Bastardos Lali Nascimento

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Bastardos Lali Nascimento

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BASTARDOS Lali Nascimento CAPÍTULO I

Londres, 1086. _

Não temos que ir, isso é ridículo. Temos pessoas inferiores para fazerem isso. As terras de Sir. George de Murray estavam sendo atacadas por ladrões e ele

encarregou seu filho de criação, Ryan, de resolver a situação. _

Não são pessoas inferiores, são nossos amigos. Ryan respondeu olhando para Harry, que se encontrava no canto da porta.

Sempre fiel. Jack sabia muito bem magoar, mas, para Ryan, ele era um bom amigo desde os tempos de infância. Ryan mirou Jack nos olhos

_

verdes como os do

homem que considerava seu pai _, mas não encontrou a mesma sinceridade. _

Se não dão o exemplo, como vou confiar em deixar minhas terras para meus filhos

quando me for? George, um senhor de meia idade, mas ainda bastante forte, cabelos grisalhos mesclando com os loiros e profundos olhos verdes, desceu as escadas e se juntou aos seus filhos que estavam no centro do salão. O solar estava vazio, sem nenhum criado, pois mal havia amanhecido. _

Harry. _ George o cumprimentou.

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Harry respondeu ao cumprimento de seu senhor apenas com um aceno de cabeça. _

Então eu acordo e, para variar, meus queridos filhos estão brigando…

_

Não há mais briga. Se não quer vir, não venha, Jack. Chamei-o para não dizer que

faço tudo pelas suas costas, como costuma dizer a todos. _

É o responsável por acabar com tudo isso. Eu não sirvo para nada, não é Sir.

George de Murray? Ama-o como se fosse seu sangue e não ama a mim? Jack não esperou a resposta, saindo a passos largos da porta onde Harry estava parado, quase o derrubando. _

Não ligue. Para mim é tão meu filho quanto ele. Isso não tem a ver com ciúmes,

Ryan, mas com a frustração que ele sente em saber que você é muito mais competente do que ele. Agora vá, temos que pegar logo esses ladrões. Ryan, Harry e mais quatro homens montaram em seus cavalos. Tinham que se apressar antes de o sol ficar alto, pois os ladrões costumavam atacar o povoado no início da manhã. _

Acha mesmo que vamos conseguir? Já tentamos tanto e eles são muito espertos,

estão sempre um passo a frente de nós...

_

Harry tinha cabelos e olhos escuros

como o amigo, mas o físico não tinha comparação. Enquanto Ryan era alto, com músculos bem definidos, Harry era baixo e robusto, porém dificilmente perdia uma briga. _

Shiii. _ Ryan interrompeu Harry. _ Escute.

_

Hahaha… Para Chloe. 3


Nenhuma palavra precisou ser dita, todos os seis, imediatamente, desceram dos seus cavalos e apenas um ficou tomando conta dos animais. Ryan foi na frente e desembainhou a espada, mas não havia ladrões, apenas uma senhora e um jovem sorrindo, provavelmente de alguma brincadeira. O jovem imitou o gesto de Ryan desembainhando a sua própria espada. _

Calma, calma, sem briga. _ Harry falou colocando as mãos para cima em um gesto

brincalhão. _ Nós não batemos em crianças. _

Não sou criança. _ O jovem falou se lançando para frente, mas a senhora o deteve.

_

Homem que não é com essa voz…

_

Sem brincadeiras agora, Harry. _ Ryan interrompeu. _ O que estão fazendo aqui? Muito provavelmente os ladrões já tinham passado e tocaram fogo em muitas

casas, não havia sinal dos moradores, que, com certeza, correram, preferindo perder seus bens em vez das próprias vidas. _

Estávamos de passagem e já estamos indo.

_

A senhora respondeu com uma voz

menos vacilante que o primeiro. _

Estão de passagem em um lugar como esse?

_

Ryan apontou ao redor de onde

todos estavam. _

Estamos pendendo tempo aqui, Ryan. São apenas uma velha e uma criança.

_

Ou talvez estejam aqui de propósito para nos distrair.

_

Se era para isso, já conseguiram. Vamos logo.

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_

Eu não penso assim.

_

Ryan deu uma pausa e quando voltou a falar foi

exclusivamente para o jovem.

_

O que traz debaixo disso? Não está fazendo tanto

frio assim. O

jovem

estava

envolto

em

um

grande

pedaço

de

tecido

que

improvisadamente se amarrava em seu pescoço, e ainda havia um capuz cobrindolhe toda a cabeça. _

Não somos ladrões, só estamos de passagem. Já não lhe disse? A senhora pareceu nervosa, o que só serviu para aumentar a desconfiança de

Ryan. Em um gesto rápido, Ryan se lançou em direção ao jovem, o desarmando. Agora com duas espadas na mão, Ryan deu a ordem. _

Tire já isso.

_

Você não me dá ordens. Devolva já a minha espada, ela não lhe pertence.

_

Chloe… _ A senhora começou a dizer.

_

Chloe?

_

Novamente Ryan não esperou, se lançou sobre o jovem e tentou tirar à

força sua vestimenta. _

Aiiii. De jeito nenhum aquele grito era de um homem, por mais jovem que ele

fosse. Ryan rasgou a vestimenta, arrancou-a e a arremessou longe. E o que viu o deixou paralisado.

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Apesar de estar usando túnica e calção folgado, dava para ver perfeitamente as curvas bem feitas e uma longa cabeleira enrolada e presa no alto da cabeça com o que deveria ser um cordão. _

Solte os cabelos, e, antes que diga que não lhe dou ordens, seja um pouco

inteligente. Veja que tenho duas espadas. _

Por favor, meu senhor… _ A senhora começou a dizer.

_

Não se meta, velha. _ Um dos homens falou.

_

Não fale assim com ela! Não tem respeito? _ Chloe respondeu.

_

E quem você é para dizer o que devo fazer?

_

Ela está certa, Albert. Essa senhora não fez nada para ser desrespeitada. Ouvindo isso, Chloe amoleceu o olhar reconhecendo que, talvez, aquele

homem não fosse estúpido como alguns que já conhecera. _

Meu nome é Chloe.

_

Ela falou retirando o cordão que estava em seu cabelo, que

caiu pesado em suas costas até a altura da sua cintura como uma cascata loira.

_

E

esta é Mirela. Como pode ver, não tenho nada de roubado conosco. Então, nos deixe ir. Ryan demorou de responder, estava paralisado com a visão que teve. Chloe era muito bonita, com olhos azuis claros. _

Ryan…

_

Eu sei o que estou fazendo, Harry.

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_

Não. Vão continuar aqui conosco. Albert e Jefferson ficam olhando elas e os

cavalos, e nós vamos em frente para ver se encontramos os ladrões. Falando isso, Ryan se virou para buscar seu cavalo, passando pela cara de desgosto de Albert. Harry percebeu que o mau humor repentino de seu amigo se chamava Chloe. Desde que sua mãe o abandonou quando Ryan ainda era pequeno, este adquiriu certa desconfiança por todas as mulheres e não costumava dar credibilidade nem perder muito tempo com elas. Por isso, Harry não conseguia entender porque tanta atenção repentina por Chloe, mas mais tarde teriam tempo de conversar sobre isso. Agora, tinham ladrões para apanhar. *** _

Claro que não íamos encontrá-los, com tanto tempo que perdemos com essas

duas.

_

Harry estava falando aos berros com Ryan no caminho de volta onde

deixaram Albert e Jefferson. _

Certo, Harry, eu errei. Mas vamos acampar aqui e procurarmos amanhã. Eles não

estão contando com isso, vai ser uma grande chance de pegá-los. Harry ia responder algo, mas se depararam com um Albert sorridente, bem diferente de antes. Jefferson e as mulheres também pareciam estar felizes. Quando se aproximaram perceberam que Chloe estava contando uma história que, pelo visto, deveria ser bem engraçada. _

Pelo menos teve boa companhia, Albert, diferente de mim.

_

Harry falou.

_

É muito

bonita, Chloe. Por que se veste como homem? 7


_

Porque não é de sua conta.

_

Tem língua afiada também. Além de se vestir como homem, sabe fazer coisas que

homem faz? Sabe caçar? Ryan decidiu acampar e vamos precisar de algo para comer. _

Claro que sim, aposto que ganho de todos.

_

Claro que não vai, é só uma fêmea.

_

Então vamos fazer um trato, Ryan. Ryan estava sem ação, parte pela forma como aquela fêmea falava, como

nunca tinha visto antes, e parte por ele perceber que ela falara pela primeira vez o seu nome. _

Se eu conseguir caçar primeiro ainda faço um ótimo assado, e em troca você me

dá a minha liberdade e a de Mirela. Chloe estendeu a mão para Ryan e ele a apertou tendo duas certezas. A primeira, que Chloe perderia a disputa, pois Harry era um ótimo caçador. E a segunda, que tão cedo deixaria Chloe partir, e ele ainda não sabia muito bem o porquê. Todos saíram sem os cavalos para que Chloe não ficasse em desvantagem e Jefferson se sentiu mais uma vez injustiçado por ter ficado de fora da diversão, tomando conta dos animais. Mirela ficou lhe fazendo companhia, pois, ao contrário de sua menina, não apreciava nem um pouco a caça. Ryan também devolveu a espada para Chloe e todos passaram boa parte do tempo procurando javalis, muito comuns naquelas terras. Aos poucos eles foram 8


aparecendo, mas, a qualquer investida dos homens, os animais fugiam pela mata de uma maneira que dificultava a sua captura. Foi quando Chloe decidiu subir numa grande árvore e Ryan acreditou que ela havia se cansado de tantas tentativas. No entanto, mais uma vez, foi surpreendido, pois quando um enorme javali apareceu e todos os homens se preparavam para apanhá-lo, Chloe, com uma pontaria perfeita, lançou uma adaga na altura do pescoço do animal, matando-o imediatamente. Ryan ficou paralisado percebendo que essa seria uma reação comum de seu corpo quando o assunto era Chloe. Ele fez menção de abrir a boca, mas logo foi interrompido. _

Não precisa dizer nada, ainda não terminei o meu trabalho. Tenho um assado para

fazer. Dizendo isso, ela envolveu o animal nos restos da vestimenta que, mais cedo, Ryan rasgara e saiu puxando o javali, passando na frente dos homens, que só fizeram se entreolhar e segui-la, como se ela fosse o seu líder e não Ryan. _

Sabe, Jefferson.

_

Harry começou a dizer quando chegaram ao local onde iam

passar a noite, que, por sinal, já estava se aproximando.

_

Não pensou que ia ficar

aqui sem fazer nada enquanto fazíamos todo o trabalho. _

_

O que quer? Temos um grande javali e precisamos de lenha para a fogueira.

_

Chloe falou

sorridente, mostrando o animal morto que trazia consigo.

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Ryan não pôde deixar de notar o quanto ela parecia ainda mais jovem sorrindo. Com certeza tinha pouca idade, mas teria tempo para lhe perguntar e saber ao certo. Quando Jefferson trouxe a lenha, Chloe e Mirela já haviam retirado o couro do javali e o preparado para o fogo. Ryan não deixou de notar que Chloe, apesar de se vestir e caçar como um homem, também possuía muita habilidade no preparo de alimentos. _

Eu não sei se é a minha fome, mas esse assado está muito bom, Chloe. Não acha

Ryan? _ Harry perguntou. _

Sim, está muito bom. _ Ryan falou sem olhar para Chloe.

_

Então, eu e Mirela podemos ir?

_

Já conversamos sobre isso, criança.

_

Eu não sou criança, o meu nome é Chloe. E, sim, nós já conversamos sobre isso e

eu pensei ter escutado concordarmos que eu e Mirela teríamos liberdade caso eu caçasse e preparasse a ceia. _

Mas não explicaram o que estavam fazendo aqui sozinhas antes de o sol nascer,

correndo risco de serem atacadas pelos ladrões. A voz de Ryan parecia um trovão de tão alta e Harry pensou o quanto era difícil ver o seu amigo assim. _

A não ser que sejam companheiras dele.

_

As últimas palavras foram quase

cuspidas de nojo e Ryan não sabia por que se sentia assim ao pensar em Chloe com outro homem. 10


Ryan se afastou de todos, indo para dentro da mata. A princípio, Harry pensou que era por necessidades, mas, como ele demorou, Harry decidiu ir atrás e encontrou Ryan sozinho olhando o luar. _

Pensando em sua mãe de novo?

_

Pensei ter o ouvido dizer para não pensar mais nesse assunto. Apesar de não falar muito sobre o assunto, Harry sabia que Ryan nunca

superou o fato de sua mãe o ter entregado para um desconhecido e sumido no mundo. _

Não é nela que estou pensando, ela não merece o meu tempo.

_

Mas Chloe merece. Percebendo o tom com que Harry falou, Ryan desviou sua atenção da lua

para olhar o seu amigo. _

O que quer dizer com isso?

_

Sabe, pode enganar a todos, inclusive a si mesmo, com essa história de manter

Chloe e Mirela aqui por pensarem que elas são ladras. _

_

Não se trata de enganar ninguém, elas são suspeitas. Mas elas não estavam com nenhum furto e, além do mais, se Chloe fosse

realmente mulher de um dos ladrões, do jeito que é bonita, ele não a deixaria para trás. Pelo menos eu não deixaria.

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BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO II

_

Aos diabos com isso! Um homem não pode ficar sozinho com seus pensamentos?

_

Eu vou deixá-lo sozinho, mas não pense muito. Não é justo todas as mulheres

pagarem pelo que uma só fez. Chloe não é sua mãe, Ryan, talvez devesse confiar nela. Falando isso, Harry saiu, realizando o desejo de Ryan de ficar sozinho. Talvez estivesse enganado, mas tinha uma boa impressão em relação a Chloe e seu amigo merecia alguém verdadeiramente bom ao seu lado. Ryan pensou não ter demorado muito, mas, quando voltou, todos já estavam dormindo. Era tudo muito improvisado, já que a decisão de passar a noite foi tomada de última hora. Chloe estava encolhida perto de Mirela e da fogueira, os cabelos espalhados por todos os lados já que ele não lhe devolveu o cordão que agora estava enrolado em seu próprio braço. Ryan amaldiçoou o fato de ter, mais cedo, rasgado a vestimenta que agora poderia estar servindo de cobertor para Chloe. Talvez, se ela não tivesse sujado de 12


sangue do javali, ainda servisse. Pelo menos estavam na primavera e as noites não eram tão frias. Ele ainda tentou dormir, mas, depois de tanto se revirar no chão sem sucesso, resolveu sentar e esperar o momento certo para acordar os demais. Antes de o dia amanhecer Ryan avistou uma grande nuvem de fumaça e deduziu que eram os ladrões. George era um bom senhor e permitia que o povo se estabelecesse como queria. Sendo assim, preferiam morar em pequenos vilarejos ao invés de um só de maior tamanho. _

Acordem, homens, temos ratos para caçar. Não foi preciso um segundo aviso, todos já estavam acostumados com

grandes lutas e sabiam que qualquer descuido poderia custar suas próprias vidas. Mirela e Chloe também acordaram rapidamente. _

Fique aqui tomando conta delas, Jefferson. A essa altura todos, menos Jefferson, estavam montados em seus cavalos.

_

Nós ainda não estamos livres? _ Chloe perguntou com um fio de esperança.

_

Depois, criança. _ Ryan respondeu sem muita paciência.

_

Vai pagar caro por isso, Ryan. Ele não se deu ao trabalho de responder, cavalgando em direção de onde

surgia a fumaça.

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Só uma choupana havia sido queimada e parecia haver muito mais gente do que cabia em uma pequena vila como aquela. Ryan deduziu que as pessoas da última vila queimada deveriam ter se refugiado nesta. Assim que os ladrões perceberam a presença dos homens de George fugiram, e Ryan e todos os outros foram atrás. Ele percebeu que se tentassem pegar todos de uma vez só acabariam ficando sem nenhum, então usou um método que desde pequeno, mais Harry, utilizava para pegar javalis. Quando seu amigo viu Ryan desenrolar a corda que trazia em sua montaria não foi preciso dizer mais nada. Os dois forçaram os seus cavalos a cavalgarem até o limite, um no extremo direito e outro no esquerdo. No momento certo Ryan jogou a corda para Harry e um dos ladrões que estava vindo se enroscou na corda e acabou se desequilibrando de seu cavalo e caindo no chão. Quase que imediatamente, Harry desmontou de seu cavalo e amarrou o homem com a corda. Ryan pediu que os homens parassem, pois, a essa altura, os outros ladrões já estariam longe e pegar um deles já tinha sido uma grande vitória, já que há várias semanas estavam passando sem nenhum sucesso. _

É melhor voltarmos por fora da vila, essas pessoas já sofreram demais para ainda

nos darem abrigo. Vamos voltar para nosso acampamento e esperar o sol nascer, e, quando voltarmos para o Solar, decidiremos como vamos forçar esse aí a falar. Quando chegaram ao acampamento, só Jefferson estava acordado. _

Conseguiram pegar um. _ Jefferson falou empolgado.

_

Eu disse que dormir aqui seria uma boa ideia.

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_

Por falar em dormir, pensei ouvir ter dito que esperaríamos o dia amanhecer para

voltar ao Solar. Então vamos dormir. Depois que o ladrão foi bem amarrado a uma árvore próxima, Ryan se permitiu dormir, mas não pôde deixar de pensar que agora não tinha mais por que manter Chloe com ele. *** _

Ele não era um bruxo para desaparecer do nada, alguém o desamarrou.

_

Foi imprudência termos dormido enquanto poderíamos ir logo para o Solar. Todos estavam em volta da árvore onde Ryan havia amarrado o ladrão, e ele

teve um mau pressentimento ao se aproximar. _

O que diabos está acontecendo aqui?

_

O que seus olhos podem ver. Ele fugiu. _ Albert disse.

_

Como? _ Ryan praguejou. _ Eu o amarrei, ele nunca conseguiria se soltar sozinho.

_

Eu o ajudei. _ Chloe respondeu surpreendendo a todos, inclusive Mirela.

_

Então é mesmo a ladra que eu tanto desconfiei?

_

Não, mas eu disse que pagaria se não me libertasse e a Mirela.

_

Então por que não fugiu?

