Revista número 2 - Ano 2

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R E V I S T A

APO Análise Psico-Orgânica

AnoPsico-Orgânica 2  Número |2 1 Revista de Análise 2015


Conselho Editorial: Ana Luisa Baptista Edgard Sobreira Juan Carlos de la Concepción Raxach Silvana Sacharny Diretoria da ABRAPO: Presidente: Edgard Sobreira Secretaria Geral: Elen Conteratto Diretor administrativo: Daniel Ossório Diretora Financeira: Delfina da Conceição Pimenta Diretora de eventos científicos-culturais: Moema Linberg Conselho fiscal: Juan Carlos de la Concepción Raxach Priscilla de Alburquerque Shirley Saporito CEBRAFAPO: Equipe de formadores: Coordenação: Silvana Sacharny Ana Luisa Baptista Delfina da Conceição Pimenta Denise Kaiuca Edgard Sobreira Maria Roggia Mirtha Ramirez Tradução: Silvana Sacharny Diagramação e Editoração: Juan Carlos de la Concepción Raxach Imagem da Capa: Moema Linberg

A Revista de Análise Psico-Orgânica é uma criação da parceria entre a ABRAPO – Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica e o CEBRAFAPO – Centro Brasileiro de Formação em Análise Psico-Orgânica. Visa apresentar artigos, relatos de experiências, entrevistas, estudos de casos e outros registros em Análise Psico-Orgânica, mostrando como se configura o arsenal teórico, técnico e prático desta abordagem. Esta publicação tem por finalidade compartilhar e divulgar diferentes produções em Análise Psico-Orgânica no Brasil e no mundo, colaborando assim para a informação e troca entre psicoterapeutas formados por esta escola, outros profissionais das áreas de Saúde e Educação e demais interessados no trabalho psico-corporal.

Visite-nos! CEBRAFAPO: http://www.cebrafapo.com.br/eq.form.html ABRAPO: http://associacaobrasileiradeapo.wordpress.com/ Acompanhe-nos no facebook! CEBRAFAPO: https://www.facebook.com/centrobrasileiro.analisepsicoorganica ABRAPO: https://www.facebook.com/abrapo.atendimentoclinico?fref=ts

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Editorial SOBRE O CENTRO BRASILEIRO DE ANÁLISE PSICO-ORGÂNICA (CEBRAFAPO) O Centro Brasileiro de Formação em Análise Psico-Orgânica (CEBRAFAPO), fundado em 1998 e coordenado por Silvana Sacharny, é vinculado à Escola Francesa de Análise Psico-Orgânica (EFAPO). Tem como finalidade formar psicoterapeutas em Análise Psico-Orgânica. O objetivo é essencialmente a transmissão do conjunto dos princípios e métodos elaborados por Gerda e Paul Boyesen. A Análise Psico-Orgânica é um método reconhecido pela Associação Europeia de Psicoterapia – EAP – em Viena, Áustria. A Análise Psico-Orgânica, elaborada por Paul Boyesen na década de 70, amplia a proposta da abordagem da Psicologia Biodinâmica, criada por Gerda Boyesen. Aliando intimamente o trabalho corporal ao analítico, a Análise Psico-Orgânica procura estabelecer inter-relações entre a linguagem somática, emocional e psíquica, buscando conexões entre o verbo, a produção de imagens e os movimentos energéticos do corpo. Site: http://www.cebrafapo.com.br

SOBRE A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE ANÁLISE PSICO-ORGÂNICA (ABRAPO) A Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica – ABRAPO é uma entidade nacional, que congrega os profissionais da área de psicoterapia analítica com mediação corporal que adotam a teoria e o método da Análise Psico-Orgânica. Os Membros Associados são pessoas físicas que completaram a formação de base em Análise Psico-Orgânica sob a direção de Paul Boyesen, criador do Método, ou das escolas a ele vinculadas, e que atendem os critérios estabelecidos pela Associação Europeia de Análise PsicoOrgância – EAPOA. Através do movimento associativo os membros da ABRAPO se propõem a defender os princípios da Análise Psico-Orgânica e da Psicologia Biodinâmica, promover pesquisas, aprofundar conhecimentos e incentivar o intercâmbio de experiências profissionais entre as várias abordagens psicoterapêuticas nacionais e internacionais. Já inserida no panorama que integra as demais Associações que aderem os princípios da Associação Europeia de Análise Psico-Orgânica EAPOA, membro da Associação Europeia de Psicoterapia - EAP, a ABRAPO busca fortalecer sua identidade social trabalhando em prol da evolução e do desenvolvimento pessoal e profissional de seus membros, respeitando e protegendo a ética no exercício de sua prática profissional.

A Revista de Análise Psico-Orgânica tem como objetivo abrir um espaço de comunicação, apresentação de temas, entrevistas e articulações entre saberes para todo o público que tenha interesse no campo terapêutico e humano. Trata-se de um espaço que busca incentivar a criação por meio da palavra escrita possibilitando a transmissão com base no pensamento da Análise Psico-Orgânica, método criado por Paul Boyesen. Com o enraizamento e amadurecimento deste trabalho criou-se a Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica – ABRAPO, que vem difundindo o pensamento e a prática clínica da Análise Psico-Orgânica. Esta é a segunda publicação da revista digital no engajamento da divulgação e circulação de artigos produzidos por professionais de este método. Agradecemos a todos os colaboradores com as suas preciosas contribuições. Esperamos que os leitores desta revista usufruam desta leitura para agregar novos saberes às suas trajetórias. Boa leitura, Conselho Editorial.

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SUMÁRIO:

Editorial Ana Luisa Baptista e Silvana Sacharny

Memoria da pele Alain Dauty

EU –TU – NÓS Daniel Osorio / Luis de Moura Aragão

Da massagem biodinâmica à análise psico-orgânica Silvana Sacharny

Morte e Luto Mirtha Ramirez

O Círculo Psico-Orgânico como Jornada Adriana Moretta

Articulações arteterapêuticas entre a arte sensorial, a psicologia Junguiana e a Análise Psico-orgânica Ana Luisa Baptista

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Este texto foi traduzido por Silvana Sacharny e faz parte da revista Adire, Nº 6, abril de 1991, L’être touché psychothérapie et toucher.

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“O que há de mais profundo no homem é a pele” P. Valéry La Pléiade (tomo 2)

Nós estamos bem ou mal e nós mudamos de acordo com grandes mutações. Ela é abrigo, lugar íntimo por excelência, no entanto no desvio de uma paixão nos deixamos penetrar pela alma gêmea. A pele vem do ectoderma, o folheto mais externo do embrião. O ectoderma dá igualmente nascimento a diversos órgãos dos sentidos, aos órgãos sexuais e ao sistema nervoso central. A pele, o sexo e o córtex são oriundos desse mesmo folheto e possuem em comum as ligações anátomo-fisiológicas. A pele aparece muito cedo no final do 2º mês de gestação. Uma lei biológica indica que a precocidade de uma função é proporcional ao papel que ela vai executar. Na matriz de origem uterina, meio líquido, a pele se organiza para se adaptar a todas as mudanças nervosas, físicas e químicas e adaptar seu ritmo ao ritmo da mãe. As contrações uterinas estimulam os nervos periféricos da pele. O influxo transmite ao Sistema Nervoso e se propaga aos diferentes órgãos. Uma estimulação insuficiente influi então, negativamente no SNC e no sistema nervoso neurovegetativo diminuindo a atividade dos principais sistemas dos órgãos. A fase de desenvolvimento não se limita ao estágio uterino. No nascimento o processo de gestação está apenas semiterminado; assistimos então a fase extra gestacional, continuidade então da matriz do processo útero gestativo. Isto coloca o órgão pele sob a dependência e influência precoce e prolongada das estimulações do meio externo. O seu crescimento, o seu desenvolvimento e a expansão da sua sensibilidade dependem então do ambiente ao qual ela (ser/pele), está submetida, mas através dela estão referenciados todos os sistemas do organismo. A pele é intermediária entre o interior e o exterior. Desde o nascimento todas as estimulações da pele agem sobre o funcionamento e o desenvolvi-

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mento do organismo em termos: respiratórios, gastrintestinal, tônus postural, defesas imunológicas e etc. A pele representa o sistema sensorial mais importante do corpo, o mais extenso e o mais vital dos órgãos dos sentidos: sem sua integridade nós não sobrevivemos. O envelope cutâneo assume grandes funções. Ele protege o organismo contra as agressões mecânicas, químicas, térmicas. É o órgão sensorial do toque, possui um grande número de receptores que recebem os estímulos de calor, frio, tato, dor e criam a sensibilidade difusa e precisa. Mas ao mesmo tempo serve como barreira/proteção à camada superficial protegendo a mais profunda, mais sensível que assume uma função de receptividade e o organismo em geral, em oposição à mucosa viva que apresenta uma hipersensibilidade. Ela é enfim regulador térmico, participa do metabolismo das gorduras, da água e do sal. A pele tem também uma função de identidade social. Ela mostra a sua cor, os traços dos quais não poderá jamais se desfazer, aqueles do tempo (as rugas), as histórias traumáticas (as cicatrizes) e as culturais (tatuagens,). Graças a ela nós reconhecemos o indivíduo (impressões digitais) ou o futuro (quiromancia). Intimamente ligadas às considerações estéticas com seu prolongamento ligado a roupas, nós vemos bastante nas revistas femininas através de cosméticos e outros produtos de bronzear... a pele é social... Ela é também um instrumento de comunicação infra linguística, dotada do seu próprio código. A sua ligação com sistema nervoso neurovegetativo, o sangue e a energia criam suporte a um veículo da emoção. Os rubores, os arrepios, a palidez repentina são também manifestações expressivas, de mensagens ritualizadas de sinais necessários à vida relacional. O interesse pelo envelope cutâneo na elaboração dos modelos teóricos psíquicos é relativamente recente. S. Freud, bem que utilizando o termo “envelope”, não explorou essa noção. Nos anos 1950-60, o psicanalista inglês Bowlby descreveu uma “pulsão de ligação”, integrando as noções de suporte, calor, doçura do contato corporal independente da pulsão oral; hipótese reforçada pelos trabalhos dos etnologistas e notadamente aquele de Harlow nos Estados Unidos. Em 1974, na França, Didier Anzieu publicou na


