Racismo Através da História

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sendo objeto de avaliações divergentes, não se pode continuar ignorando o fato de que foram eles que abriram o caminho para os demais tráficos: [...] Os seus primeiros efeitos ao longo prazo aparecem mais claramente nos dias de hoje. Por um lado, abriram caminho aos tráficos europeus, do Atlântico e do Oceano Índico, que se inscreveram na sua esteira. Por outro lado, contribuíram para dar forma e depois para transmitir aos europeus as percepções e imagens dos africanos sem as quais este ‘comércio pouco comum’ não se teria tornado tão comum (M’Bokolo, 2003, p. 208). Com efeito, esses primeiros tráficos transoceânicos refletem o tipo de relação que o mundo árabe emergente privilegiava com o continente africano; a saber, uma relação de troca, totalmente desproporcional: produtos de consumo por mão-de-obra escrava. M´Bokolo enquadra essa problemática relação da seguinte maneira: [...] As longas relações da Arábia com a África, pelo mar Vermelho e pelo Oceano Índico, explicam que os árabes se encontrem em tão bom lugar na vasta galeria dos negreiros. Este comércio, começado em pequena escala e certamente nos dois sentidos antes do Islã, conheceu uma brusca mudança de escala após a pregação do profeta Muhammad e a expansão árabe na África do Norte. Se a existência de correntes de tráfico entre a África Negra e a Arábia não permite a menor dúvida, as características originais deste primeiro comércio negreiro continuam a suscitar problemas: os nossos conhecimentos são demasiado fracos em tudo que se relaciona tanto com o seu desenvolvimento e à sua evolução no tempo, quanto com as suas zonas de abastecimento ou ainda o volume do tráfico. Faltam, com efeito, quase totalmente as fontes entre o fim do século I, época durante a qual foi redigido o Périplo do Mar Eritreu, e o século VII, época durante a qual se começou a dispor de fontes árabes. É, contudo, possível reconstruir alguns grandes traços das relações entre África Negra e as regiões vizinhas. Estas relações decorreram principalmente utilizando o oceano Índico e o Saara. Uma primeira corrente do tráfico, provavelmente a mais importante, ligava a costa oriental da África com a Arábia. Os escravos apareciam aí como uma das mercadorias, contando entre as mais procuradas, sendo as outras o marfim, o ouro e até a madeira. A parte respectiva destas diferentes mercadorias continua a ser desconhecida (Idem. p. 208-209). Esse primeiro tráfico envolveu, inicialmente, as sociedades africanas litorâneas da África Oriental, descendo gradativamente para o sul, num momento em que o reino de Axum (500 a.C. - 900 d.C.), grande potência africana durante mais de um milênio, fôra a força política e econômica dominante no leste da África e no sul da Península Arábica -sul da Arábia e o Iêmen (ver: Schippmann, 2001). Axum vivia em estado de 145


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