Ora Pro Nobis Setembro/Outubro 2015

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Jornal Laboratório do Curso de Comunicação Social - Jornalismo da Universidade Federal de São João del-Rei | Setembro / Outubro de 2015 | Nº 17

CRÔNICAS Um passeio pelo universo das histórias de ficção e pelas cidades que nos abraçam | PÁGINA 2

ENSAIO FOTOGRÁFICO Mãos que eternizam a cultura local em peças de estanho, madeira e cerâmica | PÁGINA 8

Um bom lugar para morar A reação do mercado imobiliário são-joanense diante da grande procura dos estudantes

A história são-joanense de Telê Santana Um dos símbolos do esporte nacional teve um dos capítulos de sua história escritos em São João del-Rei. PÁGINA 6

Os caminhos da educação na pós modernidade O professor Michel Maffesoli, da Souborne, discutiu em palestra no Campus Dom Bosco os novos rumos da educação na atualidade. PÁGINA 7

Foto: Sara Paiva

Foto: Vanessa Carolina

Com o crescimento da população acadêmica da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), a cidade e a instituição adequam suas infraestruturas para acolher novos moradores. A expansão da UFSJ nos últimos 13 anos, que contou com a criação de novas unidades educacionais, implantação de novos cursos presenciais e à distância, gerou um total de 13 mil alunos matriculados. A partir daí, surgiu a necessidade de adequar a cidade para acolher os novos universitários. Investimentos foram feitos no setor imobiliário e de construções, principalmente de prédios, quitinetes individuais e novas repúblicas estudantis. PÁGINAS 4 E 5 VIDA DE UNIVERSITÁRIO Longe de casa, os estudantes encontram o desafio de encontrar um novo lar

Ciclovia na Leite de Castro abre o caminho para a mobilidade Uma iniciativa promovida pelo curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSJ trouxe uma intervenção na Avenida Leite de Castro, em São João del-Rei, para mostrar alternativas para o tráfego através do transporte cicloviário. O projeto, que recebeu o nome “Bike na Leite”, levou até a avenida uma ciclovia temporária. O projeto durou apenas um final de semana, mas mostrou a necessidade de se repensar a mobilidade urbana no município. PÁGINA 3


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poema

E só

CRÔNICA

Te contar uma história... Por Maria Carolina Dias

Eu, que aqui estou por ti não espero nem te peço o que não podes o que não posso Mas, se te tenho perto te trago logo pro meu deserto onde choves, onde molha és raio, trovão e, ao mesmo tempo, sol de verão Um instante eterno que é sempre passageiro momento derradeiro casais em cama de solteiro Flávia Borges

Charge

Expediente Jornalista responsável: Chico Brinati (MTb/MG:10.568) Chefe de redação: Mayara Mateus Assistente de redação: Sarah Evelyn Editor de arte e diagramação: Bruno de Oliveira Edição: Tawane Cruz e Daniele da Gama Analista de mídias digitais: Iara Furtado O Ora-Pro-Nobis, jornal laboratório do curso de Jornalismo da Universidade Federal de São João del-Rei (UFSJ), é distribuído na cidade de São João del-Rei-MG, bimestralmente, com tiragem de mil exemplares, impressos na Gráfica da UFSJ. Fale com a redação: jornal.orapronobis@gmail.com

Quem se lembra de La Fontaine? Das aulas de literatura, talvez. Ou de rodapés de livros como “A lebre e a tartaruga” e “A raposa e as uvas”. Jean de La Fontaine foi um escritor francês, considerado um dos pais da fábula moderna. Interessantíssimo, claro, mas não é por isso que gosto dele. O que eu acho mais legal de La Fontaine é uma frase de sua autoria: “Se quiser falar ao coração dos homens, há que se contar uma história.”. E ao chegar no coração, lá elas fazem morada. Existem histórias que nos marcam para sempre. A primeira visita de Harry à Hogwarts, na saga “Harry Potter”, de J. K. Rowling. A morte do Portuga em “Meu pé de laranja lima”, de José Mauro de Vasconcelos. O retorno de Simba em “O Rei Leão”. Essas aí são famosas. Clássicas, até.

