano trará melhor qualidade de vida para todos os moradores e melhores condições de preservação ambiental. Benefícios para o poder público: este plano permitirá executar de maneira controlada a alteração dos terrenos agrícolas para terrenos devidamente urbanizados, por meio da construção de 10 mil novas unidades para cerca de 20 mil habitantes. Custos e subsídio: o valor total investido para urbanizar a área ficou orçado em US$1.200.000.000,00. Este valor não considera os investimentos necessários para a construção das unidades habitacionais que ficou orçado em US$3.500.000.000,00. Eventuais conflitos do projeto: uma das desvantagens nesse projeto encontra-se no risco financeiro para a construção das áreas verdes e das primeiras áreas alagadiças para o lago, porque esses valores serão compensados apenas nas etapas finais de execução do projeto. Estes riscos foram responsáveis pelo impasse de dois anos no desenvolvimento do projeto. 6Perspectiva artística do projeto de land readjustment Groningen Meerstad.


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Redesenvolvimento urbano na Índia (Urban Redevelopment in India) Vinit Mukhija Muitos exemplos de inovação no relacionamento entre o poder público e a iniciativa privada existem atualmente na Índia e alguns já são operados por muitos anos. Entre eles, os projetos de land readjustment, ou “town planning schemes”, baseados nas práticas de planejamento trazidas pelos britânicos e introduzidas pela Lei de Planejamento Urbano de Bombai (atual Mumbai) de 1915; e os projetos de redesenvolvimento urbano, incluindo reurbanização de favelas e cortiços, recentemente introduzidos na cidade de Mumbai e baseados em projetos consorciados em que a iniciativa privada, unida a Cooperativas e Organizações Não Governamentais, recebe incentivos, como a doação de terrenos, para renovar setores urbanos existentes e degradados. No início da década de 1990, o Estado instituiu um novo programa para o redesenvolvimento de imóveis de locação, conhecidos como “chawls”. Para financiar a execução dos projetos, esse programa utiliza a valorização potencial da terra, além de unidades adicionais para a venda, como a criação de subsídios mistos para reassentar os residentes originais na mesma área. Os chawls densamente povoados, possuem múltiplas famílias e toaletes compartilhados entre as unidades habitacionais. Cada uma das unidades, distribuídas em edificações de até cinco andares, mede de seis a doze metros quadrados. A maioria dos chawls foi construída no centro de Mumbai, há mais de cem anos, e seus proprietários relutam em investir em melhorias para as unidades destruídas pela ação do tempo. O número delas é significativo: apesar de mais da metade da população urbana viver em favelas e cortiços, mais de vinte por cento das pessoas vive nesses imóveis para locação na Índia. Os projetos de redesenvolvimento consideram o aumento das densidades populacionais – número de unidades habitacionais – e construtivos – coeficiente de aproveitamento – nos terrenos previamente ocupados pelas locações. As unidades habitacionais adicionais são vendidas no mercado imobiliário e o lucro proveniente é usado para pagar a reconstrução das antigas unidades. Além disso, os agentes envolvidos – poder público, iniciativa privada, cooperativa de inquilinos – compartilharão os benefícios do desenvolvimento urbano. O contexto institucional de Mumbai apresentava alguns desafios inerentes para o redesenvolvimento. Por exemplo, ambos os inquilinos e proprietários reivindicavam o direito de propriedade, além dos lucros após a execução do projeto. Em alguns casos, sublocatários e


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informais reivindicavam seus direitos também. Outro problema foi o acesso ao financiamento para o desenvolvimento. Instituições formais deixaram o empreendedorismo imobiliário, dependente de maiores recursos, nas mãos do mercado informal. Críticos culpam o controle sobre o aluguel, por meio da Lei de Controle sobre as Taxas de Aluguel, também conhecida como a Lei de Aluguel de Bombai, imposta pelo governo, que congela os valores dos aluguéis pela falta de manutenção dos imóveis. Em contraposição, o governo autorizou a coleta de uma tarifa adicional aos proprietários para a manutenção de edificações selecionadas. Se as autoridades gastassem mais do que o coletado para reformar as unidades, esta diferença deveria ser paga pelos inquilinos. Essa lei, aprovada em 1976, possuía artigos controversos: permitia ao poder público adquirir edificações antigas e dilapidadas para o propósito da renovação urbana, pagando o equivalente a cem meses de aluguel para os proprietários, ao mesmo tempo em que permitia o controle dos valores dos aluguéis e isso impedia que fossem feitos os reparos nas mesmas edificações antigas e dilapidadas. O contexto regulatório passou por mudanças na década de 1980. Em 1987, o Estado designou um Comitê Gestor de Desenvolvimento em Bombai (o comitê D’Souza) para rever a legislação de desenvolvimento urbano na cidade. O comitê concluiu que os mais pobres eram os mais afetados pelas restrições de densidade e propôs índices de coeficiente de aproveitamento maiores para Bombai. Finalmente, em 1991, quando foram aprovadas as novas regulações para o desenvolvimento, adotou-se o coeficiente de aproveitamento igual a 2,0 para o redesenvolvimento de antigos imóveis de locação e igual a 2,5 para a reurbanização de favelas. A realização dos projetos de redesenvolvimento urbano foi possível, entre outros fatores, devido ao aumento constante dos valores do metro quadrado em Mumbai. O progresso, porém, tem sido lento. Mumbai possui mais de 19 mil imóveis declarados como antigos e dilapidados. A última pesquisa apontou que oitenta por cento precisa de reparos estruturais e quase dois mil precisam ser reconstruídos. Infelizmente, apenas 650 foram renovados. Empreendedores privados ou a Autoridade de Desenvolvimento Territorial e Habitacional de Maharastra (MHADA) gerenciam a maioria desses projetos. Em todos eles, os residentes originais foram beneficiados com unidades habitacionais novas ou reformadas, maiores em tamanho comparada às suas antigas unidades, mesmo sem sua participação no processo de desenvolvimento do projeto.


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Como mérito, os projetos de redesenvolvimento urbano revitalizam bairros e distritos, respondem à demanda habitacional por unidades habitacionais em uma mesma área, auxiliam os inquilinos a morarem em unidades novas ou reformadas e geram lucro para os empreendedores. Mas, diferentemente de projetos tradicionais de land readjustment, o programa para o redesenvolvimento de imóveis de locação não cria ou subsidia infraestrutura pública. Porém, como todo projeto de land readjustment, esta estratégia em Mumbai envolve a reestruturação de terrenos para alcançar determinados benefícios. Esse processo está mais relacionado à reestruturação dos fragmentados direitos sobre as propriedades do que à reestruturação de parcelas díspares de terrenos. Os empreendedores ou a agência de desenvolvimento precisam consolidar os direitos e os anseios de proprietários e inquilinos. Além disso, para evitar processos demorados, estes agentes precisam incluir tanto os detentores de direitos formais como também os informais. Essa situação ficou clara no estudo de caso apresentado a seguir, onde a Associação e Cooperativa Habitacional Sambhaji Nagar (SNCHS) decidiu incluir os inquilinos informais no processo de redesenvolvimento, pois eram eles que mais tinham disposição para paralisar o processo de acordo entre todos os agentes envolvidos. Na região metropolitana de Mumbai, outras agências de desenvolvimento tentaram executar projetos de land readjustment e redesenvolvimento urbano de maneira mais tradicional, como os exemplos do centro de Kalyan e do distrito de Oshiwara, porém com resultados menos expressivos. A SNCHS negociou com sucesso a transferência dos direitos de propriedade para os inquilinos devido à liderança de um político local. Outras agências estudadas não apresentaram tamanha habilidade de negociação ou proprietários ávidos por dispor de suas propriedades tão facilmente. A capacidade de liderança e a experiência política mostraram ser fatores predominantes para a bem-sucedida execução desse tipo de projeto. No campo do mercado imobiliário e financeiro, em que atrasos e desentendimentos significam prejuízos, resoluções rápidas têm grande demanda. Por fim, um importante caminho para suportar as cooperativas e seus esforços encontra-se em ampliar o acesso ao financiamento por intermédio de instituições formais, geralmente mais baratas e vantajosas do que as condições impostas pelas fontes informais, e mais efetivas para suportar projetos de redesenvolvimento urbano.


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Projeto de redesenvolvimento urbano Sambhaji Nagar, Índia (Urban Redevelopment Project Sambhaji Nagar, India) Local: bairro de Parel na cidade de Mumbai, estado de Maharashtra na Índia. Agente de implementação: poder público por iniciativa (municipalidade de Maharashtra) e parceria entre o poder público e o privado para execução, resultando na Associação e Cooperativa Habitacional Sambhaji Nagar (SNCHS). Área do projeto: 3.649,00 m² de terreno e 7.219,00 m² de área construída. Proprietários e inquilinos: uma família proprietária e 240 inquilinos (incluindo os informais). Período para o desenvolvimento do projeto: de 1986 a 1995. 1988: criação da Associação Sambhaji Nagar; 1990: a associação aprova o início do projeto e a contratação de escritório de arquitetura; 1991: inicia-se a negociação entre o poder público, os empreendedores e os possuidores de direitos; aprovação do plano financeiro e plano de execução do projeto; 1995: ofertas para empreendedores e construtoras; outorga do contrato. Período para a implementação do projeto: de 1995 a 1998. 1995: execução do plano de obras; 1996: 25 das 28 unidades à venda recebem propostas de compra; 1998: os antigos inquilinos e membros da associação ocupam as novas unidades; 2000: todas as unidades são comercializadas; emissão dos novos títulos de propriedade. 6Edificação pertencente ao complexo habitacional antes da execução do projeto de redesenvolvimento urbano.


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Sobre o projeto: os antigos edifícios com unidades de locação se encontram no bairro de Parel, na região central de Mumbai. O complexo habitacional contava com 199 unidades de locação, cada uma com uma família habitando apenas nove metros quadrados de cada unidade. Outras famílias viviam no complexo de maneira informal: sete delas em cabanas construídas nos espaços livres ao redor dos edifícios e duas delas vivendo embaixo das escadarias. Além disso, existiam 15 lojas em estruturas separadas do conjunto habitacional. Em 1988, os inquilinos aprovaram a criação da Associação Sambhaji Nagar, com o objetivo de executar o projeto de redesenvolvimento no antigo complexo. Após a contratação de um escritório de arquitetura, o governo aprovou uma nova legislação, aumentando o coeficiente de aproveitamento da cidade de Mumbai. Benefícios para os proprietários e os inquilinos: a antiga família proprietária estava cansada dos problemas com os inquilinos e das restrições de locação impostas pelo governo, concordando com a venda dos imóveis. Os antigos inquilinos tornaram-se os novos proprietários, que transformaram as antigas unidades em 227 unidades com 26 m² cada e 15 lojas no térreo. Projeto de redesenvolvimento urbano Sambhaji Nagar. 6


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Land readjustment na Indonésia (Indonesia Konsolidasi Tanah) Tomohiko Yoshida / Sundung Sitorus (projeto) A Indonésia apresenta problemas cívicos resultantes do rápido processo de urbanização e da demora ou ineficácia do sistema de registros fundiários no país. Nas últimas décadas, a Agência Nacional de Terras (ou BPN – Badan Pertanahan Nasional) tem sido a agência do governo federal que promove projetos de land readjustment rurais e urbanos no intuito de resolver esses impasses. A BPN, antes um órgão inserido no Ministério de Negócios Habitacionais e Autonomia Regional, tornou-se independente em 1994, com autonomia para realizar atividades como levantamento, pesquisas e registros fundiários, além de outros trabalhos relacionados, em conformidade com o Decreto Presidencial nº 26 de 1982. A JICA, em suporte a esta emancipação, passou a dar treinamento à equipe técnica da BPN, conduzindo o desenvolvimento de diversos projetos pilotos de land readjustment. O marco legal relacionado ao instrumento no país se chama Regulação da Agência Nacional de Terras nº 4 de 1991, ou Lei de Consolidação Fundiária. Antes da aprovação desse marco, o land readjustment era realizado em acordo com outras leis, tais como a Lei Agrária Básica nº 5 de 1960, a Lei nº 56 sobre as dimensões dos terrenos agrícolas de 1960, a Regulação Governamental nº 224 sobre a distribuição e a compensação fundiária de 1961 e o Decreto Presidencial nº 55 sobre os mecanismos de reforma agrária de 1980. Atualmente, a Lei de Consolidação Fundiária é complementada pela Lei Federal de Registro Fundiário nº 24 de 1997. Analisando a legislação em vigor, ela consiste das seguintes disposições: considerações iniciais e regulações relacionadas; capítulo 1 – regras gerais; capítulo 2 – objetivos e metas, taxa de contribuição, custos, determinação dos direitos de propriedade; e considerações finais. Sua composição em relação a outras legislações sobre o instrumento, por exemplo, como a japonesa, é menor, com menor número de artigos, porém sua estruturação é muito similar. Diversas disposições, entretanto, possuem suas próprias particularidades. Na Indonésia, apenas os proprietários têm direitos sobre o projeto de reajuste, os inquilinos não são elegíveis a participar. Os números de consenso para levar adiante estes projetos são maiores do que em outros países, 85,0% dos proprietários precisam concordar com todas as etapas para a execução da proposta. Essa porcentagem de consenso é bastante alta, possivelmente porque a BPN é a única agência de implementação dentro do país, tornando difícil a execução de projetos sem um alto número


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de proprietários interessados na iniciativa. Atualmente, a BPN coordena departamentos estaduais, municipais e outras agências durante a realização de projetos de land readjustment, ampliando ainda mais a necessidade de consenso pela falta de maiores condições de gerenciamento. O primeiro projeto de land readjustment da Indonésia foi conduzido em 1982, no distrito de Renon, na cidade de Denpasar, em Bali. A partir disso, após mais de 20 anos, o número de projetos realizados chega aos 300, em mais de 17 mil hectares. Em geral, as áreas de projeto ficaram em torno dos 60 hectares, com uma média de 360 pessoas detentoras de direitos de propriedade e 400 terrenos por projeto. Na Indonésia, projetos de land readjustment são realizados com o propósito de desenvolver terrenos para habitação e de regularizar as condições fundiárias, muitas vezes sem o acompanhamento do desenvolvimento conjunto de infraestruturas, feito de maneira desassociada. A justificativa dos atrasos observados, comparando o desenvolvimento dos terrenos com o das infraestruturas, deve-se ao fato de que a jurisdição da BPN recai apenas na promoção da regularização fundiária, limitando-se, assim, a desenvolver projetos sem a colaboração de outras agências (Onishi 1999). As categorias de projetos são divididas em quatro diferentes tipos: APBN ou aqueles subsidiados com recursos nacionais; APBD I ou aqueles subsidiados com recursos estaduais; APBD II ou aqueles subsidiados com recursos municipais; e SWADAYA ou aqueles autofinanciáveis com recursos do próprio projeto. Assim, como todos são executados pela BPN, pode-se considerar os três primeiros tipos de projetos como “com subsídios” e o último como “sem subsídio”. Uma característica interessante nos projetos de land readjustment na Indonésia está relacionada ao tamanho dos terrenos dentro de cada projeto: ou são muito pequenos ou, muito grandes. Além disso, o número de terrenos por proprietário diverge em quantidade: existem muitos donos com apenas um terreno em projetos sem subsídio, enquanto que existem outros que possuem mais de dois terrenos em projetos com subsídio. Estes fatores influenciam de maneira bastante arbitrária na taxa de contribuição para os projetos, pois os sem subsídios necessitam de maiores porcentagens de contribuição em comparação aos subsidiados. Em resumo, projetos sem subsídios possuem propriedades com menores dimensões e maior taxa de contribuição. Melhores condições, como menores taxas de contribuição e maiores recursos para ampliar o número de projetos subsidiados, seriam possíveis através de procedimentos compulsórios para promover a participação dos proprietários nos projetos. Menores porcentagens de adesão para


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aprovação e novas agências capazes de implementar projetos (outras além da BPN) podem aumentar os resultados do land readjustment na Indonésia. O governo precisa resolver o problema de como promover projetos de land readjustment sem subsídios em distritos que podem ter acrescido o valor do solo, em áreas urbanizadas. Além disso, em termos técnicos e financeiros, os projetos ainda são promovidos de maneira e padrões bastante básicos, encontrando alguns contratempos e problemas durante sua realização. Certamente, o instrumento chegou a um estágio no qual as pessoas conhecem o land readjustment, porém muitos problemas organizacionais e maior aprofundamento da técnica precisam ser de interesse do governo local. Além disso, outros problemas precisam de solução, como a conscientização sobre a importância de realizar as melhorias de infraestrutura consorciadas com o desenvolvimento fundiário, medida fundamental para o sucesso de projetos de land readjustment. Isso trará melhores resultados, fortalecendo a confiança dos proprietários relutantes em participar deste tipo de projeto, principalmente em áreas com líderes comunitários menos engajados.

5Imagens do bairro de Palangkaraya antes da execução do projeto de land readjustment .


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Projeto de land readjustment Palangkaraya, Indonésia (Konsolidasi Tanah Palangkaraya, Indonesia) Local: bairro de Palangka na cidade de Palangkaraya, estado Kalimantan Tengah na Indonésia. Agente de implementação: poder público (município de Palangkaraya em conjunto com a Agência Nacional de Terras da Indonésia). Área do projeto: 35,73 hectares. Proprietários e inquilinos: 352 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1989 a 1992. 1989 - 1990: preparação do projeto; seleção do local determinado pelo Chefe nível II do Governo de Palangkaraya; levantamento do inventário dos imóveis e da situação das condições de direitos; 1991: processo de acordo entre os proprietários; 1992: levantamento e inspeção das condições geográficas; desenvolvimento do plano diretor; plano do replotting fundiário; plano financeiro de execução do projeto; plenárias e reuniões de acordo entre os proprietários. Imagem aérea do projeto de land readjustment Palangkaraya durante sua execução em 2004. 6


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Período para a implementação do projeto: de 2003 a 2009. 2003 - 2008: execução do plano de obras do projeto; 2009: emissão dos novos títulos de propriedade; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: esse projeto na zona oeste de Kalimantan contempla a transição de terrenos agrícolas para urbanos, controlando a transformação – até então desarticulada – com a infraestrutura proposta pelo plano diretor do município. Mesmo com a imposição contrária de alguns proprietários ao projeto, a Agência Nacional de Terras conseguiu a anuência de 85% dos participantes para a aprovação e a execução da proposta. Nesse projeto, a infraestrutura foi construída com atraso em relação ao desenvolvimento dos terrenos urbanizados, fator negativo para a venda dos terrenos-reserva, capazes de viabilizar a continuidade e a realização do projeto, que teve de ser paralisado diversas vezes. A Agência Nacional de Terras precisou intervir várias vezes junto a líderes comunitários para que os proprietários da área de projeto não desistissem da execução do projeto. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com 8,0% em área para a constituição de sistema viário e terrenos-reserva. A quantidade total de área para terreno-reserva disponibilizado para a venda será de 25.000,00 m². Benefícios para os proprietários: eles receberam lotes urbanizados com acesso ao novo sistema viário, por meio de incentivo do poder público que inicialmente subsidiou a intervenção. Benefícios para o poder público: o projeto foi benéfico para o poder público por compartilhar os encargos financeiros com todos os proprietários do projeto para a urbanização dos terrenos na tentativa de conter a proliferação de áreas de favelas. Custos e subsídio: o empreendimento foi todo subsidiado pelo poder público e o valor total para a implementação do projeto não foi fornecido. Porém, sabe-se que o poder público concedeu um subsídio inicial de US$ 33.000,00 para o início do projeto. Eventuais conflitos do projeto: a organização dos participantes não aconteceu conforme o esperado, visto que muitos deles ao longo do processo se desinteressaram ou desistiram, e outros começaram a desenvolver seus terrenos de maneira individual, tentando fazer algo diferente do plano. Como resultado, o poder público teve de intervir para manter o andamento do projeto, caso contrário as atividades teriam sido canceladas e a Agência Nacional de Terras seria responsabilizada por eventuais prejuízos.


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Mapa do parcelamento do solo antes da execução do projeto de land readjustment . 6

Projeto de land readjustment Palangkaraya. 6

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Por que o land readjustment nas antigas colônias britânicas, mas não no Reino Unido?

Robert Home Enquanto a técnica do land readjustment é amplamente utilizada pelo mundo, ela é virtualmente desconhecida no Reino Unido. Isso pode parecer curioso, ao considerarmos a importância internacional do planejamento urbano britânico desde o movimento das “cidades-jardim” no início do século XX e o posterior programa de “novas-cidades” (Ward 2000). A seguir, será discutido por que o land readjustment não encontrou seu caminho na caixa-de-ferramentas do planejamento britânico e por que foi adotado com sucesso em algumas das colônias britânicas na primeira metade do século XX. História de uma ausência A primeira legislação britânica de planejamento urbano foi aprovada em 1909 e o Instituto de Planejamento Urbano da Grã-Bretanha, na época, ativamente debateu em reuniões várias técnicas de planejamento. Entre elas, o “Lex Adickes” e o land readjustment, que nunca foi incorporado na legislação britânica. Um membro do Instituto comentou, em uma de suas primeiras reuniões, durante o debate sobre a inovadora Lei de Planejamento Urbano de Bombai de 1915, que, “com o objetivo do Sistema de Planejamento Urbano – como era conhecido o land readjustment no contexto da aprovação da lei de Bombai – de beneficiar a comunidade, a propriedade privada do solo passaria a ser de plástico nas mãos dos planejadores urbanos”. Ele continuou a lamentar “a rigidez do direito de propriedade neste país (Reino Unido), é uma rigidez que provisões em lei alguma encontrariam condições de superar” (Mirams 1919-20). Na Grã-Bretanha, com sua tradição em grandes e sempre aristocráticos desenvolvimentos patrimoniais (Olsen 1982), o empreendedor privado estava menos preocupado com a situação fragmentada da propriedade, apropriando-se dos lucros e assumindo os custos da infraestrutura dentro de uma forte estrutura regulatória. Isso dispensou a utilização da técnica do land readjustment. As estruturas de planejamento das autoridades locais eram regulamentadas pelas denominadas Cláusulas de Modelo (com origens nas regulações de aquisição compulsória do século XIX). A cláusula 42 permitia que autoridades trocassem terrenos ou ajustassem seus limites, por meio de


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acordo entre as partes, com a transferência de escrituras na base da entrega imediata delas; porém, a cláusula foi raramente invocada. A provisão de infraestrutura, como a construção de estradas e sistemas de drenagem, seria construída pela autoridade local ou pelo empreendedor, dentro da Lei de Saúde Pública de 1875 e da Lei de Construção de Vias Privadas de 1892, sendo que a autoridade local poderia empreender a obra e recuperar seus custos. O compartilhamento de melhorias entre o proprietário de terra e a autoridade pública era um assunto bastante sensível. A lei de 1909 e as subsequentes versões dela incluíram cláusulas para que a autoridade local pudesse recuperar parte do valor criado pelas melhorias conferido pela estrutura de planejamento. Todavia, seu poder foi limitado por restrições e molestado por diversas disputas de valores – um problema pelo qual o Tribunal de Terras foi criado mais tarde, para arbitrar, resultando em apenas três casos nos quais as melhorias foram coletadas, no período entre 1909 a 1939. Um livro de 1920 para empreendedores de propriedade privada (Howkins 1926) encerrou um de seus capítulos com a seguinte advertência sobre a taxação: Enquanto os ocupados com estruturas de planejamento têm permissão para dar continuidade a seus esforços com os riscos normais de mercado, a demanda da população por habitação será respondida. Mas a ameaça de confisco, taxação especial ou outros fatores nos direciona a um sentimento de insegurança, que inevitavelmente levará o desenvolvimento pelo empreendedor privado à paralisação. Isto não surgirá pela falta de compradores, nem pela falta de empreendimentos da parte dos construtores, mas surgirá por causa daqueles, para quem eles procuram assistência financeira, que estariam pouco dispostos a arriscar seu dinheiro naquilo que se tornaria um jogo de azar. (Howkins 1926).

Em um período crucial (1905-20) quando a legislação de planejamento urbano na Inglaterra era recente e inovadora, as associações de land readjustment da Alemanha tornaram-se suspeitas por causa da guerra entre os dois países entre 1914 e 1918. O interesse na abordagem do planejamento alemão diminuiu à medida que a hostilidade cresceu entre os dois países, e o modelo alemão de forte poder concedido às municipalidades sobre a terra estava associado na Inglaterra com a autocracia e o “Germanismo Burocrático” (Harrison 1991). Na Grã-Bretanha, onde as propriedades privadas de terra eram maiores, os empreendedores tinham a expectativa de pagar pela infraestrutura e os valores da terra foram depreciados nos anos durante e após a Primeira Guerra Mundial. O land readjustment parecia oferecer poucas vantagens e a aquisição compulsória era o método preferido para a combinação de terras. Por exemplo, quando o desenvolvimento habitacional no amplo subúrbio de Becontree foi planejado


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após 1919, proprietários de terra, inseridos em um mercado de terras estagnado, estavam satisfeitos com a compensação paga pela aquisição compulsória pelo Conselho do Município de Londres, pois os assuntos sobre ajuste de limites e propriedades fragmentadas de terra não tiveram grande importância (Home 1997b). Mais tarde, quando a nacionalização dos direitos de desenvolvimento foi considerada na Segunda Guerra Mundial, o relatório “Uthwatt sobre Melhorias” retornou brevemente ao land readjustment, referindo-se como uma possibilidade de “unificação de estruturas consorciadas privadas” (Uthwatt 1942), mas dispensou-o com as seguintes palavras: A resposta lógica para as propostas de consórcio entre propriedades está teoricamente embasada nos esforços, por meio da unificação, para eliminar os requisitos de compensação que surgem da movimentação e troca de valores, porém, aqueles como troca estão na escala nacional, então o consórcio de propriedades precisa resultar em grupo único, incluindo a totalidade das terras do país. Em uma palavra, o único sistema viável de consórcio é a nacionalização, o qual é consórcio projetado resultante para se evitar. (Uthwatt 1942).

A subsequente Lei de Planejamento Urbano de 1947, seguindo a recomendação de Uthwatt, nacionalizou os direitos de desenvolvimento por meio da requisição de permissão de planejamento, compensando proprietários de terra pela perda de direitos estabelecidos, e introduzindo a carga de desenvolvimento por melhorias e mudança de uso. Estabeleceu-se taxa de 100% sobre o valor, provando, sem surpresa, ter vida curta (Hall 1965). Por volta de sessenta anos mais tarde, o governo da Inglaterra e o país de Gales retomaram o assunto dos processos de aquisição de terras na Lei de Aquisição Compulsória e Planejamento em 2004. Essa lei foi precedida por uma análise reivindicando que ela seria “fundamental”, mas que realizou poucas investigações sobre outros métodos possíveis de combinação de terrenos, apesar de algumas tentativas naquele momento terem promovido o “consórcio fundiário assistido”. Assim, a ausência do land readjustment na lei de planejamento britânica está aparentemente confirmada. Maior sucesso nas colônias britânicas Embora a legislação sobre o planejamento urbano britânico nunca tenha incorporado cláusulas sobre o land readjustment, a história é diferente em algumas de suas colônias além-mar, onde pioneiros planejadores urbanos estavam ativamente experimentando com sua nova caixade-ferramentas as técnicas aprendidas no começo do século XX (Home 1997a, 2007b). O planejamento urbano, promovido com fervor evangélico por Patrick Geddes na Índia entre 1914


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a 1920, ofereceu aos administradores das colônias instrumentos modernos de gerenciamento social, que poderiam ajudar a preservar o imperialismo britânico em tempos de guerra mundial e crescente nacionalismo local. O land readjustment foi introduzido na Índia Britânica pela Lei de Planejamento Urbano de Bombai de 1915. As presidências de Bombai, Calcutta e Madras formavam as bases do poder imperial britânico na Índia, com forte estilo paternalista de governo, seguindo a legislação fundiária e a administração municipal derivadas da Grã-Bretanha. Bombai, com forte tradição intervencionista do governo, apenas alguns anos após a Lei Britânica de Planejamento Urbano de 1909 ter sido aprovada, tentou alcançar melhores resultados com sua Lei de Planejamento Urbano de 1915. O consórcio por melhorias foi criado previamente em Bombai e Calcutta, com extensos poderes para adquirir compulsoriamente propriedades e empreender melhorias nas infraestruturas. Mas tornou-se impopular entre os proprietários, porque eram pouco ou nada ressarcidos pela perda de propriedade, sendo negados a eles os retornos financeiros do desenvolvimento urbano. Os consórcios seguiam a prática de adquirir mais terrenos que o necessário para o sistema viário, de modo que “eles” (não os antigos proprietários) beneficiavam-se do valor das melhorias e do desenvolvimento da propriedade, ocasionado pelas construções das novas ruas. A nova lei de Bombai foi assunto do trabalho apresentado, em 1920, por A. E. Mirams (agrimensor consultor do governo de Bombai) para o Instituto de Planejamento Urbano da Grã-Bretanha em Londres (Mirams 1923-24). Ele chamou a lei de “tentativa sincera de apoderar em uma única medida tudo que havia de melhor em todas as outras leis existentes de planejamento urbano” e suas cláusulas baseavam-se principalmente na lei britânica de 1909, mas também na lei alemã Lex Adickes. A lei de Bombai permitiu que as autoridades locais realizassem o land readjustment e, especificamente, a seção 12 da lei possibilitou que lotes fossem combinados e reconstituídos com o consentimento dos proprietários de terra, por meio de um “espírito de verdadeira cooperação”. Ocorreria da seguinte maneira: “dois ou mais lotes originais, cada um do qual estiver retido em propriedade com caráter de multiplicidade ou propriedade compartilhada deverá, daqui por diante, com ou sem alteração de perímetro, ficar assegurado em comum propriedade como lote reconstituído” (Lei de Bombai, Seção 12) Mirams considerou as cláusulas financeiras, nas seções 16 à 28 da lei, de “considerável interesse, já que tratavam do problema do pagamento pela execução de melhorias representando para o país


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uma base inteiramente inovadora”. Ainda assim, a presidência de Bombai já operava com um sistema de cobrança para infraestrutura, por meio do qual novas rodovias e ferrovias eram pagas por uma taxa especial imposta aos distritos a serem servidos. Municipalidades indianas estavam explorando como se beneficiar do aumento dos valores das propriedades, percebendo que em “muitas cidades europeias, notavelmente na Alemanha, incrementos urbanos em valores eram zelosamente considerados pelas municipalidades e, como de costume, eles eram intitulados como troca destes incrementos” (Shah e Bahadurji 1925). A lei de Bombai aborda o “incremento” (ou valor das melhorias) do desenvolvimento da terra como: o valor final da terra necessário para o cálculo do projeto, os custos de implementação, o valor da porção de terra utilizada para estradas, e outras infraestruturas, e a taxa de equilíbrio de 50,0% a serem deduzidas (divisão de 50:50 entre os proprietários de terra e a autoridade local). Os diversos valores eram determinados por árbitro apontado pelo governo. Mirams declarou que essa lei: Auxilia na distribuição dos custos dos projetos de desenvolvimento sobre as terras e suas melhorias permitem assim, ao mesmo tempo, uma margem justa do lucro para os proprietários de terra, que como regra têm feito absolutamente nada para melhorar o valor de sua propriedade. Da mesma forma, a lei traz para o mercado grande porções de terra as quais, sem ações de cooperação, iriam por incontáveis anos permanecer terrenos agrícolas. Deste modo, grande parcela da comunidade se tornará capaz de obter terrenos a um preço razoável. (Mirams 1923-24).

