RelevO - Abril de 2020

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Apocalipse se revela viral da Google Vitor de Lerbo

Auditório vazio, plateia vazia, planeta vazio. Pouco tempo antes da premiação mais badalada da publicidade, ninguém tinha dúvidas sobre quem levaria o leão de Cannes – até porque não havia mais ninguém. Com um insight genial atingindo em cheio seu público-alvo – as 7 bilhões de pessoas na Terra –, a ação da Google (no feminino mesmo) gerou altíssimo engajamento de Deus, Hades, Anúbis e a porra toda. Afinal, não é todo dia que se faz o Apocalipse. Liderada por John Book, Head de Marketing da agência Inner Catastrophe e agora escritor de novidades sobre prêmios publicitários, a campanha “Consumismo nunca mais” surgiu como uma arrojada proposta sustentável, pronta para gerar mudanças reais e significativas no nosso day-by-day. Book é o único sobrevivente do Apocalipse, e agora revela – para ninguém ler – que todo aquele pandemônio (incluindo o literal Pandemônio) não passava de um viral da Google. “A Google sempre foi pioneira em mudanças positivas, bem como em tecnologias que influenciam e facilitam as relações interpessoais. E depois da nossa ação, ninguém precisa mais de celular pra se comunicar!”, explica um virtuoso John, que já havia sido indicado ao mesmo prêmio em razão da emocionante campanha “Em nome do Amor – Por que não lamber um corrimão?”.

Além de livrar as principais cidades do mundo de seu trânsito caótico, erradicar todas as doenças que afetavam os seres humanos e, principalmente, libertar todas as pessoas das angustiantes conversas de elevador, o Apocalipse da Google preveniu desmatamentos, despoluiu rios e oceanos e, de quebra, evitou ainda mais maus-tratos contra os animais – que por sua vez jazem todos mortos. “Em todos os nossos meetings, a sustentabilidade sempre foi o nosso goal. Quando shootamos a campanha, percebemos que ela seria top of mind por milênios!”, constata o pioneiro Book. Mesmo com um crono apertado, a agência foi capaz de mover montanhas para alcançar suas metas. Mas, é claro, a campanha ainda não acabou: tão importante quanto a ação é o pós-venda. “Nós selecionamos, via quiz no Insta, as 365 cidades mais votadas para que, agora, em cada dia do ano, você possa acessar a Google e conferir os melhores takes do Apocalipse ao redor do globo! E tem uma cidade surpresa pro próximo ano bissexto, fica ligado!”, complementa, com acuidade ímpar, Book. Curiosamente, seu plano foi previsto pelo episódio 7.394 de Os Simpsons, conforme aponta descoberta recente de um ciborgue lituano, também programado por John Book, que reclama de tédio. “Tá tudo meio que super boring”.

O objetivo da marca sempre foi o de criar uma campanha perene em meio a uma realidade tão mutável. “Bauman diz uma coisa que eu concordo muito – o amor é líquido. Ele também diz que a realidade, assim como o medo, é líquido. E eu concordo. E adivinha? A publicidade, até a nossa ação, também era líquida. Nós fomos a ruptura rs”. Você pode até achar que John Book deseja todos os holofotes após extinguir a raça humana. Mas o publicitário superstar é singelo ao narrar as próprias realizações. “Nada disso seria possível sem os protagonistas da nossa campanha, os dois cavaleiros e as duas amazonas do Apocalipse. Eles são as grandes estrelas da ação – sempre destacando a igualdade de gênero no nosso Armagedom. A diversidade é essencial no fim dos tempos”. O casting para o extermínio em massa não foi fácil: era essencial que a marca gerasse um buzz desde o início da ação. “O maior flash mob da história precisava de brilho! Então a primeira dama do Apocalipse foi a publicidade em si – óbvio. O segundo cavaleiro foi o irmão gêmeo dela, aquele que vive entre tapas e beijos com a publicidade, mas, quando eles conseguem falar a mesma língua, olha, haja destruição! Tô falando do marketing, claro. A outra dama, Sales, foi nossa razão de viver – porque quem está nesse ramo e não

pensa em Sales nem deveria estar aqui! Por último, pra garantir que ninguém saísse vivo, veio o Comercial – e tudo que ele cobrou pra participar foi 30% do lucro da campanha e um jantar grátis no Fogo de Chão!”, salienta o estrategista Book. Não bastasse ser o principal idealizador, planejador, entusiasta, executor e fã da campanha, Book oferece uma explicação lógica para ter sido o único sobrevivente do Apocalipse. “Parece que nem o pessoal de cima nem o de baixo estava preparado para essa alma aqui rs. Bom pro planeta; agora 100% da população da Terra tem bom gosto musical!”, afirma o antenado John, em um mundo em que Air Supply finalmente recebe seu devido valor. Sem competição no planeta, a agência de um homem só já estuda os próximos passos para a gigante americana. “A Terra era pequena demais para a Google; acho que nossa agência captou isso com perfeição. Agora podemos alçar voos mais altos e buscar nosso lugar ao sol – tipo do Sol mesmo –, já pensou que louco?”. Não perca o próximo Festival de Publicidade de Cannes, que marca o retorno do Gênesis aos palcos. A cerimônia acontece daqui a uns 4 milhões de anos, quando a nova humanidade, toda herdeira do formidável saco escrotal de John Book, já tiver repetido o ciclo da anterior.


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