Memoria da pele

“nova revista de psicanálise” um artigo intitulado “O eu pele”. Ele define esta noção como “uma figuração onde o Eu da criança se serve ao longo de fases precoces no seu desenvolvimento para representar a si mesma como um Eu, contendo os conteúdos psíquicos a partir da superfície do corpo”. A noção do “eu pele” encontra o seu apoio nas diferentes funções biológicas da pele e principalmente nas funções de “saco” continente que guarda o cheio, o bom (leite, os cuidados, as palavras), o limite, a fronteira com o fora e o modo primário de comunicação. Dessa origem epidérmica, o “eu” herda a dupla possibilidade de colocar as barreiras (mecanismos de defesas psíquicas) e filtrar as trocas. Antes do nascimento a comunicação entre a mãe e a criança é constante, contínua, evidente. No nascimento a criança sente no seu corpo, no seu ser, que uma distinção de corpos se opera. O processo de dissociação se cria na passagem do envelope uterino à pele. O corte do cordão umbilical fecha o envelope sobre si mesmo e no mesmo momento gera o funcionamento de zonas de trocas vitais que são os orifícios. Fora do paraíso perdido se vive então a falta do envelope uterino. O psiquismo da criança é invadido pelo desejo do retorno a essa fusão primária. Resta então realizar uma segunda passagem, a da aceitação da diferenciação de corpos. O fracasso levaria a criança a se fechar num envelope autístico, universo em circuito fechado. Nesse estágio, o modelo proposto pelo D. Anzieu se baseia na noção de duplo envelope. Um envelope externo, continente materno, e um envelope interno, a pele da criança. Os dois envelopes se colariam criando um intervalo “pele comum” à mãe e à criança, reação à experiência de separação dos corpos na etapa transicional no caminho da aceitação dos seus próprios limites. Essa fase seria seguida de um processo de eliminação dessa pele comum visando o reconhecimento para cada um do seu próprio corpo, e isto, por um fenômeno de interiorização. Interiorização de “um lado da interface que se torna um envelope psíquico contendo os conteúdos psíquicos do entorno materno, e de outro lado que se torna um mundo interno, dos pensamentos, das imagens e dos afetos”. Esther Bick, anteriormente a Anzieu já havia, no seu conceito de “pele psíquica”, emitido a hipótese que a introjeção de um objeto externo, o continente

Alain Dauty

materno, possa ter uma função de força que articula as diferentes partes da personalidade arcaica da criança, como a pele tem uma função de ligação em relação a diferentes segmentos do corpo, incluindo a noção de globalidade corporal. Cria-se então um limite entre o interior e exterior que possui essas zonas de passagem: os orifícios, vivendo sob um ritmo binário de abertura e fechamento movidos pelo desejo de reencontrar a experiência de prazer intenso e rápido, demandando constantemente satisfação, até a sensação de saciedade. Tendo um envelope cutâneo, a pele como envelope, globalizante, contínuo, oferecendo a partir deste continente a experiência de prazer sereno e difuso cuja função é de sustentação e manutenção dos preciosos conteúdos. A noção de envelope pode ser entendida no contexto da Análise Psico-orgânica referindo-se ao ciclo psico-orgânico de Paul Boyesen. Eu escolhi para analisar as etapas dos pontos 1, 2 e 3 correspondentes a necessidade, a acumulação e a identidade. Esta parte do círculo corresponde à noção de Self. A fase da necessidade é quando a criança precisa ser alimentada de leite, é claro, mas também de cuidados, de palavras, de tato, de calor e gestos de amor. Refiro-me aqui como a pele "membrana receptiva”, permeável, dependente, à espera do continente materno. As carências vivenciadas durante este período podem causar, o que nomeamos, patologia do envelope. Zena vive sua pequena infância aprisionada na sua cama, em um mundo de solidão entrecortada por visitas episódicas da sua mãe, que trabalha no andar inferior, com tempo apenas para dar a mamadeira, trocar fraldas, e aí ela desaparece. Zena chora, berra, e depois se resigna. Zena tem trinta anos e à noite, na sua solidão, ele ingere um leite fervendo, em seguida toma um banho muito quente para tentar reativar por esta auto estimulação um efeito continente de envelope. A terapia será baseada essencialmente na imagem, aquela do envelope, sob uma forma de toque, que nomeamos de ontológico, de profundidade para profundidade, do ser para o ser. A verbalização é orientada no sentido de dar uma forma, simbolizar, o que foi mobilizado, dinamizado no nível orgânico. Dessa forma,

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Memoria da pele

Zena tem a possibilidade de interpor sua subjetividade entre sua pele real e a mão do terapeuta. O trabalho leva Zena em uma regressão que a permite visualizar um envelope, imagem matriz que servirá de base no processo de reapropriação desse envelope/limite. O ponto dois do círculo é a acumulação. A primazia é dada aqui para a noção dos limites do envelope. Aqui a questão é conter o que foi dado e recebido, é este limite que faz a acumulação, as margens que permitem que a água corrente se torne lago. O limite ou envelope cria forma e contém os traços de memória a partir de estímulos externos, é uma superfície de inscrição de traços sensoriais, mas também tem o papel de barreira/proteção. No trabalho terapêutico, o enquadre/setting tem essa função de pele por seu efeito continente. Daí a importância da regularidade dos horários e das sessões. O ponto três é o da identidade, a fase de diferenciação, da apropriação da necessidade, onde do "eu preciso" se torna "eu quero". É a fase da satisfação orgânica do seu próprio desejo. Refiro-me a "pele tambor", pele ressonante, vibratória, espelho que reenvia a associação dos sentidos e a própria imagem. É também o ponto do falso self. Paul Boyesen descreve no ponto 3, um ponto 3 ½ (falso self) construído sobre a aparência; “como se”, e um ponto 2 ½ constituição de um self pela recusa. Olga tem trinta e cinco anos, ela escreve (sob um pseudônimo) e faz teatro. Ao envolver-se com a “pele” de seus personagens, ela evita a somatização de sua própria pele. Ela constitui um eu “a partir da recusa” e oposição à sua mãe. Uma fase dinâmica do trabalho de terapia foi baseada em uma visualização onde Olga sentiu uma intensa necessidade de se livrar de uma segunda pele que se agarrava ao seu corpo (falso self), envelope “emprestado”. O trabalho pôde tomar forma a partir desta imagem, que ela chamou de "a muda da serpente”. A prematuridade da criança ao nascer cria entre ela e o entorno maternante uma relação feita de necessidades de contato, de experiências cutâneas tão importantes quanto as experiências relacionadas no

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Alain Dauty

nível oral e anal. A mãe através de seus cuidados estimula o prazer, a confiança da criança, participando na instalação de uma segurança de base na sua própria pele. As trocas táteis, a sensação de segurança, terão um efeito sobre o desenvolvimento da sexualidade da pessoa na sua busca da relação sensual com seu parceiro, carícias, prazeres preliminares...etc. Mas o perigo reside na excessiva proximidade e na dificuldade que a criança pode ter para se desvencilhar. Contatos de pele criam também uma ligação insustentável, aquela do incesto, sedução mortífera. Perrault em seu conto de fadas “Pele de Asno” conta que a jovem princesa queria uma segunda pele para escapar do desejo incestuoso do rei, seu pai. Todos esses momentos, vividos numa comunicação infra verbal estão inscritos no corpo, na “memoria da pele”. Ela conserva as impressões do corpo e da psique que influenciam o comportamento futuro. A pele se lembra deste mundo perdido de onde traz esses traços, estas marcas. Traços estes se tornam acessíveis quando corpo e coração se abrem, posto que muitas vezes, não existem palavras para traduzir todos estes campos da vida psíquica. A pele, e para além dela o “eu pele”, é o pergaminho original que conserva os rascunhos rasuráveis, arranhados, sobrecarregados de uma escrita pré-verbal feita de marcas cutâneas. Bibliografia J. Bowlby (1978) – Attachement et perte, tome 1, L’attachement – P.U.F. – Paris. J. Bowlby (1958) The nature of the child’s tie to mother, internat, J. Psycho-Anal; 39, 350-373 H.F. Harlow (1958) The nature of love – Americ-Psychol, 13, 673-685 D. Anzieu (1990) - L’épiderme nômade et la peau psychique – Apsygée – Paris D. Anzieu (1985) - Le Moi Peau – Dunod – Paris E. Bick et coll (1980) Exploration dans le monde de l’autisme – Payot – Paris J. Besson et Y. Brault (1985) - Le Cercle Psycho Organique – Revue ADIRE nº1 J. Bergeret (1974) - La personnalité normale et pathologique – Dunod – Paris A. Bouchard Godard (1986) Une peau sensible, In L’aube des sens Les chiers du nouveau-né – Stock - Paris E. Champ (1990) Complot contre Copernic – Journal Interne de psychologie Biodynamique, Nº 21 A, Montagu (1979) – La peau et le toucher – Seuil – Paris M.Pages (1986) – Traces ou sens – Hommes et groupes – Paris


Dados sobre os autores Daniel Osorio Psicólogo clinico (CRP 05/36593) Psicoterapeuta corporal formado pela CEBRAFAPO Membro titular da ABRAPO Luis de Moura Aragão Musicoterapêuta (CBM-CEU 527-1) Psicoterapeuta Corporal em Análise Psico-Orgânica (CEBRAFAPO) Psicomotricista em formação (ANTHROPOS) Membro titular da ABRAPO

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O CIRCULO PSICO-ORGÂNICO Criado na década de 70 por Paul Boyesen, o Círculo Psico-Orgânico é um modelo teórico-prático que busca observar e refletir sobre a qualidade das experiências orgânicas, psicológicas e energéticas vividas pelo sujeito no decorrer da sua vida. Esse Círculo é composto por nove pontos (etapas) que podem descrever um movimento complexo de toda uma trajetória de vida ou apenas de uma sequência do cotidiano; ou seja, o Círculo é um modelo que nos propõe olhar para a experiência humana como um processo cíclico e dinâmico. De acordo com Fraisse (2007), o ponto 1 (do círculo Psico-Orgânico) – a necessidade – corresponde “à fase da fusão intrauterina, do nascimento, do primeiro mês de vida da criança, da fase oral”. É o momento onde vivemos a experiência de “receber, aceitar, se nutrir, ser carregado, se abandonar” (2007). Segundo Sacharny (2000), “é o estado de receptividade e ao mesmo tempo de atividade, na medida em que a criança faz “seu” o leite/amor que recebe”. Esse “duplo-estado” corresponde ao conceito da criatividade originária, formulado por Winnicott (1975): o bebê não tem a capacidade de perceber a diferença entre interno-externo ou dentro-fora e por isso vive a experiência de criar aquilo que encontra, como se o seio materno surgisse como resultado “mágico” do seu próprio gesto, da sua própria necessidade de saciar a sua fome. Para Dias (2003), trata-se de uma ilusão que é necessária, pois é a partir dela que a criança se torna capaz de criar o mundo, o seu mundo. Já no ponto 2 – acumulação – a criança continua sendo dependente do outro, como no ponto 1, mas já começa a sair da fusão absoluta, ela começa “a se apropriar da sua própria energia, das suas sensações e seus afetos; é o começo do processo de separação e de diferenciação”. Esse ponto corresponde ao estágio que Winnicott nomeou de si mesmo primário, no qual a criança começa a se integrar numa unidade, ou seja, a se constituir como sujeito. Essa integração se dá num processo contínuo de tempo e de maturação psico-orgânica. No início desse processo, ela ainda não percebe o outro como legítimo outro, mas já consegue senti-lo como uma espécie de “não-eu”. 10 | Revista de Análise Psico-Orgânica

Já no ponto 3 – a identidade orgânica – a criança se apropria do seu corpo, da sua própria energia, e afirma a sua existência diante do outro: “Eu sou”, “Eu tenho”. É o momento em que ela vive o prazer de ser si mesma no encontro com o outro, onde ela pode “explorar, vivenciar, conhecer, sabendo organicamente que tem um porto seguro” (Sacharny, 2009, no seminário da Identidade Orgânica). Esse ponto corresponde ao estágio que Winnicott chama de EU SOU, no qual “a criança (...) habita mais firmemente no corpo; percebese tendo um contorno, com uma membrana limitante, a pele, que a separa de tudo o que é não-eu” (Dias, 2003). É precisamente nesse estágio que a criança conquista a capacidade de estar só. De acordo com Santos (____), “a capacidade para estar só depende de um espaço de solidão que a criança conquista na presença de sua mãe, porém como se ela não estivesse realmente lá”. Dentro desse espaço, a criança começa a se diferenciar do continente materno e a construir o seu próprio mundo psíquico e afetivo. Trata-se de uma passagem essencial para a formação da sua identidade. Nessa experiência ela internaliza a função materna e adquire a capacidade de jogar/brincar com a realidade, o que permite a elaboração de um espaço psíquico/corporal que dá continente às suas fantasias e aos seus conteúdos internos. Sem esse continente a criança “entra em um vazio” que busca ser preenchido por alguma atividade psíquica ou motora, mas que não simboliza o que ela realmente vivencia em seu mundo interno. Uma boa identidade orgânica nos traz enraizamento de nossa experiência humana e pertencimento a vida, nos levando a abertura de nossas necessidades. Quanto mais pudermos aprofundar nossa humanidade mais plena poderá ser nossa experiência de viver. Ao trazer maior percepção a nosso mundo interior, sensório, afetivo, primitivo e corpóreo melhor podemos nos relacionar com os muitos outros que nos abrigam. Fazendo-nos integrar a experiência de quem somos e vivenciar o sentimento de unicidade, autenticidade e individuação na relação com o mundo. Essa identidade construída e conquistada é o cerne de um bom desenvolvimento afetivo/psíquico.