Após alguns anos de aplicação da lei de 1915, o land readjustment estava presente em mais de sessenta projetos em Bombai. O presidente do Instituto de Planejamento Urbano da GrãBretanha, G. L. Pepler, comentando sobre o trabalho de Miriam, afirmou que a lei de Bombai “parecia mais vigorosa e direta” que a lei britânica de 1909, e um de seus membros, Joshua Schoefield, propôs um voto de agradecimento a Mirams, considerando que: “seria um grande benefício para as autoridades locais deste país se tivéssemos tamanho poder para redistribuir as propriedades para o propósito de projeto.” Mais tarde, Mirams aclamou que a lei de Bombai “conferia mais benefícios à comunidade que a Lei de Planejamento Urbano Britânica”, e que o sistema proposto pela Lex Adickes sobre consórcio e redistribuição fundiário era “uma coisa magnífica, e os proprietários estavam muito satisfeitos com seus resultados”.


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Enquanto isso, um dos principais urbanistas da época, W. R. Davidge, que havia sido consultor das presidências de Bombai e Mandras, descobriu que o land readjustment para o desenvolvimento habitacional nos subúrbios de Bombai estava contribuindo para aumentar o valor da terra em quatro vezes no período de dez anos: “Tão popular tornou-se o sistema de planejamento urbano no subúrbio como maneira de recuperar os lucros, que foi necessário que o governo controlasse e adquirisse praticamente todas as áreas remanescentes para a construção dentro dos subúrbios” (Davidge 1923-24). A presidência de Madras seguiu o exemplo de Bombai em sua Lei de Planejamento Urbano de 1920, sobre o qual Davidge escreveu que as cláusulas sobre o land readjustment em Bombai “baseadas na conhecida Lex Adickes, tinham grande valor, e sua extensão para a presidência de Madras seria observada como muito interesse” (Davidge 1921). O land readjustment foi aplicado com escalas variadas de sucesso em outras colônias britânicas. Notavelmente, lembra-se o Mandato Britânico na Palestina, que incorporou cláusulas em seus decretos de planejamento, as quais sobreviveram no pós-1948 Estado de Israel. Na África Sub-Saariana, a provisão de terra era abundante, e os administradores das colônias podiam tomar as terras que quisessem por meio de negociações com as comunidades tribais, com pouca ou nenhuma compensação financeira. No entanto, quando a legislação de planejamento urbano foi aprovada para as colônias, na década de 1930, por meio da política do Escritório Colonial, o land readjustment não foi incluído como componente da caixa-de-ferramentas do planejador urbano, e os juristas que desenvolveram a legislação provavelmente não conheciam as aplicações ou até mesmo a existência dela (Home 1993). Conclusões Essa história não acabou. O governo do Reino Unido procura aumentar os níveis de construção para habitação e existe um grande déficit de terrenos para o desenvolvimento desta atividade, portanto o potencial do land readjustment pode ser novamente avaliado. Nos dias atuais promovese também a discussão de problemas de desenvolvimento urbano na África, e a Rede Mundial de Instrumentos Fundiários (Global Land Tools Network) criado pelas Nações Unidas (UN-Habitat) está promovendo um debate do qual o conceito pode ser transferido para essas novas jurisdições.


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Land readjustment em Israel (Haloka Hadasha Yisrael / Yisraeli Repartzellazia) Rassem Khamaisi O método do land readjustment em Israel se caracteriza por várias questões, sendo as mais delicadas aquelas entre o Estado e seus cidadãos árabes-palestinos. Os conflitos relacionados ao controle sobre o território entre Estado, proprietários, inquilinos de longa data e empreendedores têm impacto direto sobre o estado do land readjustment no país. Além disso, mudanças funcionais, estruturais, econômicas e culturais na sociedade israelense resultam em forte necessidade de renovação e aprimoramento das técnicas de gestão fundiária. A história do land readjustment em Israel não é recente, data dos tempos em que os britânicos governavam a Palestina. A administração do Mandato Britânico no território incluiu artigos na Lei de Planejamento Urbano em 1921, concedendo ao poder público o direito de utilizar o método, chamado de reparcelamento (“repartzellazia”) ou novas divisões (“halukah hadasha”). A partir desses artigos, a aprovação de licenças urbanísticas dentro de zonas pré-estabelecidas seria concedida apenas mediante a aprovação de projetos de land readjustment. Eles poderiam ser elaborados pelo poder público e ser aplicados compulsoriamente aos proprietários e aos inquilinos das áreas nas quais seria usado o método. A maioria dos projetos de reparcelamento em terrenos privados nas comunidades árabes data desse período. Porém, a estrutura fundiária tornou-se o maior obstáculo para as comunidades árabes se desenvolverem de acordo com as legislações e as normas de planejamento mais atuais. As razões desses obstáculos são: a. Processo de sucessão e herança: as famílias árabes possuem geralmente grande número de pessoas e uma tradição de dividir suas propriedades informalmente, sem registro cadastral, entre seus descendentes. Atualmente, após três ou quatro gerações consecutivas, como resultado desse processo de subdivisões e consequentes confusões relacionadas à correta delimitação das propriedades, muitas sem registros, aumentou o número de disputas internas entre familiares e agregados. Nenhuma dessas subdivisões foi feita considerando-se as necessidades de equipamentos públicos, tais como ruas, escolas e espaços públicos. Nas parcelas de terra onde o direito e os limites da propriedade são conhecidos, geralmente existem tantos herdeiros – por exemplo, o avô paterno com a propriedade de 2.000 metros quadrados que possui 50 netos – que seu reparcelamento criará lotes muitos pequenos para tornar qualquer iniciativa


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de desenvolvimento atrativa. b. Apropriação do governo israelense: o poder público assumiu os direitos sobre as propriedades abandonadas pelos proprietários árabes que deixaram suas aldeias após o início da guerra árabe-israelense em 1948. Alguns proprietários árabes venderam suas propriedades para a Autoridade Israelense de Terras, ou as tiveram confiscadas por vários motivos. Depois disso, o governo iniciou a prática de partilhar direitos de alguns destes terrenos com as comunidades árabes, porém sem divisões formalizadas, registradas e acordos claros entre os proprietários, os ocupantes e o governo. Esta atitude desencadeou uma série de conflitos, principalmente porque, em muitos casos, o próprio governo aprovou as ocupações ou as subdivisões informais. Desde a última década, árabes-palestinos têm solicitado o desenvolvimento de equipamentos públicos nos terrenos de propriedade do governo. Como resposta, a Autoridade Israelense de Terras tem insistido que terras para uso público devem ser igualmente desapropriadas dos proprietários privados e do governo, gerando enormes oposições. Em Israel, cerca de 90,0% do território é de domínio público, ou seja, pertence ao Estado, ao Fundo Nacional Judaico, ou à Autoridade de Desenvolvimento Israelense. “Propriedade de bens imobiliários” normalmente significa posse temporária de direitos concedidos pela Autoridade Israelense de Terras por um período de 49 ou 98 anos. Algumas destas terras ainda são alvos de conflitos entre o Estado e os proprietários árabes originais, especialmente na parte sul do país (região de Negev). Recentemente, o poder público organizou uma comissão para avaliar os impasses nacionais relativos à terra e para propor adaptações ao instrumento do land readjustment na tentativa de utilizá-lo mais eficientemente. Dessa maneira, torna-se evidente que a incapacidade de reduzir as disparidades socioeconômicas está enfraquecendo a própria estrutura da sociedade israelense. A crescente disparidade entre as duas comunidades, a israelense e a palestina, continua a agravar as tensões já existentes, tornando-se crucial encontrar oportunidades para acabar com este círculo vicioso: enquanto um lado encontra-se em condições privilegiadas, em constante desenvolvimento de padrões urbanísticos, o outro se encontra sem condições ou caminhos para obtê-lo. Para tanto, é necessário haver esforços no sentido de minimizar as barreiras ideológicas e integrar a população, criando parcerias igualitárias para a sociedade israelense. Embora a necessidade de desenvolvimento e construção de infraestrutura pública esteja entre as prioritárias na agenda das comunidades árabes, devido aos problemas listados acima, cerca de


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um terço das terras em que elas vivem está condenada para o desenvolvimento se permanecer nas mesmas condições. Os novos planos estatutários para estas localidades frequentemente consideram a adição de novos territórios para a expansão das comunidades além de suas fronteiras. Para ampliar o entendimento acerca dos conflitos referentes ao processo de reparcelamento e à barreira para o desenvolvimento, serão descritas duas localidades dentro das comunidades árabes que seriam essenciais como o estudo de caso ou projetos pilotos, no norte de Israel: a. Dir Hana, população de 8 mil habitantes: é palco da disputa entre duas famílias, a Hussein e a Khateb, o que afeta diretamente o planejamento e a gestão do território para a construção de equipamentos públicos como ruas, áreas verdes e escolas. Os urbanistas da municipalidade e o conselho local querem convencer os proprietários e a comunidade, por meio do diálogo, a implementar projetos de land readjustment, por meio de transparência no processo e com a tentativa de criar propostas de caráter igualitário. Nesse sentido, envolver a comunidade local seria uma das principais ferramentas não apenas para iniciar o land readjustment, mas para, gradativamente, mudar as atitudes das novas gerações no processo de contribuição para o desenvolvimento urbano, contrariamente aos contratos obscuros que ocorreram até o momento. b. Yanuach Jat, população de 3,5 mil habitantes: é uma comunidade composta por dois vilarejos, surgida em 1992 e localizada na Galiléia. O ministério do desenvolvimento de Israel iniciou o plano diretor 2002-2006 para a região, o qual consiste majoritariamente em relocar terras para ruas, avenidas e equipamentos públicos. Dadas as restrições orçamentárias, alcançar os resultados estabelecidos pelo plano não será possível sem a utilização do land readjustment. Os representantes comunitários recusam-se a aceitar o uso do método, enquanto que urbanistas locais esforçam-se para iniciá-los, criando grande discussão e disputas nas comunidades. Ficam assim, por fim, esclarecidos os conflitos e os esforços entre proprietários, representantes comunitários, planejadores urbanos e agências governamentais para desenvolver projetos através do land readjustment nas comunidades árabes. Nesse sentido, o land readjustment em Israel precisa ser idealizado como uma ferramenta não para criar mais conflitos, mas para resolver disputas, principalmente entre os proprietários privados e o poder público. O land readjustment precisa ser aprofundado e atualizado, porque atualmente funciona como obstáculo entre os setores judaicos e como limitação entre os setores árabes.


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Projeto de land readjustment Schnin, Israel (Haloka Hadasha Schnin, Yisrael) Local: zona leste da cidade de Schnin Arab, região de Galiléia, em Israel. Agente de implementação: poder público (municipalidade de Schnin e comitê de planejamento local). Área do projeto: 54,65 hectares. Proprietários e inquilinos: 700 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 2001 a 2003. 2001-2003: processo de desenvolvimento do zoneamento; levantamento dos cadastros fundiários e inspeção das condições geográficas; anúncio público do projeto; término do estudo de viabilidade, plano financeiro e plano de execução do projeto. Período para a implementação do projeto: de 2003 a 2012. 2003-2006: execução do plano de obras (construção dos novos limites das propriedades, delimitação das novas avenidas, parques e outros equipamentos públicos); 2006 - 2009: término das obras; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto Schnin, como muitos outros em Israel, é caracterizado pelos fortes conflitos acerca dos títulos de propriedade. A cada nova geração, os terrenos são reparcelados e distribuídos irregularmente aos seus novos descendentes. Após a aprovação do projeto e do novo zoneamento para a área, houve enormes esforços para efetuar o levantamento cadastral das propriedades e iniciar o processo de reparcelamento dessas propriedades. Durante a execução do projeto, os preços começaram a aumentar muito rapidamente devido à instalação de novas infraestruturas e devido ao processo de autoconstrução de novas unidades habitacionais pelos próprios proprietários. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram em 33,0% em área para constituição de espaços públicos. Não houve contribuição para a constituição de terrenos-reserva porque o projeto esteve baseado na compensação pela valorização dos terrenos após a construção das novas infraestruturas. Portanto, a contribuição foi feita para pagar essa valorização. Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada no bairro. Além disso, o valor do terreno sofreu uma rápida valorização de 400,0% após a execução do projeto, com títulos de propriedade devidamente


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organizados e com proporções aptas a receberem as novas habitações. Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada a alteração dos terrenos agrícolas fragmentados e com títulos de propriedade duvidosos para terrenos devidamente urbanizados. Houve um aumento em áreas públicas de 33,0% da área total do projeto pela conversão de terrenos privados em novas ruas, parques e áreas verdes. Custos e subsídio: O valor total investido para transformar terrenos agrícolas em urbanizados ficou orçado em US$ 120.000,00. Esse valor não considera os investimentos necessários para a construção das habitações nem as obras públicas. O projeto foi completamente financiado com recursos oriundos da municipalidade de Schnin e do comitê de planejamento local. Eventuais conflitos do projeto: muitos proprietários, após o processo de reajuste, receberão terrenos menores dos que os permitidos para construir de acordo com a legislação israelense. Isso fará com que esses proprietários tenham que se unir a outros e amalgamar suas propriedades para obter a permissão de construir. Criou-se, então, enorme oposição de alguns proprietários durante o processo de elaboração do projeto. Além disso, após a execução do projeto, os valores indicados pelo estudo de viabilidade referente à valorização das propriedades foram diferentes daqueles efetivamente encontrados após a realização do projeto. 6Localização do projeto de land readjustment no município de Schnin, em Israel.


35 Obs. Mapa do parcelamento do solo, antes, durante e após a execução do projeto de land readjustment Schnin.


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Land readjustment no Nepal (Nepal Jagga Ekikaran) Sunil Babu Shrestha e Kirti Kusum Joshi Nepal é um dos países menos urbanizados do mundo, com apenas 14,0% de sua população morando em cidades e, atualmente, apresenta 6,0% de taxa de crescimento da urbanização, sendo uma das mais elevadas do sul da Ásia. Entretanto, esse crescimento urbano vem acontecendo de forma essencialmente não planejada, com provisão inadequada de serviços de infraestrutura e muitas construções erguidas a esmo. É uma tendência comum entre os proprietários construírem primeiramente suas casas sem infraestrutura básica e depois procurarem instalar os serviços. A maioria dos terrenos residenciais apresenta formas, tamanhos e orientações irregulares, tornando difícil desenvolver de maneira planejada seus bairros. Confrontado com a necessidade de guiar o desenvolvimento e prover habitação em terrenos apropriados, o governo do Nepal promulgou a Lei de Desenvolvimento Urbano de 1988, com emendas em 1991, 1992 e 1997. Havia o propósito de reduzir o crescimento desordenado e a subdivisão irregular da terra, e de servir a cidade com infraestrutura de qualidade. Essa lei pôde autorizar o comitê de desenvolvimento urbano a empreender três ações: o Desenvolvimento Fundiário Guiado (GLD), o Sítio e Serviços (S&S) e o Land Readjustment (LR). O governo iniciou projetos de desenvolvimento fundiário guiado (GLD) em 1998 para melhorar as infraestruturas existentes reorganizando o sistema viário dentro e no entorno imediato das áreas de projeto. Por meio do programa de sítio e serviços (S&S), primeiramente utilizado na década de 70, o governo adquiriu terrenos vagos e baratos com desapropriações, ou disponibilizou terrenos públicos, para desenvolvê-los adicionando serviços de infraestrutura necessária. No entanto, devido ao considerável aumento dos preços da terra, tornando difícil adquiri-las, e ao descontentamento público com projetos de sítio e serviços (S&S) por causa dos deslocamentos dos proprietários originais de suas propriedades, as iniciativas se tornaram impopulares. Como consequência, o conceito de land readjustment popularizou-se e, desde os anos 80, diversos projetos foram executados no Nepal. Atualmente, land readjustment é a única forma do governo produzir terrenos urbanizados. O principal objetivo dos projetos de land readjustment no país é promover desenvolvimento urbano planejado e prover terrenos necessários para os assentamentos humanos, com a elaboração


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de projetos ambientalmente corretos e o aumento do acesso do grande público à terra. Para isso, as parcerias entre proprietários, setores privados, poder público e organizações comunitárias devem ser encorajadas. O artigo 12.1.2 da Lei de Desenvolvimento Urbano de 1998 afirma que o land readjustment pode ser iniciado em qualquer perímetro destinado ao desenvolvimento com o consentimento mínimo de 75% dos proprietários (KKBS 2000). A mesma lei concedeu poderes aos comitês de desenvolvimento urbano, formados pelo ministério de planejamento e obras públicas, em diferentes sedes distritais, centros urbanos e assentamentos emergentes, a iniciar projetos de land readjustment. Anteriormente, esses comitês de implementação de projetos eram constituídos em acordo com a Lei de Implementação de Projetos Urbanos de 1973, posteriormente revogada e substituída pela Lei de Desenvolvimento Urbano de 1988. Além disso, a Lei da Autonomia Local de 1999 concedeu poderes às municipalidades a assumir as mesmas responsabilidades dos comitês de implementação de projetos dentro de jurisdições específicas. Portanto, as municipalidades também podem constituir agências promotoras para executar projetos de land readjustment, a exemplo do projeto Nayabazaar, implementado pelo departamento de infraestrutura do município de Kathmandu. No entanto, as municipalidades no Nepal não se tornaram suficientemente fortes e capazes de substituir os comitês conforme vislumbrado pela Lei da Autonomia Local de 1999. A técnica do land readjustment foi introduzida no Nepal em 1975, através do projeto Chipledhunga (13,5 hectares) em Pokhara, uma cidade turística, seguindo princípios do consórcio fundiário ou “land pooling” (Acharya 1988). No entanto, levou-se mais de uma década para o lançamento do primeiro projeto oficial do país, o projeto Gongabu (14,3 hectares), iniciado em 1988 como projeto piloto. Desde então, diversos projetos foram realizados nacionalmente, principalmente no vale de Kathmandu. Até o ano de 2000, um total de 12 projetos, abrangendo 246,76 hectares, foram concluídos (Joshi e Sangachhen 2000). Uma das conquistas mais importantes do projeto Gongabu foi a aceitação pública de projetos de land readjustment no Nepal (Joshi 1995, 2002). Ele não está apenas limitado à provisão de terrenos urbanizados para o uso residencial, mas está sendo utilizado para viabilizar a construção de ruas ou a ampliação de avenidas. Tem-se como exemplo o projeto do anel viário de Kathmandu, no qual a técnica está produzindo terras necessárias para sua execução. Em resumo, o land readjustment está substituindo, com sucesso e sutilmente, o método impopular de aquisição de terras por meio da


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desapropriação. Felizmente, não apenas os governos local e central reconheceram a importância do método, mas os setores privados começaram a mobilizar-se para promover o desenvolvimento urbano seguindo os princípios do land readjustment. Após a decisão oficial de iniciar projetos de land readjustment, um comitê de administração é constituído sob a presidência do prefeito ou do presidente do comitê de desenvolvimento, com representantes dos proprietários e do governo central. Um anúncio público é emitido e os títulos de propriedade são coletados. Consultores são contratados para preparar os mapas topográficos que serão utilizados para o levantamento cadastral, geralmente realizado pelo departamento de cadastros do governo do Nepal. Depois disso, o comitê de proprietários é formado para analisar as condições das propriedades dentro da área do projeto. O processo de elaboração e execução é discutido entre os envolvidos e, quando necessário, processos alternativos são adotados. Com a aprovação do plano pelo comitê de proprietários, é determinada e aprovada a taxa de contribuição com a coleta da assinatura de todos. Como sequência, os promotores do projeto iniciam o trabalho de campo para a demarcação do novo sistema viário e das novas delimitações fundiárias. Correções são feitas em paralelo através de vistorias prévias e anteriores ao processo de transferência dos terrenos readequados. Se qualquer disputa ou controvérsia surgir entre os proprietários, a resolução é feita por meio do diálogo e de acordo no próprio local, com a presença das partes envolvidas. Mediante aprovação do governo, iniciam-se as obras, seguindo a demarcação do novo sistema viário, da redistribuição dos terrenos e da venda dos terrenos-reserva. A produção de terrenos urbanizados e espaços públicos, sem confrontar o bem-estar dos proprietários originais, deu origem a ideias inovadoras, tais como a provisão de terras para os pobres e os desabrigados por meio do land readjustment. Do mesmo modo, observando-se a necessidade atual de inclusão social e assentamentos mistos, recomenda-se reformular o desenho institucional convencional do land readjustment e substituí-lo por uma abordagem holística (Shrestha e Taniguchi 2003). Esta abordagem inclui a provisão de terrenos agrícolas para a produção de uma alimentação mais saudável (Shrestha 2004), desenvolvendo eco-cidades que ofereçam produtos a preços acessíveis aos moradores. Cria-se, assim, um ambiente com melhor qualidade de vida e sustentável para as gerações futuras.


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Projeto de land readjustment Gongabu, Nepal (Gongabu Jagga Ekikaran, Nepal) Local: distrito de Gongabu, região metropolitana de Kathmandu no Nepal. Agente de implementação: poder público (comitê de desenvolvimento urbano do vale de Kathmandu). Área do projeto: 14,3 hectares. Proprietários e inquilinos: 300 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1989 a 1995. 1989 - 1995: processo de desenvolvimento do plano legalmente compulsório e negociação entre o poder público e os possuidores de direitos; levantamento e inspeção das condições geográficas; plano financeiro e plano de execução do projeto. Período para a implementação do projeto: de 1991 a 1995. Sobre o projeto: o projeto Gongabu foi o primeiro projeto oficial de land readjusment no Nepal, sendo considerado a pedra fundamental na história do país por várias razões. A mais importante delas foi que ele conseguiu difundir de maneira positiva o land readjustment para o público em geral, além de fornecer experiência e importantes lições para os urbanistas e os governantes. O projeto foi elaborado com base no levantamento cadastral, considerando a área mínima de 128 m² no processo de reajuste dos terrenos. Para os proprietários que receberiam lotes com área inferior a 128 m², foi exigida uma contrapartida financeira em vez de contribuição em terreno. O sistema viário foi elaborado com ruas de 4, 6 e 8 metros, considerando a rua de 8 metros como a ligação entre o projeto e os sistemas viários do entorno existente. O sistema de água e esgoto foi fornecido conectando a nova infraestrutura à rede existente, com o uso de recursos financiados pela companhia de água e esgoto. Os terrenos que, após o projeto, foram relocados para debaixo da linha de alta tensão foram transformados em parque linear, pois essas terras não poderiam ser utilizadas para novas construções. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com um valor entre 14,0% a 46,0% em área para constituição de espaços públicos, como ruas e áreas verdes, e também para a constituição de terrenos-reserva. Uma contribuição mínima de 5,0% foi pré-estabelecida para cada lote para ruas e 5,0% para terrenos-reserva. A quantidade total de área disponibilizada para terrenos-reserva foi de 0,84 hectares e para espaços públicos foi de 3,0 hectares.


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Benefícios para os proprietários: os proprietários tiveram mantidos seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o valor do terreno passou de US$ 70,60/m² antes da execução do projeto para US$ 101,60/m², após a execução do projeto. Os terrenos-reserva foram vendidos com preço de US$ 108,00/m². Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada a alteração dos terrenos agrícolas para terrenos urbanizados, dando à cidade 0,84 hectares de espaço públicos. Custos e subsídio: o projeto concluído em 1996 forneceu 11,4 hectares de terrenos para uso residencial com 3,0 hectares de equipamento públicos a um custo estimado de US$ 1,09 milhões, sendo que o financiamento inicial foi realizado pelo comitê de desenvolvimento urbano do vale de Kathmandu e ressarcido posteriormente com a venda dos terrenos-reserva. Eventuais conflitos do projeto: houve problemas legais relacionados com a redistribuição dos terrenos. A legislação vigente proíbe a transferência do título de propriedade de uma pessoa para a outra após o projeto. Para resolver este impasse, o governo adquiriu todas as terras do projeto com a disposição de compensar a todos os proprietários na forma de distribuição de terrenos urbanizados. 6Imagem aérea do projeto de land readjustment Gongabu após sua execução em 2000.


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Mapa do parcelamento do solo do distrito de Gongabu e projeto de land readjustment Gongabu. 5 Projeto de land readjustment Gongabu. 6


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Land readjustment na Suécia (Sverige Exploateringssamverkan) Tommy Österberg A origem legal do land readjustment na Suécia começou quando a Lei de Desenvolvimento Consorciado do Solo entrou em vigor em 1987 (Lei nº 1987:11). Os princípios e os procedimentos utilizados têm uma história legislativa muito influenciada pelo processo de consolidação agrária executado com sucesso durante os últimos séculos na Suécia, pois a consolidação de terrenos rurais na Suécia começou antes mesmo de Alemanha e França. O princípio do direito de propriedade (titularidade fundiária na Suécia) e as respectivas indenizações por sua perda foram elucidados nos seguintes artigos da Lei Constitucional do país: A propriedade de todo cidadão será tão garantida que ninguém pode ser compelido por desapropriação ou outro dispositivo a render propriedade para instituições públicas ou privadas, ou tolerar restrição pelas instituições públicas quanto ao uso da terra ou a construções, a não ser quando for necessário para satisfazer interesses públicos urgentes. [...] Qualquer pessoa que for compelida a render propriedade por meio de compra compulsória, ou outro dispositivo, deverá ter indenização garantida por sua perda. Tal indenização será garantida a qualquer pessoa cujo uso da terra ou construção for restringido pela administração pública de tal modo que o uso atual da terra, na parte afetada da propriedade, for substancialmente prejudicado. (Instrumento do Governo, Capítulo 2, Seção 1, Parágrafo 2).

O procedimento sueco para o land readjustment (“exploateringssamverkan”, em sueco) está atrelado intimamente ao planejamento local detalhado e ao plano de uso do solo, e seus principais objetivos são o desenvolvimento de novas áreas para a construção e a renovação de áreas previamente consolidadas. A iniciativa formal para o reajuste e o desenvolvimento provém dos proprietários de terra interessados, que deverão obter prévia permissão para áreas estabelecidas pelo município, já que a regulamentação dessas áreas exige também um plano de desenvolvimento detalhado, indicando que o empreendimento consorciado poderá se iniciar e designando-o como área específica para o propósito. O sistema legal suporta: a iniciativa através de diversos proprietários de terra, o planejamento físico em princípio desconsiderando o rigor dos limites fundiários existentes, e a partilha do lucro de acordo com a quantidade de terra com que cada proprietário contribuiu para o projeto. No processo de reajustamento, as porções de terrenos são unificadas em uma única parcela, na qual, posteriormente, os promotores terão de compartilhar proporcionalmente as novas parcelas entre os proprietários ou, no mínimo, devolver o valor da terra que eles possuíam antes do procedimento


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começar – cada um deles recebe uma cota de acordo com o plano aprovado e a divisão delas está baseada na contribuição propiciada por cada um, somando-se às expectativas de lucro. A avaliação do valor da terra antes do projeto é feita considerando o valor de mercado e uso do solo atual. Após o projeto, considera-se o valor de mercado com permissão para mudança de uso do solo. Com o término do estabelecimento do reajuste, as áreas públicas são transferidas normalmente para a municipalidade, os direitos relacionados às propriedades reais são necessariamente reorganizados e possíveis indenizações são determinadas. Além disso, a infraestrutura exigida para a área também pode ser implementada e o financiamento para seu desenvolvimento, obtido. A requisição pelo procedimento cadastral é feita pelos proprietários interessados em fazer parte do projeto ou pela própria municipalidade. A aprovação do Plano de Obras (plano de implementação) é feita pela Assembleia Municipal, e as aprovações sobre o empreendimento consorciado, sobre as cotas, sobre as alterações dos limites dos terrenos e sobre a partilha dos custos e das indenizações (plano da nova divisão fundiária e o certificado de conclusão) são feitas pela Autoridade Cadastral. A área para o desenvolvimento prevê terrenos para construção de casas, para a construção de novas infraestruturas compartilhadas como playgrounds e estacionamentos e para a construção de infraestruturas de uso público, como ruas e parques. Existem regras que capacitam os proprietários a construírem diferentes modalidades de infraestruturas. A construção das edificações não está geralmente incluída no procedimento do reajustamento. O lucro é dividido principalmente de modo que cada proprietário receba uma área para desenvolver, isto é, construir, proporcional à sua cota por meio do processo de “mutação e subdivisão” (ou replotting sueco), ajustando cada porção cadastral ao novo plano. Se o lucro não puder ser completamente compartilhado deste modo, também existe o pagamento em dinheiro (contrapartida financeira) entre os consorciados. Existe um sistema de indenização para a diminuição em valor de mercado e outras inconveniências, como a compensação para prejuízo nos negócios. A transferência do título de propriedade é feita por contratos de venda entre os antigos proprietários da terra (vendedores) e os novos moradores da área (compradores) dos novos terrenos urbanizados. A experiência do land readjustment na Suécia limitou-se entre 10 a 15 projetos, implementados a partir dos anos 1990, mas desde então pouco aconteceu. Existem várias razões para isso:


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a. A pouca demanda habitacional (resultado do baixo crescimento populacional), menor taxa de migração para áreas urbanas e o excedente de oferta habitacional de anos prévios. b. Pouco interesse dos municípios em promover o desenvolvimento habitacional por meio da parceria com o setor privado. Esse fator complicou a situação das municipalidades interessadas em aprovar projetos sob a Lei nº 1987:11, resultando em uma investigação e, consequentemente, novas propostas de emenda de lei para simplificações das regulamentações das permissões municipais e alguns outros procedimentos. Esta proposta está atualmente em tramitação no governo e aguarda aprovação. c. As municipalidades ainda possuem reservas fundiárias, graças aos sistema de banco de terras, que podem ser utilizadas, e desse modo, áreas mais complicadas com muitos proprietários de terras são evitadas para utilização em quaisquer projetos de desenvolvimento. Atualmente, a demanda por moradia está crescendo e a situação do mercado de crédito (com juros baixos) contribui para o maior interesse na construção civil novamente. Se o governo sueco conseguir aprovar as emendas propostas para a Lei nº 1987:11 no Parlamento, o desenvolvimento consorciado do solo poderá ter um novo futuro na Suécia. 6Mapa do parcelamento do solo antes e depois do projeto de land readjustment Uddaberg.