_

Mirela não conseguiria ir muito longe e eu jamais a abandonaria com abutres como

o senhor. _

Então acha que pode me desafiar, criança? 15


_

Eu acho que me libertar o livrará de grandes aborrecimentos. Ryan pegou a corda que outrora amarrara o ladrão, fez um laço em uma de

suas extremidades e colocou no pescoço de Chloe, o amarrando o suficiente para deixá-la respirar, mas se certificando que a machucaria, pois merecia um bom castigo. _

Ela é uma fêmea, Ryan. Por mais que esteja irritado, ela é uma fêmea e isso não é

certo. _ Harry interveio por Chloe. _

Está disposta a se desculpar?

_

Ryan perguntou já montado em seu cavalo,

olhando para Chloe. _

Nunca.

_

Ela falou olhando para ele com o olhar petulante, colocando o nariz

arrebitado para cima e o desafiando. _

Por favor, Chloe.

_

Mirela falou, mas sabia que Chloe jamais iria se humilhar, por

mais que aquilo a machucasse. Harry levou Mirela em sua montaria e aos poucos o sol foi ficando alto no céu. Ryan teve que diminuir a marcha do seu cavalo, pois Chloe estava andando cada vez mais lentamente. _

Já está disposta a se desculpar? _ Ryan falou puxando um pouco mais a corda. Como resposta, Chloe virou o rosto na direção contrária a ele. Haviam andado metade do caminho de volta para o Solar e Chloe estava com

os cabelos ensopados de suor. _

Basta se desculpar, criança.

_

Ryan falou, amaldiçoando o quão ela era arredia e

orgulhosa. 16


_

Não. A voz de Chloe estava embargada e Ryan viu lágrimas em seus olhos, contra

as quais ela lutava com todas as forças para que não transbordassem. Imediatamente ele parou o seu cavalo e em um só gesto a libertou da corda e a colocou montada em frente a ele, pondo a mão em sua cintura fina. Ryan não pôde deixar de notar o enorme círculo vermelho que ficou ao redor do pescoço delicado de Chloe. Em pouco tempo estavam em frente ao Solar imponente feito de pedras, e a mulher que criou Ryan como mãe como sempre o estava esperando para saber se ele estava bem e sem ferimentos. Ele desmontou e tentou ajudar Chloe, mas ela saltou desmontando sozinha. _

Meu Filho.

_

Lady Violet de Murray era uma mulher de meia idade, mas que ainda

possuía belos traços e cabelos ruivos que se mesclavam com os brancos que começavam a surgir. Os dois se abraçaram e logo a curiosidade falou mais alto. _

Quem é essa linda criança.

_

ela segurou no queixo de Chloe, mas demonstrando

muito mais carinho em seu olhar do que arrogância, e Chloe gostou imediatamente dela. _

Meu nome é Chloe, e essa é Mirela.

_

E por que está vestida como homem?

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_

É assim que ela gosta de se vestir. Gostaria que cuidasse do pescoço dela. _ disse

um Ryan mais aliviado, agora que haviam chegado ao Solar. Sua mãe era uma grande conhecedora de ervas e costumava curar ferimentos muito mais graves. _

_

Oh, ela está machucada. Como isso aconteceu? Pergunte ao seu filho.

_

Chloe se arrependeu por ser tão rude com quem não

merecia, e logo se desculpou. _

Pediu por isso, não se faça de vítima agora. Violet encolheu os olhos como se estivesse intrigada com algo, mas não disse

nada ao filho. _

Venha, menina. _ Ela falou, segurando na mão de Chloe, e Mirela as acompanhou. *** Ryan estava virando sua quinta caneca de cerveja quando Chloe apareceu no

Solar. Ainda se vestia como homem, mas as roupas estavam limpas e os cabelos lavados. Violet ia levá-la para uma cadeira próxima a ela, porém Ryan se adiantou puxando uma cadeira ao seu lado que ele havia deixado vaga quase a noite inteira esperando por ela. Mirela foi sentar perto de Violet. _

Está cheirando a lavanda. Chloe não respondeu, o que era muito estranho em relação à jovem

matraqueira que ele conhecera duas madrugadas atrás. _

Então é verdade o que todos dizem aqui em Murray. Há mesmo uma fêmea que se

veste como homem? Não me disseram que ela era tão bonita e curvilínea.

_

Jack

falou medindo Chloe da cabeça aos pés. 18


_

Isso não é de sua conta.

_

É assim que trata o senhor que lhe dá abrigo?

_

Não estou pedindo o seu abrigo, e se pudesse iria embora agora mesmo.

_

Segure a língua, Chloe.

_

Ryan falou querendo logo interromper o interesse

repentino que viu nos olhos de Jack. _

Até onde sei o senhor de Murray é George. Chloe observou que a linda mulher dona de cachos castanhos claros estava

brava com o fato de o irmão de Ryan ter conversado com ela, porém Chloe não queria se importar com isso. Ela se levantou e saiu sem dar importância ao falatório que ficou atrás dela quando deixou o Solar. Ryan foi logo atrás. Mirela fez intenção de se levantar, porém Violet a impediu. _

Deixe eles se entenderem.

_

O que há? _ Ryan perguntou quando já estavam fora do Solar.

_

Só quero ir embora.

_

Por quê? Estará em segurança aqui e garanto que será bem tratada, e Mirela

também. Chloe passou a mão sobre o pescoço e fechou os olhos, e foi como se alguém tivesse dado uma pancada em Ryan. _

Está na hora de ir dormir.

_

Sou eu quem decide a hora em que vou dormir. 19


_

_

Vamos para minha choupana. Violet já encontrou uma choupana de uma senhora viúva para eu e Mirela

passarmos a noite. _

Vai passar as noites na minha choupana. Agora que soltou aquele ladrão não

tenho mais nenhum fio de confiança em você e a quero bem debaixo dos meus olhos. Ao chegarem, Ryan acendeu a lareira. Apesar de estarem na primavera, as noites estavam frias e ele se lembrava o quão encolhida Chloe estava quando dormiram na vila incendiada. Ela percebeu que apesar de ser criado como filho do senhor de Murray Ryan morava em uma choupana muito simples. Havia apenas uma cama, mesa, dois bancos e um grande baú, todos em tons escuros. Ryan retirou a cota de malha e a túnica e colocou em um dos bancos. Chloe não pôde deixar de observar o quanto ele era forte. _

Não sei o porquê de tantas reclamações, se hoje não vai dormir no chão.

_

Só vejo uma cama aqui. Vai cedê-la para uma lady? _ Chloe falou com desdém.

_

Não vou dormir no chão na minha própria choupana.

_

Se é assim, onde vou dormir?

_

A cama é grande e cabe nós dois.

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Chloe deu mais uma olhada. Sim, era uma grande cama, mas, apesar de se vestir e portar como um homem, ainda era uma fêmea e não estava acostumada a dividir seu leito com um homem de verdade. _

Prefiro dormir no chão.

_

Ela falou se agachando no tapete, mas Ryan a segurou

pelos ombros fazendo-a se levantar e, em seguida, colocou o seu queixo entre o polegar e o indicador, forçando-a a olhar para ele. _

Foi esse seu orgulho que a fez ganhar esse hematoma estúpido no pescoço. Os grandes olhos azuis estavam brilhando como se ela estivesse com raiva, o

que para Ryan deixava Chloe ainda mais bonita. A sua mão que estava livre foi para o pescoço de Chloe e ele começou a acariciar levemente o machucado, fazendo Chloe se arrepiar da cabeça aos pés e soltar um leve suspiro. Então Ryan percebeu que só a mão não bastaria e colocou a mão que estava no queixo de Chloe em sua cintura curvilínea e a que estava no pescoço em seus cabelos, inclinando a cabeça dela para trás e, aos poucos, começou a beijar toda a extensão do machucado. Chloe fechou os olhos e suspirou ainda mais, nada que experimentou na vida a fez se sentir em fogo assim. Uma vez uns de seus irmãos a fez beber algo que desceu em sua garganta queimando e todos riram dela, provavelmente era isso que Ryan queria: só se divertir. A raiva substituiu o desejo e Chloe empurrou Ryan, que não estava esperando essa reação dela e quase caiu.

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Ela lhe deu as costas com o coração batendo forte, não precisava ver o seu reflexo para saber que estava corada. Ryan novamente colocou a mão em seus ombros, mas agora por trás. _

Jamais vou deixar uma fêmea dormir no chão enquanto há uma cama a

esperando. Portanto, pare de ser tão arredia e venha dormir. _ Ele falou, se deitando na cama e afastando as peles que serviam de cobertor. Chloe sabia que se negar resultaria em ainda mais brigas. E logo ela, que não dispensava uma discussão, preferiu dar uma trégua. Chloe se deitou na beira da cama e só quando fechou os olhos percebeu o quão verdadeiramente estava cansada, adormecendo imediatamente. Ryan percebeu quando Chloe adormeceu com facilidade e aproveitou o fato de ela estar dormindo para puxá-la mais para perto dele. Abraçados e sentindo o cheiro de lavanda nos cabelos de Chloe, ele também adormeceu.

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BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO III

Duas semanas haviam se passado e Chloe percebeu que morar em Murray não estava sendo tão ruim como imaginara. Ryan a deixava ter liberdade, podia usar vestes de homem e treinar com eles o manuseio da espada, o que a deixou muito feliz. Sua única negativa foi o fato de não poder prender os cabelos, que Ryan não permitia, e foi motivo de muitas brigas entre eles. Como Chloe imaginou, ela e Violet viraram grandes amigas e sempre bordavam juntas no fim das tardes. Todos tratavam ela e Mirela muito bem, menos Jack e sua esposa, Maisie, a mulher que a olhou com indiferença em sua primeira noite em Murray. _

Levante-se. Luta como uma mulherzinha. Albert estava jogado no chão com um dos pés de Chloe pressionando o seu

pescoço e sua espada apontada para ele. Ao redor todos os outros homens pararam com o seu treino para apreciar Chloe, o que incomodava, e muito, Ryan. _

É isso que chamam de luta?

_

Liberte Albert e eu vou lhe mostrar o que é uma briga de verdade.

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Chloe imediatamente obedeceu a Ryan e se pôs em posição para lutar. Ela estava muito empolgada, pois isso nunca tinha acontecido antes, Ryan sempre olhava, mas sempre escolhia outras pessoas para treinar. Apesar de não ter comentado, Chloe sabia que ele não a achava forte o bastante. Porém não foi uma briga tão fácil, Chloe se defendia no tempo certo e atacava sempre quando era preciso, e isso fez a plateia que havia antes se multiplicar. O chão estava molhado por causa da forte chuva do início da manhã e em vários pontos haviam se formado poças. Ryan percebeu o quanto tinha subestimado a força e técnica de Chloe, mas ele a atraiu para uma poça de lama, fazendo-a escorregar e cair se sujando inteira. Os risos foram em coro e Chloe negou a mão estendida para ajudá-la a se levantar. Saiu fingindo não ouvir Ryan, que a chamava aos berros. Ela se encontrou com Maisie, Violet, Mirela e Lily, criada que sempre andava na companhia de Maisie. _

Chloe, está toda suja, o que aconteceu querida? Chloe não respondeu a pergunta de Mirela e ia sair, mas não foi rápida o

suficiente para se livrar do comentário maldoso de Maisie. _

Agora, toda suja de lama, está mostrando a verdadeira porca que é. Não sei como

um homem como Ryan foi se interessar por isso.

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Se Maisie não fosse tão hostil, Chloe perguntaria o que ela estava tentando dizer, mas preferiu seguir para a cachoeira e se lavar antes que tivesse que enfrentar mais um comentário maldoso. A água estava fresca e serviu para esfriar o corpo de Chloe, que estava quente pela luta e raiva. Ela entrou de roupa, já que suas vestes também estavam sujas, e, depois de alguns minutos, começou a relaxar. _

Chloe, está aí? Graças aos céus a achei.

_

Não quero falar. _ Chloe falou dando as costas a Ryan.

_

Mas eu quero. Venha já aqui. _ Ele falou apontando para a margem da cachoeira.

_

Já disse que não manda em mim.

_

Não se trata de mandar, Chloe, só quero me desculpar. Chloe não se mexeu. Então Ryan entrou na cachoeira, a surpreendendo. Ele

a virou para sua frente e a segurou pelo queixo, forçando-a a olhar para ele, o que já era um gesto muito comum entre eles. _

Está aborrecida comigo?

_

Só venceu a luta, um teria que vencer. Não tenho porque estar aborrecida.

_

Não minta para mim. Sua lealdade é uma das coisas que mais admiro. Antes de conhecer Chloe, Ryan só conhecia dois tipos de mulheres. As

fogosas, que não se podiam confiar, e as leais, que eram extremamente pudicas e só pensavam em casamento. E ele não estava interessado em nenhuma das duas, mas em Chloe ele via o melhor lado das duas. Ela era dócil e pura, porém também 25


tinha sangue nas veias e ele pôde ver isso no dia que beijou o seu pescoço, que naquele dia já estava sem mancha alguma. _

Não se preocupe, é o melhor amigo que tenho, não estou aborrecida. Ryan fechou os olhos e encolheu as sobrancelhas, como se Chloe o tivesse

machucado. _

O que foi? Não é meu amigo? Ele encostou a testa dele na de Chloe, ainda com os olhos fechados.

_

É isso que sou? Seu amigo?

_

Não estou entendendo, Ryan. A cabeça de Chloe estava uma confusão. Antes Mirela questionou o fato de

ela e Ryan dormirem na choupana dele sozinhos, depois o comentário de Maisie e agora isso. O que todos sabiam que faltava ela saber. _

Não confia em mim? Ainda acha que sou uma ladra? Coincidentemente, os ataques haviam parado, como se os ladrões

estivessem dando uma trégua, mas Ryan sentia que ainda não era hora de relaxar, que mais cedo

ou

mais tarde eles recomeçariam. Mas,

observando o

comportamento de Chloe com as crianças e os animais, teve noção de como não era possível ser ela uma pessoa ruim. _

Sei que não é ladra, e não se trata disso, Chloe. Não a vejo como uma amiga.

_

Por quê? Não gosta de mim?

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_

Não gostar? É tão esperta para algumas coisas, Chloe, mas para outras não

conseguiria enxergá-las mesmo que estivessem na frente do seu nariz. _

Ryan…

_

Não vou cear no Solar hoje, nos vemos na choupana mais tarde. Chloe se levantou seguindo Ryan até a choupana em silêncio, ela ficou do

lado de fora até ele se trocar e percebeu que ele havia colocado uma túnica simples e não deveria ir muito longe. Ele também esperou ela se trocar e a levou para frente do Solar. Chloe descobriu que Ryan não ia sozinho, pois Harry o estava esperando, até bem animado, mas isso era normal quando se tratava de Harry, ele estava sempre de bom humor. _

Chloe. _ Ele a cumprimentou. _ Pelo menos não está mais suja de lama. Apesar da brincadeira, Chloe não se aborreceu, pois sabia que Harry não era

maldoso como Maisie. _

Então. Aonde vão essa noite?

_

A uma taberna. _ Ryan respondeu no lugar de Harry.

_

Levem-me junto.

_

Não é lugar de fêmea, Chloe. Entre e fique com minha mãe e Mirela. Ela não respondeu e esperou até ele e Harry virarem a curva no caminho em

plena escuridão da noite em cima de suas montarias. Então procurou por Jefferson,

27


desde que ele ficou com ela mais Mirela na noite em que se conheceram eles ficaram muito amigos. _

Emprestar-me-ia a sua montaria?

_

Depende para que. Se for para ir embora de Murray, Ryan me mataria.

_

Sabe que não vou a lugar nenhum sem Mirela e ela está lá dentro com Violet. Só

vou dar um passeio. _

Sem Ryan? No meio da noite? Chloe estava perdendo um grande tempo e a essa altura Ryan e Harry

estavam se distanciando cada vez mais. _

Pare de fazer perguntas e me dê logo esse cavalo. Tenho certeza que Arnold já o

teria me dado. _

Certo. Jefferson foi com ela até o local onde seu cavalo estava e lhe entregou as

rédeas. _

Não faça nada que aborreça Ryan ao ponto de ele querer arrancar minha cabeça. Chloe sorriu e montou no cavalo, que era muito forte e de tom acinzentado.

_

Só se me prometer que não vai contar nada a Ryan sobre isso. Jefferson assentiu com a cabeça e ela disparou rezando para ainda encontrar

o rastro dos outros cavalos. *** 28


Ryan não havia mentido, realmente era uma taberna. Chloe resolveu voltar, sabendo que Mirela já deveria estar preocupada, mas ela o viu sair com uma linda loira, até muito parecida com ela, que não se portava de forma nenhuma como uma Lady. Ela ria muito e seu vestido lhe caía, revelando os ombros e um profundo decote. Ryan estava com uma caneca de cerveja em uma das mãos, mas não parecia estar tão feliz como sua acompanhante. Os dois foram para os fundos da taberna, onde havia uma antiga choupana. Chloe amarrou o cavalo de Jefferson em uma árvore próxima e os seguiu sem ser vista. _

Faz muito tempo que não vem aqui, Ryan. Pensei até que havia se acertado com a

sua fêmea que se veste como homem. _

Não fale dela, Anna.

_

Por quê? Não sou digna o suficiente?

_

Não vim para conversar. Chloe estranhou, Ryan não costumava dar respostas tão rudes. Então ela viu

o exato momento em que ele segurou no queixo da mulher e começou a beijá-la como se fosse esmagar seus lábios. Não havia a delicadeza que ela sentia quando ele segurava o seu queixo. Era o mesmo gesto, porém de um jeito totalmente diferente. Ele rasgou o vestido da mulher e essa retirou a sua túnica revelando os músculos fortes de Ryan. Ele segurou nos cabelos dela e a beijou novamente. _

Chloe… _ Ele suspirou. 29


Chloe? Ela pensou ter ouvido Anna. Por que agora ele a estava chamando de Chloe? Ela sabia que ficar ali não era o correto, então saiu e voltou rapidamente para o Solar. Como imaginara, Mirela estava preocupada. Então Chloe se serviu de um pouco de assado para diminuir a sua aflição. _

Já estava indo até a choupana de Ryan. O que houve?

_

Fiquei um pouco indisposta, mas já estou bem.

_

Então vai dormir hoje comigo. Chloe já estava consentindo. Depois do que viu, se sentiria muito

desconfortável em partilhar o leito com Ryan. _

Ryan não vai gostar disso. _ Violet interferiu.