Mas aquelas que não ganharam páginas em livros ou telas de cinema são tão importantes quanto. Somos todos compostos por mais de duzentos ossos, uma porção de músculos, não sei mais quantos órgãos. E também somos compostos de histórias. Aquela cicatriz no joelho depois de um tombo de bicicleta é uma história. Aquele peso nos ombros da dor de um adeus é uma história. A falta de ar depois de uma boa gargalhada também é uma história. E todos nós, sem exceção, vivemos para ouvi-las e contá-las. Não é fácil admitir isso depois de uma certa idade, quando a coisa mais importante do dia deixa de ser chegar da escola e ir brincar. Mas a afirmação também vale após os quinze, os vinte, os sessenta. Quando você sai da casa dos pais e vai morar em uma república, você quer fazer sua própria

história. Quando você vibra com a vitória do seu time, você lê uma história. Quando você compra uma bela taça de estanho, leva pra casa o eco de suspiros e mãos calejadas que deixaram ali um pouco de sua história. Quando alguém conta sua história, é um pedacinho de sua alma que ela está dando de presente. E é preciso carinho e sabedoria para poder ouvir. Mais ainda pra entender que uma história pode estar num olhar, numa lágrima, numa aula de matemática, num passeio de bicicleta, numa matéria do jornal. E que esse é o nosso combustível primordial. Porque, com a licença poética dada aos contadores de histórias, ouso contrariar Sherlock Holmes, que disse “Eu sou um cérebro, Watson. O resto é mero apêndice”. Desculpe, Holmes, mas eu sou muitas histórias.

CRÔNICA

Os lugares que nos habitam Por Sarah Rodrigues O que há de ancestral em nós uma hora grita. Da terra do Divino eu vim: cidade que se formou porque ali estenderam linhas de ferro, homens trabalhadores em suor e fuligem. Quando veio a crise, as mulheres protagonizaram a cena: teceram roupas e lençóis para os maridos venderem. E olhem só: hoje Divinópolis é pólo confeccionista do interior do estado. Meu avô era pobre alfaiate, artesão de ternos e calças sociais, famigerado Zé Alfaiate. Minha mãe, ninguém afirmaria que daqueles dedos rústicos saem peças tão delicadas: vestido, saia, blusinha. Minha terra é de Adélia, de rio Itapecerica, da Catedral amarela que se ergue e abraça seus mais de 200 mil habitantes.

E onde eu vim parar? Na rigidez desta terra de escravos e ouro, onde o soar dos sinos te sobressaltam de madrugada. Onde as pedras das ruas estreitas ocultam as mais embriagadas histórias universitárias. Eternas senhoras rezadeiras vão desfiando rosários enquanto eu penso que, se vim para cá, é porque o que mais envolve-me e enche de vida é escrever, e por isso curso Jornalismo aqui. Os trilhos do acaso me trouxeram à São João, onde reza a lenda que nasceu à aptidão para as letras da família. Dona Ritinha, rígida e avançada senhora para seu tempo sabia escrever: elaborou carta pedindo transferência do marido soldado para terras que não fossem

essas são-joanenses. E lá se foram eles, carregando para Divinópolis minhas origens: dona Ritinha e marido são meus bisavôs, pais de Zé Alfaiate, sogro de Sueli, minha mãe costureira. Não teci peças do vestuário, mas faço das minhas letras tramas infinitas. Mal aprendi a dar pontos, mas remendo diariamente com as palavras, os sentidos que encontro por esse mundo, dando seguimento aos passos de dona Rita. Em coincidências não acredito. São João del-Rei me espreitava desde sempre, atraindo-me com as doces sedas de sua trama histórica e barroca no momento exato de me trazer para cá.


Foto: Isabela Campos

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Ponto de partida O crescimento desordenado do tráfego gera busca por alternativas na histórica São João del-Rei ANA RESENDE QUADROS LAYS VIEIRA SARAH RODRIGUES

to estreitas, uma ciclovia fixa com o trânsito dos dias de semana aqui na Leite seria inviável.” Ela completa que um estudo mais aprofundado seria necessário. Os que costumam andar sobre duas rodas e puderam desfrutar da ciclovia temporária também concordam que as bicicletas não podem interferir no trânsito. “Acho viável a ciclovia no canteiro. Na rua ela disputa espaço com o carro”, afirma Marco Túlio Ribeiro, que costuma usar sua bicicleta apenas para o lazer. Sobre a instalação da via de maneira definitiva, ele afirma: “Já fui para o trabalho algumas vezes de bicicleta e iria mais vezes se houvesse a ciclovia, principalmente em dias mais amenos”. Quando falamos em mudanças em uma cidade histórica, como é o caso de São João del-Rei, esbarramos no órgão responsável por

cuidar do patrimônio histórico, o IPHAN. Todas as decisões devem passar por ele, o que torna algumas medidas inviáveis. Mas pequenas modificações como essa podem trazer resultados para melhorar o cenário do trânsito.