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Projeto de land readjustment Uddaberg, Suécia (Uddaberg Exploateringssamverkan in Skövde, Sverige) Local: bairro de Uddaberg, município de Skövde na Suécia. Agente de implementação: iniciativa privada (agência de desenvolvimento urbano Uddaberg). Área do projeto: 4,0 hectares. Proprietários e inquilinos: 20 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1990 a 1992. 1990: regulamentação da área de Uddaberg para o desenvolvimento; 1991: aprovação da área para o desenvolvimento; 1991: aplicação do projeto de desenvolvimento consorciado; 1991: primeira e segunda alteração do projeto de desenvolvimento consorciado; 1992: o projeto devidamente detalhado foi aprovado pela municipalidade, término do plano financeiro de execução do projeto, reuniões de acordo entre os proprietários Período para a implementação do projeto: de 1992 a 1996. 1992 - 1995: execução do plano de obras de cada uma das unidades do empreendimento; 1996: término das obras; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto executado no bairro de Uddaberg fica na região noroeste da cidade de Skövde. Ele obteve ótimos resultados por causa da cooperação entre os proprietários e seu desenvolvimento. Antes da execução em si, teve o apoio dos envolvidos para a constituição de 40 novos lotes para uso residencial. Para a municipalidade, o processo resultou na criação de novos lotes respondendo à demanda habitacional do município, disponibilizando poucos recursos públicos, já que o projeto foi gerenciado pelos proprietários (iniciativa privada). Uma empreiteira ávida por construir casas nos novos terrenos foi responsável por agilizar o processo de reajustamento. Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o metro quadrado do terreno de suas propriedades mais do que dobrou de valor. Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada a construção de terrenos devidamente urbanizados, absorvendo e distribuindo os benefícios do desenvolvimento entre os envolvidos, por meio de restituição financeira ou de terrenos. Eventuais conflitos do projeto: aconteceu um pequeno conflito com dois proprietários de terra. O impasse foi resolvido pela compra e pela venda dessas propriedades por outros proprietários.


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Land readjustment em Taiwan (台灣在土地重劃) Kuang-Hui Peng Como em muitos outros países, o land readjustment em Taiwan é visto como uma ferramenta urbana para melhorar as possibilidades econômicas do uso do solo e aliviar os problemas financeiros encontrados por muitos governos diante da urgente demanda por infraestrutura urbana. Introduzido pela Lei de Terras em 1930, o land readjustment em Taiwan foi traduzido da experiência japonesa quando o país ainda era uma de suas colônias. Durante os últimos oitenta anos, o mecanismo foi amplamente utilizado para converter terrenos agrícolas com pouca densidade em terrenos urbanos, e para desenvolver terrenos agrícolas com aumento de produtividade e ampliação de suas comunidades rurais. O land readjustment urbano foi aprovado pela Lei de Terras, promulgada pelo governo nacional em 1930, com emendas em 1936 e 2001. Além dela, o instrumento também foi aprovado em 1954 pela Lei de Equalização dos Direitos da Terra (promulgada em 1954, com emendas em 2005) e pela Lei do Land Readjustment Urbano (promulgada em 1979, com emendas em 2003). No período entre 1958 a 2005, foram 724 projetos urbanos totalizando uma área de 13.399 hectares. Isso atingiu os mais diversos resultados: implementação de infraestrutura urbana e construções residenciais em novos centros urbanos; renovação urbana em antigos centros comerciais atendendo a demanda por segurança, qualidade de vida, transporte público e uso racional dos recursos da sociedade; e a melhoria do meio ambiente em áreas designadas como de caráter de urgência e com limite de tempo para sua execução. Como resultado do land readjustment urbano, 4.705 hectares de terrenos foram disponibilizados para equipamentos públicos e 8.694 hectares, para novas construções, economizando US$ 17,2 bilhões em gastos com infraestrutura pública para os cofres públicos. Cerca de dez tipos de equipamentos públicos foram viabilizados em função da execução desses projetos: ruas e avenidas, esgoto, playground infantil, parques, praças públicas, campos esportivos, escolas primárias, escolas ginasiais, estacionamentos e mercados públicos. A execução desses projetos urbanos não seria possível sem a contribuição dos proprietários com porcentagem de seus terrenos, que, após o reajuste, viabilizaram terrenos-reserva que foram vendidos para pagar o financiamento e os gastos das obras públicas. Por lei, a contribuição não


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pode ultrapassar 45,0% da área total da propriedade de cada um dos envolvidos, exceto para casos onde existam consenso e aprovação de mais da metade dos proprietários que, somados, possuam mais da metade da área a ser reajustada, para porcentagens maiores. O land readjustment rural teve as mesmas origens do urbano, porém com leis específicas posteriores, como a Lei do Reajuste Rural (promulgada em 1980, com emendas em 2000) e a Lei do Land Readjustment para Comunidades Rurais (promulgada em 2000, com emendas em 2002). No período entre 1958 a 2005, foram 788 projetos rurais, totalizando uma área de 394.115 hectares. Foram notados os mais diversos resultados: amalgamação e consolidação de pequenas ou ineficientes parcelas de terrenos rurais entre as fazendas para melhoria das propriedades; adequação e parceria entre as propriedades rurais para a introdução da mecanização e consequente aumento da produtividade; melhoria da rede de irrigação e drenagem dos terrenos; e implementação de sistema viário adequado entre as propriedades para facilitar o escoamento da produção. Não existe contribuição com parcela de terreno para o land readjustment rural, apenas o processo de acordo entre todos os envolvidos para o reajuste das propriedades e consequente melhoria da situação de produtividade das fazendas. O land readjustment para comunidades rurais, no período entre 1988 a 2005, foi executado em 42 áreas, totalizando 327 hectares. Teve os seguintes propósitos: a renovação dos centros residenciais rurais para melhorar o uso do solo das comunidades rurais; adequação dessas regiões ao processo de crescimento e desenvolvimento regional, consolidando sua ocupação e prevenindo eventuais conflitos; e a necessidade de reconstruir áreas que sofreram com os ataques de desastres naturais tais como terremotos, enchentes, tufões e incêndios. Como resultado do land readjustment rural, o governo viabilizou nessas áreas novo sistema viário, água e esgoto, sistema subterrâneo de telefonia e eletricidade, centros de atividades e terrenos adequados a futuras expansões do uso rural. A execução desses projetos rurais foi possível com a contribuição dos proprietários com porcentagem de seus terrenos, que, após o reajuste, foram vendidos para pagar o financiamento e os gastos das obras públicas. A contribuição nessas áreas não ultrapassa 35,0% da área total da propriedade de cada um dos envolvidos, porém não foi estipulada por lei uma quantidade mínima ou máxima de taxa de contribuição. Ficou o valor da contribuição a cargo da aprovação de mais da


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metade dos proprietários cujas áreas somadas constituam mais da metade da área a ser reajustada. A agência promotora de projetos de land readjustment, seja ela pública ou privada, é a responsável pela preparação do plano de execução e reporta a autoridade competente superior, geralmente mediante aprovação do prefeito ou do governador, para anúncio público e execução após 30 dias antes do início do projeto. A autoridade competente superior, após a notificação, faz a verificação do local, da situação do uso e da ocupação de cada uma das propriedades. Também avalia o valor do metro quadrado e compara com as previsões de valorização após a execução do projeto. Em seguida à confirmação do comitê de avaliação de terras do governo, os valores das propriedades avaliadas serão a base de cálculo para quantificar os gastos públicos com a infraestrutura, as taxas para a transferência das parcelas entre os proprietários e as possíveis compensações. O anúncio público expedido pela agência promotora acontece após o processo de vistoria e avaliação que notifica os resultados do processo de reajuste. Os proprietários que se opuserem aos resultados do projeto podem encaminhar por escrito sua objeção e reclamações diretamente à agência, dentro do período estabelecido, que irá considerar e, caso concorde, alterar o projeto. Se não for alcançado nenhum acordo entre os proprietários opositores, o caso é levado à autoridade competente superior, que irá julgá-lo e expedir decisão acerca do impasse. Após julgamento, o plano é novamente anunciado publicamente para implementação e nenhum proprietário pode apelar contra sua execução. O poder público deverá, em acordo com a execução do projeto, atualizar a base cadastral das terras reajustadas, registrando e transferindo diretamente os direitos e os títulos de propriedade incidentes, das antigas para as novas propriedades, aos proprietários. Os proprietários que não trocarem ou atualizarem seus antigos registros de propriedade pelos novos certificados, dentro do prazo estabelecido, perdem o direito à propriedade, porque os antigos registros serão anulados. O land readjustment em Taiwan, por fim, apresenta resultados muito positivos diante do problema de suprimento insuficiente de terrenos para o desenvolvimento urbano, herança da prevalência de propriedades pequenas e desarticuladas. Porém, land readjustment é apenas parte da solução: enquanto o direito à propriedade é resguardado pelas leis, o que fazer após o resultado da redistribuição é também importante e deve ser levado em consideração.


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Projeto de land readjustment Hsin-Yi, Taiwan (台灣台北市信義計畫區市地重劃計畫) Local: distrito Hsin-Yi, no município de Taipei em Taiwan. Agente de implementação: poder público (departamento de terras do município de Taipei). Área do projeto: 151,68 hectares. Proprietários e inquilinos: 793 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1977 a 1981. 1977: negociação entre o poder público e os possuidores de direitos; levantamento e inspeção das condições geográficas; 1981: aprovado o plano de execução do projeto. Período para a implementação do projeto: de 1982 a 2003. 1992: anúncio da execução do plano de obras; 1985 - 1988: execução e término da primeira e segunda fase; notificação e distribuição dos títulos de propriedade; 1994: todos os possuidores de direitos de propriedade detêm a posse dos terrenos reajustados e todas as objeções foram conciliadas pela autoridade local; 2003: término das obras de infraestrutura e equipamentos públicos; emissão dos novos títulos de concessões; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto Hsin-Yi está localizado na zona central de Taipei. Nessa zona, existiam instalações militares, terrenos vazios e oficinas públicas, tais como fábrica de munições e armamentos. Após a gradativa transferência dessas oficinas na década de 70, o poder público municipal decidiu revitalizar a área com novas ocupações residenciais, shopping centers, edifícios para educação e cultura e outros equipamentos públicos. A primeira revisão do plano, em 1994, além de propor a extensão das funções públicas e do centro financeiro, também estabeleceu a mitigação do fenômeno de lotação do antigo centro comercial. A segunda revisão do plano, em 2000, compatibilizando-o com a proposta do Plano do Centro de Operações da Ásia, determinou que o novo centro fosse um centro internacional, elevando Taipei ao status de “cidade global”, atendendo a demanda para novos edifícios capazes de suportar tais operações com habitações de alta qualidade. Por fim, o projeto preparou um terreno de grandes proporções para a construção do edifício Taipei 101, o maior do mundo na época e o símbolo de Taiwan. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com 38,61% em área para constituição de espaços públicos (30,08%) e terrenos-reserva (8,53%). A quantidade total de área disponibilizada para contribuição no projeto foi de 585.667,00 m².


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Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura instalada em seu bairro. Além disso, o valor do terreno sofreu uma valorização de 103% após a redistribuição dos títulos de propriedade em 1994; e, após a construção da infraestrutura e aprovação de novos coeficientes de aproveitamento, a valorização alcançou 1.700,0% nas zonas residencial e comercial. Benefícios para o poder público: o plano permitiu executar o novo centro comercial e financeiro de Taipei com a criação de 81,85 hectares para uso público, utilizando a venda dos próprios terrenos-reserva para financiar a construção das infraestruturas públicas. Custos e subsídio: o valor total investido para a execução do projeto ficou orçado em US$130.300.000,00. Eventuais conflitos do projeto: houve forte resistência diante a demolição das instalações militares existentes na área. A contribuição em terreno foi menor do que a necessária para a execução do projeto e o governo teve de compensar alguns proprietários por desapropriações. 6Imagem aérea do projeto de land readjustment Hsin-Yi após sua execução em 2004.


Mapa do parcelamento do uso do solo antes e depois do projeto de land readjustment Hsin-Yi. 5

Perspectiva artĂ­stica do projeto de land readjustment Hsin-Yi. 5 Projeto de land readjustment Hsin-Yi. 6


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Land readjustment na Tailândia (Thai Klong-garn nam-rong Jad-rupe-tee-din) Ittipong Tanmanee A Tailândia iniciou sua experiência envolvendo o land readjustment em Bangkok no fim da década de 1970 e início de 1980, por meio do método conhecido como “land sharing”, ou seja, compartilhamento de terrenos, especificamente para converter processos de favelização. O método consistia no acordo entre os moradores da favela e os proprietários da terra onde aconteciam as ocupações informais e, depois disso, na remoção temporária, na racionalização do trecho urbano e na sua reocupação. As condições para o sucesso de alguns desses projetos foram a presença de forte liderança comunitária, seguida de topografia favorável; porém, o aumento considerável do valor de mercado desses imóveis iniciou prontamente a revenda dos mesmos e a migração para outras áreas informais. No processo de aprimoramento do método do “land sharing”, a partir de 1987, por meio do acordo de cooperação técnica internacional, a JICA e o DTCP – Departamento de Obras Públicas e Planejamento Nacional e Local, iniciaram o estudo de “transferência de tecnologia aplicada para confecção de planos diretores: land readjustment como ferramenta para o desenvolvimento urbano na Tailândia”. Em novembro de 1991, Bangkok sediou o “VI Seminário Internacional sobre Land Readjustment e Desenvolvimento Urbano” para apresentar o método ao grande público, gerando um forte interesse dos partidos políticos presentes e ativando efetivamente o processo para incorporar o land readjustment à legislação urbanística tailandesa. Em 1992, o gabinete do governo assinou uma resolução atribuindo ao Ministério de Interiores a responsabilidade de executar os primeiros projetos pilotos. Criavam-se também um comitê executivo e um fundo orçamentário específico para esse propósito (orçado em US$ 1.250.000,00). Em 1993, foi lançado o primeiro projeto piloto, sob o nome de “Rama 9 LR Pilot-Project”, e em 1995, outros três foram lançados (Khokrad, Lopbuli e Roy-ad) com o apoio técnico de peritos japoneses. Durante esse processo, o governo realizou ao mesmo tempo a promoção do método, o desenvolvimento dos projetos pilotos e a formulação da legislação específica do land readjustment. Em 2000, a JICA realizou nova avaliação da aplicação do método e nos dois anos seguintes foram iniciados os estudos de viabilidade para os projetos de Lampang e Yala. Em novembro de 2004, logo após o terrível desastre causado pelo Tsunami, foi enviado ao


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gabinete do governo a Lei do Land Readjustment B.E. 2.547 Bhumibol Adulyadej, aprovada no mês seguinte. A lei continha provisões para restringir direito e liberdade individuais e era amparada pela Constituição do Reino da Tailândia. A Lei nº 2.547 conceitua o método da seguinte maneira: Land Readjustment significa implementar o desenvolvimento de muitos lotes de terra através do replotting fundiário (redimensionamento e reposicionamento), melhorando ou construindo infraestruturas, e consorciadamente arcar com as cargas e equilibradamente repartir os benefícios. Para esse fim, deverá haver a cooperação entre setor privado e o setor privado e entre o setor privado e o setor público, com o objetivo de utilizar a terra mais apropriadamente em relação aos transportes, à economia, ao social, ao meio ambiente e à comunidade, e assim estar de acordo com o planejamento urbano. (Lei do Land Readjustment B.E. 2.547 Bhumibol Adulyadej).

Os projetos de land readjustment, após essa lei, são aprovados pelo Comitê de Land Readjustment composto pelo ministro, um secretário permanente do Ministério de Interiores, secretários permanentes de cada ministério do governo tailandês, representantes de entidades da sociedade civil tais como conselho de engenheiros e arquitetos, advogados, câmara do comércio e das indústrias, e quatro especialistas apontados pelo gabinete do governo. O comitê possui, entre outras responsabilidades, formular políticas públicas, estabelecer objetivos, aprovar planos e projetos, recrutar corpo técnico especializado e regulamentar a utilização de recursos financeiros para apoio a projetos de land readjustment. Subordinados a este comitê estão os comitês regionais e locais e as associações de implementação, que possuem, entre outras responsabilidades, a de promover e apoiar projetos, mediar reuniões e conflitos entre proprietários e apresentar considerações sobre compensações a danos e desapropriações, caso necessário. A política de seleção das áreas para projeto, subordinado ao comitê, deverá considerar as seguintes condicionantes: a capacidade das autoridades locais em administrar tal responsabilidade; a propensão à boa cooperação dos proprietários de terra; a localização da área que preferencialmente deve estar inserida nos limites do plano diretor, contendo um novo alinhamento viário proposto; apresentar um conjunto de terrenos vagos ou com pouquíssima ocupação, possuindo um tamanho razoável; e, por último, conter um número razoável de lotes (até 100) e de proprietários (até 50). Para a aprovação da área, uma votação de consenso deve ter o aval positivo de mais de dois terços de todos os proprietários envolvidos e estes devem possuir uma somatória de mais de dois terços do valor total dos terrenos envolvidos. Após a execução do projeto, cada proprietário recebe


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uma quantia menor em comparação ao seu lote original, porém recebe um lote urbanizado com sobrevalorização do metro quadrado. Além disso, todos os proprietários envolvidos, inclusive o promotor (seja ele público ou privado), possuem preferência na ordem de aquisição dos terrenosreserva oriundos do reajuste bem como a aquisição de qualquer imóvel construído sobre eles. Todos os direitos que o proprietário possuía antes devem permanecer após o reajuste, e todos os envolvidos estão isentos do pagamento de quaisquer taxas e impostos cadastrais. Se o valor da terra aumentar em proporções desiguais, os beneficiados pelo valor mais alto terão de compensar os menos beneficiados em equivalente quantia (podendo ser em terra ou em dinheiro). A implementação do land readjustment em áreas religiosas, contendo templos, monastérios e propriedades de comunidades religiosas, está temporariamente suspensa. A experiência dos dez primeiros projetos pilotos executados pelo DTCP indica que muito ainda precisa ser feito para melhorar a aplicação do método: revisar a lei do land readjustment e as regulamentações ministeriais; desenvolver e instalar esse instrumento no âmbito dos planos diretores municipais; treinar uma quantidade maior de técnicos e especialistas; desenvolver manuais para implementação de projetos; e aprimorar a metodologia existente através de gerenciamento mais detalhado e de estratégias no processo de reunião com os proprietários de terra. E ainda, divulgar o método, estreitando os laços com os diversos setores privados. O processo de implementação do método, que já dura duas décadas, possui diversos fatores negativos que reforçam a necessidade de medidas para reversão da sua atual situação na Tailândia. Entre os fatores negativos temos a não familiaridade com as novas ferramentas propostas, pelos setores públicos e por diversos setores da sociedade. Pode-se afirmar também como elemento negativo: a falta de confiança dos proprietários de terras no governo, que estão relutantes em disponibilizar terras para propósitos de reajuste; e a taxa de contribuição muito alta para a conversão de área privada em pública. Vale a pena ressaltar, entretanto, que a Tailândia ainda não possui nenhum exemplo de sucesso, já que nenhum projeto executado chegou até o fim com resultados efetivamente positivos. Atualmente, a JICA e o governo da Tailândia estão reunindo esforços e desenvolvendo novo projeto denominado “Plano para promoção do Land Readjustment 2010”, a fim de encorajar mais municipalidades a utilizar esta ferramenta, promover o método através dos mais diversos meios de comunicação, remodelar a metodologia aplicada até o momento e, enfim, concluir com sucesso algum dos projetos pilotos iniciados desde então.


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Projeto de land readjustment Lampang, Tailândia (Klong-garn nam-rong Jad-rupe-tee-din Lampang) Local: município de Lampang, província de Lampang na Tailândia. Agente de implementação: poder público (município de Lampang e departamento de obras públicas e planejamento nacional e local e o departamento de estradas da Tailândia). Área do projeto: 28,8 hectares. Proprietários e inquilinos: 77 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 2001 a 2007. 2001 - 2007: levantamento e inspeção das condições geográficas; desenvolvimento do plano diretor; plano do replotting fundiário (reposicionamento e redimensionamento); plano financeiro de execução do projeto; plenárias e reuniões de acordo entre os proprietários. Período para a implementação do projeto: de 2008 a 2011. 2008 - 2010: execução do plano de obras; 2011: emissão dos novos títulos de propriedade; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: a área alvo da intervenção é um vazio urbano existente na região central do município de Lampang. O projeto considerou a aplicação do plano para abertura de nova via proposta pelo plano diretor do município e a consequente mudança de uso para residencial de média densidade ao longo da nova via estrutural. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram 15,0% em área para a constituição de espaços públicos e 10,0% em área para a constituição de terrenos-reserva, totalizando uma taxa de contribuição de 25,0%. A quantidade total de área para terrenos-reserva disponibilizados para a venda será de 28.800,00 m². Benefícios para os proprietários: haverá uma valorização prevista decorrente da execução do projeto em torno de 2,5 vezes o valor do m², já que antes da execução do projeto, o valor total da área era de US$ 7.825.000,00, e após a execução, o valor total previsto será de US$ 13.505.000,00. O valor atual está avaliado em US$ 62,50/m² e, possivelmente, avançará para US$ 156,25/m², ou valor superior após a execução do projeto. Benefícios para o poder público: cobrança de taxas e impostos de maior valor, construção de um dos projetos estratégicos previstos no plano diretor e constituição de agência “modelo” para implementação de outros projetos de land readjustment no país.


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Custos e subsídio: houve subsídio do governo federal para a construção da principal via estrutural (US$ 750.000,00), subsídio do governo municipal para a construção do sistema viário secundário (US$ 650.000,00) e para a infraestrutura básica (água e luz) dos terrenos-reserva (US$ 130.000,00). O valor total do subsídio para a implementação do projeto ficou orçado em US$ 1.530.000,00. Eventuais conflitos do projeto: aconteceram diversos conflitos entre os proprietários de terra da região que não quiseram participar do projeto por causa da elevada taxa de contribuição para a conversão de área privada em pública. Além disso, há falta de confiança dos proprietários de terras no governo, os quais estão relutantes em disponibilizar terra para propósitos de reajuste. 6Mapa do parcelamento do solo antes e depois da execução do projeto de land readjustment Lampang.


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Land Readjustment na Turquia (Türkiye Arsa Arazi Düzenlemesi) Tahsin Yomralioglu, Bayram Uzun e Recep Nisanci As primeiras tentativas de aplicação do land readjustment na Turquia basearam-se no Regulamento de Estradas e Edificações em 1864. Inicialmente, o método foi utilizado para acelerar o desenvolvimento de áreas onde ocorreram incêndios, terremotos e inundações. A partir de 1930, promulgado pela Lei nº 1663 de Ankara, o método passou a ser utilizado em áreas com incidências de planos urbanísticos de desenvolvimento. A partir de 1985, o land readjustment ficou conhecido como o artigo 18 da Lei de Zoneamento e passou a ser intensivamente usado nas leis de zoneamento vigentes, com regras e procedimentos específicos. Através do artigo 18 (do land readjustment), duas agências possuem legalmente a permissão de executar esses projetos: a municipalidade e o governo do Estado. Enquanto as municipalidades são responsáveis pelos projetos de caráter urbano, o governo estadual é responsável pelos projetos fora das zonas urbanas. Para iniciar um projeto de land readjustment, primeiramente são realizados todos os levantamentos cadastrais e a lei de zoneamento precisa estar aprovada. Por exemplo, a municipalidade toma a decisão sobre quando, onde e quais as parcelas de terra que serão alvo do reajuste e, após essa decisão, todas as tarefas técnicas e não-técnicas serão realizadas pelas instituições competentes. A principal afirmação no artigo 18 da Lei de Zoneamento (Lei nº 3.194 aprovada em 1985) é aquela em que os proprietários que possuem parcelas de terra em projetos de land readjustment precisam doar até 40,0% da área total de seu terreno para uso público, e isso inclui ruas e avenidas, parques, estações de polícia, playgrounds, estacionamentos e locais religiosos. A porcentagem depende do tamanho das áreas públicas designadas no projeto. A principal característica do método do land readjustment na Turquia consiste na inserção da desapropriação dentro do processo, a qual pode ser usada de duas formas. A primeira acontece onde a contribuição necessária dentro do projeto for superior a 40,0% e a diferença será desapropriada pela municipalidade. A segunda acontece em áreas designadas para alguns usos públicos específicos, como hospitais, creches ou instalações oficiais, que são coletivamente denominadas como “áreas para serviços extraordinários”. Embora o land readjustment tenha grandes vantagens em resolver os problemas de uso do solo em áreas urbanas, ainda existem algumas questões a serem enfrentadas, como a distribuição


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desigual de terras e o ineficiente sistema cadastral e de gestão do solo, que afetam diretamente o uso efetivo do método. Na Turquia, desde que o land readjustment foi aprovado recentemente, alguns projetos obtiveram resultados insatisfatórios ou não foram finalizados dentro do prazo. As limitações no orçamento, a má gestão do sistema de informação cadastral e a falta de suporte do poder público têm impedido alguns projetos de alcançarem seus objetivos. Como resultado, há e houve movimentos significativos de objeções principalmente sobre o processo de relocação. Muitos alegam que a distribuição equilibrada dos benefícios não foi devidamente realizada e muitos reclamam que inúmeros fatores, como distribuição do número de pavimentos, uso do solo, visão da paisagem, maior ou menor proximidade de áreas comerciais e outros equipamentos públicos, não foram considerados. A situação atual do land readjustment na Turquia e suas principais questões podem ser resumidas da seguinte maneira: a. Problemas com os proprietários: os quais, na maioria dos casos, não aprovam projetos de land readjustment. Principalmente quando se dão conta de que parte de suas propriedades se tornarão bens públicos sem qualquer compensação em dinheiro. No entanto, existem os proprietários que possuem parcelas de terra tão fragmentadas ou inúteis do ponto de vista comercial, que aprovam mais rapidamente a execução do projeto. b. Problemas com as municipalidades: elas possuem grande responsabilidade na execução de projetos de land readjustment, fornecendo todos os aparatos técnicos e não-técnicos para o desenvolvimento urbano. No entanto, ao mesmo tempo em que as municipalidades têm o poder de executá-los também podem ser as responsáveis pelo atraso e até mesmo por seu cancelamento devido a razões políticas. Os habitantes dessas áreas podem afetar os resultados das eleições locais, e por isso, os membros eleitos podem não concordar com a implementação do land readjustment. Além das razões políticas, as municipalidades possuem problemas técnicos com a aplicação de projetos. Na maioria dos casos, os recursos disponíveis como corpo técnico, orçamento e equipamentos são insuficientes para executar os projetos. c. Avaliação fundiária: na Turquia, o valor da terra não desempenha papel importante no cálculo das porcentagens de contribuição de cada proprietário nas áreas de projeto. O único critério é o tamanho da parcela de terra e o fator de contribuição para equipamentos públicos estipulados pela lei de zoneamento. Esse coeficiente único é calculado e aplicado a todos os proprietários na área de projeto segundo a contribuição necessária para terrenos de uso


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público. Não existe avaliação da parcela de terra antes ou depois da execução do projeto. O coeficiente de doação, ao invés da avaliação fundiária, não fornece uma abordagem equitativa para os proprietários, porque ignora muitos outros fatores que modificam o valor da terra. d. Processo de tomada de decisão: os agrimensores e projetistas sempre têm dificuldade em tomar decisões sobre as novas localizações das parcelas de terra. Portanto, os proprietários estão em grande risco, devido às diferentes decisões tomadas pela equipe técnica, cujas novas decisões gerem diferentes localizações e benefícios. A relocação é uma tarefa complexa que requer perícia altamente especializada, porque existem muitas questões a serem respondidas. No que se refere às prioridades da lei de zoneamento, os detentores de direitos discutem, por exemplo, quem irá receber as novas parcelas de terra, como as antigas parcelas de terra serão avaliadas, quais critério e características do solo serão consideradas, como o direito de propriedade será distribuído e como a satisfação após a execução do projeto poderá ser avaliada. e. Dados cadastrais: embora ambos o cadastro e o título de propriedade estejam em formato digital desde 1998, o processamento manual de projetos de land readjustment ainda é realizado. Utilizar o sistema de cadastro existente para encontrar as informações necessárias, manualmente, demora e consome tempo significativo, além de incorrer a erros. f. Padronização do land readjustment: não existe uma padronização dos procedimentos e processos do land readjustment na Turquia. Em particular o processo de relocação não foi padronizado e, portanto, não existem regras sobre a criação de novas parcelas de terra ou sobre seu processo de redistribuição aos proprietários. Além dos pontos fracos do land readjustment na Turquia explicitados, falta a produção de terrenos-reserva capazes de pagar as despesas com a construção de infraestrutura pública, atividade usada em outros países. A principal razão é a dificuldade em explicar aos proprietários que, além da altíssima taxa de contribuição de 40,0%, ainda existe a necessidade de uma taxa adicional para pagar a construção das obras públicas. Portanto, como a construção da infraestrutura fica a cargo do poder público, muitos projetos esperam décadas até que as obras públicas se iniciem. A Turquia, por fim, não possui qualquer instrumento para conter o processo especulativo da compra de parcelas de terra quando a execução do projeto é anunciada. Geralmente, elas são adquiridas a valores muito baixos e valorizam entre 400,0% a 600,0% após a execução do projeto. Como resultado, famílias de baixa renda não conseguem ter acesso às parcelas de terra após o projeto pelo alto valor dessas propriedades.