_

Ele não está aqui, saiu mais Harry e só devem voltar pela manhã. Chloe viu o sorriso no rosto de Mirela, sabia que ela não aprovava o fato de

dormir sozinha na choupana com Ryan. Além disso, eram muito amigas e ultimamente estavam afastadas, pois Ryan sempre estava por perto. Mirela desconfiava desde a noite em que se conheceram que havia um interesse da parte dele por Chloe, mas ele não demonstrou desejo algum pelo matrimônio e sua menina era preciosa demais para viver em pecado. *** Chloe acordou e pela claridade que viu ainda deveria ser noite, afinal ela se deitara muito cedo. Porém o lugar onde estava deitada pareceu ser muito mais 30


confortável do que o tapete em que ela se aconchegou mais Mirela e havia um braço a segurando pela cintura possessivamente e uma enorme parede de músculos em suas costas. Ela não precisou olhar para saber onde estava, mas, como a lareira estava acesa, a choupana não estava totalmente às escuras, dando-lhe uma visão de onde se encontrava. Ela se levantou e foi mais para perto do fogo. Logo Ryan se levantou, isso sempre acontecia quando ela se levantava no meio da noite. Por mais que estivesse dormindo ele sempre acordava, como se pressentisse quando ela saía da cama. _

O mal-estar voltou? Posso chamar minha mãe se não estiver se sentindo bem.

_

Mirela havia contado a ele da indisposição de Chloe quando ele foi buscá-la. _

Não vai ser preciso. Ryan a virou para que pudesse olhar para ele e viu algo de estranho nos

olhos dela que não conseguiu identificar. _

Tem certeza?

_

Ele falou segurando em seu queixo de um jeito carinhoso,

bem diferente da maneira com que mais cedo segurou Anna ou Chloe. Ela não sabia.

_

Por que não me deixou dormir com Mirela?

_

Não consigo dormir, acho que já me acostumei com a sua presença. Chloe não sabia por que se sentia assim em relação ao que viu, pois Ryan

era apenas seu amigo. 31


Ele a abraçou e ela não soube ao certo quanto tempo ficaram assim, abraçados em frente à lareira, até que ele a carregou e a levou para a cama novamente. Ryan começou a alisar os seus cabelos e ela logo adormeceu.

32


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO IV

Quando Chloe acordou, Ryan não estava mais no leito. Não importava o quão tarde ela despertasse, ele nunca a incomodava, mas Chloe não queria que fosse assim, não queria ser conhecida como a preguiçosa de Murray. Logo que se lavou foi para a cozinha do Solar ajudar Molly nos preparativos da janta. Molly era uma jovem criada ruiva, de dezesseis anos como Chloe, elas se davam muito bem e Chloe ficou muito feliz de encontrar alguém de sua idade para ser sua amiga. Chloe gostaria muito de falar sobre o que viu na taberna, mas Molly era muito envergonhada e, com certeza, iria vê-la com maus olhos. Assim, ela se contentou em ajudá-la a preparar o cozido de coelho e falar sobre banalidades. Até então Chloe não tinha visto Ryan e agradecia aos céus por isso, era difícil não corar depois de tudo que viu. Ela sabia que Ryan tinha muitos afazeres, George lhe havia confiado toda a segurança de Murray, um dos motivos da inveja de seu irmão Jack. Mas ainda tinha muita coisa por trás disso.

33


Ryan era melhor em tudo em comparação a Jack, espada, montaria, até mesmo na aparência. E, apesar de possuir vastos cabelos loiros e olhos verdes, Jack não era tão forte e alto quanto Ryan. Para Chloe, Ryan era lindo e o seu sorriso maravilhoso. Ele sempre a tratava bem e até quando discordavam ele não era rude. Mas não era só ela, todas as mulheres solteiras e até mesmo algumas casadas, como Maisie, davam em cima de Ryan, um dos outros motivos que alimentavam o ódio de seu irmão por ele. Certa vez, Violet comentou que era com Ryan que Maisie queria se casar, porém ele não a quis, e Jack se ofereceu. _

Sempre me ajuda muito, Milady. _ Molly falou.

_

Já lhe disse que não quero ser tratada dessa forma. _ Chloe a repreendeu. _ Gosto

muito de sua companhia. _

Também gosto da sua. Não é rude como Maisie e, apesar de ser a protegida de

Ryan, trata muito bem todos os criados como Violet. _

Como assim protegida?

_

Todos aqui em Murray sabem o quanto é preciosa para ele. Ryan nunca se portou

assim por outra fêmea, é como se estivesse encantado. _

Vamos Chloe. Ryan apareceu, percebeu que estavam falando dele, mas não disse nada.

_

Está quase na hora da janta, vou estar lhe esperando. _ Falando isso ele se retirou,

com a mesma rapidez com que havia aparecido.

34


_

Viu? Ele só vê você, nem percebeu que eu estava aqui. Chloe saiu sem responder. Ryan a estava esperando. Desde a sua primeira

ceia em Murray sempre havia o acento vago ao lado de Ryan, como se a estivesse esperando. _

Soube que estava indisposta. Sente-se melhor agora, criança? _ George perguntou,

ele era um homem muito gentil. _

Sim.

_

Então, por que ainda não tocou no cozido?

_

Ryan perguntou.

_

Quero que minha

mãe a olhe, se não está bem tem que se cuidar. _

Não vai ser preciso.

_

Violet interveio.

_

Chloe não está doente, só precisa de um

pouco de ar fresco. Ela está acostumada a ser livre, Ryan, e está há muito tempo presa em Murray. _

Já está na hora de ela se acostumar.

_

Ryan disse com uma voz mais fria.

_

Prepare um pouco da janta para eu levar. _

Aonde vamos?

_

Não é de ar fresco que precisa? Ele saiu arrastando Chloe pela mão, levando-a para fora do Solar. Molly veio

logo atrás com uma pequena trouxinha e a entregou para Chloe sorrindo. _

Viu? É como eu disse. _ Ela falou sussurrando para que só sua amiga ouvisse. Ryan montou Chloe em seu cavalo e a levou para a cachoeira. Como não

foram a pé, chegaram bem rápido. Lá Ryan desmontou e a ajudou a fazer o mesmo. 35


Ele amarrou Fast, seu cavalo, em uma árvore próxima e desamarrou a trouxa estendendo o pano no chão. _

Sente-se, quero ver qual é a desculpa agora para não comer. Chloe se sentou e comeu em silêncio.

_

O que há? Ao inferno com isso! É a pior matraqueira que conheço e resolve ficar

muda? Depois de uma grande pausa, Chloe resolveu falar. _

Violet está certa, não estou acostumada a isso. Já me confessou que não acredita

que sou uma ladra, então me deixe ir. _

Vai deixar Mirela aqui?

_

Tenho um carinho muito grande por Mirela, mas ela gostou de Murray e não a

obrigaria a ir comigo. _

E o que diabos vai fazer por aí sozinha, se tem um lar.

_

Ryan falou, segurando-a

pelo os ombros, sacudindo-a como se quisesse que ela acordasse de um devaneio. _

E o que tem a ver com isso? Já tem as terras de seu pai para se preocupar.

_

Não vou deixar que vá embora de Murray.

_

Então sou uma prisioneira?

_

Sabe que não.

_

Pois é o que está parecendo.

36


Chloe respirou fundo e virou a cabeça para o lado mirando para o céu azul. No fundo não gostaria realmente de ir embora de Murray, já se acostumara àquele lugar e aos seus moradores. _

Não a trouxe aqui para ficar chateada comigo. Ela não respondeu. Então ele a colocou deitada com a sua cabeça apoiada

em seu colo, acariciando seu vasto cabelo loiro. Chloe achou que provavelmente tinha adormecido, pois quando se deu conta o sol já estava bem mais brando que antes. _

Temos que voltar. Chloe sabia que o tempo de Ryan era muito precioso, ainda mais com a ideia

que teve de deixar um grupo de homens em cada ponto estratégico de Murray. Realmente, os ataques dos ladrões haviam cessado, mas requeria muito mais tempo, pois Ryan tinha que percorrer toda a extensão de terra a cada novo dia. Os dois se levantaram, Chloe recolheu as sobras da janta e montaram em Fast, voltando para o Solar. Ryan ficou para esperar Harry, enquanto Chloe foi bordar mais Mirela e Violet. _

Podemos falar um momento, Mirela? As três mulheres se entreolharam, pois sabiam que Mirela e Ryan não se

davam muito bem, mas mesmo assim ela se levantou e acompanhou Ryan até a saída do Solar. _

Chloe quer ir embora de Murray. Faça-a desistir disso.

_

Já conhece Chloe o suficiente para saber que ela não aceita ordens. 37


_

Quem a vê falar acha que é isso que quer: que ela vá embora. Prefere que Chloe

fique só, abandonada à própria sorte, do que em um lar que a acolheu? _

Quem a acolheu?

_

O que quer dizer com isso?

_

Deita com Chloe todas as noites em seu leito e nunca demonstrou vontade alguma

de um matrimônio. Sei que ela é diferente das outras fêmeas, mas é pura e uma boa menina e merece respeito. E se você não o dá, talvez outro homem o faça. *** Chloe estava muito contente com o fato de ficar a sós com Violet. Não sabia qual era o tipo de assunto que Ryan poderia ter com Mirela, mas isso lhe deu a oportunidade de fazer as perguntas que estavam martelando em sua cabeça à pessoa certa. Nem foi preciso começar, pois, apesar de gentil e delicada, Violet era a mulher mais astuta que Chloe conhecia. _

Quer me falar algo?

_

Violet...

_

Sim.

_

Conhece todo o povo das redondezas?

_

Sim, os que são dignos e os que eu preferia nem ter conhecido. Por que está a me

perguntar isso? _

Existe outra Chloe por aqui? 38


_

Não que eu tenha conhecimento. E, se não tenho, com certeza a única Chloe que

habita em Murray é essa que está na minha frente. Mas qual é o motivo da pergunta? _

Nada, só é curiosidade.

_

Não é só isso que quer me perguntar, não é?

_

O que sente quando George a beija?

_

Bem, essa pergunta é um tanto ousada, criança.

_

Perdoe-me, eu não queria ofendê-la. A mãe de Chloe havia morrido de parto e ela não tinha outra referência

feminina além de Mirela, porém ela era bem mais velha e às vezes via as coisas de uma forma mais exagerada. _

Não ofendeu. Também já tive sua idade, criança. Confesso-lhe que já não é mais

grande coisa. gargalhada.

_

_

Violet olha para o rosto contrariado de Chloe e dá uma curta

Não é o que está pensando querida, amo muito meu marido, mas já

temos muito tempo juntos. Quando me casei tinha mais ou menos a sua idade, era mais velha só um ano. Chloe a olhava atentamente. _

Quando éramos jovens e George me beijava o tempo parava, Chloe. Era como se

só existíssemos nós dois e nossos corpos pegavam fogo. descrição quando viu o rosto de Chloe corar.

_

_

Violet parou a sua

Não é assim que se sente quando

Ryan a beija? _

Ele nunca me beijou nos lábios. 39


_

Nunca? Bem, isso não é uma surpresa. Ryan a admira muito e só vai fazer algo se

assim o permitir. Chloe ficou em silêncio e se virou para o lado contrário ao de Violet, evitando o seu contato visual. _

Ele a deseja muito, Chloe.

_

Somos só amigos.

_

Não, não são. É esperta demais para não perceber o que todos em Murray já

sabem. Dois amigos não dormem abraçados no leito, criança, principalmente quando um é macho e a outra é fêmea. _

Ele nunca tentou nada.

_

É preciosa para ele, nunca vai tentar algo que possa assustá-la ou fazer alguma

coisa que não queira. Nesse momento, Mirela entrou novamente e se juntou a Chloe e Violet. _

O que Ryan queria?

_

Ele me disse que quer ir embora de Murray. Por que não me disse nada? Sabe que

aonde for eu irei. _

Ninguém quer que vá embora, Chloe, principalmente Ryan. Fique mais um pouco e

pense no assunto. Chloe assentiu com a cabeça. Os criados começaram com os preparativos para ceia. Chloe colocou cuidadosamente o pano que estava bordando em cima do acento e foi ajudar Molly. 40


Violet e Mirela subiram as escadas levando com elas todo o bordado. Mais tarde todos estavam ceando e Ryan percebeu o quanto Chloe estava mais feliz e falante. _

Que bom que sua indisposição passou, Chloe.

_

Jack falou, olhando-a de uma

maneira que deixava Chloe desconfortável. _

Fico grata com a sua preocupação. A ceia demorou mais do que Chloe gostaria. George queria saber se a ideia

de Ryan estava dando certo em todos os detalhes. _

Jack vai nos ajudar a partir de amanhã. _ Ryan declarou.

_

Fico muito feliz que queira ajudar seu irmão. Chloe apertou a mão de Ryan que estava na sua e, voltando a atenção dele,

ele também reparou que ela estava muito bonita com uma túnica de um amarelo claro que contrastava com a dele, marrom escuro. _

O que foi?

_

Estou com sono. Podemos ir?

_

Claro que sim.

_

Ryan estranhou a vontade repentina dela de ir para a choupana.

Chloe sempre era uma das últimas a ir dormir, mas ele estava muito feliz com o fato de ela estar mais animada. Assim que chegaram à choupana Ryan começou com o seu ritual, retirando a cota de malha e a túnica e as deixando em um banco próximo. Logo em seguida acendeu a lareira e se sentou na cama. 41


Chloe continuava parada encostada na porta, que agora estava fechada. _

Posso lhe pedir uma coisa?

_

Não, Chloe, você não vai embora de Murray.

_

Não era isso que eu ia pedir.

_

Então peça. _ Chloe nunca pediu nada a Ryan e ele estava um pouco intrigado com

a sua pergunta. _

Quero que me ensine algo.

_

É muito boa no manuseio da espada, Chloe. O fato de ter escorregado naquela

poça não quer dizer que não é habilidosa. _

Pare de tentar adivinhar o que eu quero e escute. Quero que me ensine a beijar. Chloe resolveu falar de uma só vez, parte por não saber se sua coragem

duraria por muito tempo, e parte por saber que Ryan ia continuar falando coisas completamente diferentes do que ela realmente queria. _

Vai ficar em silêncio sem me dizer nada?

_

Eu não posso, Chloe.

_

Como não? _ Ela estava muito chateada. Ele não se negou a beijar Anna, então por

que não com ela? _

Um beijo não é só um beijo, criança. Se lhe beijar eu não vou parar.

_

E se eu não quiser que pare.

42


Chloe falou chegando perto dele e se agachando, colocando as mãos em cada um de seus joelhos. Ryan fechou os olhos por um momento e quando os abriu Chloe viu fogo neles. E ela sabia que os seus não deviam estar diferentes. Em um só gesto ele a colocou sentada em seu colo e pôs uma das mãos em sua nuca e a outra em sua cintura. Chloe deu um beijo casto nos lábios dele. _

Abra a boca, querida. Chloe o fez.

_

Não assim, um pouco menos. Chloe obedeceu e Ryan primeiramente saboreou o seu lábio inferior para

depois ir levemente para o superior, aos poucos aprofundou o beijo e Chloe o seguiu, pois o seu corpo estava lhe dizendo o que fazer. Ela também colocou as mãos nos cabelos de Ryan e ele puxou a sua cabeça para trás, para beijar também o seu pescoço que agora não estava mais machucado. _

Chloe… Ela percebeu que era um suspiro parecido como o que ele deu quando

estava com Anna. Logo Ryan fez o caminho de volta com os lábios em seu pescoço para outro beijo quando a porta da choupana se abriu. _

Ryan, Oliver chegou, ele… _ Harry parou ao se deparar com Chloe no colo de seu

amigo. Ela rapidamente saiu, ficando de pé e se virando de costas, evitando tanto o contato visual dele quanto o de Ryan. 43


_

Perdão, eu…

_

Não tem culpa, pedi para que me avisasse quando Oliver estivesse em Murray.

_

Ryan se virou na direção de Chloe, que ainda estava de costas. _ Eu volto em breve. _

Ela não respondeu e Ryan preferiu não insistir, teriam bastante tempo para

conversar. _ Vamos, Harry.

44


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO V

_

Pensei tê-lo escutado dizer que não tinha nada com Chloe.

_

E não temos.

_

E que diabos foi aquilo que vi?

_

Não consigo mais, como me disse outro dia, não posso fugir de mim mesmo. Estou

apaixonado por Chloe, nunca senti por outra o que sinto por ela. _

Bem que desconfiei quando me disse que iria comprar um presente para ela, pois

nunca você gasta com mulheres. Os dois estavam andando da choupana ao encontro de Oliver. Ele era um ferreiro que não se estabelecia em nenhuma terra fixa, mas sempre que estava pelas redondezas parava em Murray para oferecer suas peças. _

Oliver. _ Ryan cumprimentou o homem de cabelos negros.

_

E então, Ryan. O que vai querer?

_

Quero a adaga mais bonita que tiver.

_

Tenho essa. _ Oliver lhe mostrou uma adaga com desenhos delicados, cravada de

rubis._ Mas creio que o seu valor é muito alto. 45


_

Não importa o valor.

_

E essa fêmea vale tudo isso?

_

Ela é muito mais preciosa do que qualquer coisa que possa me oferecer. ***

Chloe ficou inquieta, jamais pensou que se sentiria assim, de maneira alguma. Violet descreveu realmente a sensação. Seu coração estava acelerado, a pele queimando e, apesar de achar que estava morrendo, não se negaria a tentar novamente. Ela pensou no que poderia ter acontecido se Harry não tivesse chegado e, até agora Ryan não tinha voltado. A única coisa que ela poderia pensar era que Ryan deveria estar na taberna agora com Anna, e, logo, o coração que estava acelerado sentiu uma dor que Chloe nunca pensou sentir. Então ela decidiu que não iria dormir na cama de Ryan e se deitou no tapete perto da lareira. *** Quando Ryan chegou encontrou Chloe fora do leito e percebeu que ela estava encolhida em um canto do tapete. Ele a colocou na cama e ela abriu levemente os olhos, mas logo os fechou e voltou a dormir tranquilamente. Ryan não conseguia entender a atitude de Chloe depois do beijo que trocaram. Estava tão ansioso para lhe dar o presente e não esperava encontrá-la dormindo, ainda mais no tapete.

46


Logo no início da manhã, quando Chloe acordou, Ryan estava sentado em um banco a observando. Ela se sentou na cama e o olhou, ainda um pouco sonolenta. _

Trouxe-lhe um presente. Ele se levantou e lhe entregou algo enrolado em um pedaço de tecido cinza.

_

Ela é linda. _ Chloe falou surpresa depois de ter desembrulhado. Nunca alguém lhe

havia presenteado, além de Mirela. _

Sabia que iria gostar. Pensei em muitas coisas, mas nenhuma iria lhe agradar mais

do que essa. _

Escolheu certo. _ Chloe se encolheu um pouco sem saber mais o que dizer.