Foto: Marina Ribeiro

Utilizar o transporte público e a bicicleta pode e deve se tornar um hábito. Pensando nisso, alunos do curso de Arquitetura da Universidade Federal de São João del-Rei, A estrutura sob coordenação da professora Clarissa Cordeiro de Campos, realizaA histórica São João del-Rei ram a ação “Bike na Leite”, nos dias conta atualmente com 85 mil habi19 e 20 de setembro. Foi implantada tantes, segundo dados do IBGE. Já uma ciclovia temporária na Avenio Departamento Nacional de Trânda Leite de Castro, como primeiro sito (DENATRAN) informa que 46 passo para uma ação mais efetiva. mil veículos estão cadastrados no A pista funcionou no fim de semamunicípio. Ou seja, para cada dois na das 8h às 14h. A intervenção, habitantes há um veículo: quase que também fez parte das ações o dobro da média nacional. Lemda Semana Nacional do Trânsito, brando que, nesta estatística, não integrou as ações do estúdio Urbaentram os veículos flutuantes, que nismo Tatico na Leite, que objetiva se deslocam de cidades próximas a realização de um projeto de ciclotodos os dias. vias para a cidade, tendo como foco a melhoria da mobilidade urbana. “Os projetos da Arquitetura sempre buscam envolver ciclovias porque nós alunos do CTAN sentimos muito a falta delas”, comenta Elisa Bomtempo, aluna do curso. Ela explica que o horário dos ônibus - de hora em hora - reforça ainda mais a necessidade desta alternativa. A intervenção contou com o apoio da Polícia Militar. A tenente Michele Leão comentou sobre a viabilidade do projeto: “Infelizmente as vias de São João são mui- ALTERNATIVA Intervenção possibilita o uso da bicicleta como meio de transporte

A cidade tem mais de 300 anos, com algumas vias de pedra, pequenas, que não foram projetadas para automóveis. E devido à grande quantidade de veículos, o trânsito é caótico. “Alguns trabalhadores estacionam os carros no início da manhã e só voltam no fim da tarde”, afirma o membro do Conselho Municipal de Trânsito, Ronaldo Cipriani. Mas, segundo ele, agora a situação será diferente. Com a municipalização do trânsito, a responsabilidade de cuidar dessas questões agora é do município. “Assim, nós temos a possibilidade de fazer um estacionamento rotativo no centro. Com ele, é proibido usar a vaga por muito tempo e, se usar, terá que pagar.” Medidas educativas também têm sido tomadas para a melhoria do tráfego. A Semana Nacional do Trânsito, que teve como tema “Seja você a mudança no Trânsito”, aconteceu entre os dias 18 e 25 de setembro. Em São João del-Rei os agentes responsáveis - Polícia Militar, Prefeitura, Auto-Escolas e Escolas – criaram uma programação de conscientização e foram também distribuídas cartilhas nas escolas municipais e estaduais. “Eu, como pai, sei como meu filho fala: ‘Papai, o cinto’. Por isso nós levamos a educação no trânsito para as escolas, fazendo condutores melhores no futuro”, relata Cipriani.


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Quem passa, quer casa Como os novos estudantes enfrentam o dilema de conseguir um lugar para morar em São João del-Rei com a expansão universitária CLÁUDIA MARIA DÉBORAH VIEIRA MARIANA VERÍSIMO VANESSA CAROLINA THOBIAS PEREIRA

MORADIA ESTUDANTIL Uma opção para estudantes de baixa condição eco Foto: Ruana Santa Rosa