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Projeto de land readjustment Toklu-Besirli, Turquia (Toklu-Besirli Arsa Arazi Düzenlemesi, Türkiye) Local: distrito de Besirli, zona norte da cidade de Trabzon na Turquia. Agente de implementação: poder público (departamento de zoneamento do município de Trabzon). Área do projeto: 17,80 hectares. Proprietários e inquilinos: 500 proprietários. Período para o desenvolvimento do projeto: de 1985 a 1987. 1985-1986: processo de desenvolvimento do zoneamento; levantamento dos cadastros fundiários e inspeção das condições geográficas; anúncio público do projeto; estudo de viabilidade, plano financeiro e plano de execução do projeto; 1986 - 1987: execução do novo parcelamento e delimitação dos novos parques e sistema viário. Período para a implementação do projeto: de 1987 a 1989. 1989: emissão dos novos títulos de propriedade; certificado de conclusão do projeto. Sobre o projeto: o projeto Toklu-Besirli é caracterizado pela transformação e pela adequação de novas infraestruturas para responder a demanda por transporte intrarregional. Após a aprovação do projeto da nova avenida na região costeira e do novo zoneamento para a área, houve enormes esforços para efetuar o levantamento cadastral das propriedades e iniciar o processo de reparcelamento delas. O novo bairro residencial de frente ao mar tornou-se muito procurado, o que acarretou uma imensa procura por terrenos ou imóveis na região e aumentou rapidamente o valor das propriedades após a execução do projeto. Taxa de contribuição: os terrenos privados contribuíram com 40,0% em área para constituição de espaços públicos, como ruas, avenidas e áreas verdes. Não houve contribuição para a constituição de terrenos-reserva porque o projeto esteve baseado em compensação pela valorização após a construção das novas infraestruturas, portanto a contribuição foi feita para pagar a valorização. Benefícios para os proprietários: os proprietários mantiveram seus títulos de propriedade e receberam nova infraestrutura no bairro. Além disso, o valor do terreno sofreu valorização de 560,0% após as obras, e após 12 anos da realização do projeto, a valorização alcançou 3.330,0%. Benefícios para o poder público: esse plano permitiu executar de maneira controlada a alteração dos terrenos fragmentados na zona litorânea em terrenos devidamente urbanizados, absorvendo e


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distribuindo os benefícios do desenvolvimento entre os envolvidos. Houve um aumento em áreas públicas de 32% da área total do projeto, pela conversão de terrenos privados em novas avenidas, ruas, parques e áreas verdes. Custos e subsídio: o valor total investido para transformar terrenos agrícolas em terrenos urbanizados ficou orçado em US$ 85.000,00. Esse valor não considera os investimentos necessários para a construção das obras públicas como avenidas e parques. O projeto foi completamente financiado com recursos oriundos da municipalidade de Trabzon, Turquia. Eventuais conflitos do projeto: muitos proprietários após o processo de reajuste receberam terrenos menores dos que os permitidos para construir de acordo com a legislação do código de obras. Isso fará com que esses proprietários tenham que unir suas propriedades para obter a permissão de construir. Desenvolveu-se, assim, enorme oposição de alguns proprietários durante o processo de elaboração do projeto. Além disso, após a execução do projeto, os valores indicados pelo estudo de viabilidade, referentes à valorização das propriedades, foram diferentes daqueles efetivamente encontrados após a execução do projeto. Mapa do parcelamento do solo antes da execução do projeto de land readjustment Toklu-Besirli. 6

Imagens aéreas durante e após a execução do projeto de land readjustment Toklu-Besirli. 4



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Síntese da aplicação do instrumento em âmbito internacional e suas condicionantes Os estudos de caso apresentados demonstram a ampla possibilidade de aplicação do instrumento do land readjustment para a transformação de tecidos urbanos muito diversificados. Descreveramse projetos para promover a conversão de terrenos agrícolas em urbanos (Frankfurter Bogen na Alemanha, Groningen Meerstad na Holanda e Palangkaraya na Indonésia), e projetos para o redesenvolvimento de áreas consolidadas resultantes de antiga urbanização (Vila Yunong na China e Sambhaji Nagar na Índia). Ainda, descreveram-se projetos para responder à demanda habitacional com a criação de novas zonas residenciais (Loma de los Bernal na Colômbia, Gongabu no Nepal e Uddaberg na Suécia), projetos para controlar a expansão urbana recente e desordenada com confusa titularidade de propriedade (Schnin em Israel), projetos para áreas estratégicas à viabilização de infraestruturas (Lampang na Tailândia e Toklu-Besirli na Turquia) e, ainda, projetos estratégicos à viabilização de planos abrangentes de descentralização de polos comerciais para a geração de empregos (Hsin-Yi em Taiwan). As escalas dos estudos de caso também demonstram a sua ampla possibilidade de aplicação. De 4,0 hectares (Uddaberg na Suécia), passando por 151,68 hectares (Hsin-Yi em Taiwan) até chegar a 7 mil hectares (Groningen Meerstad na Holanda), dependendo das necessidades e do número de propriedades e proprietários envolvidos. O período de desenvolvimento dos projetos e sua implementação também variam. De 4 anos (Vila Yunong na China e Toklu-Besirli na Turquia) até 26 anos (Hsin-Yi em Taiwan), conforme as complexidades decorrentes do número de proprietários, conflitos de interesses, escala de intervenção, necessidade do remanejamento provisório de famílias e natureza das obras a serem implementados. Alguns projetos promovem complexas e sofisticadas infraestruturas, como no caso de Hsin-Yi em Taiwan; enquanto outros projetos promovem infraestruturas mais simplificada, como a implementação de ruas e parques, caso do projeto de Gongabu no Nepal. Em determinados projetos, há forte subsídio federal e municipal e nenhum investimento privado, enquanto outros projetos são promovidos exclusivamente com recursos da iniciativa privada. As taxas de contribuição em superfície também variam de um projeto para outro. No caso de Palangkaraya, na Indonésia, a contribuição dos terrenos privados para constituição de espaços públicos e terrenos-reserva foi de 8,0%, em oposição à, no caso de Gongabu, no Nepal,


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taxa de contribuição que alcançou, em alguns casos, 46,0%. Além disso, existem situações, como do projeto Groningen Meerstad, na Holanda, em que não houve contribuição, porque o projeto esteve baseado na manipulação de todos os terrenos pela agência de implementação do projeto, que compensará a todos os proprietários devolvendo os terrenos com a valorização gerada após a construção das novas infraestruturas. Após a leitura dos estudos de caso, existem algumas lições que podemos aprender e algumas conclusões a serem aferidas. Talvez uma das mais significativas delas seja de que projetos de land readjustment são difíceis de serem executados, principalmente porque a oposição em seguir adiante é regra e não exceção em todos os países nos quais se tenta aplicá-lo. Por melhor que seja a compreensão sobre a sua técnica de combinação de terras, o reordenamento físico das parcelas fundiárias, o financiamento da infraestrutura, o consórcio dos direitos de propriedade e a distribuição dos benefícios financeiros do desenvolvimento, existem certos requisitos encontrados na maioria dos estudos que tornam possível a aplicação do land readjustment, apesar dos obstáculos relacionados a cada um deles. Os diversos países que estão fazendo o land readjustment conseguiram reunir um número de medidas possíveis para a realização desta reforma territorial urbana. A seguir, quatro importantes requisitos para a existência do land readjustment. Existência de suporte governamental, seja ele nacional, regional ou municipal, em um ambiente de estabilidade política e continuidade administrativa. O poder público neste sentido possui importante papel na formulação das condições legislativas e técnicas para assegurar a execução do projeto e determinar os melhores caminhos institucionais para alcançar seu sucesso. Também deverá responsabilizar-se por sua promoção junto ao grande público e aos setores privados da sociedade. Ao mesmo tempo em que o poder público possui grande responsabilidade na execução de projetos de land readjustment, fornecendo os aparatos necessários, a falta de um Estado compromissado pode ser responsável pelo atraso e até mesmo pelo cancelamento de suas atividades por razões políticas. Neste sentido, o mesmo poder público imprescindível pelo sucesso pode ser também o maior responsável pelo fracasso de projetos de land readjustment. Criação de uma agência de execução de projetos de land readjustment, seja ela pública, privada ou de capital misto, com poderes conferidos pelo Poder Legislativo e equipe técnica especializada para


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coordenar e acessar as informações necessárias e pertencentes a departamentos governamentais (tais como base de mapas, dados cadastrais e levantamento de coleta de impostos dos proprietários envolvidos). Assim, na indisponibilidade de acessar todas as informações necessárias, a agência ainda pode utilizar o próprio processo de desenvolvimento do projeto para coletar todos os direitos inconsistentes sobre as propriedades e delinear os bancos de dados com registros adequados. Ao mesmo tempo em que essa agência possui grandes poderes para executar projetos de land readjustment, deverá possuir acima de tudo capacidade de gerenciamento e mediação dos interesses públicos com os privados. Nesse sentido, a agência, que deve desempenhar papel de mediadora, precisa possuir certa experiência para lidar com possíveis influências de lideranças políticas externas. Existência de um sistema cadastral e de registro de terras, em formato digital, com a maioria, senão todas, as informações necessárias para conferir legitimidade e clareza ao processo de execução. Porém, muitos países possuem um levantamento sem ferramentas ou softwares atrelados a esses bancos de dados e, assim, necessitam passar por drásticas mudanças em seu sistema de registro de terras. Esta drástica mudança, por si só, configura uma reforma anterior à execução dos projetos de land readjustment. Nesse sentido, o mesmo banco de dados necessário à reestruturação dos direitos fragmentados sobre as propriedades necessitaria primeiramente reestruturar a maneira como o poder público gerencia suas informações em muitos casos. Envolvimento da população local, sejam eles proprietários, inquilinos formais, informais e organizações comunitárias, com conhecimento prévio de seus direitos e deveres e, sobretudo suporte da agência de execução do projeto para conferir transparência e coerência ao processo. Os especialistas indicam que o envolvimento desses atores é ingrediente essencial para o processo do projeto, reduzindo chances de abandono durante sua execução. Ao mesmo tempo em que a população exerce enorme importância, muitos estudos demonstram a necessidade de instrumentos de participação compulsória, desapropriação ou direito de preempção, caso os acordos não aconteçam como o esperado. Projetos de land readjustment, em muitos casos, geraram mais problemas do que soluções, principalmente em lugares com diversidades étnicas, religiosas e econômicas. Nesse sentido, mesmo as autoridades locais entendendo que existem melhores medidas do que as administrativas compulsórias para realizar projetos de land readjustment, muitas vezes, foram algumas medidas compulsórias o fator


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responsável pelo sucesso do projeto. Adicionalmente ao que foi apontado pelo quarto requisito, é válido reconhecer também que o land readjustment é um instrumento para desenvolvimento fundiário e que pode ser aplicado de maneira complementar a outros métodos de desenvolvimento urbano. O usual tem sido utilizar: a. A desapropriação compulsória, quando existirem poucos opositores ou quando houver a necessidade de taxas de contribuição maiores do que a estipulada em lei, ou quando o projeto necessitar de mais áreas do que a soma de todas as contribuições; b. O direito de preempção quando for necessário o controle sobre a venda e a compra de terrenos ou onde o poder público quiser ter a preferência para adquiri-los em prol da execução do projeto; c. A permissão de mudança de uso do solo, quando houver a necessidade de atrair investidores conferindo maior e mais adequada utilização do solo, adaptando-o aos novos vetores de crescimento da cidade; d. A alteração nos índices de coeficiente de aproveitamento e taxa de ocupação, quando houver a necessidade de ampliar o capital necessário para a execução do projeto e, assim, aumentar a rentabilidade por meio da venda de um número maior de unidades. Muitos dos estudos de caso também demonstraram que certas medidas geram problemas ocasionados pela própria realização de projetos de land readjustment. Algumas delas estão discutidas a seguir. Suspensão temporária do desenvolvimento e de atividades na propriedade privada No caso de suspensão temporária do desenvolvimento, essa medida mostrou-se necessária para impedir inconsistências e problemas compensatórios após o início do projeto e também se mostrou ferramenta eficaz perante movimentos de especulação durante a execução do projeto. Após a realização do projeto, se não houver esforços para manter a população local, principalmente nos países em desenvolvimento, a valorização gerada pelos projetos pode originar a gentrificação, isto é, a expulsão da população local durante o processo de renovação urbana. No caso da suspensão temporária das atividades, o que fazer com aqueles que necessitam de suas terras (sejam elas rurais ou urbanas) para gerar renda para sua própria sobrevivência? Se o land readjustment pressupõe construção de infraestrutura a baixos custos para o Estado, levar adiante projetos em que o poder público tenha que recompensar toda e qualquer perda pela suspensão


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temporária de suas atividades pode tornar o projeto economicamente inviável. Distribuição dos custos e benefícios do desenvolvimento e princípios de equidade Muitos países que carecem de infraestrutura e utilizam ou discutem a implementação do land readjustment não passaram por processos redistributivos fundiários, tais como a reforma agrária, anteriormente. Portanto, muitas áreas que necessitam de desenvolvimento apresentam característica de divisão fundiária singular: muitos proprietários com apenas um terreno de menores proporções, e poucos proprietários com muitos terrenos de maiores proporções. Esse fator influi de maneira bastante arbitrária na taxa de contribuição para os projetos. O que fazer para garantir em projetos de land readjustment maiores porcentagens de contribuição aos mais subsidiados, e menores aos menos? Também temos as discussões críticas sobre noções de equidade e como elas se expressam no processo decisório, pois muitos proprietários reclamam de injustas negociações e resultados, tais como a distribuição do número de pavimentos, o uso do solo, a visão da paisagem, a maior ou menor proximidade de áreas comerciais e outros equipamentos públicos. Papel do Estado na execução de projetos de land readjustment Atualmente, em um período em que os movimentos neoliberais, tanto no sentido econômico quanto no político, estão cada vez mais ganhando força, o land readjustment se mostrou eficaz em países onde o Estado regula ou regulava com maior força as atividades públicas e privadas. O momento atual apresenta críticos que defendem cada vez mais uma menor intervenção do Estado nas ações privadas e até mesmo instituições conhecidas por propagar as “boas práticas” para os países em desenvolvimento que defendem a manutenção, além de enaltecer, a propriedade privada. Nesse momento, projetos de land readjustment são caminhos contrários a esses pensamentos. Além disso, ficou comprovado que a falta de confiança no poder público dificulta a existência de qualquer projeto de sucesso, a exemplo do que acontece na Turquia e Tailândia, entre outros países. Supervalorização da propriedade privada Nos estudos de caso, no âmbito do benefício para os proprietários, existem as valorizações que chegam a duas vezes o valor do metro quadrado anterior. Isso ocorre principalmente em países onde a disparidade econômica é menor ou em lugares onde o processo de transformação foi suportado pelo poder privado com menor agressividade ou maior controle.


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Existem projetos em que a valorização passou de 560,0% para 3.300,0% após mais de 10 anos de seu término. Nesses casos, os terrenos foram adquiridos a valores muito baixos e valorizavam muito após a execução do projeto, apresentando, como resultado, a dificuldade de acesso por parte das famílias de baixa renda às parcelas de terra pelo alto valor das propriedades. Como projetos de land readjustment pressupõem a divisão dos custos, mas também dos lucros do desenvolvimento, principal fator pelos quais muitos proprietários concordam em participar dos projetos, o poder público precisa encontrar medidas para resguardar o direito de propriedade por lei, mas também saber o que fazer após a redistribuição desses direitos e quais serão seus efeitos. O land readjustment jamais deve ser pensado como única solução para reduzir a grande demanda por habitação e infraestrutura nos países em desenvolvimento, porque terra não é sempre o único problema atribuído para resolver esses problemas. O método mostrou-se eficiente em situações: em que a divisão fundiária é inapropriada para o desenvolvimento, principalmente quando há interesse do setor privado em construir na área; onde a estrutura urbana é antiga e seu redesenvolvimento urgente; e em lugares onde exista uma enorme demanda por infraestrutura e serviços. Além disso, em países em desenvolvimento onde a falta de recursos é enorme para alcançar o desenvolvimento urbano, a ferramenta do land readjustment mostrou-se eficaz para fornecer um financiamento sustentável por meio dos terrenos-reserva. Porém, muitos países não carecem apenas de infraestrutura básica, mas também, de infraestruturas de rede de longo alcance (como estações de metrô e grandes avenidas expressas), casos em que o financiamento por terrenos-reserva não é suficiente e o investimento público ainda é essencial. Revendo o processo de transferência internacional do instrumento do land readjustment, temos a clareza da importância do Japão e do Reino Unido: principalmente no período entre a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, no processo de difusão do instrumento nas colônias destes países; e, após a década de 1970, do Japão no processo de cooperação técnica internacional. Em um panorama internacional, além dos países desenvolvidos, que em grande parte já dominavam o land readjustment rural, os países asiáticos foram aqueles que conseguiram aplicar o instrumento, com ou sem defasagens, com melhores resultados. Em certa medida, deve-se isso ao fato de que muitos desses países possuem os denominados “Estados desenvolvimentistas” (Evans 1993) e, principalmente na década de 1970, apresentaram sucesso econômico cujo dependente foi interpretado como o ativo envolvimento do Estado em suas funções. Foi o caso principalmente de


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Coréia do Sul e Taiwan que, ao procurar bases institucionais para promover o desenvolvimento, adotaram o modelo ativo regional do Japão. Análises do caso japonês oferecem um ótimo ponto de partida para a compreensão do Estado desenvolvimentista e de como ele influenciou e influencia os países asiáticos na compreensão e na execução de projetos de land readjustment. Outra razão diferente, mas não menos importante, foi encontrar grandes desastres atrelados à história de muitos dos países que utilizam o land readjustment, tendo sido esta ferramenta fundamental para a própria sobrevivência, a reestruturação e o ressurgimento de suas sociedades. Quando esses países não foram alvos de terríveis desastres naturais, tais como terremotos, enchentes, tufões e incêndios, foram alvos de destruições em massa ocasionadas por grandes guerras, tais como a Primeira e Segunda Mundial, ou guerras nacionais, como a Guerra Civil Coreana. Em uma situação de extrema necessidade, sociedade civil e governo sacrificam o que for necessário, como por exemplo, parte do seu terreno, para restabelecer a sua posição no mundo. A maioria dos países asiáticos que procura aplicar o land readjustment, mesmo possuindo distintas estruturas de Estado associadas a diferentes bases sociais de sustentação, padrões de organização e estratégias políticas, compartilha características cruciais. Em todos os países, as iniciativas políticas que facilitaram sua transformação estavam enraizadas em uma organização burocrática competente. Além disso, o poder público entendeu a necessidade de aproveitar a iniciativa privada e sua perícia gerencial para alcançar metas de desenvolvimento econômico e fundiário. Excluímos dessa afirmação os países asiáticos do Oriente Médio e Índia, onde a questão é bastante complexa e fator contraditório ao desenvolvimento e à implementação do mecanismo. No caso de países do Oriente Médio e Índia, seus Estados partilham de muitos problemas iguais. Suas burocracias, que são caricaturas patrimoniais e em muitos casos predatórias, ainda carecem da coerência corporativa do tipo desenvolvimentista ideal. Com uma capacidade burocrática menos desenvolvida, esses países ainda enfrentam estruturas sociais mais complexas e divididas. Sua capacidade de elaborar um projeto de land readjustment é especialmente complicada pela manutenção do poder social das elites agrárias. No caso dos países latinoamericanos, além dos fatores compartilhados com o Oriente Médio e a Índia, o Estado ainda possui determinada orientação para a renda, conceituada em termos mais primários como corrupção ou como mantenedor das elites agrárias no poder, que tem sido sempre uma faceta bem conhecida da operação nesses países e forte entrave ao desenvolvimento fundiário. A aplicação do land readjustment no Brasil, seus entraves e oportunidades serão discutidos no próximo capítulo.


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CAPÍTULO 5: AS POSSIBILIDADES DE APLICAÇÃO DO LAND READJUSTMENT NO BRASIL A regulação urbanística e os instrumentos de intervenção urbana em São Paulo A região metropolitana de São Paulo concentra 10,5% da população brasileira, dentre os quais mais de 5,0%, ou 11 milhões de habitantes, se concentram apenas no município de São Paulo. Tal concentração responde por aproximadamente 18,0% do PIB nacional (R$ 160.637.530.000,00), segundo dados da fundação SEADE em 2008 (www.seade.gov.br), um dos fatores responsáveis pelas evoluções demográficas e construtivas pelas quais a região passou nos último 15 anos. De 1986 a 2002, só no município de São Paulo, a evolução de área construída total passou de 255 milhões para 400 milhões de metros quadrados, e espera-se alcançar 480 milhões de metros quadrados até 2010. Apesar desses significativos indicadores, a cidade ainda passa por um período de estagnação viária e de transporte público, de altos níveis de poluição e deterioração ambiental e de um déficit de habitação equivalente a 12% da demanda. Isso significa que esse importante polo latino-americano, e também quinta maior região metropolitana do mundo, ainda acumula situações de exclusão econômica e territorial, especialmente quando colocado ao lado de outras cidades com mesmo ou menor grau de potencialidades, mas que estão alcançando níveis maiores de desenvolvimento perante o atual processo de globalização. Para abranger a dimensão dessa exclusão se faz necessário olhar a cidade sob dois pontos de vista: “o da esfera visível, em que se inserem as ações diretas do poder público: produção de habitação, saneamento, transportes; e o da esfera invisível – das transferências de renda que a própria estrutura urbana engendra” (Refinetti Martins 2003, p.167). E a essas dimensões de exclusão, o que sempre está em jogo é a demanda por terrenos na cidade de São Paulo, tanto para estabelecer as ações diretas do poder público quanto para engendrar as transferências de renda. Os preços de muitas áreas, principalmente as mais estratégicas, permanecem com tendência de alta, e quando uma incorporadora compra um terreno, o preço das áreas do entorno aumentam para alcançar o valor do metro quadrado do terreno incorporado ao empreendimento. A faixa média de valorização dos terrenos em 2007 ante 2006 foi de 20,0% a 50,0%, dependendo da infraestrutura da região. Diante desse quadro, a competição acirrada por terrenos que se destaquem pela sua localização e possibilidade de incorporação para médio-alto e


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capítulo 5

alto padrão (unindo-se a processos de especulação imobiliária na cidade de São Paulo) continua presente sem qualquer interferência do poder público. Nem mesmo o marco jurídico federal discutido no capítulo 1, o Estatuto da Cidade (lei nº 10.257 de 2001) e a aplicação de seus instrumentos no marco jurídico municipal do Plano Diretor Estratégico de São Paulo 2002-2012 (lei nº 13.430 de 2002) e do Plano Regional Estratégico (lei nº 13.885 de 2004) estão sendo efetivos e eficazes neste sentido. Segundo dados elaborados por Embraesp (2007) e Guimarães (2009), a própria lei de zoneamento aprovada em 2004 colaborou para os empreendimentos ficarem mais caros e parte da população só pode comprar imóveis fora do centro expandido, longe das melhores infraestruturas instaladas. Ainda que estabelecido como meta das novas leis de ordenamento da cidade, consolidar conceitos para promover o desenvolvimento urbano e a recuperação de determinadas áreas da cidade, compartilhando os custos com o investimento privado, realizando assim, entre outras intervenções, a “implantação de projetos estratégicos de requalificação urbana, de parques lineares, da rede viária estrutural e da rede estrutural de transporte público coletivo” (lei nº 13.885 de 2004), muito pouco foi efetivamente realizado. Considerando que um estudo aprofundado seja bastante necessário, o modelo atual empregado pelas leis de zoneamento se baseia em modelos estáticos de delimitações de perímetros, onde a lei indica quais os coeficientes e usos a serem respeitados, com nenhum projeto urbanístico ou outros mecanismos atrelado a seu desenvolvimento. De acordo com essa lógica, os projetos urbanísticos devem vir depois, aprovados por leis específicas, geralmente utilizando o instrumento da desapropriação para adquirir parcelas de terras para as obras públicas e, após sua execução, admitir que o mercado imobiliário seja receptivo a esses novos vetores de transformação. Portanto, o modelo estático delimitado pelas leis de zoneamento, muito baseado nos de desenvolvimento do ocidente europeu e norte-americano, vem se mostrando pouco eficiente. E isso não se deve a esses países estarem em condições mais avançadas, mas se deve ao fato de que suas taxas de crescimento são muito inferiores àquelas constatadas, sobretudo nas décadas de 1970 e 1980, em São Paulo. No caso do plano diretor de São Paulo, sua principal legislação urbanística, dois instrumentos principais foram estabelecidos, a fim de transformar o modelo estático em um operante do desenvolvimento urbano: as operações urbanas consorciadas e as zonas especiais de interesse social. Ambas são políticas que envolvem a aplicação da outorga onerosa do direito de construir,


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ou seja, concessão emitida pelo Município para que o proprietário de um imóvel edifique acima do limite estabelecido pelo coeficiente de aproveitamento básico, mediante contrapartida financeira a ser prestada pelo beneficiário. “A inspiração para o modelo proposto em São Paulo era o “plafond legal de densité”, que em 1975 era instituído pela França e a experiência da transferência de potencial construtivo (“development right transfer”) instituída pelo Plano de Chicago de 1973” (Senado Federal 2005). Ambos os instrumentos (operações urbanas consorciadas e zonas especiais de interesse social) serão brevemente discutidos a seguir para situar o leitor das condições atuais do “suposto” planejamento urbano em São Paulo. Operações Urbanas Consorciadas Uma década antes da aprovação da Constituição Brasileira, começaram a se formar na Europa e nos Estados Unidos da América parcerias entre agentes privados e a administração pública, envolvendo financiamento e gestão de atividades, que antes eram de competência exclusiva do governo. Essa questão tornou-se uma forma de lidar com a tendência conflituosa entre a manutenção do Welfare State (Estado de Bem-Estar), em que se convive com maior escassez relativa de recursos, e a redução do papel do poder público, aliada a uma maior participação da sociedade civil, inclusive para reduzir os aspectos negativos da globalização sobre a comunidade local (Abrucio 2005). No Brasil, essa experiência de financiar a cidade por intermédio de agentes privados foi introduzida como absorção da experiência internacional francesa e norte-americana de controle de densidades, controle da valorização imobiliária e política de preservação de imóveis históricos. No município de São Paulo, esse instrumento de parceria público-privado ficou conhecido como “operações urbanas consorciadas”, incorporadas nos planos diretores de 1988, 1991 e 2002, e aplicadas em lei a partir da década de 1990, marcando o período de experimentação do instrumento (Montandon e Souza 2007). A partir de 2001, com o estabelecimento das operações urbanas consorciadas no Estatuto da Cidade, houve uma continuidade da adoção do modelo aplicado anteriormente. A lei define o instrumento da seguinte maneira: Considera-se operação urbana consorciada o conjunto de intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos proprietários, moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização ambiental. (Lei n° 10.257 de 2001).


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As operações urbanas consorciadas pressupõem um instrumento legal que permite ao Executivo autorizar alterações nos parâmetros urbanísticos estabelecidos na lei de zoneamento, obtendo recursos por meio de contrapartidas pagas pela iniciativa privada para a viabilização dos projetos consorciados (cuja implementação ocorre a médio e longo prazo). À medida que o poder público dispõe cada vez menos de uma capacidade para investimentos diretos em infraestrutura, esses instrumentos tornaram-se importantes alternativas à concretização de ações estratégicas (seja de investimentos públicos, seja em melhorias urbanas), sem o exclusivo comprometimento de recursos públicos, e sem a necessidade de aguardar por recursos do Estado ou da União. As leis dos planos diretores anteriores, desde 1988, previram esse instrumento com o objetivo de viabilizar a produção de imóveis, atrelada a infraestrutura, equipamentos coletivos e espaços públicos, principalmente onde houvesse dificuldade do poder público em fazê-lo. Apenas na lei do plano diretor de 1991, porém, foram aprovadas operações urbanas que trariam alguns resultados sobre o mercado imobiliário existente, principalmente a Operação Urbana Faria Lima. A atual produção das operações urbanas consorciadas é alvo de críticas, porque se fundamenta na capacidade de investimentos imobiliários para a produção de grandes infraestruturas, e para tanto na aquisição de parcelas de terra. Se o custo do projeto for maior do que a contribuição adquirida com o potencial construtivo adicional, se a capacidade de suporte não for suficiente e se o projeto não for totalmente concluído, para acomodar todo o excedente populacional oriundo das altas densidades pretendidas, dificilmente haverá sucesso nesse método de planejamento urbano em ampla escala (Maricato e Ferreira 2002). As operações urbanas consorciadas, portanto, são ferramentas que cumprem pontualmente a recuperação da valorização criada pelas obras públicas, mas que por si só não são capazes nem de absorver a demanda futura por espaços públicos e nem garantir a transição de escalas entre os espaços dos empreendimentos adquiridos lote a lote, com as propriedades restantes e não agregadas às áreas de renovação. Em outras palavras, as operações urbanas brasileiras se caracterizam por intervenções em perímetros determinados pela dinâmica imobiliária, que viabilizam obras e serviços com a venda de potencial construtivo excedente. Contudo, o poder público absorverá o impacto futuro gerado pelo adensamento e será conivente com o aprofundamento das diferenças intraurbanas. Para o sucesso dessas operações de parceria público-privada, é necessário que o Estado realize grandes


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investimentos preliminares para a consolidação das perspectivas da valorização; é um jogo onde a iniciativa privada nunca perde (Fix 2001). Por isso, a crítica de Enio Moro Junior se sustenta: O principal mote dos defensores destas parcerias seria seu autofinanciamento, ou seja, o capital privado viabiliza o investimento na reordenação de grandes áreas e o poder público investe em áreas carentes. Este discurso sensibilizou governos progressistas e conservadores de todo o Brasil e afirmou mais uma das facetas do Brasil neoliberal: a ilusão do protagonismo municipal. O poder municipal possui poucos instrumentos para alterações em seu campo social de abrangência. O desenvolvimento econômico municipal alternativo também é dificultoso por seus impedimentos no rompimento da acumulação entravada [do capital]. (Moro Junior 2007, p.54-55).