EU –TU – NÓS

Daniel Osorio / Luis de Moura Aragão

Jacqueline Beson e Yves Brault Manual de ensino da EFAPO, Vol. 1

Bibliografia FRAISSE, Anne - Manual de Ensino: O Círculo Psico-Orgânico WINNICOTT, Donald - O Brincar e a Realidade DAVIS, Madeleine, WALLBRIDGE, David - Limite e Espaço: Uma introdução a obra de Winnicott SANTOS, Manoel - A Constituição do mundo psíquico na concepção winnicottiana: uma contribuição à clínica das psicoses (artigo em : http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0102-79721999000300005&script=sci_arttext)

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Dados sobre a autora Psicóloga pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Psicoterapeuta formada pela EFAPO (École Française D' Analyse Psyco-Orga-nyque) Paris. Especialização em Psicologia Clínica pela Universidade Sorbonne – Paris. Especialização em Psicoterapia de Casais e Análise Psico-Orgânica pela Escola Francesa de Análise Psico-Orgânica. Coordenadora e formadora do Centro Brasileiro de Formação em Análise Psico-Orgânica (CEBRAFAPO). Membro Titular da ABRAPO – Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica.

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O trabalho de massagem biodinâmica foi concebido pela fisioterapeuta e psicóloga norueguesa Gerda Boyesen durante a década de 50. A massagem é uma linguagem não-verbal que possibilita uma comunicação através do toque com intenções precisas, aonde o vínculo vai se tecendo na relação terapeuta e paciente. O toque é um elemento muito potente, pois faz referência a uma das primeiras memórias somáticas do ser humano. Na vida intrauterina e a partir do nascimento, o bebê traz grande sensibilidade através da pele. A partir do contato tátil na origem da vida é que se estabelece a comunicação afetiva entre a mãe e o bebê. Dessa forma, ao tocarmos o corpo de uma pessoa, tocamos na história de vida desse sujeito, pois apreendemos o corpo enquanto unidade psicossomática. O trabalho com a massagem biodinâmica, precisa levar ao relaxamento, onde o indivíduo pode sair de uma posição frequentemente ativa, de vigília, para uma posição receptiva. Numa primeira etapa, o indivíduo se dá conta do seu próprio funcionamento habitual: ritmo, postura, respiração. Essa observação, ou percepção de si mesmo não é realizada a partir da consciência mental, mas da permissão sensorial. O registro é o da sensação, se torna possível o relaxamento do controle mental para a conexão com o universo sensorial. Nesse espaço é viável conectar um outro ritmo, uma outra respiração, e resgatar a confiança no seu ser orgânico, no seu ser corporal. Quando o indivíduo entra em contato com o seu ser sensível, se torna mais acessível para a emergência de suas memórias somáticas primárias, em torno de sensações, emoções e/ou imagens. A comunicação afetiva é estabelecida na origem, através da linguagem corporal, a função psíquica se apoia e se desenvolve a partir da vivência corporal. Esta vivência no quadro de uma relação segura, dá acesso a um sentimento de base que garante à criança a integridade de seu envelope corporal.

O trabalho terapêutico através da massagem pode ser uma das vias para o restabelecimento da comunicação tátil primária insuficiente. Este processo permite ao sujeito reconectar a confiança em si mesmo e na comunicação com o outro. Através de um vínculo de confiança, quando tocamos, damos espaço e reconhecimento ao sofrimento, de forma que a pessoa também possa reconhecer sua dor, medos e fragilidades. Acompanhamos o indivíduo no reconhecimento de sua profunda existência. A direção do tratamento é viabilizar a vivência e a expressão dos sentimentos, das sensações e/ou imagens, respeitando profundamente os limites e possibilidades do sujeito. Dessa forma nos interessa o trabalho de diluição das resistências, que exercem função de defesa, na medida da permissão corporal. Nesse sentido as noções de tempo e maturidade são fundamentais. Dar tempo ao outro é poder exercitar o seu ser paciente. A massagem restaura a perda ou a diminuição da capacidade de auto-regulação vegetativa do organismo, baseada na função de dissolução de stress físico e emocional. A digestão do stress se dá através do psicoperistaltismo que se refere a uma segunda função da atividade intestina, isto é, a capacidade de regular e dissolver produtos de pressão e tensão emocional a partir da descarga metabólica. O toque biodinâmico centra a pessoa sobre si mesma. Respeitoso e sensível, permite que a pessoa massageada perceba seu esquema corporal, aprecie sua segurança interna, o prazer de existir, a confiança no corpo, nas sensações e sentimentos. Esse processo é denominado regulação interna ou microregulação, o limite da massagem se inscreve nessa relação introspectiva. Paul Boyesen (psicoterapeuta e filho de Gerda Boyesen), partindo do método de Gerda, cria a Análise Psico-Orgânica durante a década de 80. A Análise Psico-Orgânica busca as ligações entre a linguagem verbal (significar a vivência emocional), a produção de imagens (acessar o universo simbólico) e a experiência energética sensorial. Dando à Psicologia Biodinâmica uma forma mais analítica, Paul Boyesen cria modelos fenomenológicos (o círculo psico-orgânico, o trabalho sobre o Impulso Primário

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Da massagem biodinâmica à análise psico-orgânica

– Primary Impulse Training ), permitindo a compreensão do funcionamento intrapsíquico do sujeito e a dimensão da relação (transferência e contratransferência) no processo terapêutico. A orientação do tratamento, nesse momento, não permanece na micro, mas busca também a macro regulação, ou seja, o sujeito na relação com o outro, com o objeto do seu desejo. As palavras também constituem o corpo, o que é dito sistematicamente, as ditas "frases chaves", frases familiares que auxiliam a estruturação do sujeito em um determinado padrão de funcionamento. Esse padrão pode se tornar cristalizado, imóvel na possibilidade criadora. O sintoma psicossomático pode ser visto como a expressão de um sofrimento que não encontra outra tradução. Faz-se necessário descobrir a verdadeira mensagem para que o indivíduo transforme esse modo de expressão. Na psicoterapia voltamos para o passado para poder avançar no futuro. O sujeito carrega e traz sua história no seu encontro com o outro. Não se pode mudar o passado, mas pode-se mudar a experiência de seu passado, ou seja, trazer à consciência e olhar de um outro lugar, podendo no presente fazer uma outra opção. Procuramos perceber como o indivíduo traz sua história, sua linguagem somática, emocional e mental. Lidamos com a tríade sentimento/expressão/situação. O sentimento se refere à percepção e à forma de sentir, poder nomear seus afetos e dar corpo a, esse sentir. A situação fala de como a pessoa introjetou o seu vivido, remetendo-se a um corpo subjetivo, fantasmático, ao registro das imagens. A expressão e a capacidade de externar, poder colocar em cena os afetos, as representações mentais e desta forma reelaborar, redinamizar o que havia se paralisado. Dessa forma, o indivíduo se atualiza, permitindo a liberação da energia vital, primária, do seu potencial criativo para ser de fato sujeito de transformação. Para Paul Boyesen, a questão de "por quê eu vivo" é importante, mas também o "como eu vivo", e nesse como, podemos encontrar a pessoa com todos os seus sentimentos, sua expressão vital e suas situações, é o que ele define por qualidade da vivência.

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Silvana Sacharny

Bibliografia BOYESEN, Gerda. Entre psiquê e soma, introdução à psicologia biodinâmica. Summus, São Paulo. L'ètre touché, psicothérapie et toucher. Adire nº 6, avril 1991, Revue d'Analyse PsichoOrganique Manuel D'enseignement, Tome 2, École Française d'Analyse PsychoOrganique.


Dados sobre a autora Psicóloga, CRP: 05/ 09090 – Universidad Nacional de Córdoba, Argentina, 1972. Curso de Formação Psicanalítica: Centro de Estúdios Psicoanalíticos (CEP). Formação Permanente no Centro de Estudos Sociopsicanalíticos (CESOP). Formação em Terapia Familiar Psi-codinâmica, Vínculo Oficina Psicos-social. Estudo Teórico Clínico, Técnicas e Vivências Corporais – Ferenczi, Boadella, Reich, Groddeck, Winnicott, Keleman, Lowen, Navarro, no Centro de Estudos de Clínica Contemporânea. Formação em Análise Psico-Orgânica e Psicologia Biodinâmica pela École Française d’Analyse Psycho-Organique (EFAPO) e pelo Centro Brasileiro de Formação em Análise Psico-Orgânica (CEBRAFAPO). Ciclo de Base em Massagem Biodinâmica e Análise Psico-Orgânica pelo CEBRAFAPO. Formação em Terapia Crânio Sacral. Spécialisation em Psychothétapie de Couple et en Analyse Psycho-Organique pela École Française d’Analyse Psycho-Organique (EFAPO).

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Deixamos os mortos chegarem até nós; eles amadurecem e se suavizam; eles crescem em nós com raízes póstumas; somos o verdadeiro campo, a verdadeira terra dos mortos; eles querem ser sepultados em nossos corações. Ernst Junger.

