Açores percursos pedestres

Page 52

102

FIOS DE LENHA Os fios de lenha, na época em que surgiram, eram na realidade vias de alta velocidade para transporte de materiais. Um arame preso num ponto alto da encosta, ou no cimo da mesma, era estendido e esticado até à fajã. Com recurso a um sistema rotativo, que faz parte da estrutura existente na base do fio, era dada tensão ao arame elevando-o no ar. O material era então feito deslizar pelo fio, sem controlo de velocidade. Um feixe de lenha junto à base (e mais recentemente pneus) servia para amortecer o choque da chegada. A sua principal utilidade era servir para o transporte de lenha, cortado aos matos da vertente. Mais recentemente alguns fios foram utilizados para transportar outros materiais, nomeadamente para a construção e reparação de casas, botijas de gás e não só. Na Fajã dos Bodes conseguem-se encontrar em número bastante significativo e apesar da mesma base de funcionamento, apresentam variações estruturais de uns para os outros. Na sua grande maioria estão hoje abandonados.

Tenha atenção ao pisar as pedras da ribeira, habitualmente escorregadias. Continue a subir... e a subir. Quando o chão se tornar mais plano, logo adiante, observa pela 1ª vez a Fajã de São João. Está a entrar nos Lourais, como o indiciam as hortas, a espadana, as sebes de buxo, criptomérias e hortênsias. A saída é num caminho de penetração que parece ter sido aberto para cortar e retirar madeira. Continue um pouco mais até chegar à estrada de asfalto e às casas dos Lourais... agora é sempre a descer. Após a última casa passa o chão novamente a terra batida e bagacina enquanto se aproxima do vale cavado pela Ribeira do Salto. Por aqui foi captada e canalizada água através de um tubo preto que o vai acompanhar boa parte da descida. Esta vereda leva-o até à Fajã de Além (não confundir com a Fajã de Além da costa Norte, onde há outro Percurso Pedestre), a meio caminho da de São João. Durante a descida, fácil mas com pedras soltas a fugirem debaixo das botas, encontra vinha nas cotas mais

103

elevadas e muitos pássaros a chilrear. O resto é paisagem... de grande beleza, com a fajã que o espera a marcar continuamente presença à sua frente. A vereda alarga-se, o piso melhora... permitindo a chegada de carrinhas que vêm buscar a uva, que para alguns devia ser apertada aqui mesmo... a fazer fé na prensa que ainda se vê em pelo menos um dos “palheiros” ao lado do caminho. Depois de passar a enseada onde desagua a Ribeira de São João (dizem-me que a maior da ilha, de caudal permanente e onde vivem eiroses - uma espécie de enguia), adornada por uma praia de rolo, numa zona onde o mar parece vir lavar com o seu bafo os taludes da encosta, entra na Fajã de São João. As primeiras casas e uns grandes salgueiros esperam-no à entrada. Resta-lhe, para o fim do percurso, 700 m de fajã, feitas no caminho principal que serve os moradores, com o chão nalguns troços em calçada portuguesa de paralelepípedos, com ruas por vezes estreitas e casas com pormenores de arquitectura rural, de valor bem evidentes. O percurso termina num chafariz de 1896 junto à Ermida de São João, de 1762, que poderá visitar, bastando para tal perguntar pela Dona Judite no Café e Mercearia Águeda mesmo ao lado. Se precisar, o dono da mercearia faz serviço de táxi, havendo ainda telefone que poderá usar se necessário. Mate a sede e aproveite para dois dedos de conversa... ou três.

FAJÃ DE SÃO JOÃO A Fajã de São João pertence à freguesia de Santo Antão, sendo uma das maiores fajãs da costa sul da ilha de São Jorge. Muito abundante em água, com uma ribeira de caudal permanente que forma grandes cascatas na sua descida pela arriba e com um clima local diferenciado, mais ameno, foi possível habitar em permanência esta fajã desde 1560, data em que aparecem as primeiras referências aos seus moradores. A fajã foi severamente atingida pelos desmoronamentos causados pelo grande tremor de terra de 9 Julho 1757 (que ficou conhecido popularmente como o Mandado de Deus), tendo grande parte da sua população ficado soterrada sob imensas derrocadas, as quais ainda hoje são bem visíveis na encosta e ao longo

da costa. Contabilizaram-se, só em São Jorge, 1053 mortos “sepultados nas ruínas” e mais tarde com os desaparecidos e feridos que vieram a perecer o número subiu para cerca de 1500 pessoas. Reconstruída, foi novamente atingida com gravidade pelo terramoto de 1 de Janeiro de 1980, que voltou a semear a destruição no lugar. Tinham fama os seus vinhos, mas era também conhecida pelas boas produções de figos, nozes, laranjas, maçãs, castanhas, ananases e café. Algumas dessas culturas ainda se fazem, de forma mais descuidada, a par das hortícolas para auto subsistência, com destaque para o vinho jaquê, aguardente de nêspera, figos e também café embora sem expressão económica. Hoje a Fajã de São João é um importante local de veraneio.


Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.