Portanto, partindo da premissa de permanência dos galpões industriais, foram adicionados diversos elementos em concreto armado, de acordo com o programa proposto, e substituídos alguns materiais, conforme a necessidade e pertinência. O conjunto estrutura-se pela rua interna, de orientação norte-sul, configurando o percurso principal e conduzindo aos diferentes usos do extenso programa. A partir dessa via principal ordenadora do projeto, vê-se primeiramente, dos dois lados, conjuntos de galpões que abrigam refeitório, choperia, teatro, oficinas, consultórios, espaços para exposições, praça coberta, lancheria, biblioteca, entre outros. O maior galpão abriga um universo próprio de atividades. É uma praça coberta onde se destaca um riacho esculpido no piso de pedra. Solto como uma serpentina, contribui com o microclima ameno e introduz o elemento água no interior, fazendo referência ao rio São Francisco, símbolo da região nordeste, de onde são oriundos muitos dos trabalhadores de São Paulo. A lareira e o mobiliário confortável e farto denotam encontro, convívio, ócio, aproximação, enfim, um ambiente de estar. A biblioteca e os espaços para estudo e leitura também são sinais dessa sensação de proximidade, o que não apaga a presença da fábrica nas soluções de arquitetura. Toda a área do grande pavilhão é utilizada para exposições e eventos, misturando os usos e enfatizando a ideia de lugar amplo, público. Todo o mobiliário presente nos galpões do Sesc foram projetados por Lina. É curioso observar que, enquanto alguns lugares recebem aconchegantes poltronas, outros como, por exemplo, a plateia do teatro, possuem cadeiras de madeira. Essa decisão de desenho de mobiliário foi motivo de duras críticas à arquiteta. Lina, por sua vez, escreveu um artigo contestando um novo lançamento europeu: o Post-Modern, e conclui que “a cadeirinha de madeira do Teatro Pompéia é apenas uma tentativa para devolver ao teatro seu atributo de distanciar-se e envolver, e não apenas de sentar-se4”.
B11.indb 157
TEM, ATRAVÉS DO SEU PROJETO, UMA FUNÇÃO SIMPLES, MAS DE IMPORTÂNCIA ÚNICA: PROPORCIONAR ACESSO À CULTURA E LAZER ÀS FAMILIAS E INDIVÍDUOS, EM MEIO A UMA CIDADE OPRESSIVA E CARENTE DE ESPAÇOS PÚBLICOS DE CONVIVÊNCIA 157
De maneira geral, os galpões tem seus usos reciclados e recebem adaptações a estas atividades. As intervenções são simples, manifestadas em pequenos gestos e sutis provocações. Lina intervém minimamente para atingir o potencial máximo da situação e do lugar. Cabe lembrar que esse projeto foi elaborado de forma simultânea à obra, com participação de arquitetos, engenheiros e diferentes funcionários. Lina, sempre sensível à cultura local e à dura realidade do povo brasileiro, transformava funcionários em artistas. Solicitava aos empregados da obra que inventassem soluções, como pequenas esculturas que iriam sinalizar o cardápio da cantina. Assim, dava valor especial ao trabalho dessas pessoas, que acabavam por ser reconhecidas em obra por apelidos como “Da Vinci” e “Mãos-de-ouro”.
Guilherme Osterkamp O Sesc Pompéia de Lina Bo Bardi: Conexão Latino-América
De acordo com o sentimento inicial da arquiteta, que parece ser quase uma intuição, o que faltavam eram pequenos gestos transformadores: “uma lasca de luz, um sopro de vento3”.
10/11/2015 17:18:39