As três formas: unária, dual e ternária. Em Análise Psico-orgânica - APO, distinguimos três modalidades de relação: unária, dual e ternária. A modalidade unária corresponde à vivência intra-uterina do bebê, que está em fusão com a placenta e, mais tarde, durante os primeiros oito meses, à simbiose pós natal. É uma modalidade de relação que pode ser vivida de forma muito agradável e determinada pelo principio do prazer, mas, em algumas situações, essa modalidade unária pode existir numa qualidade de fusão mórbida, mortífera. Na relação unária, o outro não existe. Na relação dual, o outro existe. Estamos juntos para constituir uma identidade. Na dual, a relação se dá entre eu e tu. O pronome na relação unária é “eu”, auto-referente. Na relação dual é “tu”. A estrutura ternária, o pronome é “ele”, decorre da intervenção de um acontecimento, de uma força externa que determina a vida humana. É descrita pelo pronome “ele”, que é externo à relação dual; é uma terceira pessoa, um terceiro termo, que nos é imposto pelo externo. Trata-se da entrada da lei. Somos constituídos por essas três formas, com tendência maior para uma ou para outra. As três formas são uma ferramenta teórica da APO, útil para diagnóstico e como maneira de ver toda uma série de grandes temas, tais como a lei, o dinheiro, as transferência, a sexualidade e a morte. Vejamos a questão do luto e da morte. A morte é uma das questões da nossa existência. É um mistério. A morte pode chegar abruptamente, como um evento brutal, sem ser prevista. Nesse caso, subitamente somos confrontados com um 16 | Revista de Análise Psico-Orgânica

acontecimento inesperado, abrupto, uma entrada do real, e isto muda completamente a situação que existia momentos antes. O contrário da morte não é a vida. É o nascimento, porque se trata de uma passagem. Não sabemos o que há antes do nascimento nem depois da morte. Tudo o que podemos dizer sobre a morte não esgotaria a questão. Do ponto de vista unário, a morte é essa passagem de forma indefinida, indiferenciada, uma espécie de dissolução. Pode-se dizer que no unário a morte é um processo interno. Segundo Freud, a pulsão de morte trabalha no inconsciente. É a nossa pulsão de morte que pode ir no sentido da dissolução do nosso “envelope”. Na forma unária, a vivência é interna. A depressão é do registro unário. A pulsão que se estabelece na estrutura unária está profundamente ligada à regressão. No dual, a morte é uma erupção do externo, do real, que vem criar uma ruptura, por exemplo, um acidente. Já na forma dual, a morte é uma a erupção da realidade, um rompimento, um esgarçar do ser, algo que vem de fora, algo que vem quando menos se espera. O dual se refere à identidade. Nós precisamos do outro, de estarmos eu e tu. É o lugar do confronto. Podemos dizer que na forma dual há a presença de duas pessoas diferentes que se relacionam de diferentes maneiras. Maneiras distintas de cada um ser. Certamente, é o lugar da raiva, da violência, mas é esse também o lugar do encontro, do amor. É o lugar da cumplicidade. Existem duas pessoas que dizem “eu”. E existem duas pessoas que dizem “tu”. O aspecto da morte no sentido ternário, é o que está ligado a tudo o que inscreve a morte em relação ao destino humano, o que se refere à transmissão, à sucessão de gerações, à tudo o que se refere à memória do morto. Aí entram as tradições e os rituais. Lembrança da memória de quem morreu. Formas de criar funerais, rituais que permitam separar-se do morto, ao mesmo tempo em que se perpetua sua memória. No ternário é onde se insere a lei e a cultura. Podemos tomar a morte como parte de uma lei natural.


Morte e Luto

É muito importante separar-se da pessoa que morreu. No luto, o primeiro sofrimento vivenciado é o da impossibilidade de viver sem o outro. O que é presente é a falta concreta da presença do outro, da sua energia. É aí onde o ternário é tão importante, porque podemos simbolizar a presença, a memória, para não trair, não esquecer, mas poder seguir vivendo. O ternário é o tempo social, é como o homem organiza o ontem, o hoje e o amanhã. No tocante ao tempo, isso está diretamente ligado ao interdito do incesto, que é a obrigação de passar do dual ao ternário. O ternário é a sucessão de gerações. E a aceitação do interdito do incesto é a mesma coisa que aceitação da morte. O pai que aceita a interdição do incesto, perde uma relação privilegiada com a filha; o que ele ganha é que a filha terá uma criança e ele será avô.. Ser avô é de certa forma aceitar a morte. Existe um luto nessa relação. O luto consiste em aceitar a morte e inserir-se no social, no tempo humano, no qual as crianças chegam depois dos pais e não antes deles. Os netos depois dos filhos. E assim faz-se a sucessão. Se o pai se apoderasse da filha, estaria fechando o círculo sobre si mesmo, no presente. O incesto é uma forma de negar o tempo. O tempo que carrega a morte. É uma forma de ficar na ilusão de eternidade. O interdito do incesto é a obrigação de passar do dual para o ternário. É a aceitação da lei. O ternário se dá no sentido da reorganização. No unário, vive-se fora do tempo. No dual o tempo se dá no presente. No ternário, por outro lado, o tempo é social. O unário é o lugar da nutrição. O dual é o lugar da identidade. E o ternário é o lugar da lei Vamos falar de morte e luto na psicanálise. Segundo Freud, “se concebemos a vida tomando como centro o amor, e pensamos que toda alegria vem de amar e ser amado, o seu paradoxo é o sofrimento e a dor”. Perder um ser amado é perder o que era centro organizador do psiquismo. Para seguir vivendo precisa-se fazer um trabalho de elaboração de luto. Para Freud, o luto não é a perda. É a reação à perda. Não

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situa a dor como sendo exclusivamente ligada à perda, mas ao trabalho de luto. O que se perde com a morte de um ente querido é a imagem de mim mesmo que ele me permitia amar. O que perdi, antes de tudo, é o amor a mim mesmo que o outro tornara possível. Isso significa que o que se perde é o eu ideal, ou mais exatamente o meu eu ideal ligado à pessoa que acaba de morrer. Em que consiste o trabalho do luto e a elaboração do luto? É uma lenta e minuciosa retomada de cada um dos detalhes do vínculo que me ligava ao objeto amado e agora perdido. Nesse trabalho, cada lembrança do morto é tratada pelo eu segundo três procedimentos:  primeiro, há uma focalização, uma delimitação de cada lembrança e de cada imagem ligada ao objeto perdido;  segundo, uma vez delimitada a imagem, produzse então um desinvestimento;  terceiro, a libido, destacada da imagem mental do outro, é transportada para grande parte do eu. É precisamente esse movimento que produz a identificação com o objeto, mais exatamente com a imagem do objeto. Aí a libido está livre para substituir e investir em outro objeto. Podemos assim nomear os três patamares da elaboração do luto: superinvestimento, desinvestimento e enfim transporte do afeto para o conjunto do eu, isto é, identificação. No luto normal, a retirada da libido se desloca progressivamente para um outro objeto. A libido deixa pouco a pouco a representação do objeto perdido para investir a representação de um novo objeto eleito. A diferença no luto patológico, uma vez destacada do objeto perdido, é que a libido se dissemina pelo conjunto do eu e se cristaliza sob a forma de uma identificação congelada com a imagem do objeto perdido. Freud sustenta que a imagem do objeto perdido é a sua “sombra”, que cai sobre o eu e encobre uma parte dele. A dor é, pois, uma reação. E ante o transtorno pulsional introduzido pela perda do objeto amado, o eu se ergue: apela a todas as suas forças vivas. Mesmo com o risco de esgotar-se. E as con-

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Morte e Luto

centra num único ponto, o da representação psíquica do amado perdido. A dor ocorre cada vez que acontece um deslocamento maciço e súbito de energia. Assim o desinvestimento do eu dói, e o desinvestimento da imagem também dói, o que dói não é perder o ser amado, mas continuar a amá-lo mais que nunca, mesmo sabendo-o irremediavelmente perdido. “Mas é necessário separar-se do morto e isso é possível com o processo do luto. O luto é um longo caminho que começa com a dor viva da perda de um ser querido e declina com a aceitação serena da realidade, da perda e do caráter definitivo da sua ausência. Durante esse processo, a dor aparece sob forma de acessos isolados de pesar. O luto é desfazer lentamente o que se coagulara precipitadamente”. “Nunca estamos tão mal protegidos contra o sofrimento como quando amamos, nunca estamos tão irremediavelmente infelizes como quando perdemos a pessoa amada. Assim, o amado me protege contra a dor enquanto seu ser palpita em sincronia com os batimentos dos meus sentidos. Mas basta que ele morra bruscamente para que eu sofra como nunca” “Durante o período de luto, o eu percorre o caminho inverso: pouco a pouco desinveste a representação do amado, até que esta perca a sua vivacidade e deixa de ser um corpo estranho, fonte de dor para o eu. Desinvestir a representação significa retirar, retirar-lhe o seu excesso de afeto, reposicioná-la entre as outras representações e investi-la de outra forma” (Juan-David Nasio). Freud disse que o luto é uma retirada do investimento afetivo da representação psíquica do objeto amado e perdido. O luto é um processo de desamor, é um trabalho de luta, detalhado e doloroso. Pode durar dias, semanas e até meses, ou ainda toda uma vida... O luto é um movimento de afastamento forçado e doloroso do que tanto amamos, que não existe mais, somos obrigados a nos destacar dentro de nós, do ser amado que perdemos. Seria como identificarse (ficar com) com o melhor do objeto perdido dentro de nós e enterrar o resto. Segundo Fernando Ulloa, luto congelado é um luto diferido, adiado, que pode ser mantido por mui-

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tos anos e se caracteriza pela rapidez com que se resolve quando é trabalhado na psicoterapia. É uma espécie de estagnação, de sofrimento congelado. Bibliografia Material de EFAPO/CEBRAFAPO. Freud, S., Obras Completas. Nasio, Juan-David, O Livro da Dor e do Amor, J. Zahar Editor, Rio de Janeiro, 1997.


Dados sobre a autora Psicoterapeuta em Análise Psico-Orgânica e Massagem Biodinâmica, formada pela EFAPO e CEBRAFAPO. Membro Titular da ABRAPO – Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica. Criou e administra a página NOTÍCIAS DO CORPO no Facebook, para divulgar textos, eventos e atividades voltadas ao trabalho corporal e autoconhecimento. Professora e pesquisadora de História.

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O Círculo Psico-Orgânico como Jornada

O Círculo Psico-Orgânico foi criado por Paul Boyesen nos anos 70 como um modelo que se refere tanto à trajetória de vida como à circulação de energia. O Círculo engloba aspectos corporais, energéticos e psicológicos. O símbolo gráfico circular aponta para seu caráter dinâmico e contínuo. Ou seja, as etapas do processo se repetem de formas diversas em grandes momentos da existência ou em meros acontecimentos cotidianos, num eterno pulsar em movimento e construção. Podemos estudar o Círculo Psico-Orgânico ou aplicá-lo como ferramenta terapêutica no sentido do trabalho com a energia. De um lado o fluxo, a carga, o acúmulo energético, o movimento ascendente. De outro o defluxo, a descarga, o relaxamento, o repouso, o movimento descendente da energia. Por outro lado, o Círculo também se refere a momentos, estágios da vida desde a fase intrauterina, passando pela primeira infância, adolescência, até o encontro com a própria maturidade e integridade. As nove etapas do Círculo referem-se tanto ao movimento de fluxo/defluxo energético, quanto às fases da existência. No presente trabalho, priorizarei a concepção do Círculo no que se refere às etapas do movimento, do crescimento, da vida. Assim, o movimento do Círculo inicia-se no ponto um, a Necessidade. Esta etapa corresponde aos primeiros momentos da existência humana, que vai desde a vida intrauterina até os primeiros meses do bebê. Nesta fase o recém-nascido chega ao mundo ainda desprovido de contornos que o definem e separam do mundo que o cerca. O momento fase caracteriza-se pela indiferenciação e pela total dependência e submissão às necessidades mais básicas, notadamente de nutrição tanto no sentido concreto, do leite, quanto no sentido simbólico do afeto, do amor sem o qual a criança não sobreviverá. A mãe, ou quem exerça a função materna, precisará oferecer ao neném o aconchego de seu próprio corpo para que ele, aos poucos, possa vencer a necessidade associada ao desprazer e chegar à sensação de 20 | Revista de Análise Psico-Orgânica