Entre casarões e repúblicas, é assim que se vive o cotidiano em São João del-Rei. Com a expansão da UFSJ nos últimos 13 anos, a criação de novas unidades educacionais, implantação de novos cursos presenciais e à distância, gerando um total de 13 mil alunos matriculados, surgiu a necessidade de adequar a cidade para acolher os novos universitários. Investimentos foram feitos no setor imobiliário e de construções, principalmente de prédios, quitinetes individuais e as repúblicas foram se formando. Uma pesquisa do ano de 2012, feita pelo Curso de Economia da UFSJ sobre o perfil sôcio-econômico dos universitários residentes em repúblicas, verificou um total de 495 imóveis ocupados por esse público. Na análise foi ressaltada a preferência dos universitários pelas moradias em apartamentos, devido a procura por quartos individuais e lugares com menor número de pessoas, além das repúblicas especificamente femininas, que priorizam a segurança nesse tipo de imóvel. A coordenadora do curso de economia, Daniela Raposo, é uma das professoras responsáveis pela pesquisa. Para ela, a necessidade do estudante em encaixar o valor do aluguel nos gastos faz com que os universitários

procurem cada vez mais dividir as moradias. É o caso do estudante do curso de Arquitetura e Urbanismo da UFSJ, Arnaldo Augusto, que optou por morar em uma república durante o período da faculdade: “A localização também influenciou na escolha”, conta. O mercado imobiliário são-joanense é livre de regulamentaçoes e tem consumidores suficientes para atender a demanda, fazendo com que proprietários e imobiliárias taxem as residências como preferirem, como informa Daniela Raposo: “O mercado imobiliário de São João del-Rei não tem uma associação e não está ligado a nada. É um mercado de livre-iniciativa.” A falta de planejamento adequado de construção civil também é reconhecido pelo corretor de imóveis, Marcelo de Carvalho Santos, que atua na profissão há 20 anos: “Há uma grande demanda [na procura de imóveis], entretanto há dificuldade em atender tudo o que os estudantes necessitam. São João del-Rei não possui uma política voltada para locação de imóveis, que acolha e supra as demandas dos universitários, professores e trabalhadores que chegam”. O público universitário representa expressivos 20% das locaçoes imobiliarias, entretanto ainda há receio e certa resistência em alugar para esse público já que parte dele faz mal-uso dos imóveis.

COTIDIANO Repúblicas são locais de convivência e aprendizado

Com a expansão da UFSJ nos últimos 13 anos, surgiu a necessidade de adequar a cidade para acolher os novos universitários.

O número só não aumenta porque muitos pais optam por comprar o imóvel através de financiamento, conforme informa Celso Júnior, corretor. “ O valor que seria pago no aluguel, eles pagam num financiamento. Em 5 ou 6 anos, conseguem o retorno do investimento, por conta da valorização do mercado dos imóveis.” Ainda segundo o corretor, a procura pela compra de imóveis por universitários representa uma parcela de 10% em São João del-Rei.


5 Foto: Mariana Veríssimo

conômica, que procuram um local para viver durante a vida acadêmica na UFSJ

Estudantes da UFSJ também podem contar com a moradia estutandil Completando um ano de funcionamento, a moradia estudantil da UFSJ, localizada no Campus Tancredo Neves (CTAN), não preencheu todas as vagas oferecidas nos últimos editais. Para conseguir o benefício, o aluno que o desejar, precisa passar por um processo de avaliação sócioeconômica através da equipe de assistência social, e da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis, a PROAE. Esse processo tem o objetivo de identificar o Foto: Jederson Rosa

OPÇÕES DE MORADIA São 495 imóveis ocupados só por estudantes na cidade de São João del-Rei

estudante em situação de vulnerabilidade socioeconômica, garantindo a igualdade de tratamento e de acesso a todos os Programas de Assistência Estudantil da UFSJ. Atualmente, o prédio conta com a presença de aproximadamente 40 alunos. O estudante de Engenharia Elétrica e representante dos moradores, Lucas Oliveira, afirma que a infraestrutura é um dos pontos positivos: “Os apartamentos são todos mobiliados e bem equipados, ainda não faltou lugar para ninguém e a segurança também está sendo garantida”. Os estudantes que não optarem pela Moradia tem a oportunidade de receber uma verba para auxiliar no custeio do aluguel em outro local. Segundo o Diretor da Divisão de Assistência e Ações Afirmativas (DIAAF), José Ricardo Braga, a distância e, por consequência a dificuldade de locomoção, são os principais fatores para a evasão que houve no preenchimento das vagas disponíveis. “Muitos alunos optam pela verba, pegam esse auxílio e acabam morando em república, dividindo as contas com mais pessoas e conseguem se manter do mesmo jeito”, completa ele. Lucas conta que os moradores estão em busca de soluções para o problema do transporte, principalmente para quem estuda nos outros campi da cidade (Campus Santo Antônio e Campus Dom Bosco) e tem dificuldade de retornar ao término das aulas noturnas. “Uma solução seria a disponibilização de ônibus intercampi para acompanhar o horário das disciplinas”, conclui.