Não obstante, com o Estatuto da Cidade, as operações urbanas consorciadas foram vinculadas a outro instrumento de captação de recursos; dessa vez, antes mesmo da aprovação de qualquer empreendimento no interior da operação urbana. Os denominados CEPACs – Certificados de Potencial Adicional de Construção são considerados uma forma de antecipar os recursos para investimentos públicos, porque, após o projeto urbanístico estabelecer o estoque de área adicional, esses certificados são vendidos em leilões na bolsa de valores, e certa quantidade é vinculada a determinada obra pública. Ainda que o CEPAC seja uma forma de redistribuir ganhos provenientes da valorização antecipadamente, uma vez que se pode incorporar a sobrevalorização da parcela de terra ao seu valor, tal medida não inibe o aumento especulativo dos preços da terra e não inibe, caso aconteça, a especulação que a própria manutenção desses certificados pode causar. Nessa atuação, abstraem-se regularidades e governam-se as excepcionalidades com objetivos imediatos, sem visão a longo prazo. Como exemplo de operação urbana, a lei aprovada nº 13.769 de 2004 (que altera a lei nº 11.732 de 1995), conhecida como Operação Urbana Faria Lima, foi aquela que apresentou maiores resultados em termos financeiros: entre 1995 e 2004 foram obtidos R$ 570 milhões (dados de Sempla 2009) pela venda de outorga onerosa do direito de construir. Ao mesmo tempo, porém, segundo os indicadores municipais, sua região foi a que apresentou maior perda populacional: um declínio de 25,0% nos últimos 10 anos. Em contraposição foi a área que teve o maior número de lançamentos imobiliários em toda São Paulo. Segundo estudos de Paulo Sandroni e Ciro Biderman, o preço por metro quadrado de terreno dentro da operação urbana Faria Lima estava 20,0% maior em comparação com a média na região


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metropolitana de São Paulo. Entre 1985 e 1991 e entre 1996 e 2001 o valor já alcançava 80,0% (Sandroni e Biderman 2004). Se considerarmos a qualidade de alto padrão dos empreendimentos lançados nessa mesma época, torna-se difícil atribuir essa valorização em porcentagens: às melhorias feitas pelo poder público e às melhorias feitas pelo poder privado. Encaramos assim um outro desafio: não possuímos mecanismos para avaliação que discrimine benfeitorias feitas pelo poder público e pelo privado, mesmo dando continuidade a ações de descentralização do poder público em buscar alternativas de financiamento e autonomia de gestão dos entes subnacionais. No contexto das políticas urbanas, compreende-se a necessidade de representantes do poder público de encontrar alternativas face ao aumento sem precedentes nas demandas políticoeconômicas por recursos, sobretudo no contexto de São Paulo, onde o financiamento do desenvolvimento urbano para a melhoria das condições que favoreçam a população, quando não é limitado, parece ser insuficiente. Em vez de procurar soluções de descentralização voltadas ao fortalecimento da população local, para que esta possa participar do “instrumento de intervenção urbana estrutural”, o poder público municipal, com as operações urbanas consorciadas, parece ainda seguir na direção de uma política urbana voltada “ao serviço cada vez mais exclusivo e explícito das necessidades de acumulação capitalista em detrimento das condições de vida da população” (Borja 1975, p.14). As limitações têm, portanto, algo a ver com a técnica, mas também parecem uma questão política, uma vez que “seu efeito progressista depende da capacidade de mobilização da sociedade civil garantir que [operações urbanas consorciadas sejam regulamentadas] de forma a assegurar uma implementação segundo os interesses da maioria e não apenas das classes dominantes, e que permita o controle efetivo do Estado e a possibilidade de controle social de sua aplicação” (Maricato e Ferreira 2002, p.216). Zonas Especiais de Interesse Social Agora passemos para o outro instrumento presente na cidade, estabelecido no plano diretor, as zonas denominadas ZEIS – Zonas Especiais de Interesse Social. As Zonas Especiais de Interesse Social pressupõem regiões (menos favorecidas sobre diversos aspectos e teorias) onde incidem normas específicas para a produção de empreendimentos de HIS – Habitação de Interesse Social. Existem incentivos diversos para o desenvolvimento dessas áreas, incluindo alterações nos parâmetros urbanísticos estabelecidos na lei de zoneamento para aqueles que cumprirem com a


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função de produzir empreendimentos para o mercado “dito popular”. As ZEIS apresentam quatro modalidades aprovadas pelo plano diretor, conforme o tipo de ocupação: a. ZEIS 1: áreas ocupadas por população de baixa renda, abrangendo favelas, loteamentos precários e empreendimentos habitacionais de interesse social ou do Mercado Popular – HMP, para promoção da produção e manutenção de Habitações de Interesse Social – HIS; b. ZEIS 2: áreas com predominância de glebas ou terrenos não edificados ou subutilizados, para promoção de Habitação de Interesse Social ou do Mercado Popular; c. ZEIS 3: áreas com predominância de terrenos ou edificações subutilizados situados em áreas dotadas de infraestrutura, serviços urbanos e oferta de empregos, para promoção ou ampliação do uso por Habitação de Interesse Social ou do Mercado Popular; d. ZEIS 4: glebas ou terrenos não edificados e adequados à urbanização, localizados em áreas de proteção aos mananciais, ou de proteção ambiental, destinados a projetos de Habitação de Interesse Social promovidos pelo Poder Público, com controle ambiental. Pela primeira vez o poder público inicia o enfrentamento dos assentamentos irregulares ou propícios a alocarem habitação de interesse social, delimitando-os em seu plano diretor. Em resumo são as áreas mais delicadas do ponto de vista da reestruturação urbana, porque além de carecerem de altos investimentos públicos, os assentamentos existentes apresentam diversos problemas que se torna difícil identificar as primeiras ou principais estratégias a serem tomadas. Por exemplo, os assentamentos populares junto aos mananciais (reservatórios aquíferos) da cidade envolvem desde a solução de ordem urbanística (a legislação estadual proíbe a ocupação dessas áreas), passando por aquisição de direitos (à moradia e ao acesso à cidade) até os prejuízos causados à qualidade da água que abastece dois terços da população do município. Embora as políticas públicas adotadas nos últimos anos tenham trabalhado na busca de alternativas que permitam técnicas alternativas entre a manutenção dos assentamentos irregulares e a preservação da qualidade da água, pouco se fez para resolver os problemas da reorganização das parcelas de terra e da instalação prévia da infraestrutura dos atuais assentamentos em estado de formação. Conforme se poderia supor, porém, o plano diretor aprovado não representa exatamente um projeto em comum com as aspirações de integração à cidade, mas pode ser submetido a uma somatória de críticas: faltam planos de urbanização adequados, falta infraestrutura básica para a articulação das regiões, e, portanto, o mercado imobiliário apresenta pouco interesse por adensar


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ou investir nessas áreas onde o poder público tem dificuldades em fazê-lo. Segundo expresso por Maria Lucia Refinetti Martins: Houve, entretanto, um senão: se a delimitação de ZEIS, nos locais em que foram aplicadas, pode significar pouco ao setor imobiliário – por se tratarem de áreas fora de seu campo de atuação, a outorga onerosa, como possibilidade de socialização da valorização imobiliária, não. No cômputo final, sua efetividade acabou reduzida pela concorrência com as operações urbanas, em que a outorga é aplicada no próprio local, repondo seu custo ao investidor, pela realização da valorização imobiliária no próprio local. (Refinetti Martins 2003, p.183).

Assim, podemos concluir que mesmo com o tanto que tem sido feito pelo poder público nesses últimos anos, estamos indo numa direção equivocada ou não estamos fazendo cumprir o que foi proposto. Em ambos os casos (operações urbanas consorciadas e zonas especiais de interesse social) mudanças são necessárias. É por esse motivo que consideramos como a disposição mais preciosa do Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257 de 2001) as duas palavras “entre outros...” na seguinte frase: “Art. 4. Para os fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos...” e segue a lista daqueles incorporados ao Estatuto. Essas duas palavras abrem espaço para os municípios avançarem sobre o que já foi conquistado e procurarem novas soluções. Contudo, a discussão sobre os instrumentos capazes de institucionalizar mudanças estruturais na cidade não se limita ao exposto. A seguir, apresentaremos outros instrumentos urbanísticos previamente elaborados e que, mesmo sem a devida legislação apropriada, ou aprovação institucionalizada, foram iniciativas na direção da distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano. O texto é de autoria do senhor Domingos Theodoro de Azevedo Netto, arquiteto e memória-viva do planejamento urbano no município de São Paulo. Imagem aérea do município de São Paulo em 2004. 4 Distribuição do uso do solo no município de São Paulo por predominância de quadra. 4 Perímetros de atuação do instrumento das operações urbanas consorciadas no município de São Paulo. 4 Perímetros de atuação do instrumento das zonas especiais de interesse social no município de São Paulo. 4


PREDOMINÂNCIA DE USO POR QUADR INDÚSTRIA / ARMAZÉNS COMÉRCIO / SERVIÇOS COM/SERV + IND/ARM SEM INFORMAÇÃO RHBP RHM/AP RVM/AP R + COM/SERV R + IND/ARM EQUIPAMENTOS PÚBLICOS ESCOLAS TERRENOS VAZIOS OUTROS

LEGENDA OPERAÇÕES URBANAS EXISTENTES 1 – FARIA LIMA 2 – ÁGUA BRANCA 3 – CENTRO 4 – ÁGUA ESPRAIADA 5 – RIO VERDE / JACÚ OPERAÇÕES URBANAS PROPOSTAS 5 – VILA SÔNIA 6 – VILA LEOPOLDINA 7 – DIAGONAL NORTE 8 – DIAGONAL SUL 9 – CARANDIRU / VILA MARIA 10 – CELSO GARCIA 11 – AMADOR BUENO 12 – SANTO AMARO 13 – PÓLO DESENVOLVIMENTO SUL


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5Skylines urbanos: imagens panorâmicas da região central do município de São Paulo.


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Instrumentos urbanísticos prévios: contribuição de melhoria, requisição urbanística, consórcio imobiliário Domingos Theodoro de Azevedo Netto É importante explicar ao leitor que houve tentativas prévias da implementação de instrumentos semelhantes aos projetos de land readjustment e aos de redesenvolvimento urbano por meio de projetos de lei no Brasil. O resultado nos mostra de que políticos, urbanistas e outros setores já tiveram iniciativas que infelizmente nunca foram levadas adiante pelo poder público. Para facilitar o entendimento façamos aqui o paralelo entre os conceitos discutidos nos capítulos anteriores e as nomenclaturas encontradas no Brasil, e que serão discutidas a seguir: a. Carga de desenvolvimento por melhorias (descrito por Robert Home no capítulo 4) = contribuição de melhoria; b. Projeto de land readjustment (descrito no capítulo 2) = requisição urbanística; c. Projeto de redesenvolvimento urbano (descrito no capítulo 3) = consórcio imobiliário. Contribuição de melhoria A contribuição de melhoria é um instrumento que existe em nossas constituições há décadas, mas nunca foi devidamente utilizado. Em 1971, em documento do CEPAM intitulado “Índices Urbanísticos”, redigimos a respeito: A contribuição de melhoria consiste em instrumento legalmente instituído de modo a permitir que o poder público seja ressarcido do custo de obras públicas realizadas que provocaram diretamente a valorização dos imóveis beneficiados. Os proprietários desses imóveis pagariam os investimentos, na respectiva proporção dessa valorização. As complicações de cálculo e as complexidades burocráticas para cobrança desse tributo, fixadas pela legislação pertinente, tornaram-no praticamente inoperante, embora enfaticamente recomendado por grande número de especialistas. Sua aplicação tem sido apenas nominal, somente para permitir o reembolso de investimentos como os de pavimentação, por exemplo, mas sem nenhuma relação com a valorização do imóvel. As dificuldades operacionais são muito grandes, desde a identificação dos imóveis beneficiados até as dificuldades de cálculo da valorização imobiliária causada pelo investimento realizado. (CEPAM 1971).

A situação atual não é muito diferente. Na Constituição vigente de 1988, a contribuição de melhoria aparece no artigo 145 que dispõe: “Art. 145 – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, (...); III - contribuição de


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melhoria, decorrente de obras públicas”. É curioso que, pelo que se sabe, nenhum dos três níveis de poder se interessou em instituir, normatizar ou regulamentar a contribuição de melhoria. Outra observação interessante é que a expressão “decorrente de obras públicas” não significa necessariamente que só pode haver cobrança após a conclusão das obras públicas. No Estatuto da Cidade (lei n° 10.257 de 2001) ela aparece, no artigo 4° - inciso IV - b, como um dos instrumentos da política urbana, mas nada há que avance sobre sua normatização. Além disso, a legislação atual estabelece limites: o conjunto das contribuições não deve ultrapassar o custo da obra e as contribuições anuais de cada imóvel não podem ultrapassar 3,0% do seu valor venal. Sob o espírito da nova Constituição, é de se esperar que a contribuição de melhoria tenha sua legislação alterada de modo a facilitar a cobrança. No entanto, há juristas que entendem que essa legislação já está superada com a Constituição de 1988, e que os municípios já podem dispor desse instrumento com maior autonomia. Existem outros que não veem essa possibilidade sem uma nova regulamentação federal. A questão foi bastante debatida no “Seminário Contribuição de Melhoria: Retomada do Desenvolvimento com Justiça”, em 16 e 17 de maio de 1996, promovido em São Paulo pela Associação dos Agentes Fiscais de Renda do Estado de São Paulo. Nesse seminário foi apresentada mais uma vez a experiência da Colômbia, onde esse tributo é cobrado com sucesso há décadas. Recentemente tivemos acesso à legislação pertinente de Cali e Bogotá e nos pareceu perfeitamente adaptável às nossas condições. Um aspecto interessante dessa experiência é a participação da população contribuinte ao longo de todo o processo. A cobrança da contribuição de melhoria nas operações urbanas é extremamente importante. Em primeiro lugar, por uma questão de justiça: as obras a serem executadas no interior da área da operação urbana vão também valorizar os imóveis dos proprietários que não participam da operação, com solicitações específicas de exceções à legislação usual que permanece em vigor. Em segundo lugar, porque no cálculo do valor do benefício (e, portanto, da contrapartida) concedido aos imóveis dos proprietários participantes da operação também está embutida a valorização decorrente das obras. Se houvesse contribuição de melhoria, os imóveis participantes deveriam pagar duas coisas: a contribuição de melhoria, como todos os imóveis valorizados na área, em decorrência das obras realizadas, na proporção dessa valorização; e a contrapartida devida em função do benefício auferido com as exceções permitidas.


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Requisição urbanística A requisição urbanística, que em outros países tem um nome menos atemorizante (land pooling, land readjustment), possibilita ao poder público uma intervenção mais direta no direcionamento do desenvolvimento urbano, sem prejudicar o proprietário que será beneficiado com a valorização do imóvel. Esse nome surgiu entre nós na década de 1980, quando em 1984 a EMPLASA – Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A. estudou o projeto de lei federal n° 775 de 1983 e propôs uma série de aperfeiçoamentos, entre os quais a introdução desse instrumento. Esse projeto de lei foi elaborado por um grupo de trabalho específico criado pelo CNDU – Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano, órgão responsável pela proposição e pela implantação da Política Nacional de Desenvolvimento, vinculado ao Ministério do Interior. A justificativa da EMPLASA era a seguinte: O instituto, inspirado no “land pooling”, designação que toma na Inglaterra, Austrália, Japão e Coreia, propicia ao Poder Público uma ação direta de urbanização, permitindo-lhe atuar diretamente no mercado imobiliário, com vistas a uma ação moderadora, mediante o aumento da oferta de lotes urbanizados, notadamente para a população de baixa renda, dentro dos padrões técnicos exigidos, evitando, consequentemente, a formação de loteamentos clandestinos. (EMPLASA 1984).

Distinto da desapropriação e do parcelamento compulsório, a requisição urbanística apresenta características similares às do empreendimento de incorporação imobiliária. Funciona como se as partes envolvidas tivessem ajustado, entre si, o que caberia a cada uma no empreendimento urbanístico, no qual o proprietário participa com a gleba e o poder público com as obras de urbanização. Em relação ao instituto da desapropriação, a vantagem para o poder público consiste em que a requisição urbanística não exige grande soma de recursos financeiros para o início do empreendimento (sem desapropriações). Os proprietários atingidos são beneficiados com a valorização imobiliária resultante das obras de urbanização, efetuadas pelo poder público, que também não será onerado, pois lhe é assegurado o ressarcimento dos custos incorridos na implantação de empreendimentos. Apenas, com vistas à prevalência e à satisfação do interesse público, reconhece-se ao poder público a prerrogativa de estabelecer os termos e as condições de realização do empreendimento e de ocupar o imóvel requisitado, findo o prazo estabelecido na notificação, para iniciar as obras projetadas. Como se pode observar, o objetivo de então não era urbanizar apenas, mas comandar o crescimento das cidades para áreas mais adequadas à ocupação urbana, independentemente


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de divisões fundiárias ou tamanho das propriedades. Hoje, o instrumento deveria facilitar a reurbanização de áreas construídas, mas inadequadas para as condições de vida atuais. O projeto de lei nº 2.191 de 1989 do deputado Raul Ferraz (Ferraz 1989) veio preencher essa falha. Elaborado com a colaboração do arquiteto Cândido Malta Campos Filho (Campos Filho 2001), ele é muito importante, porque foi o primeiro depois de promulgada a Constituição Federal de 1988, que inovou em relação à problemática urbana, e se tornou a base de referência com os inúmeros projetos de lei sobre política urbana que lhe sucederam até o Estatuto da Cidade, em 2001. Ele aproveitou as proposições da EMPLASA de 1984 e as adaptou à nova Constituição e às necessidades da década seguinte. Com 80 artigos, no artigo 38 assume a Requisição Urbanística nos seguintes termos: Art. 38 – O município com base no plano diretor e no projeto aprovado, poderá requisitar por prazo determinado, um ou mais imóveis contíguos, situados em zona urbana ou de expansão urbana, para promover loteamentos ou obras de urbanização e reurbanização, devolvendo, após o prazo fixado, o imóvel devidamente urbanizado ou outro de valor equivalente aos respectivos proprietários. (Projeto de Lei nº 2.191 de 1989).

Seguem-se 6 outros artigos dispondo sobre: os procedimentos a serem obedecidos; os direitos dos proprietários dos imóveis requisitados; a possibilidade de juízo arbitral; a escritura pública registrada em cartório sobre a operação realizada; e a garantia do “acompanhamento pelos particulares interessados, assegurando-lhes o acesso a documentos e projetos pertinentes”. O artigo 44 reafirma a possibilidade de utilizar o instrumento “para fins de reurbanização desde que o empreendimento seja aceito por dois terços dos proprietários atingidos” e sejam ouvidos os inquilinos dos atingidos. Dispositivos semelhantes constaram dos inúmeros projetos de lei sobre o desenvolvimento urbano, mas, infelizmente e por motivos ignorados, desapareceram do texto do Estatuto da Cidade. Consórcio imobiliário O consórcio imobiliário é um instrumento urbanístico criado pelo Estatuto da Cidade, no Capítulo V – Disposições Gerais (artigo 46 e seus dois parágrafos), não no capítulo II, que trata dos instrumentos de política urbana. Ele faculta ao proprietário de área atingida a obrigação de parcelar, edificar ou utilizar seu imóvel, a requerimento dele, por meio do “estabelecimento do Consórcio Imobiliário como forma de viabilização financeira do aproveitamento do imóvel”. O


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texto do Estatuto que trata dessa compulsoriedade é o seguinte: Art. 5 - Lei municipal específica para área incluída no plano diretor poderá determinar o parcelamento, a edificação ou a utilização compulsórios do solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, devendo fixar as condições e os prazos para implementação da referida obrigação. (Lei n° 10.257 de 2001).

O não cumprimento dessa obrigação é penalizado pelo instrumento do imposto IPTU progressivo no tempo, durante 5 anos consecutivos (Art. 7). Após 5 anos a Prefeitura “poderá proceder a desapropriação do imóvel, com pagamento em títulos da dívida pública”. O texto do parágrafo 1 do artigo 46 pode levar a certos equívocos. Ele dispõe: § 1 - Considera-se consórcio imobiliário a forma de viabilização de planos de urbanização ou edificação por meio da qual o proprietário transfere ao Poder Público Municipal seu imóvel, e após a realização das obras recebe, como pagamento, unidades imobiliárias devidamente urbanizadas e edificadas. (lei n° 10.257 de 2001).

A proposta é interessante, mas pressupõe que a Prefeitura tenha recursos para a execução das obras necessárias, o que não é comum entre nós. Nesse caso, parece mais eficaz apelar para a venda do direito de superfície, ou mesmo da propriedade plena, a empreendedores imobiliários possivelmente interessados. O parágrafo 2 é ainda mais estimulante, a saber: “o valor das unidades imobiliárias a serem entregues ao proprietário será correspondente ao valor do imóvel antes da execução das obras, observado o disposto no § 2 do artigo 8 desta lei”. O artigo 8 é o que trata da desapropriação com pagamento em títulos e o parágrafo 2 é o seguinte: § 2 - O valor da indenização: I- refletirá o valor da base de cálculo do IPTU, descontado o montante incorporado em função de obras realizadas pelo Poder Público na área onde o mesmo se localiza após a notificação de que trata o § 2 do art. 5 desta lei; II- não computará expectativas de ganhos, lucros cessantes e juros compensatórios”. (Lei n° 10.257 de 2001).

Essas limitações ao valor da indenização visam ressarcir as despesas realizadas pela Prefeitura com as obras de urbanização ou edificação, mas nada garante que os dois montantes sejam coincidentes, nem há razão para tratar o consorciado como se fosse um desapropriado com títulos. Melhor seria garantir que as despesas fossem ressarcidas “in totum”, e os consorciados recebessem unidades imobiliárias de valor proporcional ao da situação anterior, como previsto no instrumento da requisição urbanística.


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capítulo 5

Só a experiência nos dirá se há eficácia ou irrelevância do instrumento, mas há um ponto importante a salientar. Segundo os exegetas das leis, as disposições dos parágrafos estão vinculadas ao conteúdo do “caput” do artigo. Isso quer dizer que o consórcio imobiliário só pode ser solicitado pelos proprietários intimados a parcelamento, edificação ou utilização compulsórios. Ele não pode ser utilizado para viabilizar planos de urbanização ou edificação sem que todos os proprietários envolvidos sejam previamente intimados ao parcelamento, edificação ou utilização compulsórios. Conforme descrito anteriormente, os instrumentos urbanísticos prévios pouco foram explorados ou mesmo implementados no sentido de resolver as deficiências urbanas das cidades brasileiras. Ainda existe um impasse quanto a questões econômicas e principalmente jurídicas. Enquanto alguns instrumentos necessitam da incidência de outros dispostos pelo plano diretor vigente, como prévia incidência do parcelamento, edificação e utilização compulsórios, para outros instrumentos ainda não existe uma clareza se pode haver aplicação sem a aprovação de lei federal específica. Além disso, alguns pressupõem a atuação da iniciativa privada, o que, pela própria tradição brasileira de descompasso com esse setor, obrigaria o poder público a se reformular, já que não dispõe de recursos para investir em todos os projetos de urbanização necessários. A seguir, as potencialidades da aplicação dos instrumentos do land readjustment e do redesenvolvimento urbano no Brasil. Estudo de potencialidades do instrumento land readjustment no Brasil Na prática, projetos de land readjustment são muito difíceis de executar, como demonstrado em vários projetos no Japão e nos estudos de âmbito nacional. Os proprietários são, antes de tudo, cautelosos e consideram o equilíbrio de riscos e benefícios durante a execução: o período de interrupção de suas atividades cotidianas, o deslocamento ou realojamento, os danos materiais no processo de mudança e outras possibilidades de algo dar errado. No Brasil, o processo de aplicação de tal metodologia também enfrentaria diversas dificuldades, que não consistem apenas em dificuldades conciliatórias ou oposicionistas no âmbito da transição entre propriedade pública e privada. Aqui, elas vão muito além. Sua implementação esbarra em questões de ordem legal, institucional, técnico-territoriais, sócio-ecônomico-culturais, políticas e que abrangem o estágio atual de formulação de políticas de desenvolvimento urbano no país (Souza 2008).


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

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Após a promulgação da Constituinte de 1988 e a aprovação do Estatuto da Cidade (lei n° 10.257 de 2001), os planos diretores estratégicos tornaram-se a principal ferramenta de política e ordenação urbana. Referente a essa lei, a primeira dúvida abrange a necessidade, ou não, da criação e institucionalização do land readjustment em nível nacional como instrumento urbanístico, seguido de sua regulamentação técnico-jurídica por meio dos diversos agentes envolvidos no processo: poder público, iniciativa privada, proprietários e outros setores da sociedade. A criação e a aplicação de uma legislação própria para o land readjustment seria uma necessidade para que o método pudesse ser aplicado? Se a resposta for positiva, essa legislação complementaria as leis já existentes? (principalmente a antiquada Lei do Parcelamento do Solo Urbano – lei 6.766 de 1979, em fase de reestruturação – e o Estatuto da Cidade – lei 10.257 de 2001 – que regulamenta o capítulo original sobre a política urbana aprovado pela Constituição de 1988). Se for assim, os municípios poderão estabelecer normas complementares para adequar essa nova lei à sua própria realidade? Ou devemos implementar o método japonês sem segui-lo à risca? Como alternativa, será que poderíamos explorar seus elementos separadamente (reposicionamento e redimensionamento fundiário, contribuição por meio de doação em parcela de terra etc.), combinando instrumentos existentes no Estatuto (edificação compulsória, tributação progressiva, usucapião especial urbano, consórcio imobiliário etc.)? A resposta por si só contém um determinante prévio a ser considerado: o início desse processo depende, invariavelmente, de tomada de decisão política e governamental. Para tanto, é preciso haver identificação do problema no âmbito da política pública, estabelecer a melhor maneira de enfrentá-lo dentro de uma agenda política, institucionalizar e implementar essa resposta (seja por meio da introdução do método japonês ou de alternativas), gerenciar e avaliar seus resultados, e fazer reformulações segundo nossa realidade. O processo de formulação de políticas públicas é descontínuo no Brasil, devido à mudança de prioridades de cada gestão a cada quatro anos, o que nos faz questionar sobre qual seria a garantia de continuidade do processo de desenvolvimento do projeto e como realizá-lo desvinculado da gestão político-partidária. Em consequência, quais seriam os mecanismos preventivos à instabilidade desse processo, capazes de conferir confiabilidade ao poder público, perante os diversos setores privados, permitindo a realização de um projeto no qual todos devem ceder parte de sua propriedade,


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capítulo 5

esperando um resultado positivo (financeiro e urbano) após mais do que quatro anos? Ou: quais seriam os mecanismos para utilizar o land readjustment como facilitador da readequação fundiária, sem a cobrança de contrapartidas para obter recursos e viabilizar obras públicas? Outro fator, complementar a qualquer vontade política, porque um não pode acontecer sem a viabilidade do outro, diz respeito a questões técnico-territoriais. O Brasil não possui um sistema de cadastro fundiário atualizado em nenhum nível de governo, seja ele municipal, estadual ou federal. Além disso, o poder público é muito limitado na gestão de suas próprias terras. Onde há grandes centros urbanos que apresentam bastante potencial para desenvolvimento, existem terrenos ocupados irregularmente, e, portanto, ilegalmente consolidados. Dessa maneira, o land readjustment poderia ser utilizado como uma ferramenta de auxílio na gestão do uso do solo, principalmente nos processos de regularização fundiária, pois o processo é democrático, não gera grande ônus para o poder público, é indicado para áreas pequenas e prevê a regulamentação física e jurídica dos terrenos. Considerando o plano das possibilidades, ainda que determinada gestão político-partidária considere a implementação de tal método, transpondo as dificuldades técnico-territoriais e ainda que o land readjustment encontre suporte legal e jurídico, existe ainda um grande salto entre a teoria e sua aplicação. Os recursos humanos da administração pública precisam ser qualificados e capacitados, capazes de dialogar e discutir sobre o método para sua execução efetiva. O Japão, há muitos anos, vem despendendo esforços para o aprimoramento técnico e a capacitação de seus recursos humanos, bem como para a criação de sistemas de avaliação do mercado de imóveis e o estabelecimento de procedimentos claros e precisos para a tramitação projetual. Nesse caso, o projeto urbanístico passou a ser o elemento principal das orientações focadas nas diretrizes do desenvolvimento urbano e o land readjustment o método para implementá-lo. Ainda com relação às questões que envolvem o poder público, para projetos urbanos, é necessária a criação de agências de interlocução e articulação para o processo de negociação entre os agentes relacionados, a fim de viabilizar a execução do projeto. Essa articulação não se restringe ao âmbito municipal, relacionando-se aos órgãos estaduais e federais, mas também aos agentes privados. Quando se trata dos agentes privados, temos, primeiramente, que discutir o regime da propriedade, dando garantias ao cidadão, conforme a Constituição Federal, que estabelece o


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

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direito coletivo, sobrepondo-se ao direito individual. Apesar disso, qualquer ato de interferência ou intervenção do poder público sobre a propriedade privada é sempre considerado uma ameaça. Mesmo devidamente justificado e ressarcido, provoca inconformismo e longos impasses quanto à sua execução. No entanto, quando tal intervenção traz benefícios relativos à valorização da propriedade, a reação provocada é de resistência à socialização dessa valorização, considerando o benefício apenas como uma obrigação por parte do Estado. Além disso, vivemos a cultura do curto prazo, o que torna muito difícil encontrar parceiros financeiros interessados em investir grandes quantias de dinheiro num projeto com longa duração e complexidade. Em âmbito nacional, o levantamento desses problemas não consiste apenas na implementação ou na incorporação parcial ou integral de metodologia internacional. Refere-se também a discussão e melhoria na maneira como fazemos planejamento urbano no Brasil, contribuindo para o debate e a reflexão para que novos ou atuais instrumentos de desenvolvimento urbano possam ser mais efetivos. No caso específico do município de São Paulo, considerações particulares sobre o mecanismo foram elaboradas durante os últimos dois anos. O principal objetivo de aplicação do método do land readjustment em São Paulo está no aperfeiçoamento dos projetos de desenvolvimento, seja por meio de lei específica, seja por meio dos instrumentos existentes de intervenção urbana (como, por exemplo, as operações urbanas e as zonas especiais de interesse social). A princípio foram identificadas cinco situações em que o método pode ser adaptado e empregado para a facilitação de transformações urbanas. Primeira: em áreas de urbanização consolidada e com parcelamento do solo existente, objetivando a ampliação de espaços públicos por meio da promoção de empreendimentos imobiliários que ocupem toda a quadra ou um conjunto de parcelas de terra, explorando com maior intensidade o uso do solo. Segunda: em áreas subutilizadas e com oferta de infraestrutura existente, geralmente atrelada a áreas com baixa densidade e antigos usos industriais, objetivando melhor exploração das parcelas de terras vazias, ampliando o adensamento e a mistura de novos usos e a melhoraria da infraestrutura existente. Terceira: em áreas com grandes ofertas de áreas públicas e problemas fundiários, na maioria das vezes decorrentes de ações públicas realizadas anteriormente (retificação de rios e tamponamento


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capítulo 5

de córregos para abertura de avenidas), objetivando a rearticulação do conjunto fundiário desajustado, geralmente com problemas ambientais e de inundações e sistemas viário e de transportes desarticulados e desconexos. Quarta: em áreas previstas para a construção de novas infraestruturas, normalmente atreladas a grandes desapropriações de terrenos privados, nos quais é desejável evitá-las, para viabilizar a implementação de abertura ou ampliação de novas avenidas, criação de parques lineares e construção de ciclovias. Quinta: em áreas de controle de urbanização e regularização fundiária, geralmente atreladas a assentamentos informais e irregularidades de ocupação (favelas), objetivando o reajuste da configuração urbana, principalmente em área de risco ou áreas de proteção ambiental estratégicas para a cidade, buscando a elevação da qualidade de moradia da população local. Após o processo de identificação e discussão do mecanismo, e apesar de todos os questionamentos apontados, no sentido de adaptar e aplicar o land readjustment em São Paulo, durante o processo de revisão do Plano Diretor Estratégico de São Paulo 2002-2012 (lei nº 13.430 de 2002), a SEMPLA – Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo inseriu na minuta da revisão do plano em questão os artigos 184 e 185, relativos ao instrumento do “reajuste fundiário”. O texto encaminhado à Câmara de Vereadores encontra-se a seguir: Seção VI - Do Reajuste Fundiário Art.184 - Fica instituído o instrumento do reajuste fundiário, para possibilitar a alteração das dimensões e da disposição de lotes e glebas num determinado perímetro, segundo um Plano Urbanístico Específico – PUE, com adesão dos proprietários nele contidos, visando a obtenção de melhorias urbanísticas, ganho de áreas públicas e de qualidade ambiental, fazendo-se cumprir a função social da propriedade nos termos dos artigos 11 e seguintes desta Lei. Art.185 - O reajuste fundiário poderá ser empregado exclusivamente nas seguintes áreas: I. contidas nos perímetros das Operações Urbanas Consorciadas; II. contidas nos perímetros das Áreas de Intervenção Urbana – AIU. (Projeto de Revisão da Lei nº 13.430 de 2002, artigos 184 e 185).

