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“Estou há oito meses sem receber um real”, desabafa atleta Jucilene Silva
Em meio às discussões sobre salários cortados e atletas com bolsas atrasadas, o debate sobre o investimento no esporte cresceu no Brasil durante as Olimpíadas
Por Isabela Gama Figueroa, Tiago Herani Oliveira e Carlos Eduardo Morita
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Ao longo dos Jogos Olímpicos de Tóquio 2020, o desempenho do Brasil gerou um sentimento de patriotismo quase esquecido pelos brasileiros. Junto a isso, o debate acerca dos investimentos nos atletas do “Time Brasil” tomou conta das redes sociais. Em entrevista ao Contraponto, o diretor de esportes das Olimpíadas do Rio 2016, Rodrigo Garcia afi rma: “Na minha opinião, a falta de incentivo é um problema de política nacional e não só do Comitê Olímpico do Brasil (COB). A missão do COB é desenvolver o ideal olímpico no país, mas quem tem que investir nas categorias de base, nos clubes e manter as federações saudáveis, é a Secretaria do Esporte”.
Em 2001, foi sancionada a Lei n° 10.264/01 conhecida como Lei Agnelo/ Piva, que destina 1,7% da arrecadação da loteria federal para o comitê olímpico e 0,3% para o paralímpico. Garcia explica que uma parte desses recursos fi ca com o próprio COB para tocar alguns projetos, como a Missão Olímpica – que consiste em levar os atletas para participar dos jogos. O restante é distribuído para as confederações brasileiras de cada esporte, que repassam para as federações estaduais onde o esporte é praticado. Por exemplo, o COB transfere a verba para a Confederação Brasileira de Voleibol que, por sua vez, direciona o recurso para a Federação Mineira de Voleibol e, fi nalmente, aos clubes, numa espécie de “efeito cascata”.
Garcia revela que o COB faz um planejamento baseado na arrecadação das loterias para cada quadriênio – o tempo que leva de uma olimpíada a outra – e, nesse processo, são privilegiados os esportes com mais chance de conquistar medalhas nos próximos Jogos. No entanto, ele aponta: “a grande maioria das confederações pega esse dinheiro, investe errado, e no próximo ciclo elas não tem essa verba, voltando para a estaca zero”.
Segundo a Secretaria Especial de Esportes do Ministério da Cidadania, 242 dos 302 atletas olímpicos recebem a Bolsa Atleta – auxílio governamental –, correspondendo a 79% dos esportistas. Entretanto, em 2020, com a pandemia da Covid-19, o Governo Federal não abriu o edital de requerimento da bolsa, o que resultou no corte da verba para centenas de atletas, que tiveram que se manter com os patrocínios e salários dos clubes. Além disso, o “DNA do Time Brasil” expôs que 131 competidores brasileiros não contam com patrocínio.
Matheus Corrêa, segundo colocado no ranking brasileiro de marcha atlética, revelou ao GE que contava com o benefí cio para pagar o seu aluguel, mas devido ao atraso passou a realizar fretes para conseguir se sustentar.
Em seu Instagram, a praticante de lançamento de dardo Jucilene Lima desabafou: “Estou há oito meses sem receber um real, tive que me virar como podia. Minha família que me ajudou financeiramente”.
Apesar do alto número de benefi ciados, muitos atletas se queixaram sobre a falta de patrocínio e problemas com os salários dos clubes. Entre eles, está Thiago Braz, campeão olímpico em 2016 e medalhista de bronze em Tóquio 2020, que foi demitido do Esporte Clube Pinheiros no ano passado, após a diretoria alegar que não havia retorno de visibilidade que fi zesse jus ao investimento nele. nossas histórias ou começar a gostar de um esporte novo”.
O caso de Darlan Romani mostra que o incentivo da população é capaz de superar inúmeros obstáculos na visibilidade e, consequentemente, no investimento nos esportes. Na internet, torcedores realizaram uma “vaquinha”, colocando como meta a quantia de 150 mil reais para o atleta conseguir arcar com os custos de preparação para os Jogos de Paris 2024. A arrecadação não só atingiu a meta, como a dobrou. Contudo, Romani decidiu reter apenas a quantia inicialmente proposta, doando a outra metade para o projeto social “Atletismo na Rua”, do qual faz parte. Durante as Olimpíadas, o presidente Jair Bolsonaro manifestou-se duas vezes sobre a competição. Uma delas durante as provas de skate street, quando enalteceu a redução do imposto sobre a importação do skate, e, posteriormente, divulgou um vídeo em apoio aos atletas que não subiram ao pódio.
João Roma, Ministro da Cidadania, parabenizou os competidores brasileiros em todas as medalhas olímpicas conquistadas, sendo também o representante ofi cial do Governo em Tóquio. Enquanto isso, Marcelo Reis Magalhães, amigo de infância de Flávio Bolsonaro e atual Secretário de Esportes, não se pronunciou sobre as conquistas do Time Brasil em nenhum momento.
A realidade de centenas de atletas depende de visibilidade e valorização. Mas, quando estas vêm, são apenas durante os Jogos Olímpicos.
© Reprodução
Darlan Romani com as crianças do projeto “Atletismo na Rua”
© Júlio César Guimarães/COB
Thiago Braz com sua medalha de bronze no salto com vara
Quando perguntado sobre as difi culdades que terá que enfrentar para chegar nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, Pedro Burmann, atleta de revezamento 4x400m, revelou em uma live na página do Instagram “@tequeroemparis2024” que: “A grande maioria dos atletas brasileiros não tem condições de ir para a Europa competir. Aqui nós competimos com pessoas de um nível, mas lá fora o patamar é outro. Fica muito difí cil evoluir se não competimos com os melhores”.
Burmann acredita que podemos reverter esse quadro aos poucos se houver incentivo não só de empresas, mas da população: “Ninguém é obrigado a assistir os jogos e acompanhar os atletas, mas, às vezes, se você ao menos se permitir conhecer, pode se inspirar com