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prazer, saciedade e, consequentemente, contorno. Lembrando que o círculo é constante e cíclico em nossas vidas, esta primeira etapa se repetirá sempre que nos depararmos com momentos de intensa fragilidade, dependência e vulnerabilidade. O contato com nossas verdadeiras e profundas necessidades será fundamental para vencer esta fase e avançar rumo a outros estágios de nosso percurso pessoal. O segundo ponto do Círculo chama-se Acumulação. Nesta etapa o bebê dá início ao processo de se perceber enquanto um corpo autônomo, aos poucos se diferenciando do corpo de sua mãe/figura materna a partir do contato com ela. Na medida em que o neném inicia a percepção de si, apreende também a noção de receber e acumular o que vem de fora, do outro. O bebê ainda é inteiramente dependente de cuidados e afeto, porém já começa a notar que o que o nutre vem de fora, do não-eu em oposição ao eu que principia a se delinear. A forma como esta fronteira corporal se constrói será fundamental para definir a possibilidade de troca do indivíduo. Se o contorno for excessivamente espesso, a pessoa terá pouca flexibilidade para a interação e tenderá a desenvolver comportamentos de acumulação e retenção. Ao contrário, se a fronteira for permeável demais, haverá dificuldade de manter a energia, acumular recursos e conteúdos e uma tendência ao esvaziamento. Assim também será a integração com o outro: em função de como tiverem sido construídos os limites entre o eu e o outro, a proximidade poderá ser vivida com o desconforto da invasão, assim como a distância pode representar a falta de contorno e identidade. Ao longo de toda a vida estaremos lidando com este ponto toda vez que precisarmos redefinir nossos contornos, nosso espaço em relação ao outro e nossa forma de acumulação concreta ou simbólica. O que é meu? O que é do outro? O que recebo? O que retenho? Do que posso abrir mão? Em seguida chegamos ao ponto três, a Identidade. Este é o momento em que a criança pequena explora seu corpo, agora plenamente apropriado. Nesta etapa se dão os jogos, as brincadeiras e experimentações que delineiam a identidade orgânica. A criança se apropria de seu território, de seus objetos, afirma “é meu” com frequência, delimitando suas


O Círculo Psico-Orgânico como Jornada

possibilidades no mundo. Ela irá, também, explorar os efeitos do “não”, estabelecendo gostos, prazeres, jogos, preferências. Esta fase coincide com a entrada no Jardim de Infância (Educação Infantil) onde ocorrerão as primeiras trocas coletivas e suas mais variadas negociações. Este será um momento importantíssimo onde os adultos colocarão limites claros e a criança terá que lidar com a frustração das barreiras que restringem seu desejo infinito e imediato. Trata-se do encontro entre o impulso primário, o élan que nos move e a reação secundária que vem de fora, do outro, do mundo e que nos proporciona a oportunidade de nos estruturarmos com fronteiras claras. Na vida adulta o ponto três estará em jogo sempre que nos depararmos com desafios a nossos contornos, à necessidade de dizer ou aceitar o “não”, aos momentos em que é preciso dar início a movimentos próprios, profundos, enraizados e ousar seguir o próprio rumo. De posse de uma delimitação pessoal básica, como me movimento no espaço? Que caminhos posso e devo percorrer? Qual o meu estilo de caminhada? Que estradas seguir? Como experimentar minha autonomia? O próximo estágio da jornada é o ponto quatro, a Força. Nesta etapa a criança faz contato com o desafio à figura paterna que representa a lei. Constitui-se o momento de se apropriar da própria potência no embate com o outro. Se, por um lado, as regras e limites são fundamentais na estruturação do indivíduo, por outro em muitos momentos é preciso desafiar a autoridade e disputar nosso lugar no mundo. A qualidade dos limites impostos será imprescindível na formação do sujeito. Interditos rígidos demais podem gerar uma sensação de impotência ou criar raivas intensas. Ao contrário, se as fronteiras forem pouco delimitadas, a pessoa corre o risco de se perder e se prender na fantasia da onipotência ou na sensação de falta de rumo, norte. A justa medida das proibições e regras é importantíssima na boa construção da personalidade. Em etapas da existência posteriores à infância, a questão do ponto quatro se fará presente quando nos depararmos com o desafio de nos contrapormos ao outro e de nos apropriarmos de nossa própria força. Como sentimos nossa própria potência? De

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que maneira nos posicionamos quando é preciso enfrentar discussões, debates, disputas? Como percebemos a força do outro diante de nós? Como somos capazes de resistir a imposições? Como lidamos com a autoridade? Como experienciamos a superação de obstáculos internos e externos? O passo seguinte nessa caminhada, o ponto 5, é a Capacidade. Este momento diz respeito à possibilidade de formular, imaginar, criar, sonhar com nossas ações no mundo. Antes de agir fantasiamos, planejamos, projetamos em nossa tela mental tudo que poderia ser real. Esta etapa é fundamental para abrir todas as potencialidades num universo imaginário amplo e criativo. Os riscos desse processo – e há riscos a cada passo! – mais uma vez dizem respeito aos excessos e extremos. Se não desenvolvemos nossa capacidade de sonhar, imaginar, visualizar mentalmente, teremos dificuldade no planejamento da vida e viveremos a aridez do real bruto, sem poesia nem cor. Ao contrário, se nos perdemos na fantasia, o empecilho se dará na concretização dos projetos. Para realizar é preciso antes formular, imaginar. Mas, em seguida, é necessário sair do mundo das ideias e efetivar nossos planos. O aprisionamento da fantasia, ou a ausência dela são dois extremos doentios na lida com a capacidade, que podem se manifestar em qualquer época de nossa vida. Os dilemas relacionados à capacidade aparecem quando nos vemos diante do desafio de imaginar onde queremos investir a energia que acumulamos, a potência que descobrimos em nós. Para onde canalizaremos nossos talentos, nossas possibilidades, nossas habilidades? É preciso formular, fantasiar antes de agir. O ponto 6 do Círculo Psico-Orgânico chama-se Conceito. Esta é uma etapa muito interessante em que nos deparamos com o hiato entre a formulação do desejo e sua concretização. O que separa o sonho, a imagem ideal, o projeto mental, da realidade? Quais os caminhos efetivos que deveremos trilhar para atingir nossos objetivos, concretizar nossos desejos, realizar nossos sonhos? Neste momento é necessário fazer escolhas. E cada escolha implica numa perda: ao decidirmos por uma coisa, abrimos mão de todas as outras. Além disso, mesmo aquilo pelo qual optamos jamais será,

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O Círculo Psico-Orgânico como Jornada

no real, igual ao projeto imaginado. Há um duplo luto, portanto. A morte simbólica de todas as alternativas abandonadas em nome de uma opção e o contraste inevitável entre o sonho e a realidade alcançada. Em termos da circulação de energia, o ponto seis é o ápice da carga. Ou seja, a última etapa antes da canalização da energia, de sua expressão no mundo externo e da descarga e relaxamento posteriores. Ao longo da trajetória do ponto um ao seis ocorre o processo de estruturação do sujeito, de construção da individualidade até chegar a este limiar onde ocorrem as escolhas que permitem a concretização de desejos e projetos. Ao longo de nossa vida lidamos com questões relacionadas ao conceito todas as vezes em que nos depararmos com a necessidade de escolher caminhos, decidir o rumo a tomar, a atitude mais legítima a adotar. As escolhas que norteiam nossa existência partem de uma formulação mental anterior, pressupõem uma estruturação profunda e só então podem ser efetivadas. Esse momento entre o planejamento e o real, entre a ideia e o fato, quando optamos por uma trajetória, uma atitude, um gesto, representa a materialização do ponto seis. Avançamos na jornada em direção ao ponto sete, a Expressão. Esta etapa refere-se a todas as formas de expressão, seja verbal, artística, cultural, corporal, criativa, social, emocional. Mas, sobretudo, diz respeito ao movimento, à possibilidade de ir ao encontro de seu desejo, de realizar o que planejou, concretizar suas escolhas e aptidões. Segundo Ana Luisa Baptista, “Quando a energia pode encarnar, ganhar uma forma, o sujeito passa da idealização para o concreto, com todos os obstáculos existentes na realidade. Vai de encontro ao mundo real. Vive a Expressão do seu desejo. A possibilidade da expressão, do fazer concreto, está intrinsecamente relacionada com a maneira com que os outros pontos do Círculo foram vivenciadas.”1 Assim, a qualidade da ação e a própria viabilidade do ato concreto dependem de todas as etapas anteriores da jornada. Os primeiros passos da caminhada rumo ao ponto sete preparam o sujeito para a expressão inteira, coerente, orgânica, legítima. E lhe dão coragem e ímpeto para agir. A passagem da concepção à encarnação, da

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formulação ao ato não será possível sem vencer obstáculos. O sujeito, apropriado de suas escolhas e ações, arrisca-se ao expressar seu desejo, porque se expõe e não pode prever a reação do outro ou as consequências efetivas de seus atos. Agir representa uma saída do conforto da inércia e do mundo das ideias para o risco e a exposição, consequências inevitáveis do movimento. Durante nossa existência esbarraremos em momentos associados à expressão quando enfrentamos a necessidade de agir, lidar com obstáculos, iniciar um movimento, tomar atitudes, criar, utilizar a própria força, realizar projetos. A maneira como lidamos com estas questões demonstram como nos encontramos em relação à expressão. Em alguns casos o sujeito apresenta dificuldade de romper a inércia, mover-se, posicionar-se, levar adiante seus planos. No extremo oposto, vemos pessoas “viciadas” na ação, incapazes de desfrutar dos resultados de seus atos, sempre em busca de um novo movimento que lhes supra a necessidade de um constante fazer. Mais uma vez, o conforto se apresenta em algum ponto entre essas duas polaridades. O penúltimo capítulo da caminhada pelo Círculo é o Sentimento. Nesta etapa estaremos lidando, por um lado, com a abertura para os próprios sentimentos, a possibilidade de fazer contato e aceitar o que sentimos profunda e sinceramente. Por outro, estamos diante da oportunidade de vivenciar o amor em sua plenitude. O sujeito é capaz de saborear a qualidade de sua experiência, de sua ação. A realização de seus projetos, a concretização de seus sonhos e planos permite uma avaliação do trabalho realizado e desta avaliação chegamos ao sentimento de satisfação. Os sentimentos podem ser experienciados, vividos, aceitos. A partir do contato com os próprios sentimentos e da trajetória até aqui percorrida, a pessoa será capaz de vivenciar a entrega ao outro, ao afeto sincero, à alegria, ao sofrimento e, sobretudo, ao amor. O amor permanece um mistério, o coroamento de muitas estradas, o supremo objetivo, a meta primordial. Mas aqui nos referimos ao afeto construído ao longo de uma profunda jornada interior, fruto do avanço diante de diversos obstáculos no processo de auto percepção e autoconhecimento.


