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Educação a distância não é para todo mundo
from Jornal De Fato
a éCI o Câ N d I do professor da UERN, aposentado. autor da obra Tempos do verbo aeciocandidocuite@gmail.com é necessário, por todas as razões que sabemos: a conquista de uma sobrevivência digna passa, em geral, pelo estudo. Mas não é este argumento racional o que mais pesa na configuração do estudante ideal. O que pesa mais é um dado subjetivo: ele gosta de estudar. guém se educa sozinho, que os homens se educam em comunhão, mas ela pode também ter esse alcance. O convívio de adolescentes é educativo, em várias direções. Ele funciona como estímulo afetivointelectual para se buscar juntos uma resposta, um conhecimento novo. A admiração criada em torno do estudante inteligente e dedicado, do “cobra” em uma ou outra matéria, funciona como um estímulo difuso, mas gerador de efeitos positivos, em razão da tendência ao envolvimento emocional e à imitação que nós humanos carregamos. O convívio frequente partilha desejos e pode influenciar bons hábitos.
A diferença entre paciente e estudante é crucial: o bom paciente é bom pela necessidade da cura; se adota o tratamento, não é por gosto, é por necessidade. O bom estudante não estuda apenas porque o estudo é uma necessidade individual e social, mas sim porque gosta, porque sua curiosidade pelo mundo extrapola seu universo particular.
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Minha mãe é uma paciente ideal. Paciente ideal é aquele que não dá trabalho ao médico, que segue à risca suas determinações. O paciente ideal precisa ter muita disciplina. Minha mãe tem: toma os remédios na hora certa, pelo prazo estabelecido, cuida da alimentação e do corpo, conforme a prescrição. Para ela, não há remédio ruim; há remédio necessário, e isso basta como motivação.
Há também o estudante ideal: é aquele que estuda sem que alguém o obrigue a estudar. Estuda por prazer, estuda porque gosta. O estudo
A escola, claro, não recebe apenas estudante ideal. Na verdade, de entrada, recebe poucos. Faz parte do seu trabalho transformar o aluno em estudante ideal. Mas, se ela, planejadamente, não faz nada para isso, alguns elementos do ambiente escolar atuam, naturalmente, nessa direção: gostar dos colegas, gostar da escola, gostar dos professores, gostar do esporte, do teatro, da música ou da iniciação científica são variáveis poderosas para fazer um jovem gostar de estudar. Ou seja, o convívio escolar pode transformar o estudante alheio ao estudo em estudante ideal.
O convívio entre pares é fundamental para o aprendizado. Não é este o sentido primeiro da frase de Paulo Freire, a que afirma que nin- www.defato.com e-MaIL: redacao@defato.com
Enfim, o ambiente intelectual, por contágio, pode corrigir ou estimular uma qualidade pessoal, que alguns têm naturalmente e que outros precisam adquirir ou lapidar: o gosto e a disciplina para o trabalho intelectual, por exemplo. Mas se com o convívio pode-se aprender a gostar de estudar, dificilmente com ele pode-se aprender a estudar. Esta é uma atividade racional, só se adquire por intervenção sistematizada.
Tudo isso, claro, diz respeito apenas à educação na modalidade presencial.
A Educação a Distância é uma política pública de grande poder inclusivo. Ela quebra as barreiras geográficas e traz para a sala de aula quem está a centenas de quilôme- dIreçÃO geral: César santos dIretOr de redaçÃO: César santos gereNte adMINIStratIVa: Ângela Karina deP. de aSSINatUraS: alvanir Carlos tros de distância de uma escola e que, por muitas e diversas razões, não pode sair de onde está, deixar de lado o que faz, e se dedicar aos estudos. Olhando apenas por este lado, ela `permite um verdadeiro milagre intelectual e social, possível graças ao grande avanço das tecnologias de comunicação. Por princípio, ela quer incluir todo mundo. Mas se na educação presencial o papel do estudante no processo de aprendizagem é fundamental, na EaD ele é capital, é determinante. Não há o entorno afetivo, mediado pela camaradagem do grupo e participação na vida escolar, tão importante como estímulo à aprendizagem quanto outros instrumentos pedagógicos. Na EaD é o estudante e ele mesmo; a relação mais fria com os professores, sem criar os laços que a presença facilita e desperta, exige que o estudante se baste a si mesmo, em grande medida. A EaD está distante dos benefícios do convívio.
O sucesso do aprendizado na EaD depende do perfil do estudante, do seu perfil de estudante ideal, aquele que traz consigo todas (e aqui cabe um negrito, como destaque) as qualidades necessárias a quem quer aprender: curiosidade, atração pelo conhecimento, capacidade de concentração, disposição, paciência e persistência (para repetir uma leitura ou um exercício quantas vezes forem necessárias, porque nem tudo – na verdade, quase nada – se aprende no primeiro contato). Enfim, o gosto pelo estudo, ponto de partida de tudo. E, além deste, o conhecimento das técnicas que facilitam a apreensão do conteúdo e que tornam mais eficiente e menos penoso o ato de estudar. É esse aluno que terá sucesso nessa modalidade de ensino e é ele que justificará a invenção desse meio de educação, democrático, inclusivo, mas com muita facilidade para ser desvirtuado.

Um produto da Santos Editora de Jornais Ltda.. Fundado em 28 de agosto de 2000, por César Santos e Carlos Santos.
No ensino a distância não se conta com o convívio, com a intensidade das trocas facilitadas pelo ambiente presencial. Falta à EaD o ambiente de contágio, a mistura de racionalismo intelectual e afeto gerado pela convivência entre pares. Esta variável precisaria ser levada em conta. Claro que a metodologia da EaD pode enfrentar esse problema, tentando criar respostas a ele. Resta saber se tem consciência dele e se tem tentado mitigá-lo. Por sua vez, o ensino presencial público não dá muita atenção ao treino do aluno para o estudo. Fala-se muito na fórmula “aprender a aprender”, em autonomia do aluno para buscar seu próprio aprendizado, mas se investe muito pouco em seu ensino – em ensinar a aprender.
O aluno ideal da EaD é aquele que já aprendeu a aprender, que chega sabendo aprender. E não são muitos os existentes.