Dossiê Megaeventos e Violações dos Direitos Humanos no Rio de Janeiro 2014

Page 17

Santa Teresa nº 143 (prédio abandonado da Universidade Santa Ursula), e de dois prédios do INSS (R. Mem de Sá, 234 e Rua Sara, 85).

indícios de má qualidade construtiva. Em função de rachaduras e problemas de acabamento, a empreiteira teve que realizar obras complementares com as famílias já morando no local.

Remoções em áreas ditas de risco e interesse ambiental

Santa Marta – Desde a década de 1980, o Governo do Estado tem realizado obras na favela visando a urbanização. No projeto mais recente, há cerca de seis anos, o governo começou a demarcar casas situadas na área conhecida como pico do Santa Marta, sinalizando estarem em risco. Há famílias que moram no local há mais de 50 anos. Inicialmente, 50 casas foram demarcadas, número depois ampliado para 150. O espaço já recebeu na década de 1990 obras de contenção de encosta, de saneamento, e estava incluído na área a ser urbanizada. Um grupo organizado na Comissão de Moradores do Pico do Santa Marta questiona as reais intenções da Prefeitura com a remoção, já que após a instalação da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP), a comunidade tem sido alvo de programas de incentivo ao turismo, como o programa “Rio Top Tour”, apoiado pelo Ministério do Turismo. A Comissão de Moradores obteve o contra-laudo de um engenheiro geotécnico, que aponta a possibilidade de permanência dos moradores. O governo se recusa a reconhecer a proposta.

O argumento da Prefeitura para essas remoções não está diretamente associado à realização da Copa e das Olimpíadas. No entanto, a situação dessas comunidades é um caso ilustrativo dos processos de ameaças vinculados ao embelezamento da cidade, no qual se intensificam as ameaças de remoção, em geral com a justificativa de serem áreas de risco. O que chama atenção nesses casos é a ausência de laudos que explicitem o risco ambiental. Os moradores denunciam que por trás das remoções encontram-se grandes interesses imobiliários. Recentes recuos da prefeitura e redução do número de habitações que estariam em situação de risco, comprova a hipótese do uso do argumento técnico para motivar intenções políticas da remoção. Comunidade da Estradinha / Tabajaras – Situada na Ladeira dos Tabajaras, em Botafogo, a comunidade da Estradinha, fundada em 1952, reunia 352 famílias, das quais 252 já foram removidas, recebendo indenizações a partir de negociações individuais com a Prefeitura. A comunidade é um assentamento consolidado em uma área nobre da cidade, muito próxima ao cemitério São João Batista, em Botafogo, que tem origem na gestão do Prefeito Saturnino Braga (1986). Segundo os moradores, a intenção da Prefeitura do Rio de Janeiro seria remover os moradores, alegando que a comunidade estaria situada em uma área de risco. Membros da Associação de Moradores afirmam que a maior parte das casas não está situada em área de risco, esta se restringe a uma pequena parte do morro, portanto esses moradores poderiam ser reassentados na própria comunidade. A defesa dos moradores é justificada por um laudo técnico independente que sustenta seus argumentos e que contesta o laudo do órgão técnico da Prefeitura. Em 2010, os moradores conseguiram, com apoio da Defensoria Pública do Estado, liminar para a retirada dos entulhos que permaneceram no local, sob pena de multa diária. Mesmo assim, em meados de 2012 a retirada dos entulhos foi interrompida. A Prefeitura ofereceu aos moradores apartamentos do MCMV em Triagem, que não foi aceito por representar piores condições habitacionais e urbanas. Em agosto de 2013, no contexto das grandes manifestações na cidade, o Prefeito esteve na comunidade e se comprometeu rever as remoções e realizar a urbanização da comunidade. Das 100 famílias ainda ameaçadas, apenas 10 teriam que sair em função de situação de risco. Os entulhos foram retirados, mas a situação de incerteza se mantém, uma vez que as afirmações do prefeito não foram apresentadas oficialmente, nem o projeto de urbanização. Virgolândia (Jacarepaguá) – As expectativas de urbanização e de remoção se misturam entre os moradores da Virgolândia. A comunidade possui cerca de 600 moradores, e foi contemplada pelo Programa Morar Carioca em 2011. Entretanto, em meados de 2012, eles foram intimados pela Fundação Rio Águas, vinculada à Secretaria Municipal de Obras, a “demolir as construções e liberar a área ocupada no prazo máximo de 30 dias”. Apesar de terem buscado auxílio junto à Defensoria Pública, subsiste ainda o temor de que quase a totalidade das edificações seja afetada, já que estão localizadas às margens do Rio Passarinhos. Comunidade do Pavão-Pavãozinho – Sob o argumento do risco geotécnico ou estrutural, a Prefeitura Municipal reassentou 300 famílias na comunidade Pavão-Pavãozinho. As casas foram marcadas com tinta spray, mas a Prefeitura nunca apresentou o laudo de comprovação do risco, nem discutiu com a comunidade a possibilidade de realização de obras para garantir a segurança dos moradores. A população foi assentada em cinco prédios de quatro pavimentos na área, com 32