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Mestre Telê e sua trajetória em São João del-Rei Treinador com passagens pela Seleção Brasileira teria começado a carreira de jogador em clube da cidade CRISTIANO GIOVANNI DIEGO GABRAL JOÃO HENRIQUE CASTRO

Quem poderia imaginar que um dos maiores técnicos da história do futebol mundial saiu de um campo na Avenida Leite de Castro? O franzino garoto Telê Santana da Silva foi jogador e filho do fundador do América de São João del-Rei. Aos 18 anos, foi para o Rio de Janeiro e começou uma das mais ricas trajetórias do futebol brasileiro. Nascido em Itabirito, em 1931, Telê foi criado pela tia. Com o falecimento de dona Maria Faustina da Silva, o garoto teve que se mudar para a casa dos pais, em São João del-Rei. Chegando à cidade, o jovem não poderia ter encontrado um cenário melhor: seu pai, João Veríssimo da Silva, tinha fundado o América Recreativo e Futebol. “O Seo Zico (pai), era presidente e treinador, ele dominava a coisa, era bravo e não admitia moleza em campo”, conta José Diláscio Teixeira, primeiro secretário do clube, hoje com 89 anos.

do interior – e naquela época tudo era mais difícil – para procurar sua certidão de identidade, chegou lá, tinha uma com o nome João Veríssimo. A partir daí, ele adotou esse nome, se casou e foi sepultado com ele”, lembra Jorivê. Há controvérsias Após se destacar nos gramados são-joanenses, Telê despertou a atenção de pessoas ligadas a clubes cariocas. Porém, sua saída do América rendeu várias histórias. Para muitos, o jogador foi para o Rio de Janeiro jogar no Fluminense. Entretanto, há uma história, contada por Jorivê Jr., de que, na verdade, Telê teria ido para o Botafogo. Na sede do time da estrela solitária, um olheiro do Fluminense teria pedido ao jogador que “pulasse o muro” para ir jogar na equipe das Laranjeiras. Seu pai, que se importava com a palavra empenhada, não queria que o filho jogasse no Fluminense, pois já tinha se comprometido com o Botafogo. Apesar dos esforços de Seo Zico, Telê vestiu a camisa tricolor.

João Veríssimo da Silva?

Jogador e treinador

A paixão de Telê Santana pelo futebol era comum na família. Seu pai foi goleiro do América Mineiro entre 1927 e 1928. Um fato curioso sobre Seo Zico era que, até a adolescência, era conhecido por outro nome. Segundo seu sobrinho Jorivê Jr., quando o tio foi buscar o documento de identidade em Belo Horizonte, deixou sua impaciência falar mais forte: “Quando vovô saiu

No time carioca, Telê ganhou reconhecimento nacional. Tanto que foi organizado o concurso “Dê um slogan para Telê Santana e ganhe 5 mil cruzeiros”. O apelido escolhido foi “Fio de esperança”, pois o jogador era franzino, pesava 57 kg. Ainda como jogador, teve passagens por Guarani, Madureira e Vasco da Gama. Iniciou sua carreira de treina-

dor nas categorias de base do Fluminense. Posteriormente, treinou o time profissional. Foi campeão carioca pelo Tricolor das Laranjeiras em 1969. Pelo Atlético Mineiro, foi campeão brasileiro em 1971. Passou por Botafogo, Grêmio e Palmeiras, até chegar à Seleção Brasileira, em 1980, time que, para muitos, foi o melhor de todos os tempos. Após derrota nas Copas de 1982 e 1986, Telê foi taxado de “pé frio”, mas nem por isso se deixou abater. “Telê era um cara centrado, nunca se lastimava, sempre focado. Muito alegre na família e muito carrancudo fora”, revela o sobrinho. Apesar de ter retornado algumas vezes a São João del-Rei, alguns integrantes da velha guarda do