_

Vou me ausentar por alguns dias. Preciso ver melhor os grupos de homens que

estão pelas redondezas nos ajudando contra os ladrões. _

Quanto tempo vai ficar fora?

_

Não sei ao certo. No máximo três noites.

_

Harry também vai?

_

Sim, mas Jefferson irá ficar.

_

O que ele irá fazer ficando aqui? Iria ajudar muito mais se ficasse ao seu lado.

_

Ele já vai me fazer um grande favor. Ryan não quis comentar, pois sabia que Chloe iria protestar, mas pediu para

que Jefferson ficasse cuidando dela enquanto estivesse longe. 47


_

E eu? Posso ir?

_

Não, Chloe. A voz de Ryan foi firme, mostrando para Chloe que não iria mudar de ideia.

_

E por que não?

_

Porque isso não é trabalho para fêmea.

_

Pensei ter o ouvido dizer que eu era boa no manuseio da espada.

_

E é, mas não se trata disso, Chloe. Pode se machucar, e eu morreria se alguém a

ferisse. Ryan chegou ainda mais perto da cama onde Chloe estava, ela também se levantou e eles ficaram frente a frente. _

Ficar aqui e se manter em segurança vai acalmar meu coração. Faça isso por mim.

Não quer me ajudar? Ele falou segurando-a pelos ombros e ela assentiu com a cabeça. _

Os céus me ajudem a não perder a minha sanidade enquanto estivermos longe,

nunca me senti assim Chloe.

_

Ryan fez uma pausa como se estivesse pensando.

_

Qualquer coisa que precisar fale com Jefferson. Pode dormir na choupana onde Mirela está enquanto eu estiver fora, se assim o preferir. Mais uma vez Chloe assentiu com a cabeça e ele se virou em direção à saída. Mas Ryan se deteve na porta olhando para fora com os punhos cerrados como se estivesse lutando contra algo que estava dentro do seu próprio corpo. _

Ryan. _ Chloe o chamou estranhando a sua reação. 48


Ele não lhe respondeu nada, apenas se virou e caminhou em sua direção, tomando o seu rosto com as duas mãos e lhe beijando profundamente. _

Não vou permitir que vá embora de Murray. Não vou permitir que vá embora de

minha vida. Falando isso ele se retirou sem dizer mais nada. *** Para Chloe o dia se passou como de costume. Ajudou Molly no preparativo da janta e bordou mais Violet e Mirela. Trazia sempre sua adaga nova consigo para que Ryan sempre estivesse ao seu lado. Pela primeira vez na ceia sentou no outro extremo da mesa perto de Mirela e Maisie, que sempre fazia de tudo para evitá-la e excluí-la. Por outro lado, Jack sempre tinha um comentário a lhe fazer. _

Já está com saudades de Ryan?

_

Ele não vai demorar a voltar.

_

Chloe respondeu.

_

E por que não foi com ele?

Pensei ter ouvido que iria ajudá-lo. _

E vou, partirei amanhã de manhã.

_

Agora a atenção de Jack estava totalmente

voltada para Chloe, fazendo Maisie se remexer inquieta em seu assento.

_

Hoje

tenho algo muito importante para tratar, que já deveria ter resolvido há muito tempo, mas a presença de meu irmão em Murray estava me impedindo. Chloe não fazia ideia do que fosse, mas só a maneira como Jack a olhava lhe dada um frio na espinha.

49


Ela foi dormir mais cedo, pois já não suportava mais o olhar de Jack sobre ela. Mirela se ofereceu para que passasse a noite com ela, como Ryan havia sugerido, mas Chloe recusou. Mesmo sem Ryan estar lá queria dormir em sua choupana. Ainda estava acordada no leito quando viu um vulto passar pela lareira. Jefferson a havia acendido como Ryan faria se estivesse lá. _

Quem está aí?

_

Não precisa ter medo, sou muito mais amoroso do que Ryan jamais vai ser. Mesmo não conseguindo ver direito o seu rosto, pela voz covarde Chloe já

sabia de quem se tratava. _

Vá embora.

_

Então já se tornou tão dona dessa choupana ao ponto de me pôr para fora? Chloe sabia que Jack estava se aproximando, podia sentir seu peso na cama

se afundando perto dela. Ela tentou se afastar, se levantar, mas Jack foi mais rápido prendendo suas mãos acima de sua cabeça, cada uma para um lado e colocando o peso de seu corpo sobre o dela. _

Não há por que resistir, Chloe. Ryan não está aqui e ele nunca saberá, será o

nosso segredo e servirá para acabar com essa inquietação que sinto quando está perto de mim. _

Tenho nojo de homens covardes.

_

Prefere Ryan? Acha que ele é melhor do que eu, como meu pai?

50


_

Eu não acho, ele é e nunca me forçaria a nada.

_

Não quero forçá-la, Chloe, mas é isso que vai acontecer se continuar resistindo. Já

conheci muitas fêmeas iguais e a verdade é que quer tanto quanto eu. _

Se me conhecesse saberia que ninguém nunca me força a nada. Falando isso, Chloe lhe deu uma joelhada fazendo-o afrouxar as mãos que

estavam nas suas e lhe dando a oportunidade de empurrá-lo e sair da cama se distanciando. _

Sua víbora.

_

Jack falou entre os dentes, ainda se revirando na cama.

_

Ryan

realmente merece uma fêmea assim. Um pouco recuperado ele se levantou e avançou sobre ela que estava na direção da porta fechada já tentando sair. Chloe não queria ferir realmente Jack, pois aprendeu a gostar muito de Violet e George. Então pegou sua adaga nova e lhe cortou um pouco a mão, sabendo que doeria muito, mas que não causaria muitos danos. _

Arh. O grito que Jack soltou chamou a atenção de Jefferson e ele entrou na

choupana com a espada desembainhada pronto para atacar. _

Jack? Eu pensei que fossem os ladrões, mas o que… Jefferson se calou, não precisava completar a sua pergunta para saber do

que se tratava. _

Boa sorte com essa serpente. _ Jack falou para Jefferson, saindo da choupana com

a mão ensanguentada. 51


_

Disse que era melhor ficar perto da choupana. Ryan vai me matar.

_

Não preciso que cuide de mim. Como viu, sei me cuidar sozinha.

_

Explique isso a ele, Ryan me pediu para cuidar de Milady.

_

Não me chame assim, não sou nobre.

_

Mas é assim que ele quer que seja chamada.

_

Jefferson deu uma pausa. _ Ele vai

me matar e vai matar Jack também. Chloe pôde ver o desespero na voz de Jefferson e imaginou a tragédia que seria para todos em Murray se a inimizade que existia entre Ryan e Jack virasse uma grande discórdia. Pensou mais ainda em George, que era um homem calado, mas muito bondoso, e em Violet, que havia se tornando sua grande amiga. _

Ryan não vai matar ninguém se não souber do que houve.

_

Não posso fazer isso que está me pedindo, Chloe, devo lealdade a Ryan.

_

Cumpriu com todos os seus deveres, ficou aqui e me protegeu, como Ryan lhe

ordenou. _

Não é bem assim. Eu estava longe quando ouvi os gritos de Jack.

_

Porque eu pedi para ficar afastado. Ryan e todos em Murray sabem o quanto sou

arredia, ele sempre está repetindo isso.

_

Chloe deu uma pausa, tinha que ser

convincente o suficiente para fazer com que Jefferson nada dissesse.

_

Além do

mais, sei me defender sozinha, pôde ver isso com seus próprios olhos. De um jeito ou de outro, Jack não iria conseguir.

52


Jefferson tinha que admitir que Chloe havia realmente sido valente e que poucas fêmeas conseguiriam o que ela conseguiu. _

Isso não é o certo, Chloe.

_

E o certo é arranjar mais problemas para Ryan? Já não são muitos os que ele tem,

tendo que proteger Murray desses ladrões que somem como pó. Ainda mais por algo que de fato não foi consumado? _

Mas poderia ter acon…

_

Mas não aconteceu.

_

Chloe interrompeu Jefferson sabendo que aos poucos ele

estava cedendo. _

Certo, mas os céus não permitam que Ryan descubra, ou eu vou ser um homem

sem cabeça. _

Para cortar-lhe a cabeça Ryan terá que colocar meu pescoço na guilhotina

primeiro. _

Isso nunca acontecerá. É muito preciosa para ele. Vou ficar perto da choupana, e

nem adianta protestar, já estou com meu pescoço por um fio. Chloe demorou muito para dormir, não pelo que tinha acontecido com Jack, mas pela ausência de Ryan. Nunca havia se aproximado tanto de uma pessoa, além de Mirela. Quando o dia amanheceu fez a mesma coisa de costume, indo se juntar a Molly para auxiliá-la no preparo da janta. Além da ausência de Ryan, ainda havia uma coisa bastante incomum. Lily, criada que sempre estava com Maisie e evitava

53


Chloe tanto quanto sua senhora, parecia estar em todos os lugares onde Chloe estava. Na janta todos perguntaram a Jack o motivo de seu ferimento na mão e ele inventou que havia se machucado com as rédeas de sua montaria. As pessoas pareciam ter se convencido, menos Violet, que parecia estar um pouco desconfiada, e sua mulher Maisie, que, ao invés de estar provocando Chloe, estava bastante calada. _

_

Mesmo com esse corte ainda vai se encontrar com Ryan? _ Violet o interrogou. Isso não é nada para um homem de verdade.

_

George, que até então estava

calado, falou. Chloe agradeceu aos céus o fato de George ter interrompido a conversa, o que em geral não era de seu costume. _

Meu pai está certo, como sempre.

_

E conseguiu resolver o que disse que a presença de Ryan estava atrapalhando?

_

Violet insistiu no interrogatório. _

Nem sempre se consegue resolver tudo.

_

Se vai, o que ainda está fazendo aqui? _ Maisie pela primeira vez se pronunciou.

_

Até parece que minha mulher me quer ver pelas costas.

_

Não me entenda mal. _ Maisie falou abrandando a voz. _ Só que quanto mais cedo

partir, mais cedo voltará para os meus braços. Assim que a janta foi encerrada Jack partiu, acalmando o coração de Chloe. 54


O dia continuou com a presença estranha de Lily. Chloe quis lhe perguntar o que estava acontecendo, mas temeu que assim criasse ainda mais raiva de Lily e Maisie por ela. Quando estava perto de fazer companhia a Violet com os bordados, Mirela a chamou. _

Chloe.

_

Sim, Mirela.

_

Por que não veio dormir ontem comigo?

_

Já estou acostumada com a choupana de Ryan.

_

Ou talvez a minha presença já não a agrade mais.

_

Não diga isso, Mirela, sabe que é como se fosse uma mãe para mim, a mãe que

nunca tive. _

Eu sei, mas sinto que estou lhe perdendo. Deve ser porque já está em idade de se

casar. _

Não vou me casar, Mirela, sabe muito bem o que penso a respeito de matrimônio e

de ter filhos. _

Pensaria o mesmo se Ryan estivesse disposto?

_

Ele não está. _ Chloe falou levando uma das mãos aos lábios inconscientemente.

_

Ele é um bom amigo, só isso.

55


_

Sim. É melhor deixar que descubra isso sozinha, mas tenho algo a mais a lhe dizer.

Jack não me enganou nem por um segundo com a sua história de ter se machucado com as rédeas. _

E o que acha que pode ter acontecido, então?

_

Chloe falou tentando ser o mais

natural possível. _

Não tente me enganar também. Vi você nascer, criança, não me aborreça e diga-

me logo tudo. Chloe sabia que não podia negar nada para Mirela e, olhando para os lados da entrada do Solar, percebendo que Lily havia sumido misteriosamente, decidiu contar tudo.

56


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO VI

Conforme os homens retrataram, a paz nas terras de Murray havia voltado, e fazia dias que os ladrões não apareciam. Jack já havia chegado ao local onde Ryan e Harry estavam e repetiu para todos a história do incidente com as rédeas para justificar o seu ferimento em uma das mãos. _

O que há homem?

_

Harry perguntou vendo a estranha inquietação de Ryan e

principalmente pelo fato de ter se afastado de todos.

_

Nem parece que recebeu

boas notícias._ Onde estavam não podiam ser ouvidos. _

_

O fato de os ladrões não terem aparecido não quer dizer que desistiram. Mas conseguimos fechar o cerco e agora eles nos temem, o que antes não

acontecia. Harry esperou, mas não teve resposta do amigo. _

É verdadeiramente só isso que o está preocupando?

_

O que quer me perguntar, Harry? _ Ryan falou diretamente, sem rodeios.

_

Quero saber quando vai ceder e pedir Chloe em matrimônio?

_

Nunca me entregaria de tal maneira. 57


_

Mas ela tem o poder de lhe deixar assim como está agora.

_

Também tem o poder de me destruir se me deixar, e não sou tão tolo para permitir

que isso aconteça duas vezes em minha vida. _

E não sofreria agora se ela o deixasse, mesmo não estando em matrimônio?

_

Isso não vai acontecer.

_

Quem pode lhe garantir isso, Ryan? Ela é livre, ouvi você dizer que sabe que Chloe

não é ladra e que, portanto, ela também não é prisioneira. _

O que está tentando fazer?

_

Um milagre de fazer um cego enxergar. Chloe não é sua mãe, para de lutar contra

si mesmo. Conheço-o desde nossa infância, só estou tentando ajudar o meu amigo a ser feliz. Ryan não respondeu nada e ficou assim por um longo tempo. *** _

Estava certa como sempre, minha senhora.

_

Lily estava no quarto de Maisie lhe

relatando o que ouviu de sua conversa entre Chloe e Mirela. _

Sabia. Jack é habilidoso demais na montaria para se ferir daquele jeito com as

rédeas. Mas a culpa não é dele, é homem, e, como todos, não resiste à tentação. É ela, aquela erva venenosa que Ryan colocou dentro de Murray. Mesmo vestindo aqueles farrapos, consigo ver o olhar dos homens sobre ela quando passa. Lily conseguia ver nos olhos de sua senhora a fúria.

58


_

Mas se aquela ladra acha que vai conseguir tudo que já conquistei, vai ter uma

grande surpresa. Quero que vá aos aposentos de Violet e pegue aquele colar de safiras que ela tanto adora. Os criados são muito fiéis, então não deve estar muito escondido. _

E se eu for vista por alguém, minha senhora?

_

Pare de ser tola, isso não vai acontecer, Violet está bordando agora e com certeza

George não estará no leito a essa hora. Agora se cale, pois não terminei. Obedecendo à ordem de Maisie, Lily se calou para ouvir o resto da instrução de sua senhora. _

Depois vá até a choupana de Ryan e coloque o colar em seu baú. _ A expressão de

Maisie mudou do ódio para um largo sorriso. _ Vou pedir para Violet ver o colar, não vai estranhar, pois eu sempre peço isso, ela sabe como eu admiro aquele colar. Quando notar que sumiu vai procurar nos pertences de todos... e adivinha onde vai estar? _

Isso é muito arriscado, minha senhora.

_

Não se preocupe, Lily. Será muito bem recompensada.

_

Maisie sabia que não era

preciso muito para convencer Lily, sempre soube do caráter falso da criada e era esse o motivo que permitia que ela sempre estivesse por perto, ao contrário de Molly, que era extremamente correta e preferia muito mais a companhia de Chloe. Não demorou muito para Lily cumprir as ordens de Maisie. Não foi vista por ninguém e acabou não sendo um trabalho tão difícil.

59


Mais tarde, antes da ceia, Maisie seguiu com seu plano e adentrou no aposento de Violet, sabendo que ela estaria se aprontando para descer e se juntar a todos. _

Milady.

_

Sim, Maisie, nem precisa dizer, já sei o que quer. Veio admirar o meu colar mais

uma vez? _

_

Acertou, ele é tão lindo. Sabe que eu o daria se não tivesse sido um presente tão especial dado por

George.

_

Violet não gostava nem um pouco de Maisie, mas era sua nora e vivia

bem com o seu filho, portanto fazia de tudo para que tivessem uma boa relação.

_

Lembro-me exatamente onde o deixei, deixe-me ver. _ Depois de uma busca sem sucesso ela decidiu procurarem outros lugares.

_

É estranho, não o encontro em

lugar nenhum. Vamos à ceia e depois o procuro com mais calma. _

Não, Milady, é uma joia de muito valor, não pode sumir do nada, tem que encontrá-

la. Depois de uma longa procura Violet percebeu que pela primeira vez Maisie estava certa, havia realmente sido roubada. Maisie desceu as escadas na frente e Violet atrás, ainda um pouco desapontada, pois, há anos, nunca fora roubada. _

Os seus criados nunca lhe deram motivo para desconfiança, então creio que só os

novatos em Murray são os suspeitos.

_

Maise falou olhando diretamente para Chloe

que estava sentada ao lado de Mirela, provocando um grande burburinho no Solar. 60


Àquela hora, todos já estavam esperando a ceia. _

O que está acontecendo?

_

George falou usando a sua autoridade de senhor e

fazendo o silêncio retornar. _

Nós fomos roubados, George.

_

Violet falou esclarecendo o que estava

acontecendo. _ O colar de safiras que me deu sumiu. _

Mas não é possível, como um dos ladrões conseguiu entrar no Solar sem ser

percebido e por que roubou apenas o seu colar? _

Talvez o ladrão já estivesse dentro do Solar e fosse acima de qualquer suspeita.

_

O que está insinuando? _ Chloe falou, finalmente, não suportando mais as indiretas

de Maisie. Sabia que não gostava dela, mas acusá-la de ladra? Ela estava indo longe demais. _

Estou afirmando que foi uma ladra, está bem aqui na nossa frente. Aproveitou da

confiança de todos para roubar Milady. _

Cale-se, Maisie.

_

Violet interrompeu.

_

Chloe já provou que é de extrema

confiança. É claro que não foi ela. _

Então prove isso, Chloe. Deixe que se faça uma revista na choupana de Ryan.

_

Não só na choupana de Ryan, mas em todos os outros lugares. Chloe não é a

única suspeita. Todos são, inclusive você, Maisie. Maisie não foi capaz de contestar as ordens do senhor de Murray, apenas baixou a cabeça e consentiu.

61


George insistiu para que todos ceassem mesmo quando as suspeitas estavam pairando sobre todos. Foi quando um criado baixo e robusto entrou no Solar com o colar de Violet nas mãos. _

É isso que procura, minha senhora?

_

Sim, Oscar. Onde o achou? _ Violet falou um pouco apreensiva.

_

Na choupana de Ryan.

_

Como disse? _ Chloe pensou não ter escutado direito.