Vidigal – Casas da comunidade estão ameaçadas de remoção em função de laudo de risco, mas as informações disponíveis são bastante imprecisas. No final de 2012, casas foram marcadas pela Prefeitura. Segundo moradores, há interesse na construção de uma estrada turística no local, associada a empreendimentos hoteleiros. A Associação dos Moradores da Vila do Vidigal (AMVV) solicitou a elaboração de um contra-laudo que demonstra que a obra de contenção, estimada em R$900 mil, é viável e mais barata que a remoção, estimada em R$ 25 mil por unidade, valor muito abaixo do mercado. Segundo a AMVV, somente sete casas teriam que sair. Moradores solicitaram acesso ao laudo, negado pela Prefeitura. Horto – A área começou a ser ocupada por funcionários da antiga fábrica e do Jardim Botânico, com autorização (formal e informal) das sucessivas administrações do parque. Hoje, com 589 famílias de baixa renda, descendentes de antigos funcionários e em sua maioria pessoas idosas, está ameaçada de remoção justificada pela necessidade de preservação ambiental e de regularização do perímetro do Jardim Botânico, o qual nunca foi oficializado, nem em documentação, nem na prática. Em 2005, tentativas de despejo desencadearam na morte de um morador com problemas cardíacos e na hospitalização de outros cinco. A Associação de Moradores e Amigos do Horto (AMAHOR), junto com movimentos sociais, estabeleceu parceria com a Secretaria de Patrimônio da União (SPU) em 2008, e em convênio com a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da UFRJ, foi desenvolvido um projeto de regularização fundiária. A Administração do Jardim Botânico insiste na remoção e não reconhece a proposta de regularização fundiária. Há processos de reintegração de posse para grande parte das moradias, mas por determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), estes estariam suspensos até a conclusão da demarcação de perímetro, em acordo entre Ministério do Meio Ambiente/Jardim Botânico, Ministério da Cultura/Iphan e SPU, com prazo para apresentação de proposta até 04 de maio de 2013. Apesar disso, em abril de 2013, por ordem judicial, quatro famílias que ocupavam um lote foram despejadas. Com apoio da SPU, elas foram assentadas em apartamentos da União, com a promessa de voltar a serem assentadas no Horto, no processo de regularização fundiária. Cerca de 400 famílias, que não têm ação judicial, deram entrada na SPU para o reconhecimento do direito à moradia através da Concessão de Uso Especial para fins de Moradia (CUEM). Em 07 de maio de 2013 o governo federal, através de uma coletiva de imprensa que contou com a presença da Ministra do Meio Ambiente, da Secretária do Patrimônio da União e do Advogado Geral da União, anunciou decisão pela delimitação do perímetro do Instituto de Pesquisa Jardim Botânico incluindo a área onde estão estabelecidas 520 famílias da comunidade do Horto. 33


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.