Princípios gerais da orientação nutricional no diabetes mellitus
Terapia nutricional enteral As recomendações internacionais sobre terapia nutricional enteral (TNE) em diabetes foram iniciadas em 1998, quando a ADA e a Associação Europeia para o Estudo de Diabetes (European Association for the Study of Diabetes, EASD) desenvolveram, em Chicago, nos Estados Unidos, um consenso que estabeleceu propostas para esse fim. Os últimos consensos publicados pela ADA recomendam a presença de nutricionista habilitado na equipe hospitalar para conduzir plano realista sobre a terapia nutricional.1 As indicações da terapia nutricional para pacientes com diabetes devem ser as mesmas definidas para os demais pacientes,156 sendo preferível a via oral quando o sistema digestivo estiver em condições normais, podendo-se instituir suplementos orais caso o paciente não alcance 60% das necessidades energéticas e proteicas. Em situações de contraindicação da via oral, ou quando o paciente ingerir menos que 60% de suas necessidades por essa via, indica-se a TNE. Já a terapia nutricional parenteral (TNP) está recomendada quando o trato gastrintestinal não estiver funcionando ou não for possível atingir o mínimo de 60% das necessidades nutricionais do paciente pela via enteral.157,158 É primordial individualizar as necessidades nutricionais dos pacientes,1 evitando-se a superalimentação; ademais, o aporte energético não deve passar de 35 kcal/kg/dia, permanecendo, em geral, entre 25 e 35 kcal/kg/dia (C, D).44,159 Pacientes diabéticos com indicação de TNE podem receber fórmulas enterais padrão, que fornecem em torno de 50% do VET na forma de carboidratos, preferencialmente fórmulas poliméricas e em infusão contínua lenta, para evitar fornecimento excessivo de glicose. De qualquer modo, pacientes diabéticos ou com hiperglicemia de estresse podem beneficiar-se de fórmulas especializadas para DM, nas quais os carboidratos representam de 33 a 40% do VET.1,144,160,161 Estudo recente incluindo pacientes com DM2, internados em unidades de terapia intensiva (UTI), mostrou que o uso de fórmula especializada em controle glicêmico esteve correlacionado com redução da mortalidade e com melhores resultados econômicos.162 As fórmulas específicas para diabéticos, existentes no mercado nacional, têm como objetivo reduzir complicações metabólicas relacionadas com a disglicemia. São produtos com conteúdo total reduzido de carboidratos e acréscimo de fibras; a recomendação de fibras para pacientes diabéticos é de, no mínimo, 14 g/1.000 kcal ou 25 g de fibra/dia (C).17 A inclusão de ácidos graxos monoinsaturados também é indicada nessas fórmulas, totalizando em torno de 20% do VET, por aumentarem a fluidez das membranas celulares, com consequente redução da resistência à ação da insulina.156,157 Ainda, preconiza-se limitar os ácidos graxos saturados devido ao elevado risco de doenças cardiovasculares nesse grupo de pacientes. Além do menor teor de carboidratos, essas fórmulas são compostas por carboidratos de absorção lenta, que atenuam a resposta hiperglicêmica pós-prandial (A).156-164 As dietas enterais especializadas facilitam o controle glicêmico e podem diminuir a necessidade de insulina, o que reduz o risco de hipoglicemia e, consequentemente, a variabilidade glicêmica.156,161,163
A resposta glicêmica dos pacientes não depende somente da dieta prescrita, mas também de outros fatores, como dosagem de insulina administrada, grau de estresse, diferentes métodos de administração da dieta enteral (bolus, contínua, intermitente) etc. Gastroparesia é frequente em diabéticos e ocorre por degeneração das células nervosas do plexo mioentérico, determinando hipomotilidade antral, hipotonia gástrica, contrações tônicas intensas no piloro e ausência de esvaziamento gástrico. Essa dismotilidade acomete também o intestino delgado. Eructações, saciedade precoce, dor epigástrica, sensação de distensão abdominal, náuseas e vômitos pós -prandiais são queixas comuns dos diabéticos. Esses sintomas aumentam o risco de hipoglicemia, principalmente em pacientes que utilizam insulina, além do risco nutricional por déficit calórico e proteico. As dietas isosmolares são esvaziadas mais facilmente do estômago do que as hipo ou hiperosmolares, assim como as dietas hipoglicídicas em relação às hiperglicídicas. Assim, a escolha de dieta isosmolar e hipoglicídica pelo nutricionista pode ser mais benéfica, já que ela favorece o esvaziamento gástrico. Pacientes com gastroparesia diabética podem, ainda, beneficiar-se com o uso de fórmulas de alta densidade calórica, devido à redução do volume ofertado. Fórmulas com menores quantidades de fibras também podem ser benéficas para atenuar os sintomas da gastroparesia. Outra opção é a administração por sonda nasojejunal, mas com cautela, pois a gastroparesia diabética acomete todo o trato gastrintestinal, o que aumenta o risco de diarreia. Indica-se progressão baixa e lenta da taxa de infusão (20 mL/hora), com aumento de 10 a 20 mL a cada 12 horas.158 Observar a ocorrência de diarreia também é importante, a qual, em geral, é noturna, de difícil controle e decorrente de neuropatia periférica e autonômica. Obstipação intestinal pode ocorrer quando há redução da motilidade colônica, podendo as dietas ricas em fibras contribuir para o controle desses sintomas.
Suplementos orais Suplementos orais especializados no controle glicêmico apresentam composição nutricional similar à das dietas enterais especializadas (C).158,161 A melhora do controle glicêmico, nos suplementos, está relacionada com a composição das fórmulas, que contêm menor teor de carboidratos, além de carboidratos de baixo IG e fibras, que melhoram os níveis de glicemia pós-prandial. São formulações com maiores concentrações de ácidos graxos monoinsaturados, os quais aumentam a fluidez das membranas celulares com consequente redução da resistência à ação da insulina, e que controlam os níveis de triglicérides pós-prandiais e o perfil lipídico. Reduzem, ainda, a glicemia pós-prandial, cuja composição pode, também, diminuir a necessidade de insulina e os episódios de hipoglicemia, bem como reduzir a variabilidade glicêmica.156,158,161,164-166 Em pacientes com baixo peso, risco nutricional ou consumo alimentar inferior a 60% das necessidades nutricionais, os suplementos orais especializados podem ser indi96