_

Na choupana onde vive mais Ryan.

_

Seu filho não tem motivo para roubar a própria mãe. Foi essa erva venenosa que o

fez. _ Maisie falou elevando a voz acusatória para Chloe. _

Não acuse minha menina.

_

Mirela falou defendendo Chloe, que ainda estava

paralisada sem acreditar no que estava acontecendo. _

Está certa, Mirela, talvez não deva só acusar Chloe. Talvez seja cúmplice dela.

_

Não acredite nisso, Violet. Pense, isso não faz sentido. _ Chloe falou recobrando as

forças. _

Eu sei que existe uma explicação para isso, querida. Sei que não é uma ladra.

_

Está ficando insana, Milady. O que você é? Uma feiticeira para enganar todos em

Murray. _ Maisie falou com medo de seus planos não darem certo. _

_

Não chame minha mulher de louca, Maisie, respeite a senhora desse Solar. Desculpe-me, só não consigo acreditar no que meus ouvidos estão escutando.

Mesmo com todas as provas, ainda acredita nessa víbora? 62


_

Violet. Sabe que não há como ter sido eu, muito menos Mirela, nós estávamos

bordando juntas. _

E quem garante que foi hoje que o colar foi roubado. Está há semanas em Murray,

pode ter sido em qualquer momento. _ Maisie continuou insistindo em acusar Chloe, observando que era a única que estava fazendo isso. _

Parece-me que está bem empenhada em acusar Chloe.

_

Jefferson falou

defendendo Chloe, não só por Ryan, mas também pela forte amizade que criou com ela. _

O colar já está de volta às mãos da dona. Vamos esquecer isso e fingir que nunca

aconteceu. _ George falou. Criou uma grande admiração por Chloe e sabia o quanto Ryan sofreria se essa história fosse adiante e, mesmo com provas, não acreditava de todo que Chloe era realmente uma ladra. _

Isso só terá fim se escutar que acredita que não sou uma ladra.

_

Chloe falou se

referindo a George. Ele se calou e abaixou a cabeça se negando a responder. _

Então não há mais o que ser dito. Vou arrumar minhas coisas e irei embora de

Murray. _

Não, Chloe, por favor, querida. Faça como George disse, vamos esquecer tudo

isso. _

Não. Já está decidido, Violet.

_

Eu vou junto. _ Mirela declarou.

63


_

Não Mirela.

_

Violet falou segurando em suas mãos.

_

Precisa ficar aqui para

defender Chloe quando Ryan voltar. Mirela pensou melhor e percebeu que sabia muito mais do que Violet, e que seria muito mais útil para Chloe se ficasse em Murray. _

Tenho certeza que Ryan confia em você. Fique aqui, Chloe, sabe que está sob os

meus cuidados. _

Sinto muito, meu amigo. _ Chloe falou respondendo ao apelo de Jefferson. _ Mas eu

não posso ficar onde desconfiam de mim. Chloe saiu e se dirigiu para a choupana de Ryan, fazendo uma pequena trouxa com os pertences que tinha antes de chegar a Murray. Colocou cuidadosamente a adaga que ganhou em cima do leito e substituiu pela sua que trazia sempre consigo, além da sua espada. _

Ao menos vá com um dos cavalos.

_

Não quero levar nada de Murray.

_

Espere Ryan chegar, Chloe.

_

Não. Eu não quero ver a desconfiança nos olhos de Ryan como vi nos de George.

_

ela falou para Mirela, que a acompanhou segurando as lágrimas que queriam transbordar. Falando isso, Chloe saiu na noite. ***

64


_

Ryan.

_

Jefferson falou chegando pela manhã no local onde Ryan e os outros

estavam. _

O que está fazendo aqui? Deveria estar tomando conta de Chloe.

_

Ela foi embora de Murray.

_

O que? _ Ryan falou aos berros. _ Não deveria ter permitido isso.

_

Chloe é livre como o vento, Ryan. Como queria que a mantivesse em Murray?

_

Não sei. Amarrando-a, talvez. _ Ryan falou avançando sobre Jefferson.

_

Acalme-se, o tempo que está brigando com Jefferson poderia estar passando à

procura de Chloe. _ Harry falou notando o nervosismo do amigo. _

Nós sabíamos que ela não ficaria por muito tempo, até estranhei porque ela não foi

antes. _ Jack falou usando o veneno de costume. _

Fique aqui e comande os homens até eu ou Harry voltar.

_

Ryan respondeu sem

dar importância ao comentário de seu irmão. _

Então Harry é mais importante do que eu?

_

É mais experiente e sabe como agir melhor em certas situações.

_

Mas…

_

Ao inferno com seus mas, não me importo com o que pensa.

_

Claro. Essa víbora virou sua cabeça.

65


Ryan não se deu o trabalho de responder, já estava montado em Fast e seguindo em direção ao Solar mais Harry e Jefferson. Se não parassem chegariam ainda à noite. _

isso não é tudo, Ryan, há mais que devo lhe falar.

_

Jefferson disse quando já

estavam a caminho, começando a falar a Harry e Ryan sobre o furto do colar de Violet.

66


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO VII

Chloe não havia andado muito na escuridão. Já era a segunda noite que passava fora de Murray e estava se distanciando a cada instante, quando encontrou um grupo de três senhores em suas montarias. Todos eram loiros arruivados, altos e robustos, e parecidíssimos um com o outro, revelando que possuíam algum parentesco. _

Mas o que uma jovenzinha como você está fazendo aqui sozinha no meio da

escuridão? _ Um dos senhores lhe disse. _

O que não lhes interessa.

_

Vejo que a língua é bastante afiada.

_

Tanto quanto a minha espada. _ Chloe a desembainhou.

_

Não há necessidade disso, criança. _ O terceiro senhor indagou. _ Só me responda:

tem onde passar esta noite? Chloe não esperava essa pergunta, mas quando olhou mais uma vez para os três senhores percebeu que eles tinham bondade em seus olhos e que não pareciam ser perigosos, colocando, assim, a espada de volta no lugar.

67


_

Sou Benjamin de Begum e esses são meus irmãos gêmeos, Logan e Toby de

Begum. _

Sou Chloe.

_

Só Chloe?

_

Sou uma só, não sabia que precisava de dois nomes.

_

Vejo que a menina Chloe não está de bom humor. Espero que isso só seja essa

noite, pois seria um pecado um rosto tão lindo com um coração tão amargo.

_

Benjamin disse. _ Venha, vou levá-la para Lola, ela nunca se nega a acolher jovens sozinhas. Chloe aceitou a oferta de Benjamin, pois não sabia realmente onde passar a noite. Ela se surpreendeu ao ver que não foram muito longe e ainda estavam nas redondezas de Murray. Certamente, não ficaria por muito tempo ou Ryan ia acabar lhe encontrando. Quando entrou no recinto viu que não era o lar de uma simples senhora, mas sim um bordel. _

Venha aqui menina

_

Um homem tão gordo quanto um barril, e que trazia uma

mulher sentada em seu colo, falou com a boca cheia de assado se dirigindo a Chloe. Ela estremeceu só de pensar em ser tocada por ele. _

Mas que bela menina. Uma senhora, que deveria ter a idade de Violet e cabelos extremamente

negros, falou. Chloe não pôde deixar de notar o quanto ela se parecia com alguém que até então ainda não tinha identificado. 68


_

Já estou de saída, não vou ficar aqui.

_

Não precisa ter medo, criança. Sou Lola, e você?

_

Chloe _ Ela respondeu. _ Não estou com medo, não tenho medo de nada.

_

Sei o que está pensando. Não será forçada a nada, basta olhar para os seus olhos

para ver que não se trata de uma cortesã. Vamos subir para um de nossos aposentos e conversarmos melhor. _

Diga-me o que uma garota tão bonita está fazendo com essas roupas de homem. As duas já estavam em um pequeno aposento simples com uma pequena

cama e um baú. _

É assim que gosto de me vestir.

_

Não aqui. Só tenho uma exigência a lhe fazer: que se vista como fêmea.

_

Parece que não tenho muitas escolhas.

_

Chloe sabia que era uma insanidade

passar mais uma noite na escuridão sozinha. Antes tinha Mirela, agora nem isso mais. _ Mas não vou me portar como as outras. _

Nem eu vou lhe pedir que faça isso. Quero que entenda, Chloe, que nenhuma

menina está aqui forçada Chloe viu a sinceridade nos olhos de Lola e sabia que não era a pessoa mais indicada para julgar ninguém, afinal de contas era uma menina que se vestia como homem. _

Por que tanta tristeza nesses olhos? _ Lola levantou o queixo de Chloe como Ryan

faria, mas não de uma maneira romântica. _ Há um homem nessa história? 69


Chloe assentiu com a cabeça, apesar de não ter sido Ryan a acusá-la de nada. Sabia que era o fato de estar perdidamente apaixonada por ele o motivo de seu sofrimento, e não de ter sido chamada de ladra, mesmo sendo inocente. _

Mais cedo ou mais tarde eles nos magoam.

_

Lola falou.

_

Veja só o meu caso.

Quando enviuvei ainda era muito nova e só o que consegui foi um senhor que me usou e tomou meu filho de mim. _

Como assim?

_

Chloe perguntou se esquecendo por um momento de sua própria

dor. _

Na verdade, não posso acusá-lo de ter me roubado o filho, foi eu que o entreguei.

Afinal de contas, que futuro ele teria ficando comigo sendo um bastardo? Nem Lola sabia o motivo de estar se abrindo dessa maneira para uma estranha. Havia pessoas que a conheciam há anos e não sabiam do seu segredo, mas sentiu uma forte ligação com Chloe. _

Tem notícias dele? Do seu filho?

_

Sim, ele é um homem muito bonito e digno, mas também amargurado, não tem

mulher nem filhos. _

Se ele é um bom homem, vai encontrar uma boa mulher.

_

Assim espero. Não posso ficar muito tempo aqui, vou mandar uma menina trazer

vestes de fêmea para você. _ Falando isso, Lola se retirou. *** _

Quero saber quem acusou Chloe de ladra e a expulsou?

_

Ryan adentrou no Solar

como um trovão. 70


Ryan chegou na hora da janta, pegando, assim, o salão cheio. _

Não é bem assim, Ryan, ninguém verdadeiramente expulsou Chloe. _ Violet falou.

_

Se não o fizeram, por que ela não está aqui?

_

Ryan não baixou o tom. Harry

estava certo, mesmo não estando em matrimônio a partida de Chloe o desesperou. _

Não foi preciso ninguém expulsá-la, ela é uma ladra e foi para a rua que é o seu

lugar. _

Eu não sei por que perguntei se já sabia a resposta. Foi você Maisie.

_

Não. Foi a sua fêmea que se veste de homem que roubou o colar de Milady.

_

Ou talvez uma outra fêmea com o orgulho ferido querendo se vingar.

_

Mirela, que

até então estava quieta, falou. _

Do que está falando?

_

Maisie perguntou para Mirela, traindo-se com a sua voz

fraca. _

Sabe de algo? _ George se pronunciou. Não disse a Chloe que confiava nela e com

certeza esse foi o motivo maior de sua partida. A verdade é que não desgostava de Chloe, porém achava muito injusto a maneira como Ryan e Violet tratavam Maisie, já que ela nunca levantou nenhuma suspeita ruim.

_

Se sabe, é melhor que diga. Não

gosto de mentiras em minhas terras. _

Acho que todos se lembram do ferimento nas mãos de Jack, que fez todos

acreditarem que foi um incidente com as rédeas de sua montaria.

_

Mirela

prosseguiu. _

Mas o que isso tem a ver com Chloe?

_

Violet perguntou, na verdade ela não

acreditou, de fato, na história que seu filho lhe contara. 71


_

Tem a ver que foi Chloe que o feriu. _ Mirela continuou. _ Logo quando Ryan viajou,

à noite Jack foi a sua choupana e tentou possuir Chloe à força, mas ela lutou contra ele e o feriu para se defender. Jefferson também a ajudou e ele não conseguiu o que queria. _

Isso é uma mentira.

desmascarada.

_

_

Maisie falou em desespero, vendo que estava prestes a ser

Se é verdade o que diz, porque Chloe não contou isso a todos? A

verdade é que ela também o queria. Chloe é uma víbora e está envenenando todos em Murray contra mim. _

Então admite que sabia do que houve entre Jack e Chloe naquela noite?

_

Violet

perguntou estreitando os olhos. _

Não… não foi isso que quis dizer… é só que… _ Maisie começou a gaguejar.

_

Pare de tentar se mascarar e admita que foi você quem roubou aquele colar para

incriminar minha menina. _ Mirela explodiu. _

Não fui eu.

_

Pode não ter sido Milady, mas com certeza foi Lily. Todos que agora estavam de pé voltaram a atenção para Molly, que quase

nunca falava, mas se viu na obrigação de defender sua amiga, pois sabia que Chloe faria o mesmo por ela. _

Chloe sempre me ajudava no preparo da janta, como todos devem saber. No dia

do roubo estranhamos a presença de Lily, que sempre costumava ficar com Maisie, mas nunca com Chloe.

72


_

Até você agora acha que pode se pronunciar, criada? _ Maisie falou aos berros com

Molly. _

Todos podem se pronunciar, a não ser que estejam mentindo. E o que me parece é

que não é Molly a mentirosa aqui. _ George disse. _

Posso saber o porquê de eu não saber que Jack tentou atacar Chloe? _ Ryan falou

com uma voz mais baixa, mas não menos perigosa, olhando para Jefferson. _

Ele não conseguiu o que queria, Ryan, mesmo assim lhe peço perdão, não deveria

ter escondido isso de você. A verdade é que Chloe pediu para que eu me calasse para não lhe causar preocupação. _

Sabe que errou comigo e não vou me esquecer disso, ainda mais se tratando da

minha Chloe. Jefferson consentiu e baixou a cabeça. _

Quero que me diga, Lily, se Molly e os outros estão certos, ou se é só Maisie quem

diz a verdade? _ George falou utilizando toda sua autoridade. Lily desviou os olhos de Maisie, que a olhava com bastante intensidade. _

Sim, Milord, é verdade o que Molly e os outros dizem. Chloe é inocente.

_

Lily falou

sabendo que era bem melhor ter a mágoa de Maisie do que de George. _

Por que fez isso? Chloe nunca fez nada contra você! _ Ryan falou avançando sobre

Maisie fechando uma de suas mãos no seu pescoço e a suspendendo no ar. _

Não faça isso, Ryan, só vai fazer com que seja igual a ela. Tenho certeza de que

seu pai irá dar o castigo que as duas merecem.

_

Violet falou tentando abrandar a

situação. 73


Ryan a soltou sabendo que isso só iria desperdiçar um tempo que poderia estar gastando procurando por Chloe. Maisie se apoiou na mesa com uma das mãos no pescoço puxando vigorosamente o ar. _

Quanto ao senhor, agora sabe que Chloe é inocente?

George.

_

_

Ryan falou se dirigindo a

Vou trazê-la de volta e quando a trouxer quero que lhe peça perdão, ou

então pode esquecer o dia que me tomou como filho. Falando isso, Ryan se virou em direção à saída sem esperar pela resposta de seu pai. Harry e Jefferson o seguiram. _

Vou junto. _ Harry declarou.

_

Sei que quer me ajudar, meu amigo, mas preciso que vá ao encontro de Jack. Nós

dois sabemos o quanto ele é inconsequente. _

Se assim o prefere...

_

Deixe-me que vá com você.

_

Dessa vez foi Jefferson quem falou.

_

Tenho um

grande carinho por Chloe e achá-la é uma questão de honra. Ryan assentiu com a cabeça e os dois montaram em seus cavalos seguindo o caminho que Chloe levou para sair de Murray. Harry, por sua vez, também montou no seu cavalo, sabendo o quanto seria difícil suportar Jack e convencê-lo que sabia melhor o que era para ser feito. Se ele não se curvava a Ryan, que era o seu próprio irmão, quanto mais a ele, que Jack achava um ser inferior. A verdade é que a única coisa que Jack

74


possuía de digno era ser filho de Violet e George e irmão de Ryan, e, após esse dia, Harry percebeu quão pouco valia a sua mulher Maisie. O dia já havia amanhecido e nem Ryan nem Jefferson quiseram parar para descansar. _

Estão querendo algo?

_

Um ferreiro falou para Ryan quando entraram em um

vilarejo não muito longe do Solar. _

Sim. Não quero comprar nada, mas estou procurando uma garota com cabelos

longos loiros e olhos azuis. _

Há muitas garotas assim por aqui.

primeiro disse.

_

Veja.

_

_

Um outro homem muito parecido com o

Ele fez um sinal com a mão apontando para a rua, e Ryan

pôde ver pelo menos três garotas com tal descrição. _

Talvez ajude dizer que ela se veste como homem.

_

Jefferson falou interrompendo

a conversa. _

Então ela é única e, para sua sorte, já a encontramos. _ Um terceiro homem com o

rosto idêntico aos outros dois chegou, sem deixar nenhuma dúvida a Ryan e Jefferson de que eram irmãos. _

E onde ela está agora?

_

No bordel de Lola. É só ir perguntando que chegará lá, não fica longe daqui.

_

Um bordel? _ Ryan repetiu a palavra, pois não acreditava no que acabara de ouvir.

_

Sim, não escuta direito? _ O primeiro homem disse em tom de zombaria.

75


_

Por acaso sabe com quem está falando?

_

Jefferson interrompeu mais uma vez a

conversa. _

Sim, sabemos, é Ryan de Murray. Desculpe-me pelos modos de meu irmão, ele é

sempre muito brincalhão. _ O terceiro homem disse. _

Tudo bem, a única coisa que quero agora é encontrar Chloe.

_

É esse mesmo o seu nome, ela nos disse quando a encontramos. Sou Benjamin de

Begum e esses são meus irmãos. Nós a levamos para o bordel de Lola, pois era noite e ela não tinha onde ficar. _

Eu entendo, mas não tenho tempo para conversas. Fico grato pelo que fizeram.

_

Ryan falou muito mais ríspido do que gostaria, porém só conseguia pensar em Chloe. Depois pensaria em recompensá-los de algum modo. Como os irmãos disseram, não era difícil encontrar o tal lugar. Jefferson ficou do lado de fora com os cavalos e Ryan adentrou no recinto, que à noite deveria ter muitos visitantes, mas agora estava em total silêncio. _

Olá, eu estou procurando por uma pessoa.

_

Ele se dirigiu a uma garota que

parecia estar limpando o chão. _

Ryan?

