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Estereótipo racial afeta vida de mulheres amarelas no Brasil

Alunos da PUC-SP promovem debate sobre racismo amarelo e abrem espaço para refl exões sobre o corpo feminino

Por Gabriel Tomé e Júlia Takahashi

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Desde 2017, a Atlética de Comunicação e Artes da Pontifí cia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) realiza a Semana da Diversidade anualmente, com o intuito de debater temas pouco discutidos nas principais mídias e entre os jovens. Este ano, o evento ocorreu entre os dias 18 a 22 de outubro, chegando a sua quinta edição e trazendo à tona temas como gordofobia, saúde mental, maternidade de atletas e crise climática.

A semana foi aberta com a mesa “Eu Não Sou o Vírus: a Intensifi cação do racismo amarelo durante a pandemia”. Participaram a atriz Julie Kei, autora da monografi a “Entender a origem do termo ‘perigo amarelo’ e analisar seu uso na atualidade”, reconhecida pela Columbia University, Enzo, infl uenciador e criador de conteúdo sobre racismo amarelo e a estudante de relações internacionais Miwa Kashiwagi, que está realizando intercâmbio em Seul, na SKKU, pela Fundação Getúlio Vargas.

Durante o debate, Miwa relacionou a discriminação com a fetichização da mulher amarela, já que, muitas vezes, elas são esteriotipadas como delicadas, meigas e indefesas. Em entrevista ao Contraponto, a jornalista Misaki Tanaka comenta que um dos motivos dessa sexualização refere-se às Gueixas. “No ocidente, há uma interpretação incorreta em relação ao ofí cio das ‘maikos’ e das ‘gueixas’, das quais são consideradas prostitutas de luxo, o que está incorreto, além de que confundem as diferentes culturas (coreana, chinesa, japonesa, etc)”.

As Gueixas possuem o conhecimento das danças tradicionais, sabem tocar instrumentos musicais e são refi nadas. Durante o século XVII, se apresentavam para os mais nobres e até hoje realizam performances para entreter o público, principalmente líderes políticos e famosos da sociedade japonesa, enquanto as Maikos são mais novas e estão no treinamento para ser uma gueixa.

A partir disso, é possível analisar os valores culturais que o Ocidente dissemina sobre o Oriente, principalmente a respeito da mulher. O que fi cou evidente quando, no dia 16 de março de 2021, ocorreu um massacre em Atlanta, no Estado da Geórgia. O assassino Robert Aaron Long, jovem de 21 anos, entrou em três casas de massagem em que a maioria das funcionárias eram de descendência asiática e atirou a esmo. Quando confessou o crime, alegou ser “viciado em sexo” e isso seria uma tentativa de acabar com a “tentação”. O caso está diretamente ligado à hipersexualização da mulher Oriental, uma vez que a indústria cinematográfi ca difunde o estereótipo de que as mesmas usam jogos sexuais para levar os homens à ruína.

Em produções tradicionalmente asiáticas, como animes, a mulher possui uma imagem totalmente romantizada, na qual é indefesa e submissa , às vezes contendo conotação sexual. No fí sico, são vistas com roupas decotadas, seios enormes, cinturas fi nas, inalcançável para qualquer mulher. Esse estereótipo sobre o corpo delas vai muito além de padrões de beleza, mas como o machismo e a xenofobia afetam outras áreas de sua vida.

“Inúmeras vezes fui abordada por desconhecidos na rua, como se qualquer mulher amarela topasse sair com desconhecidos. Ou perder uma vaga de trabalho para as mulheres caucasianas, por ser considerada “diferente”, relembra Misaki, de vezes que o preconceito afetou sua vida.

Diante disso, Julie Kei acrescenta: “Na hora de conhecer pessoas novas, por exemplo, sempre fi co apreensiva porque nunca sei o porquê real delas estarem falando comigo, se é pela minha personalidade ou pela minha aparência. Depois que eu fi z minha pesquisa, vi depoimentos que me deixaram mais apreensiva ainda: gente que aposta com o amigo se consegue fi car com uma pessoa amarela, como se fôssemos um objeto. Os estereótipos também fazem pressão, porque você se sente pressionado a seguir os padrões que te impõem. De certa forma, acho que eles acabam moldando traços da nossa personalidade.”

Durante sua pesquisa, Kei descobriu que há uma grande procura por mulheres amarelas em sites pornográfi cos e que isso está muito atrelado ao estereótipo de submissão, permissiva e de poucos desejos.

A estudante de direito Jéssica, da Universidade de São Paulo, se posiciona diante disso: “a sexualização não vem só do sentido lato do ato de sexualizar (o de dar um caráter sexual a algo ou alguém). Mas também na forma de exercer constante pressão nas mulheres amarelas para que estas atinjam e se mantenham dentro dos padrões estéticos disseminados pelos fi lmes pornográfi cos”.

Essa imagem que é moldada há muito tempo somou-se ao ódio agravado pela pandemia. Segundo os dados do Centro de Estudos do Extremismo da Universidade Estadual da Califórnia, em 2020, dezesseis das maiores cidades dos Estados Unidos reportaram aumento de 150% em relação a 2019 nos crimes de ódio contra orientais. De março de 2020 a fevereiro de 2021, ocorreram mais de 3,5 mil relatos de incidentes, que variam de comentários racistas a ataques violentos.

A sociedade está muito longe do fi m do racismo, da xenofobia e do machismo. Dessa forma é de suma importância questionar e debater sobre racismo amarelo e principalmente como o papel da mulher é representado diante esse preconceito.

© Larissa T Ferraz

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