O Círculo Psico-Orgânico como Jornada

Aprendemos a amar nas relações familiares com mãe, pai e irmãos. Porém, caso a construção desse amor original tenha sido incompleta ou ineficaz, temos a oportunidade de refazer esta trajetória por conta própria numa jornada terapêutica em busca do afeto que nos habita. Encontrar nossos sentimentos nos prepara para oferecer amor ao outro e vivenciar a plenitude do encontro. Nos deparamos com questões ligadas à etapa do sentimento todas as vezes que nos defrontamos com a necessidade de entrar em contato com o que sentimos, que nos for exigida a percepção de nossos afetos e que o relacionamento amoroso estiver em foco. O coroamento da jornada através do Círculo Psico-Orgânico (lembrando que percorremos esta trajetória inúmeras vezes, num movimento circular e cíclico) é o ponto nove, a Orgonomia. Orgonomia é um termo criado por Wilhelm Reich em sua busca por definir a força que circula em nosso organismo (de organismo deriva “orgon”, como Reich batizou essa energia). Reich partiu da Psicanálise que definiu a noção de libido, da Filosofia de Henri Bergson, que postulou a existência de um élan vital e da Biologia Vitalista que defendia a realidade de uma energia biológica. A síntese dessas correntes gerou a ideia de uma forma de energia que circula por nossos corpos e também pela natureza e pelo universo.2 Paul Boyesen usa a palavra reichiana dando-lhe um sentido mais amplo de energia cósmica, bem-estar universal, plenitude sem fronteiras, integrada, conectada ao cosmo que nos cerca. Por um breve momento nos sentimos parte do todo, conectados a tudo que nos rodeia, pertencentes ao cosmo. Para atingir esse estado é preciso chegar a uma atitude de entrega, relaxamento, abertura, inação, aceitação e receptividade. O momento é de prazer intenso, serenidade, completude. A orgonomia segue-se à expressão, à realização, à ação. Depois da missão cumprida, a bonança. As questões ligadas a este estágio do percurso humano dizem respeito à nossa possibilidade de desfrutar de nossas vitórias, fazer uma pausa ao atingir o cume e saborear nossas conquistas. Por pressa, desconexão, ou ansiedade muitas vezes nos precipitamos para a próxima ação, o passo seguinte, sem

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nos darmos tempo e espaço para viver a plenitude da chegada. Assim, percorremos as nove etapas do Círculo Psico-Orgânico e atravessamos a trajetória psíquica em busca do EU integrado. E encararemos a travessia tantas vezes quantas forem necessárias, nesta incrível jornada a que chamamos VIDA! Notas 1.

2.

BAPTISTA, Ana Luisa. Círculo Psico-Orgânico e Ciclos Arquetípicos na Arteterapia. Publicado no site www.cebrafapo.com.br. Página 4. Adaptado de http://www.org2.com.br/orgonomia.htm

Bibliografia BAPTISTA, Ana Luisa. Círculo Psico-Orgânico e Ciclos Arquetípicos na Arteterapia. Publicado no site: www.cebrafapo.com.br FRAISSE, Anne. Manual de Ensino da Escola Francesa de Análise Psico-Orgânica: o Círculo Psico-Orgânico. Rio de Janeiro: CEBRAFAPO/EFAPO, 2007 Site: www.org2.com.br/orgonomia

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Dados sobre a autora Psicóloga (CRP 05/23146); Arteterapêuta - AARJ: reg. 022; Especialista em Psicologia Junguiana pelo Instituto Brasileiro de Medicina e Reabilitação – IBMR. Psicoterapeuta Corporal e Formadora em Análise Psico-Orgânica e Psicologia Biodinâmica pela EFAPO (École Française D' Analyse Psyco-Organyque) e pelo CEBRAFAPO (Centro Brasileiro de Formação em Análise Psico-Orgânica). Especialista em Psicoterapia de Casais e em Análise Psico-Orgânica pela EFAPO. Fundadora do Incorporar-te: Espaço Terapêutico Corpo Artes; Sócia da SBPO – Sociedade Brasileira de Psico-Oncologia. Membro Titular e Diretora Cultural e de Eventos da ABRAPO – Associação Brasileira de Análise Psico-Orgânica (1ª e 2ª gestões). Coordenadora do curso Formação de Terapeutas em Arteterapia com abordagem Junguiana e Psico-Corporal em Análise Psico-Orgânica desde 1996, com turmas no Rio de Janeiro, Curitiba e Florianópolis. Coordenadora do Programa Arteterapêutico de Humanização Hospitalar e Contação de Histórias do Hospital Federal dos Servidores do Estado do Rio de Janeiro – HFSE/RJ. Autora do livro infanto-juvenil Segredos do Coração, ilustrado por Márcia Széliga, publicado pela Espheris Edições, em 2010.

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É no aqui e agora que o acontecimento se dá como se fosse pela primeira vez embora num passado remoto este acontecimento já se tenha dado através de sensações corpórea. Podemos pois enunciar: “tudo está lá”. Nós o sentimos hoje, não por tudo, estar lá, mas sim, tudo está lá por o sentirmos no aqui e agora. Lygia Clark (1980 p. 306)

Na Análise Psico-Orgânica busca-se acolher a Sensação (o que vem do corpo), o Sentimento (o que vem da alma), e o Sentido (o que vem do espírito). Para tanto, o trabalho caminha em três direções:  a Conexão Orgânica no momento presente do trabalho terapêutico, que permite a percepção da forma como o sujeito introjetou o que foi vivido, remetendo-se na vivência da Situação de forma individual e coletiva, abrindo espaço para a emersão de imagens inscritas no corpo1;  o encontro com Orgânico Profundo vinculado ao desejo e aos instintos, expresso através do Sentimento2 - revelador da qualidade da experiência sensória/sensitiva. Refere-se à experiência de impressões e de expressões sensoriais. Trata-se de “... respostas às situações (simbólicas, reais ou imaginárias) interiores ou exteriores” (BOYESEN, Tome 5, 1999).  e ao conceito, que trás a forma como o que foi vivido é percebido e elaborado, chegando ao sentido da experiência, à Expressão. Na utilização da Arte Sensorial na prática arteterapêutica, focaliza-se o corpo, as sensações, como via de acesso ao inconsciente.

A “Sensação” é precisamente isso que se engendra em nossa relação com o mundo para além da percepção e do sentimento. Quando uma sensação se produz, ela não é situável no mapa de sentidos de que dispomos e, por isso, nos estranha. Para nos livrarmos do mal-estar causado por esse estranhamento nos vemos forçados a “decifrar” a sensação desconhecida, o que faz dela um signo. Ora a decifração que tal signo exige não tem nada a ver com “explicar” ou “interpretar”, mas com “inventar” um sentido que o torne visível e o integre ao mapa da existência vigente, operando nele uma transmutação (Rolnik, 1995, p. 2) .

Um signo que ganha um sentido torna-se um símbolo. Ou seja, é uma imagem a qual se atribui uma qualidade afetiva, pessoal e única para cada sujeito e que apresenta um significado para o coletivo. Logo, na busca em decifrar a sensação experimentada nos deparamos com “... o arquétipo (que) aparece no aqui e agora do espaço e do tempo, podendo, de algum modo, ser percebido pelo consciente. Falamos então de símbolos” (JACOBI, 1995, p. 72). Este é passível de diferentes interpretações que podem variar de acordo com as referências socioculturais e com a compreensão (sentido) de cada sujeito. Favorecendo a emersão de imagens provindas do inconsciente, o trabalho com a Arte Sensorial caminha em diferentes direções de acordo com a demanda de cada pessoa. Ora parte da palavra, do conceito, da Expressão, trazendo o sentido da experiência, para se chegar ao que foi vivido (Situação) ou ao que se sente (Sentimento). Outras vezes do Sentimento que o objeto evoca indo em direção de fatos vivenciados (Situação) ou do sentido da experiência (Expressão). Em outros ainda busca-se a Situação, trazendo a relação entre objeto e um contexto em que sensações semelhantes foram experimentadas, buscando o Sentimento que a acompanha e o melhor canal para a Expressão da experiência. Dependendo da proposta buscamos, neste momento, o menor contato visual possível, uma vez que a visualização facilita a desconexão com a experiência e traz a racionalização. Então pode-se pedir para que a pessoa mantenha os olhos fechados, venda-los ou colocar máscaras especialmente preparadas para possibilitar a visualização parcial.

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Articulações arteterapêuticas...

A interatividade com o material favorece a comunicação não verbal e gestual, sendo estes instrumentos de acesso ao inconsciente, permitindo a emersão de conteúdos do imaginário e outros reprimidos, possibilitando a liberação da imaginação criativa e uma nova visão e percepção de si, do outro e do mundo. A tradução das informações sobre os diferentes componentes variáveis do espaço/objeto sensorial centra-se na relação dinâmica interrelacional que se estabelece entre o sujeito-espaço-material, trazendo percepções e sentimentos diversos. Ou no dizer de Clark: O objeto relacional não tem especificidades em si. Como seu próprio nome indica é na relação estabelecida com a fantasia do sujeito que se ele define. O mesmo objeto pode expressar significados diferentes para diferentes sujeitos ou para um mesmo sujeito em momentos diferentes (AMIN. e GONÇALVES, 2007, p. 7) ... Não é uma forma simbólica que representa materialmente um determinado conteúdo subjetivo, mas um receptáculo de significações renovadas a cada ato .... (Clark, 1997, p. 54).

A construção deste trabalho tem por base estudos e pesquisas da Arte Contemporânea, em especial os desenvolvidos por Lygia Clark que, relativizando o campo da arte mediante a técnicas psicoterápicas, nos trouxe a possibilidade de fazer da obra de arte um instrumento de mediação terapêutica. Através do contato com a obra podemos reinventar a nós mesmos, recriar nossa história e re-significar nossa existência. Sob essa ótica, cabe ao artista: ... dar ao participante o objeto que, em si mesmo, não tem importância, e que só virá a ter na medida em que o participante agir. O artista não é mais o autor da obra mas um suscitador do ato criativo do outro ... Ele se contenta em propor ao outro serem eles mesmos ... (Oiteral, 2007, p. 5).

Tanto os objetos relacionais3, como outros materiais que possibilitam a exploração sensorial, veem sendo recriados e utilizados na prática arteterapêutica com o objetivo de facilitar o mergulho no inconsciente profundo por meio de vivências que possibilitem acionar a memória sensorial nas mais diferentes faixas etárias e no trabalho com portadores de defi-

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ciências ou com distúrbios emocionais de ordem orgânica/psíquica. Estes são “vividos numa interioridade imaginária do corpo” (Wanderley, 2002, p. 19.), através da imagem sensorial que o objeto carrega. Esta não se atinge através da visualização do objeto ou de seu significado, mas do contato. Contato este que acontece no presente, no exato momento em que o sujeito toca e é tocado: no agora. E “... o agora nos impõe infinitas possibilidades. O agora viaja dentro de nós como um segundo corpo para o aprendizado do existir” (Bonomi apaud Bosco, 2007). A integração entre o contato sensório e a arte, reconecta o sujeito com as lembranças de sua história de vida na perspectiva do símbolo vivificado. Há lembranças, há imagens iniciais e formadoras, nem sempre felizes, mas marcantes, que se constituem como essenciais na dinâmica da vida, incluindo formação, produção, trajetórias. Entretanto, muitas delas desaparecem, e outras permanecem vívidas na memória, podendo ser resgatadas nas vivências do cotidiano (Freitas, 2007, p. 01-10).