_

Chloe não precisava olhar para trás para saber de quem pertencia essa

voz. _

Chloe, é você? Olhe para mim. _ Ryan não conseguia acreditar, talvez tenha ficado

muito tempo sem dormir e agora os seus olhos estavam lhe pregando uma peça. A beleza era igual, mas ela estava com um vestido simples cereja e uma tiara fina da mesma cor, adornando seu cabelo. 76


Assim que Chloe ficou de pé e se virou, Ryan avançou segurando-a no rosto com as duas mãos e a beijando, sem se preocupar se aquilo era verdade ou se apenas estava sonhando.

77


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO VIII

_

Por que foi embora?

_

Ryan falou entre os lábios de Chloe.

_

Por um acaso acha

que não viria atrás de você? Eu a avisei que não deixaria que fosse embora de minha vida. _

Eu só não queria ficar em um lugar onde não me queriam. Meu lugar não é em

Murray. _

Seu lugar é ao meu lado, e não tem escolha em relação a isso. A voz de Ryan soou firme e Chloe pensou nunca ter visto ele tão possessivo

assim antes como agora. Ele lhe deu mais um beijo, dessa vez colocando uma das mãos em seus cabelos e outra na base de sua coluna, deixando-a o mais perto possível do seu corpo e levantando os pés dela do chão. Chloe também não conseguiu controlar a vontade de tocá-lo e agarrou o cabelo de Ryan. Ele pediu forças para não possuí-la ali mesmo, no chão de um bordel, o que não seria digno de Chloe. _

Eu o amo… _ Ela deixou escapar quando ele cessou um pouco o beijo e a colocou

de volta no chão.

78


_

Mas que lindo ver a intensidade da paixão em um casal tão belo. Amélia, junte os

pertences de Chloe e os traga aqui. Algo me diz que ela já vai partir. Ryan tirou um pouco sua atenção de Chloe para voltar-se à voz que vinha do pé da escada. A mulher que tinha os cabelos tão negros quanto os dele substituiu o sorriso que estava no rosto por uma cara de espanto. _

Você? _ Ryan falou um pouco assustado.

_

Essa é Lola, dona desse lugar. Foi ela quem me acolheu. Você a conhece?

_

Muito mais do que gostaria. _ Ryan falou com desprezo na voz. _ Então, abandonou

seu próprio filho para acolher os dos outros? _ Ele perguntou para Lola. _

Do que está falando? Por que está sendo tão rude com ela? _ Chloe perguntou sem

saber o que estava acontecendo. _

Ela merece de mim muito mais do que ser apenas rude.

_

Ryan tem razão, Chloe. Sou a mãe dele e, mesmo assim, o abandonei.

_

Minha mãe é Violet, e ela é uma mulher muito mais digna do que você. _ Ryan falou

aos berros.

_

Eu não sei o que seria de mim se ela e George não tivessem

aparecido. _

Não é como está pensando, deixe-me explicar.

_

Teve uma vida inteira para explicar. _ Ryan falou tomando uma das mãos de Chloe

e a arrastando consigo para a saída. _

Por favor, Ryan, deixe-a explicar. Todos merecem ter o direito de falar.

_

Chloe

disse, empacando no salão e se esforçando ao máximo para segurar Ryan no lugar. 79


_

_

Não a defenda, Chloe. Não estou defendendo, só pedindo para não a acusar. Fui chamada de ladra,

quando, na verdade, não sou. Por favor, não estou pedindo que a perdoe, apenas que a deixe se explicar. Ryan fechou os olhos e franziu a testa como se estivesse lutando com algo internamente. A verdade é que não queria negar nada a Chloe, mesmo que isso significasse ouvir a quem ele nem ao menos queria ouvir a voz. Ele se virou para escada e disse: _

Diga o que quer, mas saiba que não é por você que estou fazendo isso, e sim por

Chloe. Chloe tentou se livrar da mão dele que estava segurando na sua, mas ele a apertou ainda mais. _

Onde pensa que vai?

_

Vou esperar lá fora enquanto conversa com a sua mãe. _ Ela não queria atrapalhar

e sabia que era uma intrusa nesse assunto. _

Quero que fique aqui, não quero ter nenhum segredo com você. Além do mais, não

vai ficar longe dos meus olhos nem por um momento, não vou permitir que fuja de mim mais uma vez. _

Talvez o destino tenha sido generoso e ele já tenha encontrado uma boa fêmea.

_

Lola falou com Chloe se referindo à conversa que tiveram na noite anterior, quando ela disse que seu filho era um homem amargurado.

80


Ryan pensou em perguntar do que elas estavam falando, mas se deteve, pois queria sair dali o quanto antes. _

Ande, não tenho o dia todo, diga logo o que quer me dizer. Lola desceu calmamente as escadas se preparando para a conversa que, ela

sabia, não seria fácil. _

Quando era mais nova me casei com um homem muito bom, mas ele sofria de uma

doença nos pulmões e logo morreu. _ Lola começou. _

Então por que nunca me contou a verdadeira história, sempre se negava a

responder quando eu perguntava de meu pai? Por que simplesmente não me disse que ele havia morrido? _

Porque ele não morreu. Adoraria ter tido um filho com o meu falecido marido, mas

ele me deixou antes disso. O seu pai é outro homem. _

_

E ele a abandonou? Ele nunca foi verdadeiramente meu para eu dizer que fui abandonada. Ele é

casado há muitos anos com outra mulher. _

E eu o conheço? Ryan percebeu que Lola estava hesitante, o que fez concluir que realmente

se tratava de alguém que ele conhecia. _

Eu quero o nome. _ Ele usou a sua voz, que era baixa, porém ameaçadora.

_

Talvez seja melhor nunca o saber.

_

Se começou, vai terminar. Diga de quem se trata? _ Dessa vez ele levantou a voz. 81


_

Ryan, por favor.

_

Chloe, que até então estava calada, se limitando apenas a

observar, tentou intervir. _

Não, Chloe, não tente ajudá-la. Ela não merece isso.

_

Você não conhece os motivos dela.

_

Como vou conhecer se ela não me diz?

_

Ryan olhou para a mulher que estava

escutando uma conversa sobre ela passivamente, como se não estivesse ali.

_

E

então? Vai me provar pelo menos uma vez na vida que posso confiar em você? Ou estou certo em meu julgamento e já posso seguir caminho mais Chloe? _

_

As coisas costumam ser muito difíceis para uma mulher sozinha.

Lola falou com

um fio de voz, já perto das lágrimas. _ Ainda mais se ela tiver um filho. Eu nem tinha como alimentá-lo direito, Ryan. _

E por que não recorreu ao meu pai?

_

Mas foi o que eu fiz. _ Ela falou finalmente, libertando as lágrimas. Ryan ficou parado, tentando entender o que acabara de ouvir.

_

Sir. George de Murray é seu pai. Na época eu era cortesã para sobreviver e, como

todo homem jovem, mesmo amando sua mulher Violet, ele foi fraco e impulsivo. Lola fez uma pausa, tentando controlar o choro para continuar.

_

_

Nenhum de nós

achou que algo de grave poderia acontecer, afinal de contas eu já era muito experiente. Mas eu engravidei de você, Ryan. Ele ainda estava mudo, incapaz de dizer qualquer coisa. _

George nunca soube que você é filho dele, apenas dei você para que ele o criasse,

pois eu não tinha condições nenhuma de fazer isso. E, como um homem bom que 82


eu sei que ele é, com certeza lhe deu muito amor e carinho e nunca fez distinção entre você e Jack. Mas eu sempre estive por perto, Ryan, olhando você crescer. _

Não tão perto quanto eu queria. _ Ryan finalmente falou.

_

Eu não poderia correr o risco de ser descoberta, pois isso destruiria sua vida. E eu

não queria ser uma mãe ruim para você, não mais do que já fui. _

Foi por isso que trocou de nome? Lola assentiu com a cabeça e Chloe teve vontade de lhe perguntar qual era o

seu verdadeiro nome. Mas sabia que aquele não era um bom momento para se pronunciar. _

Eu não tenho nada para lhe dizer, então não espere que eu a perdoe e passe a

chamá-la de mãe. _

Sei que isso jamais iria acontecer.

_

Mesmo assim, eu lhe agradeço pelo que fez. Acolheu Chloe e, se não fosse por

isso, nem sei onde ela poderia estar agora ou se eu ia conseguir encontrá-la. Se tinha alguma coisa que poderia ter feito para me agradar era isso, e o fez. Vou ser sempre grato a você, Lola, mas é só isso. Falando assim ele se virou em direção à saída, dando as costas. Chloe, porém, conseguiu se desvencilhar de sua mão e correu ao encontro de Lola, que estava em prantos, lhe dando um forte abraço. _

Também sou muito grata. Não fique assim.

Lola com as costas das mãos.

_

_

Ela falou, enxugando as lágrimas de

Um dia ele vai entender.

_

Ela falou, tentando

83


consolar a mulher que fez o mesmo por ela na noite anterior quando estava chorando também por Ryan. _

Jefferson._ Chloe falou sorrindo quando saíram e ela avistou seu amigo.

_

Olá, fujona.

_

Mas isso não vai mais se repetir. _ Ryan falou duramente olhando para Chloe.

_

Não, não vai _ ela respondeu. Os três seguiram a cavalo de volta para Murray, Jefferson sozinho em sua

montaria bem na frente para dar privacidade ao casal, e Chloe e Ryan atrás, ambos montados em Fast. _

Está tudo bem?

_

Ela falou virando um pouco a cabeça para trás e olhando para

Ryan, que estava calado desde o momento em que se despediram de Lola. _

Vou ficar bem.

_

Pretende contar tudo a George e Violet?

_

Não sei ainda. Falar não seria bom, ficar calado tampouco.

_

Seja lá o que escolher, estarei ao seu lado.

_

Sei disso.

_

Ryan falou lembrando-se do momento em que ela revelou que o

amava. Queria ter respondido o mesmo para ela, mas foi interrompido por Lola e agora ele não sabia mais como lhe dizer. _ Gostei muito de vê-la, finalmente, vestida como fêmea.

_

Ele falou alisando uma das mangas do vestido que Chloe estava

usando.

84


_

Para falar a verdade, eu também gostei dele, principalmente da tiara, pois ela

permite que eu use os cabelos soltos como você gosta e impede que eles fiquem indo para a frente do meu rosto, como eu não gosto. _

Então achamos o que agrada a ambos, enfim.

_

Ryan falou com o sorriso nos

lábios. _

Não nós, Lola encontrou. Chloe viu o sorriso de Ryan desaparecer.

_

Não gosto de vê-lo assim.

_

Quanto menos falar dessa mulher, menos vai me ver assim.

_

Mas ela é sua mãe, Ryan.

_

Não, não é. _ Ryan falou levantando a voz. _ Minha mãe é Lady Violet de Murray, e,

se não quer me aborrecer, acho melhor não falarmos mais disso. Chloe não falou mais nada até o resto do caminho, entendendo bem o recado contido na voz alterada de Ryan. Mesmo estando triste por ele, não conseguia tirar o sorriso do rosto por estar indo de volta a Murray e principalmente por Ryan ter ido buscá-la. Mais uma vez Ryan não quis parar no caminho e, como não estava procurando por mais nada, pôde passar por fora do vilarejo. Chegaram no início da ceia, quando todos estavam no salão. Ele notou que nem Maisie nem Lily estavam presentes e concluiu que deveria ser parte do castigo dado por George. Assim que notaram sua presença o barulho que estava no grande salão cessou e todos, quase que imediatamente, olharam para Chloe. 85


_

Que bom que voltou, querida. _ Mirela foi a primeira a se pronunciar, se levantando

do seu lugar para dar um abraço em Chloe, que tinha uma de suas mãos presas possessivamente pela mão de Ryan, e nem mesmo o abraço de Mirela o fez libertála. _

Murray se alegra com a sua volta. Não é mesmo, George? _ Violet falou em tom de

cobrança. _

Eu poderia passar a ceia toda falando.

_

George falou se levantando de seu

assento, mas sem ir até Chloe como fez Mirela.

_

Mas não teria tudo que conquistei

nessa vida se não tivesse sempre sido direto e também o serei dessa vez. uma pausa e, quando voltou a falar, sua voz foi ainda mais firme.

_

_

Ele deu

Peço desculpas,

Chloe, não porque Ryan me pediu para fazer isso, mas porque não gosto de injustiça nas minhas terras e porque provou ser muito digna. Por favor, me avise se Maisie voltar a incomodá-la. Chloe assentiu com a cabeça. _

Então, já que tudo foi esclarecido, vamos cear.

_

Violet falou deduzindo, como toda

boa matriarca, que já era hora de pôr um ponto final no assunto. Chloe em nenhum momento foi incomodada e sabia que isso se devia ao fato de não ter visto Maisie. Achou muito estranho o seu sumiço na ceia, mas estava tão feliz de não ter que compartilhar da sua presença que resolveu não fazer nenhum tipo de comentário. Assim que Ryan observou que o prato de Chloe estava vazio se levantou e a levou consigo, mais uma vez tomando sua mão, um gesto que estava ficando muito comum entre eles. Até parecia que Ryan queria, com isso, tentar impedi-la de fugir 86


novamente. Com tal pensamento em mente Chloe começou a sorrir, intrigando Ryan. _

Do que está rindo? _ Ele perguntou ainda a levando pelo meio do caminho.

_

Estou rindo de você.

_

E tem coragem de me dizer isso assim? Não tem medo de apanhar?

_

Ryan falou

em tom de zombaria. _

Sei que não costuma bater em mulheres, além do mais, se o fizesse, perderia

facilmente de mim. Se dei conta do seu irmão, daria de você também, ainda me sobrou uma das minhas adagas. _

Você tem as duas. Ele falou entrando na choupana e lhe devolvendo a adaga que

estava lá. Depois, mais uma vez acendeu a lareira e tirou a cota de malha e a túnica como de costume.

87


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO IX

Ryan sentou e começou a olhar para Chloe sem dizer uma palavra. Ela não sabia o que ele estava pensando nem o que queria que ela fizesse. Então, ela se virou e começou a fitar as chamas da lareira. Já estava distraída quando o ouviu dizer. _

Olhe para mim. Ela se virou e obedeceu, temendo a intensidade que via nos olhos dele, era

algo feroz, mas não sabia se era raiva. _

Venha aqui. Chloe se aproximou até ficar perto do seu assento, mas ele não se contentou.

_

Aqui.

_

Ryan fez um sinal com as mãos apontando para o seu colo e Chloe se

sentou sobre ele, como na vez em que ela lhe pediu para que a ensinasse a beijar. Nunca mais fuja de mim, ouviu? Nunca mais.

_

_

Ele falou segurando-a pelos ombros

e sacudindo-a.

88


Chloe só assentiu com a cabeça, não havia o que dizer. O olhar dele não se abrandou respondendo a sua pergunta muda. Sim, ele estava com raiva, mas pelo que ela tinha feito. Com as mãos ainda em seus ombros ele começou a beijá-la, e era diferente de todos os outros. Ryan a apertava pelos ombros e não deixava tempo para Chloe respirar, e, quando a libertou, ela ofegou como se estivesse se afogando. Ryan voltou a beijá-la, dessa vez mais castamente, primeiro na testa, depois nas têmporas, descendo pela ponta do nariz e indo do queixo até o pescoço, onde deu uma atenção especial. _

Ryan…

_

Chloe não conseguia lidar com aquele calor que inundava todo o seu

corpo e parecia querer queimá-la viva. _

Olhe para mim.

_

Ele ordenou mais uma vez segurando as pontas do cabelo de

Chloe com uma das mãos e fechando a outra em torno do seu pescoço, mas sem machucá-la. _ Gosto de como fica corada quando a beijo. Nesse instante Chloe percebeu o quanto seu rosto deveria estar vermelho, já que se sentia como se estivesse pegando fogo. _

Tem ideia do que sinto por você, menina? Gosto de você, Chloe, e não é como um

amigo gosta de uma amiga. Ele colocou suas mãos uma em cada joelho de Chloe e subiu até suas coxas. Na outra vez ela estava de calção e pouco revelava o seu corpo, porém agora estava de vestido. _

Não, Ryan. 89


Ela tentou se levantar, mas Ryan segurou seus cabelos na base da nuca, mantendo-a no lugar e a beijando novamente com a mesma urgência de antes. _

Quero-a como um homem deseja uma mulher, Chloe.

_

Ele falou entre os seus

lábios. _

Não, Ryan. Dessa vez a voz dela foi mais firme e Ryan a largou imediatamente, dando

espaço para ela se levantar. Desejava Chloe, mas nunca a tomaria à força como Jack tentou fazer. _

Eu não quero engravidar e ver meu filho ser tratado como você foi, como eu fui. Eu

não quero que meu filho seja um bastardo. _ A última frase foi dita com um fio de voz e Chloe se virou mais uma vez na direção da lareira, temendo que Ryan visse as lágrimas que teimavam em descer dos seus olhos. _

Do que está falando?

_

Eu não quero falar disso, Ryan. Ryan se levantou e foi até onde ela estava, virando-a de frente para ele e

segurando em seu queixo para forçá-la a olhar para ele. _

Vai me contar. Não sei nada sobre você, sabe tudo sobre mim, e eu não quero

segredos entre nós, Chloe. Ela assentiu com a cabeça reconhecendo o fato de Ryan tê-la deixado escutar sua conversa com Lola. _

Vamos, meu bem, me conte.

_

Ryan falou enxugando as lágrimas dela com beijos

pelo caminho molhado no rosto de Chloe. 90


_

Ao contrário de você, o homem que me criou não é o meu verdadeiro pai.

_

Ela

começou a dizer. _ Ele era um homem muito rude com a minha mãe e ela acabou se envolvendo com outro homem que vivia perto do Solar onde ela vivia. Minha mãe nunca iria contar a Edward que eu não era sua filha, mas quando teve uma complicação no parto e viu que iria morrer, resolveu contar tudo. _

A sua mãe morreu? _ Ryan perguntou, já sabendo a resposta.

_

Sim. E Edward cuidou para que minha vida fosse um verdadeiro inferno. Ele me

tratava como uma criada, sempre me castigava e me batia muito, mesmo quando eu não fazia nada. Ryan tirou a mão do queixo de Chloe, fechou os olhos e cerrou os punhos, fazendo-a perceber que com certeza Edward levaria uma surra se estivesse por perto naquele momento. _

E o seu verdadeiro pai? Não fez nada a respeito?

_

Não, ele não poderia. Edward armou uma emboscada e o mandou matarem assim

que minha mãe revelou que eu não era sua filha. _

E como veio parar nas terras de Murray? Ele a pôs para fora?