Esse trecho é um resumo do que foi discutido mais longamente por juristas e antigos urbanistas da SEMPLA, porque consideraram apropriado aprovar o mecanismo inovador em lei específica, em vez de detalhá-lo nessa revisão do plano diretor. De qualquer maneira segue a versão original:


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

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Art. xxx - Considera-se reajuste fundiário a transformação das dimensões e da posição de lotes e glebas num determinado perímetro, com adesão voluntária ou compulsória dos proprietários nele contidos, com o objetivo de se obter área em superfície de terreno a ser doada ou transferida ao Poder Público para promoção de melhorias urbanísticas e intensificação e controle do uso e da ocupação do solo, fazendo-se exercer a função social da propriedade dos artigos 11 e seguintes desta Lei. Art. xxx - Os objetivos do reajuste fundiário são: I. Promover a justa distribuição dos custos e benefícios decorrentes de obras e serviços de infraestrutura urbana e das demais ações públicas de manejo do solo urbano objeto de planos e projetos nos termos do artigo xxx desta lei e conforme estabelecido no projeto urbanístico. II. Facilitar a obtenção de área em superfície de terreno para execução de melhorias em infraestrutura. III. Garantir a participação de todos os envolvidos afetados pelas obras e ações previstas no plano urbanístico. Art. xxx - O reajuste fundiário poderá ser empregado exclusivamente nas seguintes áreas: I. contidas nos perímetros das Operações Urbanas Consorciadas; II. contidas nos perímetros das Áreas de Intervenção Urbana – AIU; III. contidas nos perímetros das Zonas Especiais de Interesse Social – ZEIS.

O atual Plano Diretor Estratégico é decenal e foi aprovado em 2002, com previsão de uma revisão em 2006 e outra em 2012. A revisão de 2006 foi adiada para julho de 2007, em seguida, para setembro de 2008 e até 2009 não aconteceu, ficando a cargo da gestão do prefeito, então, reeleito, Gilberto Kassab fazê-lo. Portanto, ainda não existe qualquer garantia de que a minuta de lei será aprovada na íntegra pela Câmara de Vereadores ou quais serão os artigos vetados ou alterados. De qualquer maneira, há disposição dos técnicos e dos responsáveis pela coordenação do planejamento urbano do município de São Paulo em explorar os conceitos relativos ao land readjustment, como forma de auxiliar nas intervenções urbanas estratégicas necessárias na cidade. A partir dos artigos sobre o “reajuste fundiário” relacionados à revisão do plano diretor, das dificuldades apresentadas e da identificação das áreas indicadas para aplicação em São Paulo, ainda resta responder a algumas perguntas que foram identificadas para o aprimoramento de certas indefinições e soluções. As perguntas baseadas no documento elaborado por Montandon e Souza (Montandon e Souza 2005, não publicado) estão relacionadas a seguir: a. O conceito de redimensionamento e reposicionamento de lotes está relacionado à transferência de direitos de propriedade de um título (terreno) para outro (terreno e/ou edificação). Essa característica do land readjustment apresenta ampla vantagem em relação ao usual método da desapropriação. A atual legislação brasileira, estadual e municipal pertinente permite a aplicação do conceito? Quais os conceitos e elementos que deveriam ser alterados ou


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capítulo 5

adaptados para aplicação no contexto citado? Como proceder a transferência de propriedades durante o projeto por meio da preservação dos títulos das mesmas? b. A partir da pergunta anterior, mas considerando os aspectos de projeto urbano, como desenvolver o exercício de redimensionamento e reposicionamento de parcelas de terra em áreas com grande diversidade de dimensões fundiárias e valores de mercado? c. Uma das principais características do land readjustment é a contribuição realizada com doação de parte do terreno para o incremento e a melhoria dos equipamentos urbanos e sociais e para constituição de terreno-reserva para comercialização. O sistema de contribuição (doação de terrenos) apresenta-se como uma justa contrapartida, uma vez que, mesmo que os proprietários tenham as suas propriedades reduzidas, a redução será sempre proporcional ao aumento das áreas e melhoria das infraestruturas, sendo os terrenos e imóveis consideravelmente valorizados. Como instituir juridicamente a obrigatoriedade da contribuição de melhorias? A contribuição pode ser relacionada ou classificada como contrapartida obrigatória? Nesse caso, poderia o investimento público extensivo (em toda a área de projeto) ser considerado como um benefício a ser compensado pela contribuição? d. Baseado na questão da contribuição, o método de cálculo da valorização dos imóveis está fundamentado principalmente em dados relativos ao projeto (fatores de acessibilidade, de proximidade com as infraestruturas e equipamentos sociais e fatores de geometria do lote). Esses critérios estão instituídos na legislação do land readjustment japonês e geram um procedimento lógico para definição dos valores mínimos dos terrenos após o projeto. A partir desse método, pode-se presumir a futura valorização de terrenos, reduzindo, de certa maneira, a especulação sobre os preços mínimos. Como instituir legalmente critérios para cálculo da valorização dos terrenos a exemplo do land readjustment japonês apresentado? e. Os principais benefícios concedidos no projeto de land readjustment estão relacionados à valorização futura das propriedades e ao desenvolvimento urbano local. A principal característica desses benefícios está na credibilidade que é depositada na valorização dos terrenos e na melhoria a ser promovida pelo poder público, graças à capacidade e ao desempenho do sistema de gestão. Um dos aspectos diferenciais está no método de cálculo da valorização dos terrenos posterior ao projeto, que garante essa valorização futura. Como vincular o valor calculado de cada propriedade (no caso da aplicação do método citado) antes da realização do projeto, acrescido dos fatores de valorização, ao valor mínimo do terreno após


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

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o projeto? Quais as questões de mercado imobiliário envolvidas? f. Para cada projeto de land readjustment um agente promotor e executor do projeto é instituído. Esse agente pode ser um órgão público, uma empresa pública, uma empresa privada (por meio de concessão), uma cooperativa formada pelos proprietários ou uma individual (investidor ou proprietário). O principal aspecto diferencial é que esse agente promotor é o responsável executivo pelo projeto, e é monitorado pelo governo local, regulado por legislação federal e acompanhado pelo conselho representativo das pessoas afetadas pelo projeto. Quais as atribuições desse agente executivo em cada projeto? Quais as obrigações jurídicas para o gerenciamento de contratos, principalmente aqueles relacionados à obras públicas? Quais as implicações jurídicas relacionadas aos terreno-reserva para custeio das obras públicas? Após tantos questionamentos, testaremos duas hipóteses. A primeira é a aplicação do land readjustment em um assentamento ilegal em área periférica da cidade de Hortolândia no Estado de São Paulo. O assentamento com baixa densidade populacional convive com vários problemas de infraestrutura urbana, como a inexistência de sistemas de coleta de esgoto e águas pluviais, a falta de pavimentação e de equipamentos públicos. Como se sabe, o land readjustment pode ser útil como ferramenta de desenvolvimento urbano numa vasta amplitude de situações, porém, ele depende de certas condições para que seja plenamente aplicado. Nesse sentido, testaremos o método numa área propícia à reurbanização e analisaremos seus resultados. O estudo em questão é de autoria de Renato Guimarães Pereira, arquiteto pós-graduado no curso “Urban development focused on Land Readjustment measures” em 2007, patrocinado pela JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão. A segunda hipótese é a aplicação dos conceitos do redesenvolvimento em uma área degradada da cidade de São Paulo, alvo há mais de trinta anos de uma lei de melhoramento viário que nunca chegou a ser implementado: seja pela falta de recursos para realizar todas as desapropriações necessárias para a construção da avenida, seja pela falta de instrumentos técnicos atrelados a vontade política capaz de viabilizar o projeto. Por isso, usaremos o instrumento de maneira bastante particular, com o objetivo de responder à demanda crescente da cidade de São Paulo de abertura de novas avenidas, unido a empreendimentos residenciais com o apoio e os recursos da iniciativa privada. O estudo em questão faz parte de um conjunto de estudos para viabilizar a Operação Urbana Carandiru Vila-Maria, aprovada pelo Plano Diretor Estratégico de São Paulo, mas ainda sem regulamentação em lei específica.


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capítulo 5

Estudo de hipótese: CDHU Hortolândia A2 Sítio São João Renato Guimarães Pereira O local escolhido para o estudo da primeira hipótese (aplicação do land readjustment em área de reurbanização de assentamentos informais) é a gleba denominada “Sítio São João”, na cidade de Hortolândia. O empreendimento está localizado a nordeste do município, lindeiro a uma via coletora denominada Avenida Minas Gerais, junto à ferrovia pertencente à concessionária Ferroban, e que faz divisa com o município de Sumaré. Trata-se de uma área com 99.000,00 m², parte de uma gleba maior denominada Hortolândia A, que possui um assentamento ilegal de moradores iniciado a partir de ocupação para fins agrícolas em meados de 1990. Em pouco tempo transformou-se de assentamento rural para uma área com características urbanas. Anteriormente, a gleba pertencia à FEPASA, a antiga empresa Ferrovia Paulista S.A., que administrava parte da rede ferroviária do Estado de São Paulo e foi privatizada no final da década de 1990. No processo de privatização, a FEPASA vendeu a área para a CDHU – Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo, num acordo com o Governo do Estado de São Paulo, que assumiu a responsabilidade por seu uso e também por solucionar todos os problemas urbanísticos ali existentes. Isso posto, nos deparamos com um problema ao analisarmos o histórico dos projetos sob responsabilidade da CDHU. O proprietário da área a sofrer uma intervenção, no caso da atuação da empresa, é a própria CDHU, ou em outros casos, alguma prefeitura municipal de uma cidade do Estado de São Paulo. Como projetos de land readjustment pressupõem que a área de sua aplicação tenha parcelas de terra ou glebas pertencentes a um grupo de proprietários particulares que desejem ou sejam encorajados a se unir para formar uma cooperativa para implementação do projeto, temos uma característica peculiar no Brasil: grandes assentamentos informais e favelas estão geralmente em terrenos públicos. Partimos, então, da premissa básica de que cada uma das famílias assentadas seria considerada proprietária de seus lotes (distribuição de títulos), de modo que pudéssemos aplicar as regras absorvidas no treinamento realizado no Japão. Em um levantamento planialtimétrico cadastral de 2002, verificamos a existência de 79 lotes, com a ocupação de 33 deles por moradias senão precárias, ainda em fase inicial de construção, fruto da invasão dos últimos anos. A dinâmica antrópica local se demonstrou muito mais agressiva do que o previsto e, em pouco mais de 5 anos,


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

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a ocupação avançou de forma acelerada, como pode ser visto comparativamente entre as imagens do parcelamento do solo e a imagem aérea da área. Ao analisarmos a situação de ilegalidade dos residentes encontramos uma controvérsia quanto ao termo “invasão”, já que os moradores atuais alegam que compraram seus lotes de um suposto latifundiário, no caso, um “grileiro”. Por isso, esses mesmos assentados têm uma demanda com o Estado de São Paulo, ainda em andamento, pleiteando uma solução para o impasse. É um caso complexo, por isso, o exercício pressupõe que a área já está dividida em 79 pequenas propriedades. O objetivo do estudo é verificar a possibilidade de aplicação do método do ponto de vista teórico, sem considerar tanto a prática, posto que o mais importante seja arraigar os conhecimentos adquiridos para uma posterior aplicação em um projeto real. Com esse objetivo em mente, a intervenção deve resolver os seguintes itens: a. b. c. d. e.

Tornar o desenho das quadras e dos lotes (79 ao todo) menos irregular; Pavimentar as vias, instalar sistema de drenagem e sistema de coleta de esgotos domésticos; Implantar paisagismo público viário e criar uma praça pública com área verde; Criar uma área comercial nos terrenos-reservas, para financiamento do projeto; Prever paradas para ônibus urbano, conectando assim a periferia à cidade.

Além disso, o projeto ainda objetiva transformar o Sítio São João em uma área residencial de classe C, com a manutenção dos residentes do local na região, valorizando a urbanização e servindo como exemplo para o processo de urbanização futura dos arredores. Para viabilizar a proposta, conforme mostra o mapa do novo parcelamento do solo, projeto adotado para solucionar os problemas descritos anteriormente, haveria implantação de área comercial nos terrenos-reserva, que seriam comercializados a investidores externos e conformaria um pequeno conjunto de edificações propícios a criação de empregos. Posto ser essa uma experiência didática, optamos por adotar praticamente todos os critérios técnicos e conceituais ditados pelas normas japonesas do land readjustment, com poucas adaptações. É claro que essa não “climatização” das normas trará alguma distorção no processo de análise de valorização artificial da terra, mas, a nosso ver, isso é irrelevante nessa etapa, já que o princípio dessa simulação é apenas aferir a possibilidade de aplicar ou não o método na realidade brasileira mais corriqueira, que são as nossas periferias carentes. Após a elaboração da proposta de novo sistema viário, áreas verdes e criação dos terrenos-


capítulo 5

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reserva, aplicamos todos os cálculos rigorosamente de acordo com o land readjustment japonês, para aferir a razão de valorização do m² de terreno, após a implantação do projeto, e chegamos a um índice de 14,0% no caso específico do Sítio São João. Ou seja: antes do projeto, o valor do m² era US$ 21,40; depois de sua realização, passaria a US$ 24,39. O projeto, incluindo a implantação, ficou orçado em US$ 5.417.500,00. Com esses dados, podemos constatar com facilidade que, mesmo se a contribuição para a doação fosse de 100,0%, o valor de venda de todos os terrenos somados não cobriria o do projeto implantado, inviabilizando-o. Nesse caso, mesmo com um subsídio de 45,0% do governo, dividido em partes iguais nas esferas municipal, estadual e federal, os proprietários ainda deveriam doar 166,0% de seus terrenos para cobrir os gastos, conforme demonstra o gráfico Avaliação do Terreno-Reserva para o Projeto CDHU Hortolândia A2 Sítio São João. TABELA 09: AVALIAÇÃO DO TERRENO-RESERVA (Projeto de Land Readjustment CDHU Hortolândia A2 Sítio São João) b’ = Preço da terra antes do projeto = Razão de acréscimo calculada a’ = Preço da terra presumido após o projeto = Classificação

Subsídio Estadual Subsídio Federal Fundo do Terreno de Reserva Subsídio Municipal Total

Área privada após o projeto

Lotes privados antes do projeto (registrado em cartório)

Área exata antes do projeto (incluindo a diferença entre o registrado e o levantado)

Lotes privados, incluindo terrenos-reserva

A 80.405,63

15,00% 15,00% 55,00% 15,00% 100%

R$ 21,40 1,14 R$ 24,39

/m²

Valor em R$ 812.626,24 812.626,24 2.979.629,54 812.626,24 5.417.508,25 Contribuição

Taxa de contribuição

Lotes privados, excluindo terrenosreserva m²

Área contribuída para equipamentos e vias públicas m²

Área contribuída para equipamentos, vias públicas e terrenos-reserva m²

Percentual de contribuição para equipamentos públicos %

D=A+B

X=Z-C

Y=X-R

P=D-X

E=D-Y

P/D x100

E/Dx100

80.405,63

69.084,75

53.078,14

11.320,88

133.483,77

14%

166%

Percentual de contribuição para áreas públicas e terrenos-reserva %


as possibilidades de aplicação do land readjustment no Brasil

245

Agora vamos prosseguir o estudo, mudando a situação da seguinte forma: se o Sítio São João estivesse localizado numa área onde o valor do metro quadrado fosse sensivelmente mais alto, a valorização de 14,0% traria um ótimo benefício aos seus proprietários, cobrindo o valor do projeto com uma parcela pequena de terreno-reserva. Portanto, se alterarmos o valor da terra, aumentando-o, haverá uma sensível diminuição na contribuição para os terrenos-reserva. O gráfico Nova Avaliação do Terreno-Reserva para o Projeto CDHU Hortolândia A2 Sítio São João faz uma simulação, alterando o valor do metro quadrado do lote para US$ 600,00. Nessa nova situação, a parcela de contribuição passou para um percentual tolerável de 22,0%, permitindo a viabilidade do projeto com menos subsídios governamentais, no caso, um total de 15,0%. TABELA 10: NOVA AVALIAÇÃO DO TERRENO-RESERVA (Projeto de Land Readjustment CDHU Hortolândia A2 Sítio São João) b’ = Preço da terra antes do projeto = Razão de acréscimo calculada a’ = Preço da terra presumido após o projeto =

Classificação

Subsídio Estadual Subsídio Federal Fundo do Terreno de Reserva Subsídio Municipal Total

Área privada após o projeto

Lotes privados antes do projeto (registrado em cartório)

Área exata antes do projeto (incluindo a diferença entre o registrado e o levantado)

Lotes privados, incluindo terrenos-reserva

A 80.405,63

R$ 600,00 1,14 R$ 683,85

5,00% 5,00% 85,00% 5,00% 100%

/m²

Valor em R$ 270.875,41 270.875,41 4.604.882,01 270.875,41 5.417.508,25

Contribuição

Taxa de contribuição

Lotes privados, excluindo terrenosreserva m²

Área contribuída para equipamentos e vias públicas m²

Área contribuída para equipamentos, vias públicas e terrenos-reserva m²

Percentual de contribuição para equipamentos públicos %

D=A+B

X=Z-C

Y=X-R

P=D-X

E=D-Y

P/D x100

E/Dx100

80.405,63

69.084,75

62.350,98

11.320,88

18.054,65

14%

22%

Percentual de contribuição para áreas públicas e terrenos-reserva %


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capítulo 5

Essas constatações já nos haviam sido indicadas no treinamento no Japão, quando nos alertaram de que, em geral, quanto mais central é a localização da área do projeto maior é a participação da iniciativa privada nos custos do mesmo; e o contrário: quanto mais periférica, maior a participação de recursos públicos. Isso porque o valor inicial da terra tende a ser muito baixo em áreas mais afastadas dos grandes centros, dificultando o autofinanciamento do projeto/obra a partir da venda de parte dos terrenos da área. Em outras palavras, mesmo que haja facilidade em vender a terra e que ela tenha sido valorizada com a implantação do projeto, o montante arrecadado com a venda, em muitos casos, não cobre os gastos com o projeto, ou, para que cubra, exige a venda de uma parcela tão expressiva que inviabiliza o empreendimento. O mesmo ocorreu com o caso estudado, ou seja, a parcela de terreno-reserva teria que ser tão grande, que seria maior do que o próprio empreendimento. Didaticamente, isso serve para comprovar a sua ineficácia em situações de Imagem aérea e parcelamento do solo antes da execução do projeto de land readjustment. 64

Projeto de land readjustment proposto para o assentamento. 4


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urbanização em áreas periféricas menos valorizadas. Nesses casos, o subsídio do governo em suas três esferas deverá ser necessariamente alto, como já é comum em nossa realidade. É obvio que em situações reais essa modificação não é possível e temos poucas variáveis passíveis de alteração. Os subsídios do governo é uma delas. É nesse ponto que entra um ingrediente importante nas negociações de projetos que podem ser desenvolvidos no Brasil, com sua tradição política. Se demonstramos a ineficiência do instrumento em financiar projetos em áreas periféricas, podemos, a partir dele, avançar em outros mecanismos para a desoneração dos cofres públicos para a urbanização. Dessa forma, o instrumento do land readjustment pode ser encarado como parte do processo da urbanização, como uma ferramenta para reorganizar o solo, e a partir desse processo, ela poderá ser estruturada com a inserção da população de baixa renda em programas de produção de conjuntos habitacionais a preço subsidiado, permitindo a urbanização e a edificação das casas na modalidade de mutirão, assistido pelo poder público. Estudo de hipótese: Operação Urbana Carandiru – Vila Maria A Operação Urbana Carandiru – Vila Maria é uma entre as duas operações urbanas aprovadas pelo Plano Diretor Estratégico de São Paulo 2002-2012 (lei nº 13.430 de 2002) com prerrogativas a reconfigurar a região norte da cidade (a outra se chama Operação Urbana Diagonal Norte). A região caracteriza-se pelo conjunto de parcelas de terra muito heterogêneas (concentrações de grandiosas parcelas próximas a outras com dimensões pequenas), dispostas de maneira desordenada. Essa característica heterogênea de parcelamento do solo também se reflete em seu uso e ocupação do solo: grandes equipamentos de caráter metropolitano (centro de convenções, shoppings centers, clubes e aeroporto) estão lado a lado com bolsões residenciais, favelas, cortiços, antigas indústrias e transportadoras. O processo de ocupação da região diminuiu a quantidade de áreas públicas, reduzindo a capacidade do poder público de construir equipamentos sociais, áreas verdes e novo sistema viário. Além da necessidade de um processo de reparcelamento da região, para adequar a região às diversas escalas presentes, reduzindo o caráter inóspito e de periculosidade presente em muitos pontos da região, a principal característica dessa operação urbana é ampliar a infraestrutura de espaços públicos e conexões viárias no sentido leste-oeste, criando um sistema de apoio às vias marginais ao longo do Rio Tietê.


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capítulo 5

Para alcançar seus objetivos, a operação pretende aproveitar-se do processo de atual expansão imobiliária que vem acontecendo nos últimos anos ao longo da Avenida Luis Dumont Villares e no bairro Alto de Santana, oriundo, entre outros fatores, da criação do Parque de Juventude em agosto de 2002. O parque é resultado da desativação das atividades prisionais do complexo penitenciário do Carandiru (palavra que dá nome à operação urbana), processo que concedeu enorme potencial para a valorização fundiária e a implementação de intervenções necessárias à região. O local escolhido para o estudo da segunda hipótese (aplicação do projeto de redesenvolvimento urbano em territórios consolidados) está inserido dentro da Operação Urbana Carandiru-Vila Maria, no bairro de Santana na cidade de São Paulo. O projeto está baseado na abertura de uma avenida, aprovada pela lei de melhoramento viário datada de 1973. De acordo com a lei n° 7.884 de 12 de janeiro de 1973, que aprova o plano de alargamento das ruas Darzan e Major Sampaio, foram estabelecidas as seguintes diretrizes: Art. 1 - De acordo com as plantas anexas [...], fica aprovado plano de melhoramentos, no 8º subdistrito – Santana, a saber: I – Alargamento da Rua Darzan [...] com largura variável de 35 a 45 metros e extensão aproximada de 385 metros; II – Alargamento da Rua Major Sampaio, [...], com largura variável de 38 a 45 metros de extensão aproximada de 100 metros; III – Concordância de alinhamentos, em curva, entre a Rua Major Sampaio e a Avenida General Ataliba Leonel, entre esta e a Rua Jovita. Art. 2 - Os imóveis atingidos pelo plano ora aprovado são declarados de utilidade pública, para efeito de desapropriação, ficando o Executivo autorizado a efetivar as desapropriações dentro do prazo de 5 (cinco) anos, contados da data desta lei. Art. 3 - As despesas com a execução desta lei ocorrerão por conta das verbas orçamentárias próprias. (Lei n° 7.884 de 12 de janeiro de 1973).

Esse projeto constou em todos os planos diretores anteriores e, inclusive, faz parte dos atuais Plano Diretor Estratégico de São Paulo 2002-2012 (lei nº 13.430 de 2002) e do Plano Regional Estratégico – Subprefeitura de Santana-Tucuruvi (lei nº 13.885 de 2004). De todas as obras de melhorias viárias e vias a abrir aprovadas por tais planos, essa via é a menor, e segundo tais planos tinha prioridade para sua execução em até 2006, o que não aconteceu efetivamente até hoje. Imagem aérea da operação urbana consorciada Carandiru-Vila Maria, zona norte de São Paulo em 2004. 4 Intervenções viárias propostas pela operação urbana e delimitação das quadras diretamente influenciadas. 4



5Operação urbana consorciada Carandiru-Vila Maria: situação atual da rua Darzan, zona norte de São Paulo.


