Esperando por Doggo - Mark B. Mills

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de que nossos amigos de quatro patas são capazes mesmo de sentir uma perda é um vídeo que encontro no YouTube sobre um husky siberiano chorando como uma pessoa na sepultura de sua dona. Ocorre-me que talvez Doggo não tenha nem tido a oportunidade de fazer isso. A visão da sepultura me lembra de ligar para a minha mãe. Nigel atende no quarto de hotel deles. — Nigel, sou eu. — Daniel — ele responde cautelosamente. — Olha, obrigado por convencer a minha mãe a me contar a verdade. — Mesmo? — Mesmo. Obrigado. — De nada, amigo. Quando minha mãe atende o telefone, pergunto como foi o enterro. — Você já foi a um crematório? Coitada da Pat. Foi terrível. Uma fábrica. Acabou em dois minutos. Mal tiveram tempo de trocar a música. Algumas pessoas jogam as cinzas em um jardim memorial. Cinzas?! Eu vi uns pedaços de ossos naquelas roseiras! Ela me pergunta como estou me sentindo. — Ah, sabe como é. Ainda bem confuso. — É claro que você está confuso. Mas fiz bem de te contar, não foi? — É, acho que sim. — Você não parece muito convencido. — E se ele não quiser me conhecer? — É possível. Mas eu ficaria surpresa. Ela ficaria surpresa, mas eu ficaria preso num limbo esquisito, entre dois pais, ignorado de maneira eficaz por aquele que acha ser responsável pela minha existência e rejeitado pelo outro, que é responsável mesmo. Não posso apostar em uma reunião feliz depois de trinta anos. A minha mãe me contou que ele tem a sua própria família, uma mulher, filhos, e eu não gostaria de fazer nada que pudesse pôr isso em risco. Afinal, ele é tão vítima da situação quanto eu. Até ontem, nenhum de nós sabia que o outro existia; estávamos unidos em nossa ignorância. Minha mãe não fez isso para enganá-lo, mas, como ela mesma disse, ela sabia o que estava fazendo, se permitindo engravidar dele. Ele tem todo o direito de não reagir muito bem às novidades. — Que bonitinho você pensar do ponto de vista dele — minha mãe diz. — Mas você sempre foi um menino atencioso. Ou talvez eu só esteja me preparando para o pior. Minha mãe disse que agora ele está de férias, e mesmo quando ele voltar ela vai ter de planejar a situação com todo o cuidado e diplomacia, em respeito às circunstâncias dele. Vou ajudála porque não quero causar confusão. Já disse a ela que não quero nem preciso de nenhum tipo de reconhecimento público dele (nem um relacionamento clandestino, aliás). Só peço uma chance de me sentar para conversar e olhar meu pai biológico nos olhos. Também decidi que ninguém mais precisa saber, nem o meu pai nem a Emma. — Mesmo, Danny ? Você tem certeza? — A surpresa na voz da minha mãe vem acompanhada por um toque palpável de alívio.


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