JUP Novembro 2010

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ABC da Austeridade Austeridade tem como sinónimos rispidez, disciplina, penitência, severidade. No plano económico, o termo é geralmente aplicado quando se fala em rigor das contas públicas, nomeadamente no que diz respeito à redução drástica da despesa. As medidas que têm vindo a ser implementadas pelo Governo são resposta à preocupação com o equilíbrio das contas públicas, fragilizado após a crise dos mercados financeiros em 2008 e as seguintes injecções de capitais públicos para salvar o sistema bancário, o que fez disparar o valor dos défices em vários países da Europa. Sabemos que o défice é a diferença entre as despesas do Estado (na educação, na saúde, nas pensões e outras prestações sociais, investimento em infra-estruturas, benefícios fiscais, etc.) e as receitas (pela colecta através de diversos impostos e taxas, pelos lucros de empresas públicas, etc.) calculado anualmente e que é expresso em percentagem do PIB. Diferente

da contabilidade da mercearia da esquina, a existência de défice é natural na economia e necessária para levar a cabo políticas contracíclicas (adoptadas em períodos em que é necessário investimento público que accione a retoma económica, sobretudo quando o investimento privado e o consumo se encontram estagnados). Acontece que o défice também necessita de financiamento, o que leva o Estado a ter de pedir dinheiro emprestado, ou seja, a financiar-se. Para tal, o Estado emite títulos de divida pública, que são negociados nos mercados financeiros (mercados com características especiais, como por exemplo, a especulação). O que, portanto, preocupa o governo é que se tem vindo a assistir

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ao aumento dos juros da dívida pública (isto é, os juros que o Estado paga em troca dos empréstimos obtidos). Este aumento deve-se à diminuição da confiança que os possíveis compradores de títulos têm no cumprimento do compromisso por parte do Estado. Ou seja, quando alguém pensa em emprestar dinheiro à República Portuguesa vai ter em consideração o equilíbrio, ou não, das contas públicas para analisar o risco de não lhe ser devolvido o dinheiro que vai emprestar. Face a este problema (quer ele seja o problema económico mais grave que o país enfrenta, quer não seja) e na esperança de que os «mercados» fiquem convencidos, o governo escolheu como sua prioridade política o controlo do défice.

Algumas medidas e objectivos do Orçamento de Estado 2011 DESPESA - Cortar salários da função pública - Diminuir o subsídio de desemprego - Reduzir as ajudas de custos e horas extraordinárias da função pública. - Reduzir as despesas no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, nomeadamente com medicamentos e meios complementares de diagnóstico; - Reduzir em 20% as despesas com o Rendimento Social de Inserção; - Eliminar o aumento extraordinário de 25% do abono de família nos 1. º e 2.º escalões e eliminar os 4.º e 5.º escalões desta prestação; - Reduzir as transferências do Escolha essa condicionada pelas recomendações no mesmo sentido por parte de instituições como o FMI (Fundo Monetário Internacional) e o BCE (Banco Central Europeu) e muito influenciada pelas agências de ‘rating’ privadas que ao classificarem as políticas dos governos nacionais (o seu papel de informadores condiciona de forma determinante o comportamento dos mercados) se vêm revelando como novos poderosos agentes no actual contexto de globalização financeira. Perante este consenso global, aparentemente só contestado pelo mundo do trabalho, nomeadamente pela OIT (Organização Internacional do Trabalho) e pelas duas centrais sindicais portuguesas (a CGTP e a UGT que se juntam na greve geral do próximo dia 24 pela primeira vez em vinte e dois anos), o governo vai garantindo a fatalidade das medidas incluídas nos vários PEC’s (Programa de Estabilidade e Crescimento) e prestes a serem concretizadas no orçamento de estado para 2011. Com a certeza da escolha pela austeridade, a dúvida será perceber de que forma o bom funcionamento dos serviços públicos é posto em causa e quais as consequências da redução das prestações sociais para a pobreza, sendo já seguro que o desemprego aumente. É também claro quem sai mais prejudicado: os

Estado para o Ensino - Congelar as pensões, promoções e progressões na função pública - Aumento da taxa normal do IVA em 2pp.;

RECEITA - Revisão das deduções à colecta do IRS (já previsto no PEC); - Imposição de uma contribuição ao sistema financeiro em linha com a iniciativa em curso no seio da União Europeia; - Aumento em 1 pp da contribuição dos trabalhadores para a CGA, alinhando com a taxa de contribuição para a Segurança Social. funcionários públicos que vêem os seus salários reduzidos, os desempregados que têm cada vez menos apoio, os jovens à procura de emprego e as pessoas em situação de maior fragilidade ao verem as suas prestações sociais reduzidas ou retiradas. Também os estudantes universitários não são poupados, estimando-se que mais de 10.000 estudantes venham a perder a bolsa de estudo em resultado dos novos critérios de atribuição contidos no decreto de lei 70/2010. Uma austeridade que, ao prejudicar de tal forma os salários (e a procura/consumo) e o investimento público (necessário à criação de emprego), contém em si o terror de ser pior a emenda que o soneto: com a contracção da economia (diminuição do consumo e da produção que implica também uma diminuição da riqueza colectada pelos impostos) não é seguro que o défice diminua o que, continuando este tipo de prescrições, faz avizinhar um 4º PEC de sacrifícios. Os mercados, esses, seguem intranquilos. Para infelicidade do Ministro das Finanças, Teixeira do Santos, que, abatido, confessa: “não vejo por onde ir se os mercados exigirem mais”. AMARÍLIS FELIZES maosvisiveis.wordpress.com


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