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O principal objetivo do estudo em questão é discutir os entraves para a abertura, sem a utilização do instrumento da desapropriação, conforme estipulado pela lei de 1973, usando os meios encontrados na legislação brasileira e adaptando-os para conformarmos um projeto de redesenvolvimento urbano. Sem o uso da desapropriação, teremos de usar parte dos terrenos privados para a constituição da nova via, e os terrenos resultantes serão verticalizados, utilizando os coeficientes da operação urbana, para criar a viabilidade econômica necessária ao empreendimento. Nesse momento da história de São Paulo, a aquisição de terras por meio de desapropriação é particularmente difícil devido à verdadeira indústria de precatórios que antigas desapropriações geraram, com exagerados preços avaliados e com sistema de juros e correções monetários que aumentaram esses valores, criando o atual endividamento do município e incapacitando-o para investir no desenvolvimento urbano com recursos próprios. Os coeficientes aprovados para a área pelo atual plano diretor, uma zona de centralidade polar, são os de aproveitamento máximo igual a 2,5 e a taxa de ocupação dos lotes é igual a 0,5, ou 50% da área total. Atrelando a abertura da avenida aos coeficientes da operação urbana, teremos um coeficiente de aproveitamento maior, igual a 4,0, ou 4 vezes a área total do terreno em área construída. Segundo dados históricos e levantamentos feitos no local, o principal problema da área é a falta de um uso consolidado, principalmente ao longo das ruas Darzan e Major Sampaio, resultado da situação atual em que elas servem como vias de passagem para o trânsito no sentido leste-oeste da região sem possuírem tamanho e “grades” adequados. Além disso, as duas vias possuem problemas de microdrenagem e, por isso, são alvos de inundações sazonais. São fatores que, somados à lei de melhoramento viário, depreciaram o valor e a qualidade dos imóveis da região, como pode ser visto pelas imagens ao lado de alguns dos imóveis da área do projeto. Para este estudo de hipótese foram selecionadas parcialmente 5 quadras de intervenção direta, onde se localizam todas as propriedades diretamente afetadas pela abertura da avenida, num total de 123 lotes e 111 proprietários. No montante das áreas dos terrenos privados, 42,78 % são de usos comerciais, 33,98 % são de usos residenciais e 23,24 % são depósitos, armazéns e um posto de gasolina. A área total da zona de intervenção perfaz 38.269,89 m², sendo 33,26 % de áreas públicas (12.730,63 m² de calçadas e ruas) e 66,74 % de áreas privadas (25.539,26 m²). A área total atualmente construída está dividida em 12.365,00 m² para usos comerciais, 9.228,00 m² para usos residenciais e 4.320,00 m² para outros usos. Dividindo a somatória de todas as áreas de construção


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(25.913,00 m²) pela de todas as áreas dos terrenos privados (25.539,00 m²) temos um coeficiente de aproveitamento atual igual a 1,01 para a zona de intervenção direta. TABELA 11: NÚMERO DE LOTES E PROPRIETÁRIOS POR QUADRA (Projeto de Redesenvolvimento Urbano da Operação Urbana Carandiru - Vila Maria) QUADRA 073038

LOTES Quantidade (%) 27 21,95%

PROPRIETÁRIOS Quantidade (%) 22 19,82%

073045

39

31,71%

36

32,43%

073051

32

26,02%

28

25,23%

073058

22

17,89%

22

19,82%

073059 Total

3 123

2,44% 100,00%

3 111

2,70% 100,00%

TABELA 12: CLASSIFICAÇÃO DO USO DO SOLO ANTES E DEPOIS DO PROJETO (Projeto de Redesenvolvimento Urbano da Operação Urbana Carandiru - Vila Maria) CATEGORIA ÁREAS PÚBLICAS Sistema viário Parques e áreas verdes Subtotal (M) / (N) ÁREAS PRIVADAS Propriedades privadas (A) / (E) Terrenos-reserva (R) Subtotal Total

ANTES DO PROJETO Área ( m² ) (%)

DEPOIS DO PROJETO Área ( m² ) (%)

12.730,63 0,00 12.730,63

33,27% 0,00% 33,27%

24.576,34 274,04 24.850,38

64,22% 0,72% 64,93%

25.539,26 0,00 25.539,26 38.269,89

66,73% 0,00% 66,73% 100,00%

13.419,51 0,00 13.419,51 38.269,89

35,07% 0,00% 35,07% 100,00%


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O projeto contempla a construção da nova avenida estipulada pela lei de melhoramento viário de 1973, com o mínimo uso do instrumento da desapropriação. Isso significa que ele tem como principal característica a construção de nova infraestrutura urbana com a manutenção da população residente no local. Além disso, o estudo procura viabilizar economicamente a execução das infraestruturas públicas por meio da criação de um fundo específico de urbanização, com recursos da iniciativa privada, ficando a cargo do poder público: a. Criar a lei específica do projeto ou dispor em conjunto com as propostas da lei específica da Operação Urbana Carandiru – Vila Maria, aprovando o projeto desenvolvido pelos técnicos do poder público e aprovando a criação do fundo específico de urbanização para viabilizar a proposta de intervenção; b. Participar da nova pessoa jurídica criada para administrar o fundo, aos moldes de uma Sociedade de Propósito Específico – SPE, sem entrar na parceria com recursos, mas tendo a seu cargo desapropriar os proprietários que não estiverem dispostos a integrar-se ao projeto; c. Fiscalizar a execução das obras, a administração do fundo e o diálogo junto aos investidores, comerciantes e moradores da área. A partir de então, todas as decisões sobre a priorização dos investimentos poderão ser compartilhadas entre esses representantes, assegurando o direito de acompanhamento circunstanciado pelos particulares interessados, garantindo o acesso aos documentos pertinentes. Ainda assim, temos a temática mais delicada: o veto dos moradores. As leis de land readjustment em outros países declaram que os projetos serão levados adiante com a adesão de dois terços dos moradores concordantes, para que os demais não detenham o poder de obstrução. No Brasil, pela própria falta de experiência na execução de projetos urbanos em parceria com setores privados, não encontramos essa regulamentação aprovada em qualquer lei. Por isso, nos parece certo que o processo de acordo e adesão dos proprietários seria feito via agência específica, para cuidar caso a caso das necessidades dos moradores, garantindo aos residentes da área o direito de serem ouvidos em audiência pública sobre os objetivos do plano a ser implantado. Com isso, também se dá aos proprietários o direito de, ao discordarem dos termos adotados pelo ente requisitante do juízo arbitral, utilizar uma forma mais expedita de solução de conflitos de interesses do que o processo judicial comum, para apenas na impossibilidade de solução recorrer ao processo de desapropriação. Na realidade, alguns argumentos para a aprovação da proposta seriam eficazes.


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capítulo 5

Destacamos: a. Crescente estado de desvalorização da região: fatores como a lei de melhoramento viário (que indica futura desapropriação de terrenos), a interferência atual do trânsito, a vocação da região como trecho de ligação entre duas avenidas de grande porte e as constantes inundações na área depreciaram o valor dos imóveis. Participar de um projeto de redesenvolvimento urbano significaria morar numa localização com espaços públicos adequados, recebendo de volta no novo empreendimento a mesma área possuída antes do projeto, mas com o preço valorizado pela nova intervenção. Além disso, a grande maioria dos imóveis residenciais data do período entre as décadas de 1930 e 1960, e os imóveis comerciais, entre 1960 e 1980, não estando adaptados às demandas atuais do mercado imobiliário; b. Desapropriação x Fundo de Urbanização: participar do fundo de urbanização seria mais vantajoso do que passar por qualquer impasse desgastante junto aos órgãos públicos em casos de desapropriação. O valor da desapropriação a ser indenizado consideraria os valores atuais (alvos dos precedentes de desvalorização). Enquanto que, com a participação no fundo, as cotas devolvidas dariam aos residentes retorno acrescido de valorização. Após o processo de adesão, cada proprietário recebe uma cota do fundo de urbanização referente à metragem e/ou valor da área do terreno, segundo processo detalhado de agrimensura e avaliação imobiliária. Os receptores das cotas podem vendê-las a qualquer momento ao longo do processo de execução do projeto, ficando a cargo do próprio proprietário arcar com a responsabilidade dessa transação, respeitando as regras estipuladas pelo fundo. Este criaria incentivos para os residentes que permanecessem até o final da execução do projeto. Portanto, enquanto o investidor privado (que pode ser uma construtora, uma incorporadora ou até mesmo um banco) arcaria com os custos da construção dos empreendimentos imobiliários e da infraestrutura pública, os proprietários entrariam com suas propriedades que se tornariam cotas a serem trocadas por imóveis residenciais ou comerciais após a renovação urbana (ou ainda colocadas à venda para outros interessados). O fundo regulamentaria a forma pela qual seriam emitidos os títulos definitivos firmados pelos proprietários, contendo os termos, cláusulas e condições relativas ao empreendimento, sendo atribuído a ele o caráter de escritura pública para todos os fins e efeitos de direito, devendo ser registrado no cartório de circunscrição imobiliária competente, para transmitir o domínio sobre os lotes a serem urbanizados, depois, utilizados para ressarcir os cotistas. As opções de financiamento


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do empreendimento seriam estruturadas em um conjunto de operações responsáveis por garantir o desenvolvimento das obras e sua efetiva ocupação pelos novos usuários; as fontes primárias de recursos poderão ser garantidas pelo construtor por financiamento (bancário, de curto prazo), geralmente vinculado ao prazo de construção da obra. O projeto baseia-se em 47,46% de taxa de contribuição dos terrenos privados, o que significa que, dos atuais 25.539,00 m² de área privada, 12.119,99 m² seriam revertidos em espaços públicos. Com essa reconfiguração a área de intervenção direta passaria a ter 24.850,00 m² de áreas públicas onde se implantariam novas calçadas adequadas aos padrões de acessibilidade, uma ciclovia e a nova avenida, ampla e adequada ao trânsito da região. Mesmo com a conversão de quase 50,0% de área privada em área pública, os restantes 13.419,51 m² de área privada seriam verticalizados segundo o coeficiente de aproveitamento máximo aprovado em operações urbanas, 4,0. Dessa maneira teríamos o total de 53.677,99 m² de área a ser construída, dividido em 5 conjuntos edificados propostos. Desse montante, uma parte seria entregue a todos os cotistas do fundo de urbanização e outra seria vendida pelos investidores como retorno financeiro ao investimento na construção do empreendimento e da infraestrutura pública. TABELA 13: CÁLCULO PARA TAXA DE CONTRIBUIÇÃO EM TERRENO (Projeto de Redesenvolvimento Urbano da Operação Urbana Carandiru - Vila Maria) Propriedades Privadas

Propriedades Privadas

antes do Projeto

depois do Projeto (m²)

Áreas Públicas

TerrenosReserva

Total

Áreas Públicas

TerrenosReserva

Total

A (m²)

D - R, sendo D=A-P

P=N-M

R

P+R

p=P/A

r=R/A

(P+R)/A

25.539,26

13.419,51

12.119,75

0,00

12.119,75

47,46%

0,00%

47,46%

Contribuição (m²)

Taxa de Contribuição

Haveria uma distribuição de usos no novo empreendimento de acordo com as proporções anteriores, ainda existindo a possibilidade de mudança de usos em concordância com as próprias necessidades dos cotistas. Nos edifícios também se pretende, como condição para a instalação


56Imagem a茅rea, maquete eletr么nica e proposta de abertura da nova avenida em acordo com a lei.


Parcelamento do solo, 5 conjuntos resultado da intervenção e projeto de redesenvolvimento urbano. 56


56Perspectiva artística mostrando antes e depois da execução do projeto de redesenvolvimento urbano.


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proporcional dos usos, implementar equipamentos públicos de acordo com a demanda da região, que carece de creche, posto policial, posto de saúde e outras demandas sociais. A distribuição de usos teria outro importante papel além de responder às demandas do bairro: o de estabelecer e reproduzir a dinâmica apresentada nas Avenidas Brás Leme, Ataliba Leonel e Luis Dumont Villares, que, além de possuir um porte capaz de suportar o intenso trânsito da região, possuem uma dinâmica equilibrada entre usos comerciais, residenciais e espaços arborizados, criando uma melhor condição de moradia. Durante o processo de execução das obras nenhum morador do local seria temporariamente desalojado, apenas os usos comerciais e armazéns. O primeiro vetor de transformação seria a substituição de um edifício comercial (uma marmoraria) e de um posto de gasolina por um edifício residencial (01), beneficiado economicamente por estar em frente ao Parque da Juventude. Com esse primeiro edifício, construído com menores dimensões e padrão médio de qualidade, seríamos capazes de relocar os moradores com menor perfil econômico, com renda suficiente para se estabelecer nesse novo empreendimento (valor de condomínio compatível ao dos impostos pagos pelo morador antes da mudança). Com essa primeira transferência teríamos a vacância necessária para a construção do edifício de uso misto (02), com embasamento de 4 andares para a relocação de usos comerciais acrescida da locação de equipamentos públicos e 10 andares de usos residenciais. Esse edifício poderia ter uma arquitetura arrojada com ampla vista para o parque e expectativa de maior valorização por conta de sua localização estratégica. Também receberia moradores com melhor perfil econômico de outras duas quadras de intervenção, criando mais duas zonas de vacância para a construção de dois novos conjuntos edificados também de uso misto (03 e 04). Com essas duas novas construções, praticamente todos os proprietários teriam utilizado suas cotas e parte dos edifícios anteriormente construídos e o último conjunto edificado (05) teriam unidades residenciais e comerciais a serem colocadas à venda no mercado imobiliário. Após a construção de todos os edifícios haveria a vacância necessária para as áreas públicas, paga pelos investidores privados por meio do fundo e da rentabilidade adquirida com a venda dos imóveis restantes. No processo de execução o poder público fiscalizaria e asseguraria aos proprietários, para que não sofram perdas decorrentes do atraso ou interrupção na execução do empreendimento, salvo caso de força maior, que seriam indenizados pelo fundo de urbanização por quaisquer prejuízos causados. Agora discutiremos a avaliação econômica e o estudo de viabilidade de um empreendimento


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desse porte. Segundo a tabela Despesas e Receitas, temos o custo total para a execução na ordem de R$ 165 milhões, sendo 140 milhões para a construção dos empreendimentos privados e R$ 25 milhões para a construção das áreas públicas. Os valores dos terrenos e das propriedades privadas não entrariam como despesa, porque seriam revertidos em cotas para cada proprietário. Após a construção dos empreendimentos, considerando a avaliação recorrente do processo de transformação, o fundo pode faturar um total de até R$ 268 milhões com a comercialização da área construída por valores a preço de mercado. Dividindo o valor total da receita pela despesa temos o fator 1,62 (268 milhões divididos por 165 milhões). Esse seria o fator de cada cota. Ou seja, a cada 1 metro quadrado que o proprietário concedesse para a realização do projeto ele receberia 1,62 em cotas para utilizar como moeda de troca após a execução do empreendimento. Segundo técnicos em incorporações, em entrevistas e pesquisas realizadas no ano de 2008 na cidade de São Paulo, esse fator não tornaria o empreendimento viável pela falta de rentabilidade que o investidor privado teria para participar do fundo. O fator ideal para investimentos de grande porte costuma ter valor na ordem de 2,5 (fator elaborado sobre as taxas de oportunidade ano a ano e dado pela alta taxa de juros no Brasil, cerca de 13,0% ao ano, durante o período de execução do empreendimento). Isso significa que o montante necessário para alavancar o empreendimento teria que ser R$ 412 milhões, em vez dos R$ 268 milhões calculados, utilizando o CA = 4,0. Para tanto existem duas opções: a. A primeira seria alterar o coeficiente máximo em específico dentro desse projeto. Para viabilizar os R$ 144 milhões a mais, os empreendimentos precisariam ter uma área construída total de 82.400,00 m², no lugar de 53.677,99 m². Isso significa que a área, em vez de possuir CA = 4,0 precisaria ter CA = 6,15; b. A segunda seria captar o déficit da rentabilidade por meio das quadras do entorno e das áreas indiretas de intervenção, na forma de venda de potencial construtivo e captação de outorga onerosa do direito de construir. De certa forma, os empreendimentos do entorno imediato que viriam logo após a abertura da avenida teriam que pagar uma espécie de pedágio para ressarcir os proprietários que realmente participaram do empreendimento inicial, pois graças a eles toda a região foi beneficiada e valorizada. Esse fundo de compensação seria aplicado num total de 10 quadras localizadas no entorno imediato da nova avenida. Seria necessário para o fundo de compensação a venda de 100.000,00 m² de área construída, distribuídos em 25.000,00 m² de área de terreno, para viabilizar o projeto de tal ressarcimento.


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TABELA 14: DESPESAS E RECEITAS (R$) (Projeto de Redesenvolvimento Urbano da Operação Urbana Carandiru - Vila Maria) DESPESAS (R$) Custos da Construção dos Empreendimentos Privados Custos da Construção das Áreas Públicas Custos da Aquisição dos Terrenos Privados TOTAL

Quantidade 53.677,99 m² 24.850,00 m² 25.539,00 m²

Valor (R$) 140.560.000,00 25.250.000,00 (*) 165.810.000,00

RECEITAS (R$) Subsídios Governamentais (**) Receita por meio da Venda dos Imóveis Outras Receitas (***) TOTAL

Quantidade 53.677,99 m²

Valor (R$) 268.385.000,00 144.115.000,00 412.500.000,00

(*) Não haveria aquisição dos terrenos privados, entrando esse valor como referência para estabelecer as cotas dentro do fundo de urbanização. (**) Os únicos gastos do poder públicos seriam a alocação de uma equipe de funcionários públicos para a execução do projeto. (***) Conforme mostrado no estudo de hipótese, a receita gerada não seria suficiente para viabilizar economicamente o empreendimento, necessitando de uma receita adicional que poderia ser gerada tanto pelo aumento do potencial construtivo na área de intervenção direta, quanto pela venda de outorga onerosa nas áreas de intervenção indireta.

Mesmo com todas essas proposições, ainda se faz necessário um maior aprofundamento técnico quanto à viabilidade econômica, institucional e jurídica da proposta. Existe uma grande dificuldade do poder público, entre outras a serem apontadas e discutidas, em trabalhar com os setores privados e principalmente em participar de fundos particulares. Mas são dificuldades que o poder público terá que transpor cedo ou tarde para reorganizar a cidade. Como conclusão, o estudo nos mostra um caminho para estimular o crescimento econômico, contrapondo o que vem sendo feito até então: uma forma de crescimento que não está baseado no modelo valorizaçãoespeculação. Dessa forma, temos uma proposta de mudança do atual papel do planejamento urbano em São Paulo, que fica restrito ao âmbito normativo, concedendo índices e definindo


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diretrizes que perdem força na negociação com a iniciativa privada, porque a alteração de índices e a aplicação de recursos em obras sem prioridades técnicas acabam ocorrendo como forma de beneficiamento de alguns investidores e interesses privados. Nesse caso, o munícipe tem a oportunidade de morar num lugar melhor e com melhor infraestrutura pública, o investidor possui vacância e novos terrenos para explorar e o poder público consegue viabilizar a modernização de setores da cidade com quantidade mínima de investimentos e desapropriações. Assim, o poder público condiciona o munícipe e o investidor privado à responsabilidade consorciada da renovação urbana. Além disso, com o consequente aumento de unidades imobiliárias haverá o aumento da cobrança de impostos e taxas prediais, permitindo ao poder público a manutenção dos equipamentos públicos construídos. Por fim, temos três considerações a respeito desse estudo de hipótese. A primeira é sobre a real função do Plano Diretor Estratégico de distribuir índices (coeficiente de aproveitamento, taxa de ocupação) pela cidade não atrelados a projetos urbanísticos. Como ficou claro, nem o CA estabelecido pela lei de uso e ocupação do solo (CA = 2,5) e nem a lei de operações urbanas (CA = 4,0) seriam suficientes para viabilizar o empreendimento e a via pública. Talvez o correto fosse algo mais específico (como exemplo, CA = 6,15), com uma razão técnica fundamentada, como é encontrado em projetos de redesenvolvimento urbano ao redor do mundo. A segunda é sobre o Estudo de Impacto Ambiental e o Estudo de Impacto de Vizinhança em projetos de redesenvolvimento urbano. Conforme estipulado pelo Estatuto da Cidade: Art. 37 – O Estudo de Impacto Ambiental será executado de forma a contemplar os efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida na população residente na área e suas proximidades, incluindo a análise, no mínimo, das seguintes questões: I - adensamento populacional; II - equipamentos urbanos e comunitários; III - uso e ocupação do solo; IV - valorização imobiliária; V - geração de tráfego e demanda por transporte público; VI - ventilação e iluminação; VII - paisagem urbana e patrimônio natural e cultural. (Lei nº 10.257 de 2001).

O poder público precisará modernizar-se no processo de avaliações dos Estudos de Impacto Ambiental atrelados a projetos urbanos, pois, conforme o atendimento aos requisitos descritos anteriormente, e sobretudo conforme se vem constatando, tais processos são muito morosos.


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Por conta da própria participação, do extenso trabalho técnico e do desenvolvimento de estudos prévios, essa fase pode durar anos, alongando o prazo para sua institucionalização e prolongando o conflito de interesses, entre os envolvidos e a gestão, em regulamentar o empreendimento. Isso pode inviabilizar o projeto, principalmente pela dissonância com o “timming” encontrado nos setores privados. A terceira é sobre o estudo de viabilidade econômica. Conforme ficou demonstrado, se adotada a segunda opção, referente a captar o déficit do fundo por meio da venda de potencial construtivo das quadras do entorno para a obtenção de recursos, o montante total poderia suscitar um raciocínio inverso: por que o poder público não adquire fundos com a venda da outorga onerosa do direito de construir e com essa verba não desapropria todas as propriedades e abre a avenida com recursos próprios (como vem acontecendo constantemente em nossa cidade)? Porque, ao apenas desapropriar e abrir a avenida, deixando o entorno imediato ao sabor do processo de especulação, o poder público perde a oportunidade de “criar cidade” com os moradores vivendo em condições melhores, perde a oportunidade de balancear os usos do entorno das novas infraestruturas públicas, perde a oportunidade de diminuir a segregação social e, mais uma vez, perde a chance de estabelecer a justiça e a ordem no processo de desenvolvimento urbano. Síntese e conclusões: as oportunidades que envolvem o land readjustment no Brasil O interesse nacional que está se formando por maiores avanços em torno da reforma urbana tem como principal premissa produzir métodos de planejamento urbano mais eficientes e menos custosos, com expectativa de serviços melhores e mais qualificados com programas mais efetivos, e, simultaneamente, permitir maior controle público e autonomia gerencial, tornando o governo mais transparente e eficaz. Portanto, se faz oportuno questionar: por que no sistema de governo brasileiro existiria a necessidade de um instrumento como o land readjustment? Ainda que exista a necessidade de um maior aprofundamento sobre certos tópicos relacionados à transferência de conhecimento, nos parece correto afirmar a existência de duas respostas. A primeira resposta seria a necessidade da transformação da propriedade privada legitimada pela ação conjunta entre poder público e a sociedade civil no sentido de produzir melhorias na cidade. A segunda seria a necessidade de processos de gestão social na elaboração, aprovação e


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implementação de projetos urbanos (como acontece em muitos projetos de reurbanização de favelas). Ainda que essas propostas encontrem resistência, quando encontraremos uma “janela de oportunidade”, com grupos das mais diversas áreas da sociedade civil batalhando por interesses desse tipo, e como isso influenciará a então reforma urbana, temos poucos mecanismos teóricos para predizer. Nesse longo processo de reforma das políticas urbanas, compreende-se que muitas janelas foram e podem ser abertas e fechadas. Além disso, qualquer reforma da gestão pública no sentido de incorporar novos métodos e metodologias pode dar errado. “Elas podem não trazer benefício algum, falhar e ainda gerar efeitos políticos e administrativos perversos” (Pollitt e Bouckaert 2000, p.127). Mesmo porque, a nosso ver, a reforma necessária para a aplicação de novos mecanismos urbanísticos é um subconjunto de todas as performances políticas, e não um conjunto separado de esforços técnicos. Não temos dúvida de que a adaptação e a aplicação do land readjustment, não apenas à realidade brasileira, mas a outras, é valida. Essa, ao nosso ver, é uma das formas de aplicar o conceito da contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas, que consta na Constituição Federal de 1988, e de fazer cumprir a função social da propriedade urbana, que consta na lei federal do Estatuto da Cidade (Lei n° 10.257 de 2001). Ainda que instrumentos semelhantes existam em algumas legislações municipais ou apresentem estudos anteriores que ficaram fora da legislação final aprovada, não vemos mais razões para eles ficarem fora do alcance do poder público e consequentemente da produção da revitalização urbana tão necessária. Os instrumentos atuais ainda não oferecem uma efetiva capacidade comunitária pública ou privada de reparcelamento do solo, necessárias em face ao frequente fracionamento aleatório dos solos rural e urbano, para obtenção de uma melhor qualidade de vida, com espaços e equipamentos públicos de convivência, áreas verdes e espaços privados com luz e ventilação. Após os estudos apresentados nesta publicação, nos pareceu claro que a compreensão dos conceitos do método do land readjustment, a serem desenvolvidos dentro da legislação brasileira, deveria ser realizada de maneira desassociada: primeiramente entender passo a passo as condições para existência dos projetos do land readjustment em outras realidades e, depois, utilizá-las para compreender quais as deficiências existentes no processo de formulação do desenvolvimento urbano no Brasil. Trabalhando dessa maneira desassociada concluímos que os seguintes conceitos deveriam ser desenvolvidos dentro da legislação brasileira: os aspectos normativos referentes à revisão dos planos diretores, a instituição de processos de replotting (reparcelamento), a aplicação


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da taxa de contribuição (seja por meio de parcela de terra, contrapartida financeira ou participação em fundo de urbanização), a constituição de agências de implementação de projetos específicos (público ou privado, “in loco”), a reconstituição dos métodos de avaliação existentes (coleta de impostos e avaliações imobiliárias) e a urgente modernização dos sistemas cadastrais e de administração da titularidade da terra. Por meio de lei específica de land readjustment no Brasil, por meio da revisão do Estatuto da Cidade ou por meio da legislação de planejamento urbano regional e municipal. Outro aspecto importante é a questão do “timming” e dos esforços necessários para alcançar resultados positivos. É desejável que a instituição desses conceitos aconteça em pequenas escalas, na medida do possível, aperfeiçoando-os institucionalmente, para que a etapa do desenvolvimento brasileiro na qual for possível aplicá-los seja coerente às comunidades que assim o desejarem, e que mobilizem uma grande maioria. Por isso entendemos que é muito oportuna a inserção dos conceitos do land readjustment e, talvez, até possamos fazê-los caminhar para projetos onde a iniciativa seja privada. Mas o que realmente está em jogo, mais do que a busca de uma efetiva interlocução entre planejamento urbano e urbanismo, em que as leis e a prática até o momento são pouco eficientes, é certamente a tentativa de atribuir responsabilidades públicas ao funcionário governamental a cada etapa do processo, fazendo ser reconhecida a necessidade de abdicar e combater a especulação imobiliária, definindo como o ganho pode vir a ser coletivo, privado e público. Para isso, ainda falta no Brasil: a. Ampliar a discussão sobre as reflexões teóricas e filosóficas no que diz respeito a diferença do poder público e privado, princípios de equidade e direito de propriedade, e como lidar com isso em políticas públicas, em especial em intervenções urbanas; b. Aprofundar a discussão sobre os mecanismos de aquisição de solo disponíveis pelas municipalidades ou de maneira consorciada com o poder privado, e por que os mecanismos atuais da desapropriação são tão ineficientes; c. Aprofundar o enfoque e a compreensão dos instrumentos existentes (tais como consórcio imobiliário e contribuição por melhorias), buscando entender por que um país construído com base em tanta desigualdade social ainda permanece inerte perante iniciativas que os tragam a uma realidade.


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Como uma espécie de legado para o futuro, restariam ainda alguns encaminhamentos possíveis à criação de oportunidades para a aplicação do land readjustment, ou conceitos similares no Brasil, diante de outras problemáticas. O processo de globalização tornou o país um dos principais produtores de alimentos no mundo, o que significa que o land readjustment rural, aplicado em tantas outras nações e que não foi devidamente discutido nesta publicação, pode ser uma saída tanto para minimizar conflitos sobre a reforma agrária, como aumentar a produção com menor custo e de maneira mais eficiente. E como está claro em estudos de dispersão populacional que a falta de infraestrutura e condições melhores no âmbito rural contribuem para o processo de fuga para as cidades, os conceitos do land readjustment podem ser utilizados para implementar aquilo que está em defasagem no campo ou nas pequenas cidades que sobrevivem da agricultura, diminuindo a necessidade de grande quantidade de recursos do poder público para fazê-lo. Portanto, fica clara a falta de uma política nacional ou direcionada às regiões metropolitanas que aproveite e abasteça com melhores infraestruturas as cidades do interior, contribuindo para controlar, inclusive, a densidade demográfica nas grandes cidades. Outro fator importante está na falta de uma política nacional, muito comum em países europeus, e no Japão em especial, em relação ao envelhecimento da sociedade, do qual o Brasil será alvo num futuro pouco distante. Além do padrão atual da construção civil estar pouco adaptado ao público idoso, principalmente aos setores menos favorecidos economicamente, o caráter obsoleto das nossas cidades pouco favorece sua utilização pela terceira idade. Os equipamentos existentes para tal público ou são caríssimos e acessíveis apenas para as classes mais abastadas, que vivem em verdadeiros “resorts” construídos em antigos terrenos rurais longe dos meios urbanos, ou são equipamentos públicos precários que pouco incentivam a sobrevida do idoso. A aplicação dos conceitos do land readjustment no processo de revitalização, em especial das cidades de pequeno porte, serviria para incentivar que o idoso volte a viver uma vida “outdoor”, em vez de viver uma vida de clausura e necessidade de ajuda pela falta de uma cidade acessível. Além disso, o Brasil vive um colapso num dos setores que poderia ser o mais beneficiado pelas belezas naturais que o país possui: ainda que ele seja o maior da América Latina, o seu turismo perde em quantidade, qualidade e retorno financeiro perante outros vizinhos. Os conceitos do land readjustment, ao serem aplicados para a melhoria das cidades por meio da construção de novas infraestruturas e da reorganização espacial, aumentariam as condições que o país possui para receber turistas do mundo inteiro. A reorganização de bairros mais pobres (conforme exemplos na


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Colômbia), o adensamento das regiões centrais com edifícios e equipamentos mais modernos (conforme exemplos no Japão), a preservação de áreas de proteção ambiental atrelada à construção de infraestruturas mais adequadas e menos prejudiciais ao meio ambiente (conforme exemplos na Austrália) são alguns dos muitos exemplos que favorecem o turismo e, consequentemente, a economia local e nacional. Não nos esqueçamos de que, no âmbito da cooperação técnica internacional, a implementação bem-sucedida dos conceitos do land readjustment no Brasil trará a oportunidade de ampliar a disseminação do método em outros países com realidade similar (América Latina e África de língua portuguesa). Não existe nenhum precedente para o crescimento urbano e correspondente decréscimo populacional rural na história da humanidade, tornando tais projetos imprescindíveis. Se a visão dominante sobre a difusão de “best practices” (melhores práticas) retrata um avanço das políticas urbanas por meio da cópia de modelos fechados, isso significou que, apesar de a aparente importação de modelos internacionais para o Brasil representar mais um momento de “ideias fora do lugar” (Schwarz 1981) em detrimento do fomento à criação de um pensamento próprio de crescimento surgido de forma endógena, a compreensão desses modelos indicou inúmeras deficiências ao sistema de planejamento urbano brasileiro. Ainda que não exista dúvida sobre o crescimento da área de políticas públicas no Brasil, sobretudo em estudos de caso, é clara a necessidade de uma ampliação maior, de pesquisas que testem certas tipologias desenvolvidas nos chamados países centrais. Ademais ainda existe pouca clareza sobre quem formula as nossas políticas públicas e como elas são implementadas. Outra constatação: para viabilizar a implantação de infraestrutura e políticas públicas é necessário promover a articulação entre os entes federativos envolvidos, que têm diferentes competências legais e capacidades de investimento. Entretanto, não encontramos no federalismo brasileiro uma institucionalização para a cooperação federativa no planejamento territorial, sendo que as iniciativas locais de articulação, quando acontecem, são ocasionais (dependem do contexto político), enviesadas (privilegiam determinados atores) e não sistemáticas (processos pontuais). Em resumo, o panorama brasileiro mostra que as limitações legislativas, herdadas do passado colonial ou atuantes até mesmo no processo de aprovação de novas leis, continuarão em conflito até que sociedade civil e poder público encontrem meios de atualizar seu processo de desenvolvimento urbano, utilizando melhores mecanismos de regulação fundiária e de construção de espaços coletivos.