_

Ryan abriu os

olhos, mas a sua voz não ficou menos ameaçadora. Chloe sabia que não era com ela que ele estava bravo dessa vez. _

Não, eu que fugi. Não aguentava mais, Ryan. Ele a abraçou colocando a cabeça dela no seu peito.

91


_

Mirela veio comigo. Ela era criada de minha mãe e eram muito amigas. Ao

contrário de Edward, Mirela sempre me tratou muito bem e sempre cuidou de mim, não permitindo que eu partisse sozinha. _

Com quantos anos partiu?

_

Com uns treze anos, mais ou menos. Eu sempre soube me cuidar e aprendi a

manusear a espada para defender a mim e Mirela. Chloe falou com orgulho, fazendo Ryan sorrir e ficar um pouco menos tenso, o que a agradou. _

_

E por que se vestir como homem? Porque ninguém se importa com um menino sozinho e os homens me

aborreceriam muito se soubessem que sou fêmea. Assim como Jack o fez. Ryan gelou, ainda abraçado a ela, com tal pensamento. Com Jack, Chloe ainda tinha Jefferson para ajudá-la, mas fora de Murray eram só ela e Mirela. _

Também tem o fato de todos os filhos de Edward serem homens, e eu pensei que

se me comportasse como um ele pudesse, nem que fosse só um pouco, gostar de mim. _

Não precisa ser o que não é para que gostem de você, Chloe.

_

Ryan falou se

desvencilhando do abraço e levantando o rosto dela com as duas mãos.

_

É perfeita

do jeito que é. É perfeita para mim. _

Ninguém é perfeito.

_

Então, há três anos que vive sozinha mais Mirela?

_

Ryan perguntou mudando de

assunto. 92


_

Quase quatro.

_

Está perto de fazer anos?

_

Sim.

_

Chloe saiu das mãos de Ryan lhe dando as costas mais uma vez.

_

Agora

entende qual é o motivo para eu não querer filhos, não é? Nunca conseguiria ver ninguém tratado como eu fui, como você foi, ainda mais se fosse o meu próprio filho. Você conseguiria, sabendo que a causa do sofrimento dele era sua? _

Jamais abandonaria meu filho como Nicole fez comigo.

assim, o verdadeiro nome de Lola a Chloe.

_

_

Ele falou, revelando,

Muito menos o maltrataria como

Edward fez. _

Eu também não, mas isso não o impediria de ser chamado de bastardo e

humilhado pelos outros, como eu fui.

_

Chloe falou quase gritando, se virando

novamente na direção de Ryan, e ele pôde ver o quanto ela ainda estava magoada por tudo que passou desde o seu nascimento, já órfã de mãe, como ele se sentia, já que, mesmo sua mãe estando viva, nunca esteve presente como verdadeiramente queria. _

Diga onde posso encontrar Edward. Onde ele vive? _ Ryan também alterou a voz.

_

E eu lhe prometo que ele vai pagar por tudo que fez a você. _

O que ele fez foi no passado, e agora não tem mais importância. E eu espero que

um dia pense o mesmo em relação a Lola Falando isso, Chloe se virou em direção à saída. Nem ela mesma sabia o porquê, mas precisava se afastar um pouco de Ryan, talvez pelo fato de ele ser a primeira pessoa a quem ela revelara todo o seu passado, ou, talvez, pelo fato de

93


não querer filhos bastardos e não saber se teria força de vontade o suficiente para resistir a Ryan. _

Aonde vai?

_

Vou dormir na choupana onde Mirela está. Não se preocupe, não vou fugir mais.

_

Falando isso, ela saiu sem aguardar resposta. *** Os dias voltaram a ser tranquilos para Chloe em Murray. O verão havia chegado e já não era necessário que se acendessem as lareiras todas as noites. Lily agora fazia serviços mais pesados do que antes, fora do Solar, e Maisie servia a todos na hora da janta e também na ceia, que eram os castigos atribuídos a ambas por George. Chloe não considerava aquilo uma pena a ser paga, gostava muito de ajudar Molly em seus afazeres. Se fosse Edward no lugar de George, Maisie e Lily conheceriam um castigo de verdade. Agora Chloe dormia todas as noites com Mirela e Ryan, até o momento, não tinha feito nenhuma objeção, mas desde então tem se ausentado muito na hora da ceia e Chloe desconfiava que ele devesse estar visitando Anna com mais frequência. Chloe ainda não sabia ao certo se Anna era o verdadeiro nome dela ou se seria Chloe, mas Violet lhe disse que não havia outra Chloe em Murray. _

Quero falar com você, tenho que lhe mostrar algo.

_

Ryan falou uma manhã com

Chloe enquanto ela caminhava em direção ao Solar para ir ajudar Molly com a janta. 94


_

O que é?

_

Vai ver quando chegar lá.

_

Lá onde?

_

No estábulo, Chloe. Vamos, ande. Ela notou que Ryan parecia aborrecido, e não era só hoje, ele estava mais

impaciente que o normal, principalmente com ela _

Ela é muito bonita. Chloe falou quando ele lhe mostrou uma égua forte em tons de marrom e

branco. _

Então, você gosta?

_

Sim, mas não entendo, Ryan. Fast está doente?

_

Ela falou um pouco angustiada.

Apesar de às vezes ser arredio, Chloe gostava muito de Fast. _

Não foi para mim que trouxe essa égua.

_

Não?

_

É, Chloe, o que há? Não está escutando direito? Ryan levantou a voz e ela percebeu que realmente deveria ser o motivo da

raiva dele, já que fazia algum tempo que os ladrões não atacavam. _

Sim, estou escutando muito bem.

_

Trouxe-a para você.

95


_

Para mim?

_

Chloe falou fazendo outra pergunta desnecessária e soube disso no

exato momento em que viu Ryan suspirar.

_

Por que para mim? Já me deu a adaga

há tão pouco tempo. _

Disse-me que estava perto do seu aniversário e, além do mais, não existe tempo

para se ganhar um presente. _

Só não estou muito acostumada com isso, Ryan. Ela viu o rosto dele se abrandar e, por um momento, a sua raiva parecia ter

passado. _

Só me diga que gostou. _ ele falou a abraçando e aninhando os seus cabelos, que

estavam presos em uma trança, com a mão.

_

Depois quero que vá à minha

choupana, há outro presente lá para você. _

Não preciso de tantos.

_

Precisa de quantos eu quiser lhe dar... Ryan foi interrompido quando Chloe ficou na ponta dos pés e o beijou

castamente nos lábios. Ele, por sua vez, depois de recuperado da surpresa, aprofundou o beijo, mas ela logo o soltou para montar em sua égua. _

Sabe, existe uma pessoa que vai gostar mais desse presente do que eu.

_

Chloe

falou quando já estava em cima do animal. _

Quem? _ Ryan perguntou um pouco intrigado.

_

Jefferson, ele já não aguenta mais o quanto eu peço emprestada a sua montaria.

_

Chloe falou tirando de vez a tensão nos olhos de Ryan, que sorriu, _ Ninguém nunca me tratou como você me trata. 96


_

Então se lembre disso e nunca mais tente ir embora de Murray, até porque eu iria

atrás de você. _

Dessa vez não seria tão fácil assim, agora eu tenho a minha própria montaria. Ela falou com um sorriso nos lábios, mal conseguindo conter sua felicidade, e

Ryan soube que ela não estava falando sério. _

Qual o nome que vai dar a ela?

_

Vou pensar, foi um presente especial. Então, o nome dela tem que ser especial

também. _ Chloe falou já saindo do estábulo. Um dia sem ajudar Molly não iria fazer nenhum mal e ela já sabia exatamente aonde iria em seu primeiro passeio com o seu mais novo presente.

97


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO X

Chloe não andava muito longe das proximidades do Solar, ainda mais depois de ter ido embora. Parecia que alguém a estava sempre vigiando, principalmente Jefferson. Apesar de ter usado aquele caminho somente uma vez, não se perdeu. Estava um pouco diferente, porque agora era dia, mas não demorou muito para encontrar a taberna onde seguiu Ryan e Harry noites atrás. Assim como no bordel de Lola, o local estava bem menos movimentado de dia do que parecia estar na outra ocasião em que era noite. _

Quem é você?

_

Uma mulher muito bonita, com cabelos castanhos encaracolados

presos no alto da cabeça, perguntou. _

Estou procurando uma garota chamada Chloe.

_

Chloe falou sem responder a

pergunta da mulher. _

Não tem ninguém chamada Chloe aqui.

98


_

Talvez o nome dela seja… Anna.

_

Chloe falou um pouco desconcertada. Já havia

ido a um bordel antes, mas o olhar de Lola era bem menos hostil do que o dessa mulher.

_

O que quer com Anna? É parente dela? Chloe se lembrou o quanto Anna parecia com ela fisicamente.

_

Não, mas preciso muito falar com ela.

_

Tudo bem.

_

A mulher falou depois de uma longa pausa. Chloe sabia que a sua

imagem de vestido ficou muito mais gentil e que quem a olhasse não iria temer mal algum. _ Fique aqui, vou chamá-la. Anna não demorou muito a descer e olhou diretamente para Chloe com olhos azuis tão vivos quanto os dela. _

Uma fêmea me procurando não é muito comum. Se veio aqui por causa de algum

marido já lhe adianto que não arrasto ninguém para cá. Todos eles vêm com as suas próprias pernas. _

Não se preocupe, não vim brigar.

_

Então, diga logo o que quer, menina, tenho o que fazer. Chloe reparou como ela a chamou e soube que realmente deveria se parecer

com uma menina em comparação a Anna.

99


_

Só quero saber como é o seu verdadeiro nome. _ Chloe lembrou que Lola também

era um nome falso, que talvez o verdadeiro nome de Anna pudesse ser Chloe.

_

Anna ou Chloe? _

Mas é claro que é Anna, não tenho por que esconder meu próprio nome.

_

É que certa vez eu vi um amigo meu chamá-la de Chloe.

_

Eles me chamam de muitos nomes.

lábios.

_

_

Anna falou com um sorriso malicioso nos

Deve estar falando de Ryan. Eu não sei ao certo, ele não fala muito, até

porque ele não vem aqui conversar. Mas eu fiquei muito curiosa, assim como você, e perguntei sobre isso a Harry. _

E o que ele respondeu?

_

Que Chloe é uma moça por quem Ryan está apaixonado, mas é muito teimoso

para reconhecer isso. Confesso-lhe que estranhei, pois conheço Ryan há muito tempo e nunca o imaginei apaixonado. Mas sim, ele sempre fala o nome dessa tal de Chloe.

_

Anna deu uma pausa e quando voltou a falar estava com os olhos

desconfiados. _ Por que veio aqui me perguntar isso? Você a conhece? _

Pelos céus, eu espero que tenha um bom motivo para explicar o que está fazendo

aqui, Chloe.

_

Ryan entrou falando e tanto sua voz quanto as veias do seu pescoço

revelavam o quanto deveria estar bravo. _

Você é Chloe? _ Anna falou dando uma gargalhada tão intensa que fez sua cabeça

curvar para trás lançando sua vasta cabeleira.

_

Então eu já entendi o porquê de ter

se apaixonado por ela, é tão impetuosa a ponto de vir em um lugar como esse. Se soubesse que ser desobediente e ousada era o segredo, já teria feito para fazê-lo se apaixonar por mim. 100


_

Com você eu me resolvo depois, Anna. _ Ryan falou puxando Chloe pelo braço e a

levando para a saída. _

Como soube que eu estava aqui?

_

Chloe perguntou já sabendo a resposta. Com

certeza, alguém a viu seguir caminho, avisou a Ryan e ele foi atrás pensando que ela estava tentando ir embora de Murray novamente. _

Suba em sua montaria, e calada.

_

Ele falou já montado em Fast.

_

Não acredito

que tive que lhe buscar pela segunda vez de um bordel, Chloe. Como conhecia esse caminho? _

Eu o segui uma das vezes em que esteve aqui mais Harry.

_

Ela falou já montada

em sua égua seguindo caminho lado a lado com Ryan. E quando olhou para o rosto dele viu que sua revelação piorou, e muito, sua situação. _

_

Então você costuma me seguir. Foi apenas uma vez, Ryan. E o que é que tem? Também não faz o mesmo

comigo? _

Você é fêmea, e isso torna tudo diferente. Anna tem razão, você é muito

impetuosa, Chloe. Não estava procurando um nome para a sua montaria? Por que não coloca impetuosa? Combina muito com você. _

Por favor, não fique bravo comigo, Ryan. Ele não respondeu, só suspirou e seguiram o resto do caminho em silêncio. ***

_

Abra o baú novo. _ Ryan falou assim que entraram em sua choupana.

101


Ele a levou para lá lembrando-lhe que ainda havia presentes para ela. Assim que entrou, Chloe percebeu que havia mais um baú na choupana. Sabia o quanto ele deveria estar zangado ainda, então não fez nenhuma pergunta e foi abrir o baú que ele pediu. _

Mas o que é isso?

_

Veja você mesma.

_

Ele a incentivou num gesto com a mão para que ela

retirasse o que estava dentro do baú. Chloe o fez e percebeu que havia vestidos de quase todas as cores, em especial um de cor azul celeste que ela tomou logo nas mãos. Também tinha muitas tiaras de cores iguais às dos vestidos. _

Sabia que ia gostar mais desse, já a vi várias vezes olhando para o céu

durante o dia e achei que essa deveria ser sua cor favorita. Violet me ajudou muito, Molly também, ela tem as medidas parecidas com as suas. Mesmo assim, é melhor que experimente todos no caso de ser necessário fazer alguns ajustes. _

São muito bonitos.

_

O que foi? Não gostou?

_

Eu gostei muito. _ Ela falou largando o vestido azul em cima da cama para abraçar

Ryan. _ E eu vou usar esse para a janta. _ Chloe falou apontando para o vestido que colocou na cama. _

Não.

_

Por quê?

102


_

Quero que só o use quando eu mandar. Chloe não entendeu o motivo, mas resolveu obedecer largando os braços de

Ryan e indo até o baú buscar um vestido amarelo e uma tiara da mesma cor. *** _

Eu sabia que ia ficar linda com ele.

_

Violet falou assim que Ryan entrou no salão

do Solar com Chloe em seu vestido amarelo. _

Ou com qualquer um deles. _ Ryan falou olhando diretamente para Chloe. Ela percebeu que ele não estava mais bravo como antes.

_

Vou me ausentar mais uma vez e espero que dessa vez a encontre quando voltar. _

Ele falou quando já estavam sentados, baixo o suficiente para só Chloe ouvir. _

Tem mesmo que ir?

_

Aconteceram novos ataques, Chloe.

_

E por que não me disse nada?

_

Não queria deixá-la preocupada como está agora. Acontece que eles estão cada

vez mais perto do Solar e eu não posso permitir que isso aconteça. Quero que fique aqui dentro do Solar enquanto eu estiver fora. _

Não posso ficar mais, Mirela?

_

Traga ela para cá, vão ficar mais seguras aqui.

_

Tudo bem.

103


_

Prometa-me, Chloe, que vai ficar aqui dentro e não vai cometer nenhuma

estupidez. Não quero que saia do Solar para nada. _

Nem para alimentar impetuosa?

_

Então decidiu dar esse nome a ela?

_

Gostei da sua sugestão.

_

Arnold irá alimentá-la.

_

E por que não Jefferson?

_

Ele e Harry irão comigo.

_

Prefiro ficar com Jefferson.

_

Porque ele cede as suas vontades, não é mesmo?

_

Não. Porque ele é meu amigo.

_

Para o bem do pescoço do seu amigo, é melhor que ele esteja longe da próxima

vez que cometer uma besteira, ou eu posso culpá-lo de novo. _

Por favor, me deixe alimentar impetuosa, gostei tanto dela.

_

Tudo bem Chloe.

_

Ryan falou depois de um longo suspiro, sabendo que essa era

uma batalha que ele já havia perdido.

_

Mas só para isso e depois direto para o

Solar. Chloe balançou afirmativamente a cabeça e depois da janta foi com ele até a saída para se despedir.

104


_

Prometa-me que vai ficar em segurança, Chloe. _ Ele falou encostando sua testa na

dela quando já estavam do lado de fora. _

Só se me prometer o mesmo. Chloe compreendia a preocupação de Ryan, pois ela mesma a estava

sentindo. Esses ladrões eram diferentes dos outros, não queriam roubar, só destruir, e ela temia por Ryan e também por Harry, Jefferson e todos os demais. _

Eu volto quando puder._ Ele falou dando-lhe um beijo casto na testa e indo para a

sua choupana. Chloe sabia que demoraria a vê-lo de novo, pois ele partiria em seguida e agora ela passaria a dormir em um dos aposentos do Solar.

105


BASTARDOS Lali Nascimento

CAPÍTULO XI

Não demorou muito Jack chegou, assim que Ryan partiu. Chloe desconfiava que ele devesse ter vindo por um caminho contrário a fim de não encontrar Ryan e ter que se explicar em relação ao que tinha feito com ela. Chloe fez o máximo que pôde para ficar longe de Jack, não conseguiu se concentrar no bordado com Mirela e Violet. Então, foi ajudar Molly no preparo da ceia, já que não foi na hora da janta. _

Tenho certeza que esse cozido vai ficar intragável.

_

Maisie comentou quando

Chloe estava mexendo em um caldeirão preparando um coelho. Ela não sabe se foram as palavras venenosas de Maisie ou o fato de estar com a cabeça em Ryan, mas realmente o cozido não ficou saboroso. Porém Violet e George eram educados o suficiente para não fazerem nenhum comentário a respeito. Jack também não lhe dirigiu nenhuma palavra e Chloe sabia que ele deveria estar com medo de Ryan e principalmente do castigo que George estava preparando para ele. Se Maisie e Lily, que eram fêmeas, não escaparam, Jack também não iria. _

Já vai dormir, querida? _ Mirela perguntou quando viu Chloe se levantar. 106


_

Sim.

_

Então eu vou com você. Elas se dirigiram para um dos aposentos do Solar que continha duas camas e

um baú grande, com um grande tapete que separava as duas camas em tons pardo e marrom. _

Só quando Ryan está longe temos chance de conversar.

_

Isso não é verdade, Mirela. Nem estou mais dormindo na choupana dele.

_

Mas ele está sempre por perto.

_

Não gosta muito dele, não é?