América ficaram ressentidos com a ausência de Telê na cidade. Segundo José Teixeira, primeiro secretário do clube, o treinador não deu atenção ao clube são-joanense. Depois dos mundiais perdidos, Telê deu a volta por cima, consagrando-se bicampeão mundial pelo São Paulo em 1992 e 1993. Mestre Telê faleceu em abril de 2006, aos 74 anos. O vice-presidente do América, Celso Pinto, se comprometeu a manter viva a memória do treinador: “Faço questão de procurar os clubes em que Telê fez sua história, para manter viva a sua memória. Fala-se muito em Itabirito, mas a verdadeira história foi em São João del-Rei. Foi a escada para alcançar algo maior na vida.”


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As mudanças na educação para a pós-modernidade SARAH EVELYN

Um senhor que aparenta já ter mais idade, com cabelos grisalhos, óculos de lua e gravata borboleta é chamado à mesa e aplaudido com entusiasmo por todo o anfiteatro do campus Dom Bosco, UFSJ. Aquele senhor é ninguém menos que Michel Maffesoli, sociólogo conhecido por seu respeito às tribos urbanas e professor emérito da universidade Sorbonne. O francês, que mais parecia ter saído de um filme do Woody Allen, foi o convidado de honra do II Seminário de Caminhos Junguianos – A Travessia do Sussuarão. Fazendo referência ao livro Grande Sertão Veredas, do escritor brasileiro Guimarães Rosa, o seminário debateu as fronteiras disciplinares e as dificuldades para se transpassa-las dentro da universidade. Maffesoli costuma definir o Brasil como o laboratório da “Pós-modernidade” e levanta a discussão sobre a relação professor-aluno por meio do preceito da temporalidade. O professor explicou como a cada término de uma época os parênteses começam a se fechar e os questionamentos nela feitos devem ser recolocados. Com base nisso, já se pode ver que essa interação de forma distante não atende mais a demanda de ensino, agora o perfil de um educador parceiro muda completamente as regras do jogo e o modo como se dá a troca de conhecimento. Explorando ainda mais, o sociólogo resgatou o conceito de seminário dentro da Grécia

Foto: Divulgação / EBC

Em palestra na UFSJ, Michel Maffesoli discute o panorama do ensino e a relação professor-aluno

RUMOS DA EDUCAÇÃO Sociólogo francês acredita que vivemos uma reforma nas formas de ensino

antiga e levantou a importância de compartilhamento do mesmo de forma orgânica. Deixando clara a saturação de um sistema no qual o conhecimento segmentado, baseado na produção em massa de indivíduos rasos, não é satisfatório. “O fim de um mundo não é o fim do mundo”. Com esta afirmação ele ressalta que as mudanças que vem se materializando não são a destruição do sistema atual, mas sim sua reforma. Se purgando de algumas certezas para abrir espaço para as velhas novas experimentações de conhecimento se resgata

“O fim de um mundo não é o fim do mundo” Michel Maffesoli, sociólogo o caráter socializador da educação. Em meio a uma sociedade que naturalizou as práticas de ensino por meio da imposição, se perdeu no meio do caminho a excitação pela construção do conhecimento, tornando-se excludente para os indivíduos que não conseguem se adaptar a ele.

A formação de uma sociedade pós-moderna plural já é visível e a relação do homem em sociedade, com o tempo e por meio dos novos usos da tecnologia, é de forma desordenada, não mais cronológica, mas sim simultânea. Essas novas relações tem dado a ideia de completude dentro de um sistema, que ainda se encontra em formação trazendo não somente a recolocação das perguntas, mas o reencanto pelo mundo. A educação denegou por tempo de mais a vivência e animalidade do ser humano, agora se tem todo um laboratório para se redescobrir o aprender pela frente.


8 Ensaio Fotográfico

Mãos que eternizam a história por Suellen Jacques é aluna do 6º período do curso de Comunicação Social - Jornalismo da Universidade Federal de São João del-Rei

Estanho, madeira e cerâmica. Matérias primas de uma São João del-Rei que vai além dos sinos. Ano após ano, o ofício da arte vai sendo passado de artesão para artesão. E é na intenção de retratar a beleza e delicadeza dos moldes centenários que Suellen Jacques apresenta este ensaio fotográfico.


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