268 Percorremos, por fim, um, entre infinitos caminhos possíveis, para a compreensão do land readjustment. Chegamos ao fim de uma jornada diante da incrível escassez de literatura sobre o tema em âmbito nacional, onde não se encontram teses e apenas uma publicação em português a respeito. Não foi possível também definir nesta publicação todas as peculiaridades que fazem com que o Japão aplique com tanto êxito o land readjustment, tratando-se de um fato singular na história humana. O Brasil, porém, também possui suas singularidades, e, por isso, conforme exemplo do povo japonês, acreditamos que, com toda dedicação necessária, melhoraremos as condições de vida de nossa sociedade. Assim, esperamos ter composto um quadro que tenha permitido ao leitor entender o método de desenvolvimento urbano do land readjusment e do redesenvolvimento urbano, em perspectiva comparada, no intuito de enaltecer a distribuição justa e equilibrada dos custos e benefícios do desenvolvimento urbano, o que, nos dias atuais, não está próximo de nós.


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277 EMPLASA - Empresa Metropolitana de Planejamento S.A. (1984). “Propostas de Aperfeiçoamento do Projeto de Lei Federal sobre o Desenvolvimento Urbano” (Projeto n° 775 de 1983). Brasil, Governo do Estado de São Paulo. Ferraz, R. (1989). “Projeto de Lei n° 2.191 de 1989 sobre o Desenvolvimento Urbano”. Brasil, Câmara dos Deputados de São Paulo. Fix, M. (2001). “Parceiros da exclusão”. São Paulo: Boitempo. Guimarães, M. A. (2009). “Bairro Universitário: Desenvolvimento do Processo de Verticalização”. Material referência para a reformulação das operações urbanas consorciadas em São Paulo. São Paulo: Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo (material não publicado). Maricato, E.; Ferreira, J. S. W. (2002). “Operação urbana consorciada: diversificação urbanística participativa ou aprofundamento da desigualdade?”. In: Osório, Letícia M. (org.). “Estatuto da Cidade e reforma urbana: novas perspectivas para as cidades brasileiras”. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, p.215-250. Montandon, D. T.; Souza, F. F. (2007). “Land Readjustment e Operações Urbanas Consorciadas”. São Paulo: Romano Guerra Editora. Montandon, D. T.; Souza, F. F. (2005). “A Experiência do Land Readjustment Method no Japão e Possíveis aplicações em São Paulo”. Material referência para o 1º Seminário Interno sobre a experiência do Land Readjustment Method no Japão e possíveis aplicações em São Paulo. São Paulo: Secretaria Municipal de Planejamento de São Paulo (material não publicado). Moro Junior, E. (2007). “A Redenção Inexistente nos Planos Urbanísticos Municipais: o Caso do Projeto Eixo Tamanduatehy”. São Paulo: Annablume. Pollitt, C.; Bouckaert. G. (2000). “Public Management Reform: a comparative analysis”. Oxford University Press, U.K. Refinetti Martins, M. L. (2003). “São Paulo: Além do Plano Diretor”. In: “Estudos Avançados” vol. 17 (47), p.167-186. Sandroni, P.; Biderman, C. (2004). “Evaluation of some Impacts of Large-Scale Urban Interventions on Construction Density, Population, Gentrification, Real Estate Prices and Taxes: The Case of the Faria Lima Urban Operation in São Paulo”. Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas. Senado Federal (2005). “Estatuto da Cidade. Guia para Implementação pelos Municípios e Cidadãos”. Brasília: 4ª edição. Souza, F. F. (2008). “Urban Development focused on Land Readjustment Project applied to the Brazilian Reality”. Symposium Brazil-Japan in Economy, Science and Technological Innovation. São Paulo. Schwarz, R. (1981). “As Idéias Fora do Lugar”. In: “Ao Vencedor as Batatas”. São Paulo: Duas Cidades, p.13-28.


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SOBRE OS ESPECIALISTAS André Sorensen é professor de geografia urbana no departamento de geografia e planejamento da Universidade de Toronto. Ele recebeu seu título de doutorado na Escola de Economia de Londres em 1998 em estudos de planejamento urbano e regional e publicou extensamente sobre desenvolvimento urbano, planejamento urbano e história do planejamento urbano no Japão. Seu livro “The Making of Urban Japan: Cities and Planning from Edo to the 21st Century” (Routledge 2002) ganhou prêmio na Associação de História de Planejamento Internacional em 2004. Seu projeto de pesquisa atual “Quem Construirá a Cidade Habitável? Cultura de Planejamento, Sociedade Civil e Governança Local em Tóquio e Toronto” compara o papel das organizações da sociedade civil em administrar espaços compartilhados em duas cidades muito distintas. Em 2007 Sorensen foi eleito Emérito da Escola de Engenharia da Universidade de Tóquio em reconhecimento à sua pesquisa em urbanismo e planejamento urbano japonês. Hans Joachim Linke é engenheiro geodésico e professor doutor. Desde 2002 é presidente da cadeira de “Landmanagement” no Instituto de Geodésica da Universidade de Tecnologia de Darmstadt. Entre 1997 e 2002 foi líder do projeto para o desenvolvimento de terrenos edificáveis denominado “LEG Landesentwicklungsgesellschaft NRW GmbH”. Desde 2005 é editor do jornal científico “Flächenmanagement und Bodenordnung”. Desde 2006 é comentarista da seção sobre land readjustment no periódico Brügelmann de Stuttgart. Lisa Palomba é engenheira geodésica desde 2004. Entre 2004 e 2007 trabalhou na administração pública de Hessian no departamento de gerenciamento de terras e geoinformação - HVBG. Desde 2007 é pesquisadora e assistente do professor Hans Joachim Linke. Rainer Müller-Jökel é engenheiro agrimensor pela Universidade de Bonn, Alemanha, com ampla experiência em gerenciamento e avaliação fundiária. Desde 1983 ele trabalha para a Secretaria Municipal de Planejamento de Frankfurt, primeiramente no Departamento de Avaliação Fundiária e depois como chefe do Departamento de Land Readjustment. Müller-Jökel é presidente do Conselho de Avaliação Fundiária da cidade de Frankfurt e professor em diferentes instituições. Entre 1999 e 2006 foi presidente da cadeira de “Landmanagement” na DVW – Associação Alemã de Agrimensores e representante alemão na FIG – Federação Internacional de Agrimensores. Ling-Hin Li é professor do departamento de construção e mercado imobiliário da Universidade de Hong


279 Kong na China. Ele atua internacionalmente em pesquisas sobre políticas e problemas fundiários urbanos, em parceria com instituições como a Universitas 21 do Canadá, a Fulbright dos Estados Unidos da América e a Jackson Memorial da Austrália. Escreveu diversos livros sobre o mercado fundiário na China e em Hong Kong e seus textos foram publicados em diversos periódicos internacionais. Xin Li é estudante de doutorado na Universidade de Hong Kong e pesquisadora na área de parceria entre público e privado em projetos de renovação urbana na China. Juan Carlos Garcia Bocanegra é arquiteto da Universidade dos Andes de Bogotá, bolsista da JICA e ex-diretor geral de desenvolvimento urbano do Ministério de Desenvolvimento Econômico da Colômbia. Foi assessor dos planos diretores de Medellín, Cali e Bogotá, dos planos metropolitanos de Bucaramanga e Valle de Aburrá, de diferentes planos parciais em Cali, Palmira, Pereira, Cartagena, Sabaneta, Itaqui e Medellín, e do macroprojeto de Ciénaga de la Virgen em Cartagena. Atualmente Bocanegra é docente na área de urbanismo, na Universidade Pontifícia Bolivariana, na pós-graduação da Universidade Nacional em Medellín, na Escola de Engenharia de Antioquia e na EAFIT. Kauko Jussi Viitanen é professor de economia e avaliação do mercado imobiliário e atua desde 1997 no Instituto de Estudos Imobiliários da Universidade de Tecnologia de Helsinque, na Finlândia. É chefe do departamento de pesquisa e agrimensura desde 2000 e é diretor da Faculdade de Planejamento, Construção e Mercado Imobiliário - KIRSU desde 2007. Representante finlandês na FIG – Federação Internacional de Agrimensores, Viitanen pertence também ao conselho editorial do Jornal Nórdico de Pesquisa Imobiliária e Agrimensura (membro de 1994 a 2005 e editor regional a partir de 2006). Adri Van Den Brink é professor de planejamento espacial na Universidade de Wageningen, atuando no grupo de ciência ambiental, e também nos “Dienst Landelijk Gebied” (Serviços Governamentais para Administração de Água e Terra) em Utrecht na Holanda. Vinit Mukhija é arquiteto, urbanista e professor no departamento de planejamento urbano na Universidade da Califórnia, Los Angeles - UCLA nos Estados Unidos da América. Ele recebeu seu título de doutorado no Instituto de Tecnologia de Massachusetts - MIT em desenvolvimento urbano e planejamento. Escreveu extensivamente sobre Mumbai na Índia, incluindo seu livro “Squatters as Developers? Slum Redevelopment in Mumbai” (Ashgate 2003). Tomohiko Yoshida é urbanista e professor no departamento de política e ciência do planejamento na Universidade de Ritsumeikan no Japão. Ele recebeu seu título de doutorado em engenharia na Universidade


280 de Kyoto no Japão. Entre 1996 e 1998 foi professor nas Universidades de Toyohashi e Tsukuba, no Japão, e em 2005 lecionou como professor convidado na Universidade de Hanyang, na Coreia do Sul. Sundung Sitorus é urbanista graduado pela Universidade Norte Sumatera na Indonésia. Desde 2003 é professor de consolidação de terras na Universidade Nacional de Terras de Jogjakarta. Anteriormente, atuou como diretor na Agência Nacional de Terras do Governo Central de Jacarta, atuando em projetos de land readjustment em diversas províncias na Indonésia. Robert Home é professor de administração de terras na Escola de Direito de Anglia, na Universidade Anglia Ruskin, na Inglaterra. Ele pesquisou e escreveu extensamente sobre planejamento urbano, consolidação fundiária e land readjustment na Europa e em outros países, tais como Índia, Israel e Líbano. Rassem Khamaisi é professor do departamento de geografia e estudos ambientais da Universidade de Haifa em Israel. Urbanista e geógrafo, especializado em geografia urbana e regional, possui conhecimento em planejamento regional envolvendo os árabes em Israel e os palestinos no território Palestino e Jerusalém. Ainda estuda a relação desses povos com a administração pública e sua participação pública em projetos urbanos. Khamaisi publicou diversas pesquisas sobre políticas de urbanização e planejamento entre árabes e palestinos, em jornais locais e internacionais (com versões em inglês, hebreu e árabe). Sunil Babu Shrestha é graduado em engenharia civil, mestre em planejamento urbano pela Universidade Tribhuvan no Nepal e doutor em engenharia ambiental pela Universidade Osaka Sangyo no Japão. Autor da tese “A Sustainable City Planning Methodology for 21st Century (Concept of Food Green City)”, atualmente trabalha no programa de desenvolvimento das Nações Unidas com a implementação de projetos de parceria entre público e privado em desenvolvimento ambiental no Nepal. Kirti Kusum Joshi é urbanista, mestre em planejamento urbano pelo Instituto de Engenharia do Nepal e doutor em planejamento regional pela Universidade Tohoku no Japão. Atualmente trabalha como consultor em projetos de desenvolvimento urbano para agências privadas, governamentais ou internacionais no Nepal. Tommy Österberg é administrador de terras da agência governamental Swedesurvey. Ele trabalhou com pesquisas cadastrais na Suécia e desenvolvimento de legislação e metodologia para planos de uso do solo, incluindo a Lei do Desenvolvimento Consorciado do Solo. Atualmente, está trabalhando como consultor em projetos de cooperação institucionais entre as autoridades suecas de administração fundiária e organizações irmãs em países em desenvolvimento. Österberg também atua em programas de treinamento


281 internacionais fornecidos pela Swedesurvey no campo de gestão do solo. Kuang-Hui Peng é professor de design urbano do departamento de arquitetura da Universidade Nacional de Tecnologia de Taipei, membro do Comitê de Planejamento Urbano do Ministério de Interiores e presidente do Comitê de Intercâmbio Internacional do Instituto de Planejamento Urbano de Taiwan. Obteve seu título de doutorado na Universidade de Manchester na Inglaterra. Sua experiência profissional inclui projetos de planejamento urbano, design urbano e prevenção de desastres, atuando em Taiwan e outros países, como Reino Unido e Estados Unidos da América. Ittipong Tanmanee é urbanista da agência de land readjustment do Departamento de Obras Públicas e Planejamento Nacional e Local, do Ministério de Interiores da Tailândia. Tahsin Yomralioglu é engenheiro agrimensor graduado pela Universidade de Tecnologia de Karadeniz, na Turquia, em 1985. Recebeu o título de mestre pela mesma universidade em 1988, e o título de PhD na Universidade de Newcastle, na Inglaterra, em 1993. Seu projeto de doutorado tem o título de “A Nominal Asset Value-Based Approach for Land Readjustment and its Implementation using GIS”. Yomralioglu é professor de GIS na Universidade de Tecnologia de Karadeniz Trabzon desde 2001. Domingos Theodoro de Azevedo Netto é arquiteto e urbanista graduado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo – FAUUSP (1953), pós-graduado em direito urbanístico pela Faculdade de Direito da USP (1983) e mestre em administração pública e planejamento urbano pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV – Fundação Getúlio Vargas (1994). Azevedo Netto também foi consultor do IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada e do CEPAM – Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal do Estado de São Paulo, com trabalhos para muitos municípios e estados. Foi membro do Grupo de Planejamento do Governo do Estado de São Paulo (1959 - 1963) e diretor: de planejamento da EMURB – Empresa Municipal de Urbanização de São Paulo; de uso do solo metropolitano da EMPLASA – Empresa Metropolitana de Planejamento da Grande São Paulo e do DEPLANO – departamento de planejamento da SEMPLA. Renato Guimarães Pereira é arquiteto graduado na Universidade Presbiteriana Mackenzie (1988), mestre em arquitetura e urbanismo pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2004), especialista em administração de empresas pela FAAP - Fundação Armando Álvares Penteado (1994) e bolsista da JICA no curso de pós-graduação em “Urban Development focused on Land Readjustment measures” (2007). Atualmente Pereira trabalha na gerência de produção de projetos de urbanização da CDHU - Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo.


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SOBRE O AUTOR Felipe Francisco de Souza é arquiteto e urbanista graduado pela UNESP - Universidade Estadual de São Paulo, com pós-graduação em “Urban Development focused on Land Readjustment Measures” pelo NUI – Instituto de Urbanismo de Nagoya, no Japão. Cursou especialização em “Integrated Urban Planning” pelo BTH – Instituto de Tecnologia de Blekinge, na Suécia e pelo CBE – Centro de Estudos Ambientais de Calcutta, na Índia. Também cursou especialização em “Land Management and Informal Settlement Regularization” pela EUR – Universidade Erasmus de Rotterdam, na Holanda. Atualmente é mestrando em Administração Pública (linha de pesquisa Governo e Sociedade Civil em Contexto Subnacional) pela FGV-SP – Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. Como coordenador de projetos urbanos na Assessoria Técnica de Operação Urbana da SEMPLA – Secretaria Municipal de Planejamento, atual SMDU – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo atuou em diversos projetos, entre eles: Projeto Bairro Universitário, Projeto Nova Luz, Projeto Operação Urbana Vila Leopoldina – Jaguaré, Projeto Operação Urbana Carandiru – Vila Maria, Projeto Operação Urbana Vila Sônia e Elaboração da Postulação de São Paulo para os Jogos Olímpicos de 2012. Em 2007, por meio de acordo com a JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão, publicou, em coautoria com o arquiteto Daniel Todtmann Montandon, o livro “Land Readjustment e Operações Urbanas Consorciadas”, introduzindo os conceitos de land readjustment no Brasil. Para a gestão 2006 – 2008, foi nomeado secretário executivo da ABJICA-SP – Associação de Bolsistas da JICA de São Paulo. Em 2009, selecionado pela SVID – Fundação de Design Industrial da Suécia, participou do projeto “City Move Interdesign 2009” na cidade de Gällivare, atualmente alvo de grandes erosões provocadas pelas atividades mineradoras da região que colocam em risco a sobrevivência de sua população. Dentre as muitas questões abordadas, algumas eram: a melhor e mais segura forma de transferir parcial ou integralmente sua sociedade, e encontrar soluções modernas para remover a cidade de um local para outro com o envolvimento da população local ao longo do processo.


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CRÉDITO DAS IMAGENS Capítulo 1: p. 19 Ricardo Fujii. Capítulo 2: p. 34 MLIT - Ministério de Terras, Infraestrutura e Transporte do Japão; p. 35 Governo do Estado de Aichi e Agência de Renascença Urbana; p. 36 Governo do Município de Hiroshima, Felipe Francisco de Souza, Governo do Município de Kyoto, JICA Kobe e Google Earth; p. 37 JICA Chubu; p. 38 Shin-ichi Aoki, Agência de Renascença Urbana; p. 46 Shin-ichi Aoki, Agência de Renascença Urbana; p. 47 Shin-ichi Aoki, Agência de Renascença Urbana; p. 48 Shin-ichi Aoki, Agência de Renascença Urbana; p. 49 Google Earth; p.65 Watanabe Manabu; p. 72 JICA Kobe; p. 75 Governo do Município de Nagoya; p. 76 Yahoo Virtual Earth e Google Earth; p. 77 Governo do Município de Nagoya; p. 80 Governo do Município de Nagoya; p. 81 Governo do Município de Nagoya. Capítulo 3: p. 85 MLIT - Ministério de Terras, Infraestrutura e Transporte do Japão; p. 90 Governo do Município de Nagoya; p. 93 Governo do Município de Nagoya; p. 94 Felipe Francisco de Souza e Agência de Renascença Urbana; p. 95 JICA Kobe; p. 96 Governo do Município de Nagoya; p. 104 Agência de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Nagoya; p. 105 Agência de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Nagoya; p. 106 Agência de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Nagoya; p. 107 Agência de Planejamento e Desenvolvimento Urbano de Nagoya; p. 110 Agência de Renascença Urbana do Japão; p. 111 Agência de Renascença Urbana do Japão; p. 112 Agência de Renascença Urbana do Japão; p. 113 Agência de Renascença Urbana do Japão. Capítulo 4: p. 126 e p. 127 Julio Redshoe (arte); p. 137 Rainer MüllerJökel e Michael Trampler; p. 138 Rainer Müller-Jökel e Michael Trampler; p. 139 Rainer Müller-Jökel e Michael Trampler; p. 142 e p. 143 Corporação Gemdale Yunong; p. 144 Corporação Gemdale Yunong; p. 145 Google Earth; p. 150 Juan Carlos Garcia Bocanegra; p. 151 Juan Carlos Garcia Bocanegra; p. 157 Google Earth; p. 158 Agência de Desenvolvimento Meerstad; p. 159 Agência de Desenvolvimento Meerstad; p. 160 Dienst Landelijk Gebied; p. 164 Vinit Mukhija; p. 165 Vinit Mukhija; p. 168 Tomohiko Yoshida; p. 169 Google Earth; p. 171 Agência Nacional de Terras da Indonésia; p. 182 Governo do Município de Schnin; p. 183 Governo do Município de Schnin; p. 188 Google Earth; p. 189 Sunil Babu Shrestha e Kirti Kusum Joshi; p. 192 Tommy Österberg, Agência do Governo Sueco Swedesurvey; p. 198 Google Earth; p. 199 Governo do Município de Taipei, Instituto Chinês de Desenho Urbano de Taiwan e Mei-Hsiu Liu; p. 204 Agência de Land Readjustment da Tailândia; p. 209 Universidade de Tecnologia de Karadeniz na Turquia; p. 210 Universidade de Tecnologia de Karadeniz na Turquia. Capítulo 5: p. 227 Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo; p. 228 Fabio Mattos; p. 246 Google Earth e Renato Guimarães Pereira; p. 249 Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo; p. 250 Felipe Francisco de Souza; p. 256 Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo; p. 257 Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo e Paulo José Tripoloni; p. 258 Paulo José Tripoloni.


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AGRADECIMENTOS Chegou, enfim, o momento de agradecer ÀQUELES, pois escrever uma publicação, assim como caminhar por este mundo, não é trabalho para se fazer só. Percorrendo os percalços que me fizeram chegar até aqui, agradeço... ...ao Secretário de Desenvolvimento Urbano de São Paulo, o senhor Miguel Luiz Bucalem. ...aos arquitetos Luiz Laurent Bloch, José Geraldo Martins de Oliveira, José Magalhães Júnior e José Ignácio Sequeira de Almeida, por sempre acreditarem no meu trabalho. ...aos companheiros da antiga Secretaria Municipal de Planejamento, atual Secretaria Municipal do Desenvolvimento Urbano, principalmente: Alan Munhoz, Alexandra Aguiar Pedro, Anna Carolina Torres Aguilar Cortez, Celso Coaracy Franco, Clementina Ambrósio, Darwin Pavan, David Ventura, Domingos Teodoro, Heloisa Toop Sena Rebouças, Isaura Regina Parente, José Eudes Alves da Silva, José Fernando Ferreira Brega, José Marinho Nery da Silva Júnior, Larissa Sayuri Tsuda, Lie Matsumoto Okawa, Lisandro Frigerio, Marcelo Bernardini, Marcos Batistela, Nilza Antenor, Pedro Sales, Ricardo Kleiner, Teresinha de Donato Machado e Tomás Cortez Wissenbach. ...ao mestre e grande amigo quando o tema é planejamento urbano, Marco Antônio Guimarães. ...ao urbanista Akira Nakanishi, por ter sido meu mentor durante minha estadia no Japão e a todos no NUI – Instituto de Urbanismo de Nagoya. ...ao diretor Koji Kato e a todos os técnicos da Tamano Consultants Co., pelo treinamento em Nagoya. ...aos colegas do curso: Farzana (Bangladesh), Daniel (Brasil), Sina (República Dominicana), Nagwa (Egito), Sissay (Etiópia), Francisca e Celestina (Gana), Mohamed (Ilhas Maldivas), Linus (Papua Nova Guiné), Miriam (Peru), Stephanie (Filipinas), Sada (Tanzânia), Apichart (Tailândia), Duc e Quan (Vietnam), por fazerem parte de uma família sem barreiras de cor, idioma ou religião ao longo do treinamento no Japão. ...a toda equipe da JICA Japão, do TIC (Tokyo International Center) e às coordenadoras do treinamento, Hiromi Shinozaki, Harumi Sawada e Kaori Osone, por sua receptividade, amizade, respeito e por fazerem me sentir em casa, mesmo do outro lado do mundo. ...ao MLIT – Ministério de Terras, Infraestrutura e Transportes, em nome do senhor Hiroaki Sugita, pelo constante incentivo à promoção do land readjustment nos países em desenvolvimento. ...aos especialistas japoneses: Kazuyoshi Osawa (Japan Association of Land Readjustment); Kei Fukunaga, Takayo Sasaki e Motoyo Araki (JICA); Shin-ichi Aoki e Norihiko Yanase (URA). ...ao diretor geral da JICA no Brasil, o senhor Katsuhiro Haga. ...aos coordenadores da JICA em Brasília, os senhores Kota Sakaguchi e Marina Nakagawa, por serem a ponte entre o sonho e a realidade desta publicação.


285 ...aos companheiros da ABJICA-SP, em especial o senhor Toshi-ichi Tachibana, por traduzir em respeito e admiração a cooperação entre o Brasil e o Japão. ...ao professor André Sorensen, pelo apoio e pela tarefa de escrever o prefácio incluído desta publicação. ...aos especialistas em land readjustment por contribuírem tanto com esta publicação: Hans Linke, Lisa Palomba, Rainer Müller-Jökel, Ling-Hin Li, Xin Li, Juan Carlos Garcia Bocanegra, Kauko Viitanen, Adri Van Den Brink, Vinit Mukhija, Tomohiko Yoshida, Robert Home, Rassem Khamaisi, Sunil Babu Shrestha, Kirti Kusum Joshi, Tommy Österberg, Kuang-Hui Peng, Ittipong Tanmanee, Tahsin Yomralioglu, Domingos Theodoro de Azevedo Netto, Renato Guimarães Pereira, Augusto Carrillo Pinto, Josep Roca, Yu-Hung Hong, Peter Larkham, Sundung Sitorus, Tej Kumar Karki e Jerzy Banski. ...aos fotógrafos: Shin-ichi Sato, Fabio Mattos, Ricardo Fujii e Watanabe Manabu pelas incríveis imagens que constam nesta publicação. ...a toda equipe de revisão e produção: Mario Machado Vieira Filho, Del Candeias, Juliana Camachi, Viviane Teixeira Mendes, Fumiko Yoneta, Paulo José Tripoloni; e Maurício Kanno, Dimas Munhoz e Julio “Red Shoe”, que estiveram na primeira fase de produção. ...aos professores da Fundação Getúlio Vargas: Marta Ferreira Santos Farah, Mario Aquino Alves, Regina Silvia Viotto Monteiro Pacheco, Peter Kevin Spink, Francisco Fonseca e Fernando Luis Abrucio. ...aos companheiros de Fundação Getúlio Vargas: André Leirner, Nina Best, Thamara Strelec, Lucio Hanai, Heni Ozi Cukier, Lucio Bittencourt, Maurício Brilhante, Marcelo Maia, Maurício Feijó, Philip Hiroshi Ueno, Cristina Toth, Camila Maleronka, Maurício Corrêa, Daniel Bruno Garcia, Patrícia Laczynski, Ligia Villas Boas Gabbi, Mariana Ferreti Lippi, Fernando Burgos, Caio Motta, Roberta Buendia Sabbagh, William Borges, Eliane Barbosa, Danielle Fiabane e Maria Cecília Pereira. ...aos professores do Lincoln Institute of Land Policy: Paulo Sandroni, Carlos Morales Schechinger, Martim Smolka, Ciro Biderman, Saskia Ruijsink e Fernanda Furtado. ...às coordenadoras do Instituto de Planejamento Urbano de Curitiba: Rosane Amelia e Sheyla Lagos. ...aos meus grandes amigos: André “Hadez” Gonçalves, Fabíola e Ivan Mantovani, “Bill” Rodrigues, “Tolito” Irisawa, Marcos Döllerer, Rodrigo e Keyla Martins (e seus filhos), Rogério e Tânia Eguchi, Sabrina e Diogo Moretti, Lara e André Cavenague, Ricardo Hideki, Jefferson Pacheco, Aires Zulian, Armando Pereira, Bruna Campos, Rodolfo Geiser, Camila Minelli, Graeme Harvey, Letícia Berneira, Francisco Vasco de Toledo, Débora Maranhão, Miguel Etinger, Claudia Alves, Otávio Cabrera de Léo, Franklin Lee, Anne Save De Beaurecueil, Joaquim e Paula Aguilera, Sandra Naomi, Yaser Yaqub Yusuf e Izabel Iamaguti, por serem apoio em todas as etapas do meu crescimento pessoal e profissional.

...a minha mãe, irmã e familiares, em especial minha tia Lucila, pelo amor e dedicação. ...às priminhas Maria Eduarda Vilela e Isabela Palomares Scalise. ...e, por fim, dedico esta publicação à memória de meu pai, que lia Vinícius de Moraes.


FICHA TÉCNICA ORGANIZAÇÃO E PATROCÍNIO JICA – Agência de Cooperação Internacional do Japão Coordenador-geral da JICA no Brasil: Katsuhiro Haga Coordenadores do projeto de follow-up: Kota Sakaguchi e Marina Nakagawa ABJICA-SP – Associação dos Bolsistas da JICA de São Paulo (gestão 2006-2008/2008-2010) Presidente: Toshi-ichi Tachibana Vice-presidente: Guenji Yamazoe Conselho fiscal: Rosária Ono, Maria Luiza Costa Pascale e Luiz Alberto Bucci Conselho deliberativo: Katsumi Doi, Masahiko Nozue e Harumi Harashiro Goya REALIZAÇÃO PMSP – Prefeitura do Município de São Paulo Prefeito Gilberto Kassab SMDU – Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano de São Paulo Secretário: Miguel Luiz Bucalem Secretário adjunto: Luiz Laurent Bloch Chefe de gabinete: José Fernando Ferreira Brega Chefe da assessoria técnica de operação urbana: Lisandro Frigerio Estagiários: Adélia Midori Yamasaki, Andréa Silva Ribeiro, Carolina Rago Frignani, Elaine Akemi Niyama, Elenice Souza Lima Teixeira, Huana Assanuma Carvalho, Maíra Cotovi Suzuki, Maíra Frias dos Santos, Thais Karine Rosa, Larissa Schechtel Oliveira e Rafael Passarelli. Contato com o autor: felipefrancisco@gmail.com Para download gratuito da publicação, acesse http://www.landreadjustment.com/ O autor se responsabiliza por quaisquer erros e enganos na transcrição dos dados fornecidos. A publicação foi escrita e desenvolvida entre os anos de 2007 a 2009, nas cidades de São Paulo, Karlskrona, Calcutta e Rotterdam.




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