_

No princípio não, mas ele tem me provado aos poucos que é um homem digno. Chloe não respondeu e deitou na cama, porém dormiu muito pouco e quando

o fez teve pesadelos com Ryan e os ladrões. Ela não admitiu, porque estava com muita raiva na ocasião, mas sentia muito remorso de ter soltado um deles quando Ryan conseguiu capturá-lo. _

Ainda está muito cedo, o sol mal se levantou. O que vai aprontar agora, menina?

_

Mirela perguntou ao ver Chloe tão cedo já de pé. _

Só vou alimentar Impetuosa.

_

Pensei que Ryan tinha lhe dito para ficar dentro do Solar.

_

Eu prometo que vou só alimentá-la. Chloe saiu do aposento deixando Mirela com um olhar desconfiado. Mas ela

não podia se queixar, sempre estava desobedecendo a todos, principalmente às 107


ordens de Ryan. Dessa vez, porém, ela iria fazer tudo certo, pois ele já tinha muito com o que se preocupar e Chloe jurou a si mesma que não iria nem montar em Impetuosa. _

Chegou a hora. Chloe sabia que essa voz era de Jack e, por ser muito cedo, nem Arnold nem

ninguém estava por perto do estábulo. E, essa vez, ela estava sem sua adaga para se defender. A única coisa que podia fazer era se encolher atrás de Impetuosa e esperar que Jack fosse embora. _

_

E o que devemos fazer? Façam uma armadilha, só precisam cavar um grande buraco. Vou atrair Ryan,

Harry e os outros para lá e quando caírem serão presas fáceis. Volto dizendo que fui o único sobrevivente e George vai acreditar em mim. E será para sempre grato por eu ter acabado com os ladrões. Não precisava de muitas palavras para saber que aquilo era uma armadilha para Ryan e os seus amigos. Chloe não queria acreditar, mas era Jack que estava por trás dos ataques aos vilarejos, por isso que eles não roubavam, só destruíam. Ela se inclinou um pouco para poder ver o rosto de quem estava conversando com Jack e descobriu que era o homem que havia soltado quando estava brigada com Ryan. Impetuosa também se mexeu e acabou pisando em uma das mãos de Chloe, que tentou o mais que pôde, mas estava doendo demais e acabou soltando um grito que revelou para Jack onde estava. _

Já me causou muitos problemas, Chloe. Planejei muito a morte de Ryan para você

estragar tudo, então vou ter que matá-la antes. 108


Jack se lançou em direção a Chloe e o homem que estava conversando com ele também, porém ela foi mais rápida e conseguiu montar em impetuosa. Iria diretamente a Ryan, sabia que ele ia acreditar nela. Impetuosa passou por cima dos dois homens e ganhou caminho saindo do estábulo, mas Jack puxou a barra do vestido de Chloe e ela conseguiu pensar que isso nunca aconteceria se estivesse de calção antes de cair no chão batendo a cabeça com força e perdendo os sentidos. _

Mas o que aconteceu aqui.

_

Albert falou chegando ao local onde Chloe estava

caída olhando com desconfiança para Jack. _

Ela caiu da égua, me assustei com o grito e vim ver o que tinha acontecido assim

como você. _

Estava sozinho?

_

Sim, por acaso está vendo alguém aqui comigo?

_

O homem que estava com Jack

saiu para seguir as suas ordens assim que ouviu os passos de Albert.

_

E quem

pensa que é para me fazer interrogatórios? Que eu saiba, deveria estar aqui tomando conta de Chloe. _

Desculpe-me, mas creio que Chloe não precisaria de alguém tomando conta dela

se não se machucasse tanto quando você está por perto. _

Vai preferir ficar aqui discutindo ou vai levá-la até minha mãe para ser tratada?

_

Vou levá-la até Violet e depois avisar a Ryan o que aconteceu.

_

Fique aqui, pode deixar que eu aviso ao meu irmão da sua incompetência com os

cuidados a Chloe. 109


*** _

O que está fazendo aqui?

_

Ryan falou de uma maneira hostil com Jack. Sempre

suportou tudo da parte dele, mas não toleraria nada em relação a Chloe.

_

Pensei

que havia fugido de meu punho quando soube que eu estava vindo e ido se esconder no Solar na barra da saia de sua mulher. _

Pelo menos tenho mulher, ao contrário de você que prefere as que se vestem

como homem. _

Limpe sua boca quando for falar de Chloe. Ela é digna de uma maneira que Maisie

nunca será. _

Acalme-se, homem. _ Harry falou segurando Ryan que tentava avançar sobre Jack.

_

Não vê que é exatamente isso que ele quer.

_

Na verdade, não é isso que quero. Apesar de achar que eu não sou de confiança,

meu irmão, vim aqui lhe ajudar. Fui ao último local onde os ladrões estiveram e concluí que eles seguem um padrão. Provavelmente, devem estar indo para o norte. _

Para mais perto do Solar, como eu imaginei.

_

Ryan falou deixando um pouco de

lado sua raiva. _ Então vamos para lá. _

Talvez seja melhor montarmos uma estratégia antes. _ Jefferson falou se chegando

ao grupo, interessado na conversa. _

Já esperamos demais, eles que têm que ter medo de nós, não o contrário. Quando todos já estavam com suas cotas de malha e espadas, montados em

seus cavalos, seguiram para o norte. Como todo bom líder, Ryan foi à frente e Jack

110


se manteve atrás de todos, pois sabia que ninguém iria desconfiar, já que sempre foi muito covarde. Não demorou muito para todos caírem na armadilha planejada por Jack e, quando ele desceu de sua montaria e se dirigiu para perto do buraco, Ryan pensou que ele o iria ajudar. _

Vá buscar ajuda para nos tirar daqui. Para terem armado isso os bandidos tinham

certeza de que iríamos passar por aqui. E eles devem estar por perto. _

Claro que tinham certeza, fui eu quem lhes disse.

_

Do que está falando?

_

Estou falando que finalmente serei o filho predileto de George, pois serei o único.

_

Foi você que armou tudo isso?

_

Sim, Ryan, e você foi tão burro de não ter percebido. Pense bem, eu nunca quis lhe

ajudar antes e os ladrões pareciam saber de todos os seus passos. _

Esqueça essa insanidade e nosso pai nunca saberá disso.

_

Eu não vou esquecer. E George não é seu pai, você só foi um cachorro que ele

pegou para criar e se apegou, mas os cachorros morrem rápido, Ryan. Você demorou até demais e a sua Chloe querida será a próxima. _

Não presta, e eu não sei onde estava com a cabeça quando confiei em você.

_

Pense nisso enquanto os ladrões não chegam. Eu estou indo até o Solar dar a

triste notícia do seu falecimento aos nossos pais.

111


Ryan ouviu os passos de Jack e depois as cavalgadas da sua montaria se afastando cada vez mais. _

Não podemos ficar aqui esperando a morte, Ryan.

_

Harry falou, já perto do

desespero. _

E o que sugere? Gritar por socorro só vai chamar atenção dos ladrões. Estamos

muito afastados do acampamento. Ryan parou de falar quando escutou o trotar de um cavalo se aproximando. _

Não precisam gritar por socorro quando ele está tão perto.

_

Albert falou surgindo

na abertura do buraco. _

O que está fazendo aqui? Deveria estar cuidando de Chloe.

_

Não acredito que o homem veio nos salvar e ainda está reclamando, Ryan.

_

Harry

falou irritado. Albert amarrou uma corda que estava em sua montaria em uma árvore e todos saíram, um a um, do buraco. _

Se está aqui algo de ruim aconteceu a Chloe.

_

Sinto muito lhe trazer mais problemas do que já tem, mas ela caiu de Impetuosa e

está desacordada. _

Diga se é grave.

_

Ryan perguntou cerrando os punhos, sentido mais raiva de

Albert por não ter cuidado de Chloe do que do próprio Jack. _

Depois, Ryan.

112


Harry falou e quando Ryan olhou para a direção onde seu amigo estava olhando viu um pouco mais de uma dúzia de homens chegando, inclusive um que já havia capturado tempos atrás, que estava na frente. _

Mas o que significa isso? Disse-me que eles estariam encurralados na armadilha,

não soltos e prontos para nos atacar.

_

Um homem falou com os que estavam na

frente. _

Foi isso que Jack lhe disse?

_

Ryan falou desembainhando a espada e avançando

sobre os homens sem da chance de resposta. Albert, Harry e Jefferson também fizeram o mesmo. Os ladrões eram habilidosos em destruir a vida de pessoas humildes como os moradores das vilas que atacavam, mas não na luta e, quando viram que não teriam chance, se ajoelharam e pediram clemência. _

Não vão morrer, não porque não merecem, mas sim por não serem os meus

verdadeiros inimigos. É Jack que deve pagar por isso.

_

Ryan falou com frieza.

_

Amarre-os com sua corda, Albert, tenho contas a acertar com meu irmão. Albert o fez e quando chegaram ao acampamento Jack já havia partido. Então eles foram atrás, encontrando-o no meio do caminho em direção ao Solar, perto de um abismo. _

Você?

_

Achou mesmo que ia conseguir? Os fracos e covardes como você nunca vencem,

Jack. _

Quando se quer uma coisa bem feita é você mesmo que a tem que fazer. 113


Jack falou descendo de seu cavalo e desembainhando sua espada. Todos fizeram o mesmo, mas se detiveram a pedido de Ryan. _

É comigo que ele deve lutar. Vamos resolver a nossas desavenças de anos de

uma vez por todas. Ele desceu de Fast e começou a lutar. Ryan era muito mais habilidoso, sempre investindo contra Jack e se desviando de todos os seus ataques, e o teria matado facilmente se quisesse. Mas por George e Violet não o fez, apenas o feriu de leve em alguns lugares. _

Vamos voltar para o Solar e contar tudo ao nosso pai.

_

Ryan falou abaixando sua

espada quando já estavam bem perto do penhasco. _

_

Não, Ryan, não vou perder para você nunca mais. Não faça isso.

_

Ryan falou vendo que Jack se aproximava cada vez mais do

penhasco. _

Agora vai ser só você, como sempre quis, Ryan.

_

Jack falou se jogando do

penhasco. _

Não!

_

Ryan deu um grito ensurdecedor, como se assim pudesse segurar Jack.

Eu nunca quis isso, meu irmão.

_

_

Ele falou com a voz agora embargada do choro

que não conseguia conter. Mesmo sabendo que Jack havia tentado matá-lo, nunca quis esse fim para ele. *** Assim que conseguiram retirar Jack de onde estavam e enterraram seu corpo, todos seguiram caminho para o Solar e Ryan pediu aos céus pela vida de Chloe. Ele 114


deixou os ladrões aos cuidados de Harry para George decidir o que faria com eles depois. _

Ryan, sabia que viria quando soubesse que Chloe havia se acidentado.

falou quando o viu.

_

_

Violet

O que houve, andou chorando? Não fique assim, ela vai ficar

bem, estou fazendo muitas compressas. _

Jack está morto. _ Foi tudo o que Ryan conseguiu dizer.

_

Ó meu Deus, como isso foi acontecer? Os ladrões, foram eles que tiraram a vida

de meu filho. _

Não, foi ele mesmo que fez isso, antes de tentar me matar.

que se passou, deixando Violet e George arrasados.

_

_

Ryan contou tudo o

Eu sinto muito, mas preciso

ver Chloe. _ Ele falou seguindo para o aposento onde Chloe estava. Ryan sabia que aquela não era uma boa notícia para ninguém, principalmente para George e Violet, que eram os pais de Jack. Ele mesmo até agora não conseguia acreditar no que acontecera, mas só conseguia pensar em Chloe no momento e subiu as escadas que levavam até o seu aposento, como se isso dependesse da sua própria vida. Quando entrou a encontrou deitada com a cabeça para cima e os olhos fechados. _

Ela é forte, tenho certeza de que vai se recuperar. E Violet disse que as

compressas irão diminuir o inchaço de sua nuca. Mirela falou tentando acalmar Ryan, mas ele pôde perceber a incerteza em sua voz. 115


_

Eu vou deixá-lo a sós com ela. Ryan não respondeu, só acompanhou a saída de Mirela com os olhos e foi ao

pé da cama onde Chloe estava, se ajoelhando e tomando uma das mãos dela nas suas. _

Não faça isso comigo, Chloe.

_

Ele falou acreditando que ela podia ouvir.

_

Eu a

amo, sei que já deveria ter dito isso antes, mas eu prometo que vai escutar isso todos os dias se voltar para mim. Chloe não respondeu e Ryan não saiu de perto dela nem por um instante. Violet foi algumas vezes para aplicar compressas em Chloe e também para tentar convencer Ryan a comer algo. _

Passou a noite toda aqui. _ Ela falou quando o sol já estava alto no céu. _ Prometa-

me que vai ao menos jantar. Ryan pôde perceber as olheiras na mulher que ele aprendeu a amar como se fosse sua mãe, e sabia que elas se deviam em parte por preocupação com Chloe e, principalmente, pela perda de Jack. Então, ele tomou uma grande decisão. _

Peça para chamar George, tenho algo importante para falar.

_

Ryan sabia que se

Chloe estivesse acordada iria aprovar sua decisão. Violet já estava sofrendo demais para viver em uma mentira. Quando desceram as escadas, tanto George quanto Violet o aguardavam. O salão ainda estava vazio, mas logo estaria cheio de pessoas para a janta. _

Há algo para saber sobre Jack que ainda não sabemos?

_

Não, meu pai. Há algo sobre mim que ainda não sabem. 116


_

Não me diga que vai me decepcionar como Jack o fez.

_

Não sei se será uma decepção saber que Nicole ficou grávida do senhor e que na

verdade eu sou seu filho. _

Do que ele está falando, George? _ Violet finalmente se pronunciou.

_

Estou falando de ele ter lhe traído com Nicole e de ela não ter dado a ele qualquer

criança para cuidar, e sim seu próprio filho. _

_

Isso é verdade, George? Ele não vai poder lhe responder. Nicole nunca lhe disse. Encontrei-a há pouco

tempo e ela me revelou tudo. _

Violet, por favor.

_

George falou tentando se aproximar de Violet, mas ela se

afastou dele. _

Como pôde, George?

_

Eu era muito imaturo e…

_

Não quero saber, já é muito tarde para desculpas. Violet se virou e começou a subir as escadas, George tentou ir atrás, porém

Ryan o segurou. _

Ela o ama o suficiente para perdoá-lo se lhe der tempo. E quanto a mim, peço que

espere a recuperação de Chloe para eu ir embora de Murray. _

Do que está falando?

_

Sou um erro do passado que está afetando o seu presente, não quero atrapalhar

seu casamento. 117


_

Você nunca atrapalhou, Ryan, sempre foi o filho que eu quis ter. Eu o amo muito e

Violet também, já perdemos Jack e não vamos perder você também. George abraçou Ryan, o que o pegou de surpresa, pois não estava acostumado a demonstrações de carinho vindas de seu pai, que era sempre muito contido. *** Alguns dias se passaram e aos poucos Violet voltou a se dirigir a George. Ela nem por um momento destratou Ryan, pelo contrário, agora o tratava até com mais carinho e afeto que antes. _

Uma dorminhoca está lá dentro querendo falar com você. Ela o disse em uma manhã quando ele estava no estábulo alimentando Fast e

Impetuosa. Ele correu e foi direto ao aposento de Chloe, como se andando não fosse rápido o suficiente. _

Ryan. _ Chloe falou com a voz fraca desviando a atenção de Mirela para Ryan.

_

Minha vida, você acordou.

_

Ele falou segurando-a pelos ombros, fazendo ela se

levantar e a abraçando. _

Calma, Ryan, ela acabou de acordar.

_

Mirela falou com medo de ele quebrar os

ossos de Chloe de tanto que ele a estava apertando. _

Eu preciso lhe falar algo sobre Jack, Ryan.

_

Jack está morto e não há nada que me possa dizer sobre ele que eu ainda não

saiba.

118


_

O que aconteceu? Você o matou?

_

Ele mesmo fez isso, mas não vamos falar daquele infeliz. Eu preciso lhe dizer algo.

_

O que é?

_

Eu a amo muito, Chloe, e nossos filhos não serão bastardos, porque nós vamos

nos casar. _

E se eu não quiser?

_

Ela falou colocando as mãos na cintura e dando um sorriso

travesso. _

Você não tem querer. _ Mirela respondeu a pergunta antes mesmo de Ryan. Semanas depois, quando Chloe já estava totalmente recuperada, o

matrimônio aconteceu. Ryan exigiu que ela usasse o vestido azul celeste e soltou os seus cabelos que haviam sido presos cuidadosamente por Molly. Maisie e Lily se recusaram a assistir à cerimônia. Elas não ficavam muito no Solar desde a morte de Jack. Na opinião de Chloe, a festa de seu casamento não deveria ter sido tão grandiosa, já que havia muitos gastos com as vilas que foram incendiadas. Mas Violet não quis nada simples. Todos estavam presentes, inclusive os ferreiros trigêmeos que agora estavam melhor de vida graças a doações feitas por Ryan em agradecimento ao que fizeram por Chloe. _

Fiz questão de que todos que fizeram parte da nossa história estivessem aqui.

_

Ryan falou segurando na mão de sua mulher, desviando a atenção dela, que estava em alguns músicos que animavam a festa. 119


_

Não todos, pois não vejo Lola aqui.

_

Chloe se arrependeu no mesmo momento

quando viu que Violet havia escutado.

_

Desculpe-me, Violet, esse é o seu lar e eu

não tinha o direito. _

Não se preocupe, está certa. Ryan precisa da bênção da mãe dele.

_

Você é minha mãe.

_

Ryan falou firmemente, desaprovando o comportamento de

Chloe. _

Nicole também é. O que aconteceu no passado deve ficar lá. Quero que mande

alguém chamá-la para abençoar seu matrimônio, e isso é uma ordem. Violet falou com um sorriso nos lábios e Ryan agradeceu aos céus por ter lhe dado uma mãe tão boa e compreensiva. Lola chegou trazida por Benjamim algum tempo depois, e Ryan conseguiu conversar com ela sem discutir. Pouco tempo depois ele estava em sua choupana mais Chloe. Desta vez não foi preciso retirar sua cota de malha, pois não estava com ela, apenas retirou sua túnica, que hoje era muito mais elegante do que ele costumava usar, feita de camurça. Ryan olhou para Chloe e ela pôde ver nos olhos dele o quanto a desejava, mas agora Chloe não iria negar nada, pois, pela primeira vez na vida, confiava em um homem. Tinha certeza de que ele nunca a maltrataria como Edward o fez, e que seus filhos nunca seriam chamados de bastardos. _

Eu a amo, Chloe…

_

Eu também o amo, Ryan. 120


FIM

121


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