As imagens carregam também as memórias dos antepassados através dos conteúdos míticos vinculados àquele símbolo; bem como os múltiplos significados presentes arquetípicamente. E é somente por meio do símbolo que os arquétipos penetram na esfera cultural e humana (NEUMANN, 1995), pois o inconsciente se manifesta através das imagens, revelando o imaginário e o simbólico através de seus conteúdos, transformando e ampliando as possibilidades, dando à vida do coletivo e do indivíduo o fundo único que torna a existência plena de sentido. A arte mostra-se ser, uma vez mais, um meio facilitador da Expressão, conferindo uma manifestação visível do afeto (Sentimento) e trazendo um novo sentido à Situação vivenciada.


Articulações arteterapêuticas...

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UTILIZANDO A ARTE SENSORIAL NA PRÁTICA ARTETERAPÊUTICA A experiência sensorial desenvolveria no participante a consciência de que o “homem não deve buscar no infinito sua finalidade, mas fundar na terra o seu céu”: devorando “tudo o que até agora se chamou de sagrado, bom, intocável e divino” poderia recuperar a “trasnsbordante plenitude e potencialidades” de seu corpo; e sem a “segurança” de um “sentimento metafísico”, tornando-se “legislador de si mesmo”. Ricardo Fabbrini (Fabbrini, 1994 - p. 1995)

Na prática Arteterapêutica, a Arte Sensorial se adequa a todo e qualquer tipo de trabalho que focalize o desenvolvimento da sensibilidade e da percepção, bem como o mergulho no inconsciente profundo. Podemos pensar em três vertentes principais: a Prática Clínica, os Laboratórios de Artes Sensoriais e a Formação do Futuro Arteterapeuta.

A ARTE CLÍNICA

SENSORIAL NA PRÁTICA

ARTETERAPÊUTICA

(O psicoterapeuta) é um acompanhante, ele é um parteiro é um testemunho, é quem dá passagem do que vai emergir, do que vai aparecer ... Anne Fraisse (Fraisse, Comunicação Oral ,2007).

Na utilização da Arte Sensorial numa abordagem arteterapêutica clínica, o sujeito pode escolher um objeto e explora-lo livremente ou recebe-lo das mãos do terapeuta. Pode ser massageado com os objetos ou tê-los pousados sobre o seu corpo. No momento em que o sujeito estabelece contato com o objeto, cria com ele relações através da textura do material em que toca, seu peso, seu tamanho, sua temperatura, sua sonoridade. Em alguns casos pode criar relações entre espaços preenchidos e vazios, através de massas que fluem. Os exemplos abaixo são demonstrativos do efeito da utilização da Arte Sensorial no processo da clínica arteterapêutica.

L. tem 39 anos de idade e 8 meses de processo psicoterápico comigo. Chegou com um diagnóstico de depressão e transtorno de ansiedade generalizada. Apresentava muita dificuldade de falar de sua história e trazia sempre a mesma queixa: cansaço, desânimo, “vontade de dormir para não acordar jamais”. Contou que ficou deprimida desde a morte de um namorado, há 12 anos atrás. A partir deste momento a vida perdeu o sentido para ela. Nos últimos dez anos, L. vive num pequeno apartamento no qual morava seu irmão gêmeo, falecido três anos antes de seu namorado. Seus pais deram o apartamento para ela e lhe dão algum dinheiro para que possa se sustentar. L. era advogada, mas largou seu emprego e perdeu o contato com os amigos nos últimos anos. Pouco saía de casa e tinha muita dificuldade de freqüentar qualquer reunião familiar. Dizia ter vergonha de receber pessoas em sua casa, mesmo as mais próximas, pois “a bagunça é tanta que mal consigo andar lá dentro” – contou-me. L. concordou em fazer terapia porque seu médico disse que se não buscasse psicoterapia diria a família dela o estado em que se encontrava. Ela disse não querer preocupar seus pais e, por isso, aceitou. Já passados alguns meses do início de sua terapia, chegou para um atendimento chorando muito, sem motivo aparente, se queixando de dor no peito e muita angústia. Pedi que fechasse os olhos e sentisse a sua respiração. Pousei as mãos sobre a área em que doía. Depois, quando percebi que ela foi se acalmando, muito delicadamente, retirei as mãos e coloquei sobre seu peito uma almofada de plástico em forma de coração recheada de tampinhas de refrigerante.

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Minha intenção era de que ela pudesse continuar a se acolher, mas entrando também no contato com a leveza do material. L. abraçou a pequena almofada e espontaneamente começou a explorá-la. Ficou com ela por longo tempo e, mantendo seus olhos fechados, pedi que falasse sua sensação neste contato. Ela disse que a sensação do plástico em formato de coração e seu conteúdo lembrava-lhe “coisas de criança”. Então, lembrou-se dela menina brincando. Pedi que ficasse no contato com a imagem e me dissesse o que aquela menina sonhava. L. se assustou com a pergunta, e com certa resistência compartilhou a forma com que via o mundo quando pequena. Ela partiu do Sentimento – a angústia localizada em seu peito – para uma Situação: a infância. Pedi, então, que representasse (Expressão) o que havia contatado. Pela primeira vez ela aceitou fazer algo com os materiais de artes plásticas. L. pediu que lhe desse lápis de cor e fez o desenho abaixo:

Disse que seus sonhos tinham ficado presos na infância e, por isso, fez questão de colocar grades, representadas com cola colorida azul. Essa experiência acordou o simbólico em L., reconectando-a com a imagem arquetípica da Criança Interior. Esta trouxe novas possibilidades e deu rumo ao seu processo terapêutico. Desde, então, estamos conseguindo olhar para a menina que sonhava e, aos poucos, L. vem “libertando” esses sonhos. Ela resgata o desejo de estar viva na medida em que os traz para seu cotidiano. Como resultado, conseguiu arrumar seu apartamento, contratou uma professora de música para lhe ensinar flauta, desejo que tinha na infância. Agora começa a vislumbrar a possibilidade de voltar a fazer alguma atividade produtiva. 28 | Revista de Análise Psico-Orgânica

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Os objetos sensoriais com os quais venho trabalhando são, por vezes, bastante simples, de fácil aquisição e manuseio. A disponibilidade do paciente para estabelecer o contato com estes, parece ser suficiente para a emersão de imagens inconscientes, como demonstra o fragmento do processo de uma menina descrito abaixo. N. tem 9 anos e está em psicoterapia há três anos. Num atendimento chegou muito agitada e dispersiva. Propus um trabalho corporal lúdico explorando os movimentos que realizava naturalmente: andar, pegar objetos e brinquedos, soltar etc. Aos poucos sua agitação cedeu e deu lugar a um grande cansaço. N. jogou-se sobre uma grande bola e ficou ali, num leve balanceio. Fiz, então, um percurso de massagem biodinâmica visando a contenção e o relaxamento (Palming). Ela escorregou para o chão e sentou-se, mantendo o apoio da bola. Disse querer ficar ali. Propus um jogo: coloquei uma venda em seus olhos para ela poder “sentir melhor” as coisas que eu ia lhe dando para explorar. Ela aceitou. Fui colocando em suas mãos alguns materiais e ela tateando um de cada vez. Pedi que falasse da sensação de cada um. Deixei-os ao seu alcance e pedi que buscasse sensorialmente aquele que ela achou mais interessante. Ela buscou um que disse que “espetava”. Trata-se de uma pinha. Começou a cheira-la. Disseme: “Eu conheço isso aqui... Faz muito tempo. Eu lembro do cheiro”. Incentivei-a a falar mais e ela então disse: “Tinha isso lá, há muito tempo. Ficava no chão, na terra, e eu pegava e colocava na boca ... Sabe eu lembro disso, mas eu "não lembro direito ”. Pedi que ela tirasse a venda e visse o que tinha em suas mãos. “É parecido com a que eu lembro, mas esse é mais aberto, eu acho”. Através da exploração sensorial N. caminhou na direção de uma vivência antiga: uma Situação. Em seguida perguntou: “Tem argila?”. Entreguei-lhe um pedaço de argila e ela começou a moldá-lo. Fez uma casa. N. lembrou da casa onde passou seus primeiros dois anos de vida antes de ser adotada. O cheiro da argila lembrou-a do chão de terra. Enquanto modelava, N. foi compartilhando suas lembranças. N. partiu para a Expressão através do material plástico. Muito surpreendentemente, ela já havia trazido suas memórias desse tempo em representações diversas em Sandplay4, mas sem a


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verbalização. Os dados que supostamente ela “não sabia” foram confirmados por seus pais adotivos. Foi a primeira vez que conseguiu nomear e falar abertamente sobre os flash de memória deste tempo. Chamou-a de: “A Casa de Muito Antigamente”.

No encontro seguinte, sentiu-se incomodada com aquela casa e resolveu pinta-la, trazendo novos elementos. Assim buscou restaurar a vivência de abandono e negligência vivenciada quando ainda era um bebê. Através das cores e dos objetos escolhidos para

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colocar dentro de sua casa, expressou uma tonalidade afetiva e se emocionou, chegando ao Sentimento. A vivência de imagens tão arcaicas é comum no trabalho com a exploração sensorial, pois “... o Inconsciente tem uma memória bastante presente do vivido. Mas também do não realizado. (Nele) existem situações simbólicas do Real e não só o Real” (Boyesen, Comunicação Oral, 2008). Trazer as imagens para o concreto através da arte facilita a elaboração, pois as representações revelam o que as palavras nem sempre são capazes de dizer. Possibilitam também a transformação do Real, permitindo que o não vivido, o não realizado, possa ser elaborado ao tornar-se matéria. E, assim, visualizado ganha forma, favorecendo uma futura integração. No caso acima, a menina reconhece a falta, mas pode buscar no hoje o que não teve em bebê, restaurando a experiência anterior. Já B. aos 45 anos, após vários processos psicoterápicos, buscou a arteterapia por sentir que “sabotava o trabalho terapêutico com as palavras”. Passou longo tempo explicando-me como usava “a racionalização como mecanismo de defesa” e desqualificando os processos psicoterápicos pelos quais já passara. Iniciamos seu processo revendo as muitas psicoterapias já realizadas e o que ele pôde se apropriar de cada uma delas. Na medida em que íamos re-criando estes processos com colagens, desenhos, histórias e dramatizações. B. contava-me fragmentos de sua história de forma não estruturada e em conexão com suas sensações e sentimentos. Forma bastante diferente da postura racional como me falou de si num primeiro tempo. Em um dos atendimentos B. chegou irritado. Disse que tinha muitas coisas para fazer, mas pouco tempo e isso o “enlouquecia”. Sendo divorciado passara o final de semana com os filhos e estes desorganizaram seu apartamento. Sua faxineira não aparecera e na tentativa de limpá-lo, menciona um objeto de borracha utilizado por ele, que associou umas bolas de borracha vazadas que tenho no consultório. Pedi que fechasse os olhos e coloquei a bolinha em suas mãos. Ele sentiu um incomodo explorando-a. Fui percebendo que enquanto mantinha o contato com

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o material seu corpo se contraía e sua respiração tornou-se suspensa.

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sua raiva e expressa-la, conectando-se com os sentimentos de vergonha e humilhação, bem como com a indignação frente à forma como seu pai lidava com os filhos. Amplificando a experiência, B. escolheu uma máscara sarcástica para representar seu professor.

Repentinamente, atirou a bola ao chão com força e com muita raiva. “Que droga. Essa coisa de novo”. Perguntei-lhe com o que ele tinha feito contato. B., bastante enfurecido, disse ter lembrado de estar na escola e errado um exercício de matemática. O professor apontou seu erro para todo o grupo e o desqualificou chamando-o de “aluno vagabundo”. Fez todo um discurso em torno da sua pessoa e de seus irmãos, dizendo-lhe que ele “não negava sua raça e a laia de onde vinha”. O fez apagar tudo o que tinha feito, inclusive outros exercícios que estavam corretos, pois achou sua letra muito feia. B. ficou com muita raiva e ao apagar os exercícios rasgou a folha sem querer. Enfurecido jogou o caderno no chão. O professor uma vez mais o desqualificou e o puniu deixando sem recreio para que pudesse pensar no que havia feito e após a aula mandou-o permanecer na escola e passar seu caderno todo a limpo. Castigo esse que durou várias semanas, pois estavam no final do ano e seu caderno com muitas páginas escritas. Escreveu também uma advertência em sua caderneta falando de sua indisciplina, que resultou numa surra dada por seu pai. Este era descrito por B. como “... um juiz que lidava com os filhos de forma autoritária, julgando seus atos pelos fatos sem ouvi-los e punindo-os severamente de acordo com a sentença que ele acreditava ser justa”. Aqui partimos do diálogo (Expressão) para a escolha do objeto sensorial. A textura do material trouxelhe um incômodo e uma grande irritação (Sentimento). B. pôde conectar-se com uma Situação antiga: a cena da sala de aula. Isso lhe permitiu contatar

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Uma outra representando seu pai em sua raiva, todo vermelho, visando um equilíbrio inalcançável, com “seu poderoso chapéu”.

E, por fim, um boneco de madeira encolhido sobre si mesmo representando o menino com medo e vergonha.

A partir dessa experiência, uma nova Expressão: o diálogo entre as máscaras e o menino. Surgiu a questão do porquê de sua auto-exigência tão grande e sua dificuldade em lidar com as figuras de autoridade. A lei não era vista como meio de proteção, mas sim de repressão e injustiça. A imagem arquetípica do pai se embolava com o complexo paterno negativo na figura do juiz-autoritário e que esbravejava com raiva, “sem jamais escutar” e do sarcasmo. As combinações entre os elementos da tríade a partir do que é explorado sensorialmente são muitas. Os exemplos acima ilustram algumas alternativas na exploração dos materiais.


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LABORATÓRIO DE ARTES SENSORIAIS A reinvenção da arte é condição para que ela possa intervir na transformação radical do homem e do mundo. Assim fazendo estaria realizando e ultrapassando as categorias de arte, tornadas categorias de vida, seja pela estetização do cotidiano, seja pela recriação da arte como vida Celso Favareto (Favaretto apaud Lima, 1997 – p. 17)

Os espaços interativos de Artes Sensoriais Temáticos e Livres favorecem a experiência de um ambiente transformável no momento presente, através de diferentes estímulos provenientes do contato com objetos dos mais diversos. O sujeito em interação não é espectador da obra, mas sim criador, na medida em que faz uso do objeto com o qual interage. Na criação de Laboratórios ou Salas de Artes Sensoriais na prática arteterapêutica, o foco inicial é a Situação: a experiência exploratória, a partir das sensações. Cria-se, para tanto, um espaço interativo, onde o sujeito possa experimentar no aqui e agora, um ambiente transformável através de diferentes percepções provenientes de espaços preenchidos e vazios, densidades variadas, luminosidade e sombras, movimentos, ritmos, estímulos sonoros, olfativos e gustativos.

Espaço de Artes Sensoriais: Tipologia Junguiana: Sala dos Pensamentos. I Simpósio Brasileiro Corpo e Artes, RJ, 2008.

Espaço de Artes Sensoriais: Tipologia Junguiana: Sala das Sensações. I Simpósio Brasileiro Corpo e Artes, RJ, 2008.

Espaço de Artes Sensoriais: Tipologia Junguiana: Sala da Intuição. I Simpósio Brasileiro Corpo e Artes, RJ, 2008.

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As experiências sensoriais são organizadas de forma a enfatizar a estimulação tátil, proprioceptiva, vestibular, visual, olfativa e auditiva, tendo o intuito de favorecer a aquisição de conhecimentos mais adequados sobre si mesmo e do meio em que vive (integração do esquema corporal, noções espaçotempo, consciência corporal, percepção etc). Eles “... recorda-nos as proposições construtivas da fase sensorial” (Fabbrini, 1994 - p. 200).

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Para tanto, a qualidade do objeto se faz essencial, estabelecendo uma dialética entre real e imaginário, mundo externo e interno, e acionando no momento presente da experiência, a memória afetiva e o universo simbólico. Desperta inúmeros Sentimentos. Passa-se, então, para a Expressão: por meio do som, do movimento, da pintura, da encenação, da criação literária ... Pelos muitos instrumentos que os diversos canais artísticos oferecem, possibilitando tanto a emersão de uma questão emocional de forma concreta, como o se deixar tocar emocionalmente pelo material que emerge do inconsciente.

Espaço de Artes Sensoriais. I Encontro de Arteterapeutas do Mercossul, 2005, RJ. Espaço de Artes Sensoriais. I Encontro de Arteterapeutas do Mercossul, 2005, RJ.

Espaço Temático de Artes Sensoriais: Tipologia Junguiana: Sala dos Sentimentos. I Simpósio Brasileiro Corpo e Artes, 2008, RJ.

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O espaço possibilita o estudo das relações entre o modo como nos percebemos e a forma como enxergamos os outros, discutindo a identidade de cada um no percurso proposto a partir do contato com os diferentes materiais espalhados pelo espaço físico. Sua utilização acontece livremente sob o olhar e a escuta de terapeutas qualificados que acompanham o grupo na intenção de facilitar e dar continente para o processo que se desencadeia no espaço. O terapeuta assume a postura de testemunha da exploração livre, favorece a sensibilização e, pode, se necessário, e de acordo com a demanda, intervir de forma precisa, facilitando a reflexão e o autoconhecimento. Mantendo a mesma proposta, a partir da necessidade de um grupo, pode–se criar espaços com temáticas específicas, de acordo com demandas prévias,


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favorecendo trabalhos com dinâmicas relacionais e institucionais.

A ARTE SENSORIAL NA FORMAÇÃO DO FUTURO ARTETE-

A vivência do processo de criação dentro de um contexto que faz atravessar-se mutuamente a arte e a saúde, promove uma abertura de canais criativos e da sensibilidade que se ampliam para além do universo da arte e se estendem aos acontecimentos cotidianos, enriquecendo-os (CASTRO, 2001).

Experimentar algo significa, então, atravessar para o lado de lá, em direção àquilo que não somos. E vice-versa. Pois não há dúvidas de que nos transformamos na razão direta daquilo que experimentamos.

Assim, em instituições asilares, o enfoque voltase para o trabalho grupal e para as formas de sociabilidade e culturais que acontecem quando pessoas compartilham lugares comuns. O Laboratório de Artes Sensoriais, neste caso, é um espaço que privilegia a elaboração e a articulação de todas as experiências vividas tanto no campo institucional, como fora dele. Visando assegurar a qualidade do trabalho, é importante contar com uma equipe interdisciplinar, favorecendo a troca e o estudo do processo grupal. Cabe aos terapeutas não só acolherem os sons, as falas, as formas, os atos, articulando-os e devolvendo-os para o grupo, mas também estabelecer a ponte entre um sujeito e outro, valorizando sua presença, falas e ações, buscando junto um sentido para o que ocorre no espaço. Sua escuta deve estar aberta a expressão em todas as suas formas e possibilidades, para que ele possa acolher uma “... linguagem muitas vezes sem palavras” (CASTRO, - 2001), respeitando a "... delicadeza do que é pré-verbal, não verbalizado e não-verbalizável, exceto, talvez, na poesia” (Winnicott, apaud Lima, apaud Costa e Figueiredo, 2004, 59 – 81). “A partir da escuta, essas produções podem tornar-se linguagem, instituir canais de troca e encontro, criar novos universos existenciais” (Lima e Figueiredo, 2004, p. 59 - 81). O desdobramento da vivência no Laboratório mostra que a exploração terapêutica destas produções redimensiona o campo clínico, trazendo atravessamentos institucionais, culturais e sociais. A representação individual é parte de uma coletividade. Faz-se necessário associar a prática clínica à prática psicossocial. O trabalho arteterapêutico nestes contextos abre espaço para a aprendizagem, a produção, o intercâmbio, a ampliação das relações, o mergulho no universo sociocultural.

RAPÊUTA

Agnaldo Farias (Farias, W. 11, 1994)

A formação de arteterapeutas tem além do caráter teórico-prático, o vivencial. Focaliza o desenvolvimento do processo criativo, aguçando a sensibilidade, explorando a criatividade e sua expressão, a fim de preparar o aluno para lidar com seus próprios conteúdos conscientes e inconscientes, para posteriormente poder acompanhar um outro em seu processo. Sendo a Análise Psico-Orgânica um dos pilares teóricos que utilizo na Formação de Terapeutas em Arteterapia, a tríade Sentimento, Expressão e Situação (SES) é transmitida e as possibilidades de trabalho com esta abordagem bastante explorada. Quando associada diretamente ao trabalho com Artes Sensoriais, o trabalho caminha em três direções complementares:  experiencial – através do contato com os materiais visando a sensibilização, do mergulho no inconsciente e na vivência da amplificação dos conteúdos emergentes através dos mais diversos canais expressivos;  teórica – com o estudo do efeito da experimentação dos objetos, suas possíveis aplicações, estudos de casos, leitura de textos sobre o trabalho com a Arte Contemporânea, correlação entre os conteúdos emergentes e leitura simbólica;  exploratória – onde o aluno, a partir do estudo dos efeitos do trabalho sensorial, é solicitado a criar um objeto para utilização no grupo. Os alunos são também convidados a participar de exposições de arte contemporânea, realizando associações entre o conteúdo dado e a experiência individual e coletiva no manuseio dos materiais.

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Notas 1. Em Análise Psico-Orgânica, entende-se por Situação a projeção do sujeito sob o meio externo. 2. “Refere-se à experiência de impressões e de expressões sensoriais”. (Boyesen, Tome 5, 1999). 3. Tabuleiro de areia.

Bibliografia

Aluna do Grupo de Formação de Terapeutas em Arteterapia, explorando a instalação “Minas” da artista plástica Amélia Toledo. Exposição “Novo Olhar": Museu Oscar Niemeyer, Curitiba: 2007

Aluna do Grupo de Formação de Terapeutas em Arteterapia, explorando a instalação “Ressurgência” da artista plástica Amélia Toledo. Exposição “Novo Olhar": Museu Oscar Niemeyer: Curitiba, 2007. Museu Oscar Niemeyer, Curitiba: 2007

Têm a possibilidade de tocar, apalpar, manipular, escutar, percorrer, contemplar, fluir, perceber ... Entrar em contato com as propriedades formais e materiais. Assim experimentam texturas, pesos, equilíbrios, tamanhos, temperaturas, densidades, sonoridades, durezas, maleabilidades, opacidades, transparências, translucidez, reflexibilidades, movimentos ... Museu Oscar Niemeyer, Curitiba: 2007. Enfim: as muitas qualidades das coisas que afetam e aguçam os sentidos, favorecendo a percepção de si, a interiorização, a descoberta e a reflexão. 34 | Revista de Análise Psico-Orgânica

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